Capítulo 29
"Eu me apaixonei por uma garota que conheci no inferno
Pensando em todas as coisas
Quando você puxa as cordas
Eu amo o jeito que você me excita
Eu não sou Hades, mas sou o rei
Eu faria qualquer coisa
Para que eu pudesse te levar para casa."
- Ashes, Stellar
Dinesh aproveitou a euforia dos convidados no baile para caminhar pelo corredor afastado dos demais cômodos. Ele passou pelos seguranças mortos pela Sakura alguns minutos atrás antes de partir para longe da mansão. O Yamir possuía uma expressão vazia como se o cenário horrendo ao seu redor não o afetasse. Após causar e sofrer tanta dor em sua via, sentia-se inexpressivo quanto a essa situação.
Então, entrava no quarto de Tomio Hitsudata o encontrando amarrado numa cadeira por uma corda preta. Ele estava com a cabeça inclinava para baixo enquanto uma espuma branca saía de seus lábios cinzas. O corpo dele estava repleto de machucados e o sangue ainda pingava no tapete bege.
— Eu sempre pensei que o Ryan fosse o mais patético do grupo, mas você se superou parecendo um cachorrinho com raiva. — brincava Dinesh caminhando até o criado mudo, onde havia uma garrafa de whisky, não tardando em encher o copo ao lado. — Você está tão feio quanto naquele dia em que me drogou.
O Yamir lançava um olhar divertido em direção ao cadáver, sentando-se na cama ao lado da cadeira enquanto bebericava o whisky.
— Sabe, eu devo admitir que é um pouco assustador vê-los morrer porque eu sei que a minha vez se aproxima. — ele comenta encarando o quarto iluminado pela luz do luar que invadia o ambiente através da janela. — Como a Sakura irá me matar? Eu deixarei que ela escolha, quero ser justo. Eu sou uma pessoa justa diferente de você, seu filho da puta!
Ele sentia um extremo vazio em seu peito, além do medo evidente em sua voz. Apesar de reconhecer o quanto errou na vida, Dinesh não queria morrer, principalmente quando havia reencontrado o seu ânimo para viver e buscar a própria felicidade.
— Eu te vejo todo fodido e imagino como o meu corpo ficará. Óbvio que continuarei sendo extremamente belo mas... — ele levava o copo aos lábios, deixando uma lágrima escorrer pelo canto do seu olho. —... isso é assustador para caralho. Por isso, eu posso usar a minha vida miserável para algo mais nobre, não acha noiva cadáver da deep web?
Então, ficava de pé puxando um fio do seu cabelo e jogando-o no tapete ao lado da poça de sangue. Em seguida, ele se abaixava para encarar os olhos sem vida do seu amigo de trabalho, recordando de todos os bons – porém, curtos e quase inexistentes – momentos que tiveram juntos.
— Eu preciso deixar meu DNA aqui, sabe? E como não vou meter o meu pau em um cadáver fedorento e desprezível que, por sinal, não faria nem se estivesse vivo, vou improvisar com o cabelo. — comenta erguendo o corpo e apoiando a mão nas mechas do cabelo de Tomio, puxando a cabeça dele para trás. — Mas que droga, você está fedendo tanto quanto antes.
O homem girava entorno do próprio eixo, analisando o quarto e depois o corpo de Tomio.
— Eu terei um puta trabalho para implantar provas, mas ao menos será uma noite divertida para nós dois.
No andar de baixo, os convidados conversavam animados esperando a volta do anfitrião, Tomio Hitsudata, para anunciar a tão importante notícia que ele havia comentado para todos. Enquanto isso, Miyuki estava com as mãos apoiadas na pilastra encarando a fonte no vasto jardim do empresário.
— Sozinha?
Ela tinha um leve espasmo surpresa ao ouvir uma voz feminina, virando o rosto em direção a uma bela mulher de olhos dourados e pele morena. Por algum motivo, aquela desconhecida de vestido vermelho e longos cabelos negros a lembrava o Dinesh.
— S-Sim.
— Então, se importa em me fazer companhia? A minha filha está entretida demais, brincando. — comenta olhando Maya por cima dos ombros que pulava com outras crianças.
— Não, será bom ter uma companha. Prazer, eu sou Miyuki Sato!
— Mahara Yamir, prazer.
Miyuki arregala os olhos surpresa e a sua reação não passava despercebida pela outra mulher.
— Algum problema?
— A senhora deve ser a mãe do senhor Yamir.
— Oh, sim. Pelo visto, você também é da empresa. — Mahara dizia com um sorriso simpático. — Espero que o Dinesh não esteja causando tantos problemas.
A jovem sorria amarelo voltando a focar no horizonte.
— Eu já trabalhei como secretária do senhor Yamir mas fui transferida para o setor de distribuição. Eu não posso negar como estou amando trabalhar nessa nova área mas...
— Mas sente falta do antigo posto. Se quiser, posso pedir para o Dinesh te readmitir como sua secretária.
— N-Não, é melhor não. — ela responde levemente corada. — Eu quero aprender mais sobre a empresa nesse novo setor.
Mahara analisava a expressão de Miyuki, apoiando-se na amurada com um leve sorriso de canto.
— Você gosta dele, não é?
— O que?!
— Está óbvio.
Miyuki pigarreia alto e abaixa a cabeça mais corada do que antes.
— Sim... Eu gosto, mas o senhor Yamir precisou me afastar porque não sentia o mesmo.
— É difícil saber o que se passa na mente do Dinesh, porque ele tem a necessidade de proteger todos sozinho e, por isso, faz escolhas precipitadas que não condizem com o que sente. Então, se o Dinesh te afastou por algum motivo é porque te considera importante o suficiente para se preocupar. — Mahara dizia com suavidade em sua voz, prendendo a atenção de Miyuki nela. — É claro que não posso justificar as suas atitudes mas, no fundo, ele é um bom garoto.
— Sim, ele é. O senhor Yamir me salvou tantas vezes de diversas formas que mal sabe. — Miyuki comenta fazendo Mahara exclamar surpresa. — Eu só desejo que ele encontre a paz que tanto almeja.
— Você é uma boa garota, Miyuki. Eu tenho certeza que o Dinesh gost-...
A fala da mulher é interrompida pela Maya indo ao seu encontro, abraçando-a pela cintura.
— Mamadi! Mamadi! O bhaya disse para voltar para casa.
— Sério?
— Sim, ele foi para o carro mas eu queria ficar um pouco mais. — murmura com um bico. — Podemos?
— Infelizmente, não. — dizia afagando o cabelo da menor e desviando a atenção para Miyuki. — Foi um prazer falar com você. Eu espero que possamos nos encontrar mais vezes.
— O prazer foi todo meu!
Mahara pegava Maya nos braços e começava a caminhar, olhando a jovem por cima dos ombros para dizer:
— Eu gostaria de tê-la como minha nora.
Naquele exato momento, Miyuki ficava extremamente vermelha e sem palavras, sendo deixada sozinha com seus próprios pensamentos.
(...)
Youko andava pelo estúdio com uma sacola marrom, parando na frente do camarim e dando leves batidas. A porta era aberta onde surgia um braço musculoso e moreno, segurando a sacola. Logo, ele a puxava para si voltando a se trancar e a mulher suspirava aliviada, feliz por ter conseguido um horário acessível para o seu chefe. Ela desviou a atenção para a equipe de fotógrafos terminando de arrumar todos os equipamentos.
— Será um longo dia. — ela murmurava caminhando até o diretor da sessão. — Obrigada pela oportunidade, senhor Miyura.
— Ora, eu não poderia perder a chance de ter um grande empresário patrocinando nossas peças.
A mulher, líder do setor de publicidade, respondia com um largo sorriso gentil. Então, após alguns minutos, Dinesh surgia no estúdio com um longo roupão branco e o seu cabelo estava solto, tocando sua cintura. Ele fazia uma breve reverência para o diretor antes de puxar Youko para um canto, murmurando em seu ouvido:
— Tem certeza que isso irá melhorar a minha imagem?
— Sim. Essa grife tem as melhores referências em questão de índole e moralidade, então será bom para você ser visto com eles.
— Tudo bem. Eu confio em suas habilidades, Youko. — sorria fraco e caminhava em direção ao centro do estúdio ao mesmo tempo que retirava o sobretudo, estando somente com uma cueca boxer branca. — Vamos lá, então.
Youko cruzou os braços com um leve sorriso, vendo os fotógrafos cercarem o Yamir enquanto ele fazia as poses com grande naturalidade. Ela sabia que tinha feito a escolha certa em fazê-lo modelar para uma famosa empresa de roupas íntimas masculinas, pois o corpo do rapaz se encaixava perfeitamente nos requisitos exigidos no processo seletivo. Além de que Dinesh gostava de ser o centro das atenções, tanto que não disfarçava a empolgação durante a sessão de fotos.
Masaichi apareceu durante a sessão, após duas longas reuniões, sentindo a cabeça latejar de cansaço.
— Ele tem o dom. — comenta para Youko.
— Sim, o Dinesh nasceu para ter pessoas ao seu redor.
— Eu me pergunto o porquê dele afastar todos, sendo que gosta de estar rodeado de pessoas.
— O Dinesh tem os seus motivos, infelizmente nunca saberemos sequer metade da sua história.
— É uma pena...
Ao final do primeiro dia de fotos, Dinesh aproximava-se rapidamente dos dois funcionários da sua empresa já com um largo sorriso nos lábios.
— Veio me ver, Masaichi? Eu sabia que você não suporta ficar duas horas longe de mim.
— Sai fora, convencido! Eu vim te avisar pessoalmente que o seu plano está dando certo. Os acionistas estão gostando do desempenho da empresa e o nosso quadro de lucros está aumentando a cada semana.
— Isso é ótimo! — o Yamir exclama com ânimo. — A Youko disse que próxima semana será lançada essa edição da revista.
— Elas são rápidos e competentes. — pontua a mulher. — É muito adequado para nós que desejamos um efeito instantâneo.
Dinesh não conseguia conter o sorriso de satisfação em seus lábios, sinalizando para que os seus dois colegas de trabalho o acompanhassem até o seu camarim. Ao adentrarem no pequeno cômodo, o Yamir retirava o roupão ficando apenas com a cueca branca. Youko fez pouco caso da cena, digitando em seu celular enquanto Masaichi abria a bolsa do indiano.
— Não acredito nisso, Dinesh! — exclama tirando de dentro da bolsa uma régua de trinta centímetros, começando a rir. — Está marcado no oito, parabéns!
— Você está segurando ao contrário, Masaichi.
O vice diretor arregala os olhos, surpreso, largando a régua no mesmo instante. Youko ria alto diante da reação dele enquanto Dinesh mantinha um sorriso convencido nos lábios. Masaichi aproximava-se ainda com a mesma expressão, dando um tapa na nuca do Yamir.
— Como esse monstro cabe aí dentro?
— Sei lá. Às vezes, eu preciso ajeitar colocando-o para...
— Chega, rapazes. Nós precisamos decidir qual será o próximo passo.
— Eu irei para a área de distribuição falar com o responsável. Como nós somos próximos desde o falecimento do baldi, acredito que teremos um bom diálogo.
— E por que deseja ir para esse setor, Dinesh?
— Eu passei a noite em claro formulando um sistema de distribuição mais eficaz. — ele dizia fechando os botões da sua camisa social azul marinho. — Assim, o rendimento dobra e mantemos os mesmos gastos.
— Você é um gênio. — parabeniza Youko. — Tenho certeza que o Raj tem orgulhoso de você, onde quer que ele esteja.
Dinesh abria um sorriso bobo e assentia com a cabeça, sentindo um alívio interno por finalmente estar rodeado por boas pessoas.
(...)
Miyuki caminhava lentamente pelo lado exterior do galpão, segurando uma prancheta marrom e conferindo a chegada das mercadorias. Os caminhões chegavam com os diamantes e o ouro em seu estado bruto, onde os funcionários corriam de um lado para outro a fim de transportá-los para o interior do imenso galpão – vulgo a antiga boate. A mulher encarou aquele local totalmente diferente, lembrando de quando conheceu o seu chefe enquanto dançava para os empresários.
Ao mesmo tempo que a cena do assédio a assustava, reviver a sensação dos braços do Dinesh a protegendo causava um conforto inexplicável. Infelizmente, ela precisou afastar esses pensamentos para prosseguir a sua caminhada. Enquanto passava pela frente de um dos caminhões já vazios de qualquer mercadoria, os trabalhadores sentados na carroceria começam a comentar:
— Venha aqui, gostosa!
— Não tenha medo, nós não mordemos. Bem, só se você pedir.
Eles riam ignorando o evidente desconforto da jovem ao ouvir tais comentários. Ela apertava com força a prancha contra seus seios, apressando os passos mas quase caía por causa do sapato alto. Então, para a sua infelicidade, precisou andar lentamente com a cabeça baixa. Os homens desciam da carroceria para se aproximar dela, o que a fez ficar em alerta e mais desconfortável.
Porém, um mão surge na sua frente apoiando-se na parede e a impedindo de avançar. Miyuki recuava erguendo o olhar para o homem de intensos olhos negros e longo cabelo solto. Nesse momento, o coração dela falhava nas batidas e o seu rosto já se encontrava corado. Por outro lado, Dinesh encarava friamente os funcionários da distribuidora que davam passos para trás, assustados.
— Vocês têm algo a dizer para a senhorita?
— N-Não, nós só...
— A gente não sabia que ela estava com o senhor. — outro funcionário se explica, nervoso. — Desculpa.
— Vocês só iriam respeitá-la caso estivesse acompanhada de um homem? Então, eu posso deduzir que não seja respeito, apenas medo de ter sua cara quebrada. — comenta Dinesh ironicamente. — Independente da situação, é a obrigação de vocês respeitar uma mulher, esteja ela sozinha ou não.
— É que...
— Não tentem se justificar, porra! — grita fazendo todos se encolherem, exceto Miyuki que o fitava com admiração. — Há coisas injustificáveis como assédio e machucar inocentes, mas vocês não são inocentes, certo? Então, já podem imaginar o que vai acontecer agora.
Os homens apenas abaixavam a cabeça em uma breve reverência como pedido de desculpas, voltando para a carroceria do caminhão e pedindo para o motorista sair dali o mais rápido possível. Após vê-los cruzar a rua, Dinesh desviava o olhar para Miyuki esboçando uma singela preocupação.
— Você está bem?
— S-Sim. — ela respondia passando por baixo do braço dele, retornando a caminhada. — O que veio fazer aqui?
Ele a seguia em passos lentos, colocando as mãos dentro dos bolsos da calça.
— Eu vim confiscar pessoalmente a distribuição da carga.
— Ótimo, já viu. Agora, pode voltar.
— Mas eu sequer entrei no galpão, senhorita Sato. — dizia segurando o riso. — Eu sei que tenho várias qualidades, mas visão de raio X ainda não se enquadra nelas.
Miyuki sentia um estranho calafrio ao ser chamada como antigamente.
— Seja rápido, senhor Yamir. Nós estamos lotados de trabalho.
— Eu imagino.
Os dois prosseguiram caminhada em silêncio mas os olhos do homem estavam fixos em Miyuki.
— Sabe...
— Sim, senhorita Sato?
— Eu acho que você não fez aquilo com a garota.
Dinesh lançava um olhar confuso e surpreso.
— Por que diz isso?
— Porque você sempre prezou pelo respeito do corpo alheio, principalmente de uma mulher. Nos momentos em que nos encontramos, você está me salvando ou protegendo alguém, como o seu irmão. Então, é difícil imaginar que seja capaz de ter cometido uma atrocidade daquelas.
Os olhos dele enchem-se de esperança.
— Você acha que sou inocente...?
—Eu quero acreditar que sim, Dine-... senhor Yamir, mas será preciso provas mais concretas do que minha intuição. De qualquer forma, se você estava drogado, seu corpo iria agir de acordo com o seu subconsciente mas seus valores são voltados para o respeito e a proteção.
— Por isso, provavelmente, o meu subconsciente nunca me instigaria a machucar uma pessoa daquela forma...
— Exatamente. É apenas um palpite mas algo me diz que é verdade.
— Obrigado. Eu precisava muito ouvir isso.
Ela sorria sem jeito.
Ao entrarem no galpão, o líder do setor de distribuição vinha ao encontro de Dinesh apertando a sua mão com um largo sorriso. Eles se cumprimentam e a jovem aproveita para sair discretamente, mas ainda sentia o olhar intenso do seu ex-chefe em suas costas. Miyuki apressava os passos até estar apoiada em um corredor longe do campo de visão dele, apoiando a mão sobre o coração o sentindo bater de forma inquieta.
— Você está bem, Miyuki? — questiona um funcionário carregando uma caixa. — Está com febre? Seu rosto está vermelho.
— N-Não, eu estou bem. Obrigada a preocupação, senhor. Eu só preciso de um pouco de ar.
Ele respondia com um aceno, prosseguindo a sua caminhada. Miyuki desvia o olhar para Dinesh que conversava com o seu atual chefe, o qual coordenava todo o enorme galpão. Ao admirá-lo daquela distância, um sorriso bobo surgiu em seus lábios.
Ele continua lindo como sempre, pensava.
Miyuki afastava os pensamentos, apressando os seus passos até a sala da coordenação. Apesar do espaço ser pequeno e não caber mais do que três funcionários, a organização era impecável. As caixas perfeitamente enfileiradas e a montanha de papéis em ordem alfabética. Uma mulher baixinha de cabelos curtos, entorno de quarenta anos, arrumava os últimos documentos do expediente matinal.
— Senhora Abe, aqui está a relação das entregas do período da manhã.
— Obrigada, Miyuki. É o que precisamos para encerrar o expediente. — agradecia com um sorriso gentil, pegando a prancheta. — Pelo visto, a empresa está indo bem. As mercadorias não param de chegar e sair para as joalherias.
— Sim, eu aposto que o dono está dando tudo de si.
— Por falar nisso, eu fiquei sabendo que o senhor Yamir está aqui.
— S-Sim, eu acabei o encontrando no centro do galpão.
Os olhos da mais velha se enchem de brilho.
— Céus! Eu preciso ver esse homem agora mesmo!
— Hã? Por que?
— Eu nunca terei a chance de ver um deus grego como aquele duas vezes na vida. É claro que amo o meu marido mas o senhor Yamir... Nossa, essa visão eu preciso gravar em minha mente.
Ela saía apressadamente deixando a jovem sozinha com seus pensamentos. Então, Miyuki decidia sair da sala e ir para o restaurante mais próximo, almoçar antes do turno da tarde se iniciar. Com muito cuidado, conseguiu evitar qualquer lugar onde possivelmente Dinesh estaria.
Por que eu estou o evitando tanto assim? Nós somos apenas conhecidos do trabalho, pensava.
Quando estava próxima da saída do galpão, esbarrou com alguém e todo o seu corpo se arrepiou com a ideia de quem pudesse ser. Ela abriu lentamente os olhos e deixou um suspiro frustrado escapar dos seus lábios ao se encontrar com a senhora Abe.
— Desculpa, eu estou apressada procurando o senhor Yamir.
— Ainda não o encontrou?
— Infelizmente não. Quando eu fui para o centro do galpão, ele já tinha saído com o chefe para avaliar as novas mercadorias. Os funcionários comentaram que eles passaram por todo o estoque mas depois sumiram do campo de vista deles. Que droga! Quem perde de vista um gostoso como ele? — resmunga apoiando as mãos na cintura. — Eu sequer piscaria os olhos se o visse na minha frente.
— S-Senhora Abe! Calma, é só o senhor Yamir. Nada demais.
— Nada demais? Como ousa chamar aquele homem de "nada demais"? Nem aquele guindaste ali me tirava de cima dele. — ela comenta apontando para o guindaste no canto do galpão. — Não acredito que perdi a chance de vê-lo.
— Não é para tanto.
— Não o acha bonito, Miyuki?
Ela corava um pouco ao lembrar de todos os momentos com o Dinesh, onde teve a chance de vê-lo com várias roupas e até mesmo sem nenhuma.
— Bem... Ele tem uma beleza inegável, mas não é só isso. O senhor Yamir possui uma forte presença por onde passa, mesmo que muitos o considerem desagradável, eu o vejo como alguém de personalidade intensa. Os olhos dele possuem uma intensidade única que prende qualquer um ao encará-lo diretamente.
A senhora Abe balançava a cabeça em concordância até erguer o olhar por cima dos ombros de Miyuki que, inocentemente, continuava a falar.
— Eu nunca o vi sorrindo abertamente mas tenho certeza que o seu sorriso é belo. Sabe, cá entre nós, eu fico sem reação quando o vejo somente com a camisa social. Os músculos do senhor Yamir são... Uau! Muito "Uau!"
O mais velha tentava, disfarçadamente, apontar para a figura atrás da jovem.
— E o seu cabelo é tão belo e...
— Você acha, senhorita Sato?
Todo o corpo de Miyuki se arrepia com a voz grossa de Dinesh em seu ouvido.
— E-Er... S-Senhor Yamir...
— Eu não sabia que me ver de camisa social era tão bom. — comenta retirando o terno preto, ficando apenas com a camisa branca. — Assim está melhor ou... — ele desabotoava dois botões, deixando uma parte do peitoral exposto. — Devo retirar o resto?
Miyuki e a outra mulher estavam boquiabertas diante da cena. Dinesh inclinou levemente a cabeça para o lado, fazendo uma mecha longa do seu cabelo escorregar pelo rosto. Ele mordia o lábio erguendo a sobrancelha em uma expressão sugestiva. A senhora Abe acabava entendendo esse gesto direcionado para si mesma e sentia as pernas fraquejarem, quase desmaiando. Então, ela se apoiava em Miyuki que voltava a sua atenção para a mais velha, preocupada.
— Senhora Abe!
— Deixe-me ajudá-la. — comenta Dinesh ao se aproximar, envolvendo o braço entorno da cintura da mulher. — A senhora está bem?
Ela só conseguia acenar com a cabeça, encontrando-se sem palavras diante de tamanha aproximação. Dinesh a fitava com um misto de preocupação e divertimento até receber um leve tapa de Miyuki em seu ombro.
— Dinesh, você a fará ter um ataque cardíaco à qualquer momento!
— Com a minha beleza? — sorria convencido.
— Com a sua ousadia!
Ele ria alto com um certo alívio interno ao vê-la tratá-lo novamente. Miyuki mordeu o interior das bochechas fazendo careta, mas logo começou a rir.
— Seu idiota!
— Você continua linda como no baile.
— Espera, você estava...
— Vocês são próximos? — questiona Abe com um sorriso malicioso. — O que rolou entre...
— Nada, senhora Abe!
— Qual seria o seu conceito de próximo? — dizia Dinesh a puxando mais contra seu corpo, deixando-a novamente vermelha. — Eu devo testá-lo em você?
— E-Eu sou c-casada...
— Então, quer chamar o seu marido? Por mim, tudo bem.
Ela engolia seco mas Dinesh logo a soltava, rindo baixo.
— Não se preocupe, eu não ousaria fazer isso. Não mais.
A mais velha apenas murmurava algumas frases inaudíveis, fazendo uma reverência e saindo de perto deles de forma apressada. Dinesh a acompanha com o olhar sem tirar o sorriso divertido até virar o rosto em direção à Miyuki. Porém, ela já estava andando para fora do galpão.
— Ei! Volta aqui!
— N-Não temos nada a tratar, senhor Yamir!
Dinesh interrompia a sua corrida, lançando um olhar triste em direção à ela.
— Não deseja conversar comigo?
— Eu... Eu... — ela respira fundo virando-se em sua direção. — Eu tenho um namorado, sabia?! Ele é fofo, incrível e doce; diferente de você que usa as pessoas. Por isso, deixe-me em paz. Eu já esqueci do senhor, afinal nós fomos apenas algo físico e...
— Você está mentindo, Miyuki. Não há namorado nenhum.
— E eu estou mentindo quando disse que foi uma relação física ou você gosta de mim?
Dinesh abaixava o olhar, sentindo um nó na garganta e um peso no coração.
— Entende o que eu digo, senhor Yamir? Você não gosta de mim... Não da forma que eu quero. Então, por favor, esqueça de mim...
Miyuki prosseguia a sua caminhada secando as lágrimas com as costas das mãos enquanto Dinesh permanecia com a cabeça baixa. Ele ainda se sentia vazio por dentro, apesar da meditação com Manu no Brasil. No fundo, reconhecia como a sua transformação era difícil e talvez nunca fosse acontecer. Afinal, o próprio Dinesh duvidava muito que fosse se tornar uma boa pessoa em um passe de mágica.
Naquele momento, Dinesh percebeu que não adiantava mudar para melhor em seu interior se as pessoas ao redor ainda o viam como um monstro.
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