Capítulo 10
Quando acordei, ele foi a primeira coisa que vi. Estava se levantando da sua cama, com o cabelo liso totalmente bagunçado, que ele arrumou passando os dedos em apenas um segundo.
Estava um tanto desnorteado por causa do sono. Não sei até que horas ficou abraçado comigo, mas pelo jeito foi até bem tarde.
- Você... Está melhor? - perguntou, com a voz rouca, piscando os olhos de forma que os fizessem enxergar normalmente. Ele era uma graça, devo admitir. Apenas confirmei com a cabeça, me sentindo envergonhada por causa daquilo. - Que bom. Temos que seguir viagem.
Ele me levou até o banheiro do pequeno hotel, pelo visto conhecia bem aquele lugar.
- Se apronte, estamos fugindo mas é essencial que nos misturemos entre as pessoas. - disse, e se sentou do lado de fora.
- Vai ficar sentado aí? - perguntei, segurando a porta antes de entrar para me arrumar.
- Sim. É meu dever garantir que nada aconteça a você. - respondeu. Sorri vendo-o ali procurando uma forma de ficar confortável no chão.
- Obrigada. - falei, após um breve tempo em silêncio. Me senti bem ao ver que ele sorriu de volta.
- Disponha.
Me arrumei rapidamente, e me olhei no espelho com tristeza, já que agora não irei mais poder dar ao meu cabelo os mimos que ele merece. Me contentei com um simples coque no topo da cabeça, e por um breve momento pude ver um brilho dourado a minha volta, e me lembrei do que Pablo disse, que todo subliminar tem uma áurea a sua volta.
Aquilo realmente estava acontecendo. Eu não poderia mais fugir. Teria que ir até o fim.
Podia sentir o medo dentro de mim se tornar cada vez maior. Ali, naquele banheiro, decidi que não choraria mais.
- Você consegue! - disse baixinho, olhando no fundo dos meus olhos, onde por um instante, poderia jurar que vi chamas dentro dele. - Impossível...
Eu já não sabia dizer que aquilo era realmente impossível ou não, mas foi fascinante.
Me aproximei do espelho, tentando enxergar melhor, e ainda continha chamas dentro deles. Estranhas, mas ainda sim era nítido que eram chamas. Não estavam em movimento, estavam sólidas na minha íris, como se fizessem parte da coloração castanha.
Abri a porta com força, sentindo a maçaneta se esquentar sob a minha mão.
- Pablo... Quando seu poder se...
Ele não me deixou terminar a frase. Colocou o dedo indicador sobre os meus lábios e olhou a nossa volta, como se procurasse por alguém.
- Shiii. Aqui não. É perigoso. - sussurrou no meu ouvido, o que me deixou levemente tensa.
Ele segurou minha mão e me arrastou para o quarto, trancando a porta após entrarmos.
- Não faça perguntas em lugares onde podem nos ouvir, entendeu? - ele disse de forma calma. Balancei a cabeça, mostrando que entendi o recado.
- Quando seu poder se mostrou... Houve mudanças em você?
- Sim. Isso varia de subliminar para subliminar, eu por exemplo tive muita sede, e suava muito. - respondeu, tentando entender o motivo da minha pergunta. E logo raciocinei o que acabei de ver com o fato de eu sempre ser mais quente que qualquer pessoa a minha volta.
- Mas... Mudanças nos olhos são comuns?
Ele me olhou com curiosidade, como se estivesse preocupado.
- Seus olhos mudaram? - balancei a cabeça mais uma vez, e ele veio em minha direção, segurando meu queixo para levantar a minha cabeça, e deixar meus olhos a altura dos seus. - Mierda...
- O que foi? - perguntei, não entendendo a agitação dele.
Ele se sentou na cama, apoiando a cabeça nas mãos, como se estivesse se esforçando para pensar em alguma coisa.
- Temos que ir. - disse por fim. - Agora!
- Pablo, o que está acontecendo? - perguntei assustada.
- Todos os subliminares sentem mudanças antes do seu poder se revelar, mas algumas mudanças são permanentes. Como a cor dos olhos, ou do cabelo. Mas essas mudanças só ocorrem depois do poder se mostrar...
- Mas o meu poder ainda não se mostrou.
- Pois é. Isso é um problema. Quando um subliminar está longe daquilo que controla, o seu poder não se revela. Mas cada um de nós tem uma idade correta para isso acontecer. Quando isso é adiado, o poder se revela de forma ainda mais catastrófica, é quase impossível de controlar.
Aquilo já não estava em meu controle, e agora... Será ainda pior? Já não sei o que fazer. Já não sei o que sentir.
- Nós temos que tirar você daqui agora! Quanto mais isso for adiado, pior vai ser. - ele falou, se levantando novamente, e se dirigiu para o armário, pegando duas bolsas e me entregando uma delas. - Meus olhos só mudaram um ano depois que meu poder se revelou. Se os seus começaram a mudar, é provável que já faça um bom tempo que o seu poder está sendo contido aí dentro.
Ele colocou a mochila nas costas e se direcionou para a porta.
- Temos que ir, Ariana.
Eu o segui. Nós saímos do hotel, e Pablo acenou para a mulher que nos atendeu. E pela primeira vez pude ver claramente o lugar onde estávamos. Não sabia onde era, apenas sabia que era encantador.
Para qualquer direção que você olhasse, poderia ver árvores, crescendo livremente. E pássaros voando em todas as direções. Era simplesmente lindo.
Nós andamos até um pequeno mercadinho, onde uma senhora gentil nos encarava atrás do caixa enquanto escolhíamos o que comprar. Ela sorria ao me ver olhando para ela, era uma graça, porém ainda era estranho alguém desconhecido o olhar assim.
Pablo pegou o que aparentemente era essencial. Uma garrafa de água de um litro e meio, e poucas coisas para comer, como bolachas e salgadinhos.
Nós fomos até o caixa, e ela guardou tudo em sacolas para nós.
- Boa sorte, queridos. - ela disse, com um enorme sorriso estampado em seu rosto, e se virou para mim. - Obrigada, finalmente podemos acabar com essa guerra!
- A senhora é... - comecei a dizer, não entendendo muito bem.
- Uma subliminar? Ora, é claro que sim! - ela estendeu a mão por cima das sacolas, e as fez flutuarem, e se contorcerem.
- Mas... Plástico não é algo natural. - falei, me lembrando da explicação de Pablo.
- Realmente, ele não é. - ela respondeu. - Mas com o tempo, querida, você vai ganhando experiência. Eu controlo o petróleo, posso senti-lo no plástico, foi difícil, mas consegui controlá-lo nessa forma. Com o passar dos anos, você percebe que aquilo que controla pode estar em diferentes formas. Do mesmo modo que controladores de água podem retirar a água do ar, ou como controladores de fogo podem sentir o fogo arder sob sua pele graças ao sol. Lembre-se disso, querida, seu poder sempre seguirá você, não importa onde você esteja.
Ela não permitiu que Pablo pagasse por todas aquelas coisas. Disse que nós pagaríamos a todos quando acabássemos com esse tormento, e entregou uma chave a Pablo.
- É só seguir para os fundos, querido. Vai estar lá. - disse.
- Obrigado. - Pablo respondeu.
Atrás do mercadinho, encontramos um carro, não era novo, e não estava nem um pouco sujo. Pablo sorriu ao abrir a porta com a chave que aquela senhora entregou.
- Ela se importou em lavar o carro... - disse sorrindo. - Ela é um doce, não acha?
Era impossível não sorrir também. Às vezes tudo o que precisamos é esbarrar com uma pessoa gentil, ela pode mudar o seu dia.
- Você sabe dirigir? - perguntei, com certo receio de entrar naquele carro.
- É claro. Como acha que vim parar aqui?
Ele me encarou, esperando que eu entrasse no carro.
Joguei a mochila e as sacolas no banco traseiro e me sentei ao seu lado, olhando a paisagem em volta, vendo uma pequena estrada de terra logo a frente.
- Para onde vamos? - perguntei quando Pablo ligou o carro.
- Você vai ver. - respondeu.
No caminho, podia se ver muitas vacas e cavalos, mas o que mais tinha eram galinhas.
Passamos por várias casas, sítios e chácaras, até chegarmos em uma mais afastada. Demoramos quase meia hora para chegarmos lá. Mas valeu a pena.
Nela era bem nítido que a quantidade de animais era maior e mais diversificada. Os campos eram maiores, e a casa era gigante. Mas não havia ninguém, com exceção de um garoto andando a cavalo.
Era como se ele fosse selvagem. Não utilizava sela, deixou o cavalo completamente nu, e sequer segurava em sua crina enquanto cavalgava. Os dois estavam livres. O garoto usava apenas calça. Descalço, ele se levantou no cavalo, e começou a cavalgá-lo de pé, abrindo os braços para sentir o vento, e mesmo ao longe, era possível ver a felicidade e a liberdade estampada em seu rosto.
- Quem é ele? - perguntei a Pablo ao sairmos do carro, percebendo o quanto ele estava sorrindo ao observar aquele garoto, e era mesmo uma energia contagiante, mas ele sorria de outra forma. Uma forma mais intensa.
- É o meu namorado.
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