Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

3: Filmes de Rolo e Chá de Limão

O rolo encaixado no projetor de cinema rodopiava com tiques metálicos em meio à poeira do galpão antigo, dissolvendo a sequência de imagens contidas em cada película de plástico inflamável na parede de blocos de concreto há alguns metros. Uma luz bruxuleante escoava do aparelho, que crepitava vez ou outra sob seu amontoado de ferrugem e roldanas envelhecidas pelo tempo, as quais tossiam pó e memórias tão desbotadas quanto o filme à minha frente estava ficando graças a todas as vezes em que eu o colocava para assistir.

Ao meu redor, o depósito espaçoso da loja da minha tia exibia amontoados de velharias em caixas e protegidas por lonas. Além da mulher mais velha, somente eu e Romeu sabíamos desse lugar, devido a todas as vezes em que ela pediu para que ajudássemos no transporte de algumas das relíquias ali guardadas para seu estabelecimento.

Mas haviam coisas intransferíveis no galpão, também. Era naquele lugar que todas as coisas que pertenceram a minha mãe estavam, a exemplo do projetor de cinema e de cada um dos seis rolos de filme que eu nunca cansava de assistir, porque foram estrelados por ela.

As pequenas janelas retangulares de vidro espalhadas pelas paredes acinzentadas permitiam que os tentáculos de sol diluíssem seu filtro oliva ao meu redor, banhando o espaço com singelos feixes flamejantes que iluminavam a poeira pairando no ar, como estrelas que vagavam sem rumo pelo espaço, perdidas em algum ponto entre o início e o fim do universo.

O ar tinha um cheiro agridoce de fumaça, mofo e chocolate. O primeiro se sobressaiu assim que fisguei mais um cigarro do maço surrado ao lado da minha coxa recoberta por um short jeans, estalando o isqueiro na outra mão para libertar sua chama. Acendi a ponta do cilindro mostarda-e-branco e o deixei pesar entre meu indicador e médio por um instante, observando as feições etéreas da minha mãe sorrirem na projeção por trás dos arabescos de fumaça pálida que se dissolviam no ar.

Tive a impressão de que minhas artérias amarraram meu miocárdio em um nó quase impossível de desatar. Então, vieram as ondas confusas de saudade e angústia, quebrando no meu estômago em uma ânsia de vômito que só se findou quando traguei o cigarro com força, inundando meus pulmões de cinza.

Eu não fumava normalmente, e sempre que o fazia, precisava escovar os dentes umas quatro vezes para tirar o cheiro e Romeu não perceber. Detestava não ter coragem o suficiente para contar isso para ele, embora tivesse a impressão de que também ocultava coisas de mim. As coisas não eram tão transparentes entre nós desde... Bem, desde que crescemos e tudo começou a ficar um pouco mais abstrato.

Crescer é estranho pra burro, na verdade. Eu diria que as coisas começaram a sair dos eixos quando fiz onze anos. Mais precisamente, em uma apresentação sobre os movimentos  tectônicos na aula de geografia do sexto ano, quando fui para a frente da turma inteira recitar tudo o que havia escrito nas minhas palmas sobre a influência das placas no fluxo do magma vulcânico.

Deu que, enquanto falava sobre explosões magmáticas e derramamento de lava, senti que eu mesma havia me transformado em um vulcão, porque alguma coisa quente começou a escorrer pelo início da minha coxa coberta pela calça cor de trevo da escola. Meu pânico foi tanto que simplesmente parei de apresentar e comecei a correr na direção do banheiro como se lá tivesse um buraco de minhoca que me levaria direto para outra dimensão.

Enfiei um punhado enorme de papel higiênico na calcinha, questionando quanto tempo restava até a minha morte, porque não era normal sair tanto sangue de alguém como daquele jeito. Eu sequer sabia que tinha tudo aquilo de glóbulos vermelhos!

O mais trágico foi que todo aquele líquido apavorante tinha sujado minha calça, e eu estaria irremediavelmente ferrada se a voz de Romeu não houvesse reverberado por trás da porta da cabine, perguntando se eu estava bem ou se algum tipo de besouro alienígena tinha me picado e agora estava sentindo os efeitos colaterais para receber meus superpoderes.

Ele entrou mais em polvorosa do que eu, mas me emprestou o moletom que costumeiramente usava para eu amarrar na cintura. E, depois de passar a aula restante perguntando a cada cinco minutos se eu estava bem, me arrastou para o posto de saúde mais próximo depois do colégio, para nos certificarmos de que eu não estava morrendo de hemorragia interna ou colapso dos órgãos.

A enfermeira me deu um absorvente e uma camisinha para ele, que usamos para fazer balão de látex. Eu até amarrei um pedaço de barbante nela, alheia à funcionalidade real e bizarra daquele negócio cilíndrico.

Meus presentes de aniversário depois disso passaram de skates e carrinhos colecionáveis para sutiãs, caixas de absorventes e cólicas sinistras. Meu pai, então, se viu obrigado a me explicar tudo sobre o universo da sacanagem que origina os bebês e me deu uma série de conselhos sobre sexo, garotos e diversas outras coisas que me deixariam mortalmente traumatizada pelo resto da vida.

Naquela época, eu ainda acreditava na teoria de que os bebês eram trazidos pelas cegonhas e que existia uma espécie de correio de recém nascidos. Uma vez, eu até mandei uma cartinha direcionada à suprema corte das cegonhas pedindo um irmãozinho. Diante disso, dá pra imaginar o choque que foi descobrir a verdade sombria que cerca a concepção dos humanos.

Aquela foi a época em que eu comecei a perceber que os garotos me olhavam de um jeito diferente. Laura me disse que era por causa dos meus seios que estavam maiores e eu fiquei muito confusa. A minha cabecinha de ervilha não conseguia entender o que era tão fascinante naquelas duas coisas estranhas e circulares que, quando se puseram a crescer, eu entrei em desespero achando que eram tumores cancerígenos e quase matei meu pai de susto.

— Deve ser porque somos mamíferos. — Foi o que um Romeu de treze anos respondeu, depois de rir o suficiente para mil anos depois que fiz a pergunta que tanto me afligia sobre o supremo universo dos peitos.

Enquanto eu apertava por entre minhas palmas meu axolote de pelúcia amarelo, meu melhor amigo estava de pernas cruzadas na minha cama, distraído com uma das revistas em quadrinhos do Constantine que montava sua coleção.

Soprei uma madeixa de cabelo do rosto e rolei os olhos, arremessando minha pelúcia na sua direção, que teria acertado sua cabeça se não fosse a minha mira mais deplorável do que a de uma pomba cega.

— Ah, qual é, Jujuba, para de esquentar com esse negócio de peitos. Não é como se fossem as coisas mais incríveis do mundo, tipo chocolate com amendoim ou salgadinho de guacamole. — explicou, empurrando rapidamente seus óculos retangulares para o topo do nariz.

Salgadinho de guacamole tinha sido a nossa mais recente descoberta culinária, a qual encontramos escondida no fundo de uma prateleira na mercearia que costumeiramente íamos. E era simplesmente uma iguaria fantástica. Eu poderia viver facilmente em uma realidade alternativa onde tudo fosse feito dessa fritura verde.

— Se não é tão foda assim, por que os garotos tratam como se fosse? — resmunguei, ainda não convencida inteiramente da mediocridade dos seios.

Suas íris esverdeadas com salpicos incendiários de castanho se direcionaram para mim, e seus lábios esboçaram sorriso sacana que fez minhas bochechas esquentarem.

— Porque são bem legais. — entoou como se fosse óbvio, e voltou a ler a revista.

Laura insistiu em dizer que essa paranoia era fruto de minhocas da minha cabeça, e, por um instante, eu me peguei imaginando o anelídeo em questão rastejando pelo meu cérebro e comendo meus miolos; o que fazia completo sentido para me explicar com todas as minhas mirabolâncias de vez em quando.

Puxei fôlego, levantando-me ao som do rolo de filme enganchando naturalmente ao chegar ao final. Soltei a guimba do cigarro no chão e pisoteei seus restos mortais com a ponta do meu sapato, pescando o maço do piso cinzento logo depois para enfiá-lo no bolso do jeans. Esbarrei com os dedos em um pequeno buquê de flores cor de sol no compartimento, as quais coletara pelo caminho, e para não as amassar, decidi pôr a carteira no outro bolso.

Removi o filme do equipamento obsoleto e o guardei com cuidado na caixa de onde retirara. Em seguida, fisguei minha mochila e saí do galpão, trancando-o atrás de mim com minha cópia da chave. Minha bicicleta repleta de adesivos descoloridos descansava sobre a grama baixa que recobria as laterais do caminho de terra até a entrada.

Eram uns trinta minutos de pedalada até em casa. Uma hora e meia, se eu fosse passar na mercearia para comprar salgadinho de guacamole e chá gelado de limão para levar na lanchonete em que Romeu trabalhava, já que o idiota  se atrasou e, consequentemente, não havia conseguido tomar café.

É. Ia demorar para chegar em casa.

A residência dos Belmonte seria silenciosa se não houvesse dois gatos, um cachorro, um casal de porquinhos da Índia e um jabuti preguiçoso que adorava dormir. Além, é claro, da minha própria existência, que costumava suscitar um pequeno coro dos bichos assim que se fazia presente.

Adentrei na sala fazendo carinho nas gatas semi-idênticas Toscana e Linguiça, e tentando não cair diante do meu cachorro Salsicha tentando escalar minha perna com uma avidez surpreendente.

A televisão descansava em uma estante pequena, ao lado do toca-fitas de modelo antigo que eu nunca deixei meu pai se desfazer. Ele ainda tinha, até mesmo, sua velha coleção de fitas cassete, com centenas de filmes e músicas carimbadas no retângulo de plástico que significou muito em décadas passadas, e ainda significava mundos inteiros para mim.

A quietude de vozes humanas que polvilhava todos os cantos da casa não me dizia nada sobre a presença ou ausência do meu pai, porque era costumeiramente assim.

Tom era investidor e designer gráfico. Elaborava todos os seus projetos em seu escritório, onde se trancava praticamente o dia inteiro, trabalhando e monitorando as ações que tanto amava colecionar no mercado de valores.

Só sabia que ele estava comendo por causa do número de pratos sujos na pia, mas já estava acostumada com a sua presença-não-presença em casa. Era assim desde sempre, embora fosse inevitavelmente mais atencioso nos meus tempos de criança.

Particularmente, eu suspeitava que o motivo dessa piora durante os anos era porque, quanto mais o tempo passava, mais minhas feições remetiam às da mãe que nunca tive.

Por mais que meu pai dissesse que não, tinha a impressão de que a sua distância glacial era premeditada, porque a dor de lembrar dela ainda conseguia ser maior do que o amor que sentia por mim.

Enchi os potes de ração dos animais e fui conferir como a Costela, minha jabuti quase milenar, estava no jardim. Seus movimentos lentos, carregando a própria casa que parecia pesar consideravelmente por entre a terra recheada de plantas, certificaram-me de que o réptil permanecia bem.

Quando adentrei no meu quarto, puxei os tênis dos pés e abri as cortinas para que todo o sol possível irradiasse no cômodo, aquecendo seus móveis e abraçando as flores que cresciam nas minhas veias, estendendo suas pétalas cor de alvorecer por toda parte.

Observei o vaso no beiral por um instante, com meus dois cactos que quase pareciam sorrir na terra em que estavam imersos, até girar nos calcanhares e contemplar a desordem que se estendia naquele lugar.

Minha paleta estava uma mistura de cores inventadas sobre a desordem de lençóis da cama, que nunca parecia, de fato, abraçar o meu corpo. Havia potes de tinta espalhados pela mesa, próxima do meu cavalete de madeira manchado de colorido em alguns pontos, onde uma tela inacabada que começara há alguns dias se encaixava.

Ela exibia os contornos de um homem que não possuía olhar, porque eu não descobrira, ainda, como transpor o tipo de emoção que queria que ele tivesse.

Por algum motivo, o esboço me fez lembrar do que ouvira mais cedo vindo de Cordélia, antes de ir embora da casa de Romeu, sobre a forma como ele teoricamente me via.

Foi inevitável não escutar através das paredes finas da casa e, também, foi inevitável não ter meu peito preenchido de algum tipo de lisonja mesclada à estranheza.

Quer dizer, é óbvio que eu sabia que nós tratamos coisas e pessoas que gostamos de um jeito diferente, mas nunca havia parado para reparar que, no caso de Romeu, isso poderia ser tão notável e intenso a ponto de outras pessoas perceberem.

Deixei um suspiro escapar, capturando a pequena concha no meu bolso. Devo ter ficado admirando os seus contornos únicos no mundo por minutos, enquanto tentava não pensar demais acerca das notas de estranheza que modelavam a situação anterior.

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro