Philip retornou ao centro da cidade com cara de poucos amigos; e enquanto a mãe e seus cinco irmãos menores comemoravam por ele ter retornado são e salvo — o mesmo grupo de cavalheiros que lhe falara antes de sua ida à mansão dos Winks, interrogou-o:

— E então, o que conseguiu? — questionou um.

— Entrou na casa? — indagou outro.

— Viu algo diferente — quis saber um terceiro.

— Conseguiu arrancar alguma informação da garota, como pedimos? — perguntou um quarto.

Nesse momento, ele entendeu como Dara devia ter se sentido enquanto era crivada de perguntas .

— Não. Não! Não consegui nada! — o rapaz, geralmente calmo, exasperou-se.

Houve um silêncio de frustração por parte da meia dúzia de homens que aglomeravam-se em torno de Philip. Até que um deles, conhecido como Dramovic; forçando camaradagem, repousou o braço sobre os ombros do quitandeiro; e afastou-se com este dos demais.

— Nem tudo está perdido, meu rapaz, ainda pode arrancar o que quiser dessa moça.

— Não sei se quero. — deu de ombros.

— O que é isso? Precisa apenas de mais tempo ou, talvez, de um outro tipo de aproximação, se é que me entende... — abriu um sorriso malicioso, enquanto dava uns tapinhas nas costas do rapaz.

Enojado com tamanha desfaçatez, Philip fitou-o, boquiaberto:

— Está propondo que eu seduza a pobre garota apenas para satisfazer a curiosidade de vocês em relação aos patrões dela?

— Ora! Não é bem assim. Dessa maneira você me ofende. O que proponho não é nenhum absurdo. Veja bem, você só terá que unir o útil ao agradável.

— Se bem que, neste caso, o útil e o agradável podem ser bastante relativos.

— Ora! Philip, agora que temos uma chance real, não podemos desperdiçá-la. Não podemos vencer o inimigo se não o conhecermos. Antes com aquele criado mudo — riu-se um pouco da própria piada infame, recuperando-se em seguida — Desculpe, é que eu não resisti ao trocadilho: "criado-mudo". Mas, como eu ia dizendo, antes não tínhamos como conseguir uma informação, identificar um ponto fraco. Agora pode ser diferente.

— Não sei porque acha que eu faria isso. — rebateu o rapaz, deixando transparecer a indignação em sua voz.

— Simples, meu rapaz. Todos já fomos prejudicados, de alguma maneira, pelo fantasma ou seja lá o que for que habita naquela torre. O medo nos faz ceder às vontades dos Winks, e nunca conseguimos cobrar suas dívidas ou pôr um ponto final à elas. É vexatório, mas é a realidade que vivemos. Lockwood é uma cidade morta, fantasma!

— Eu ainda vendo aos Winks não por medo, ao menos não da minha parte, mas por minha mãe e meus irmãos. Se dependesse apenas de mim, não me importava que o tal fantasma viesse puxar os meus pés à noite. Eu daria um belo pontapé nas fuças dele, isso sim! — e cruzou os braços sobre o peito, irritado.

— Aí é que está: e se esse tal fantasma não passar de um engodo dos Winks, para conseguirem, por meio do temor, tudo o que querem?

— Ainda não entendo em quê seduzir a garota pode elucidar os nossos problemas...

— Elementar, meu caro Philip. Precisamos descobrir se esse tal fantasma existe mesmo ou não. Não podemos invadir a casa para tentar descobrir, já que se trata de uma propriedade privada, e, mesmo que não fosse, muitos não o fariam, por medo. Mas, morando lá, essa moça pode descobrir a verdade.

— E por que acredita que ela me repassaria suas descobertas?

— Contanto que se torne mais próximo, com certeza... Ela pode vir a se abrir inteiramente pra você.

— Creio que eu não seja o cafajeste de que precisa para esse serviço sujo, senhor Dramovic.

Disfarçando a contrariedade, o proprietário do único hotel da região, lamentou com ironia.

— É uma pena, mas nesse caso, terei que recorrer a outro que seja menos apegado a conceitos morais. Com aquela bela ruivinha como isca, certamente não será difícil conseguir quem se habilite à realizar tal favor.

Philip perdeu totalmente os poucos resquícios de bom humor que ainda lhe restavam:

— Está mesmo disposto a levar essa atitude infame adiante?!

— Estou — respondeu Dramovic, sucinto e frio — Numa cidade onde impera o medo, o meu ramo de atuação é um dos mais prejudicados. Pensei em você por considerá-lo destemido. Um forte candidato a herói local, com direito à todas as regalias que a gratidão do nosso povo poderia proporcionar a você e aos seus... — fez uma pausa estratégica ao perceber, através do interesse nos olhos do outro, que tocara no ponto certo, e então continuou — Não deve ser nada fácil para você ter a responsabilidade de sustentar uma família, sendo ainda tão novo. Uns cobres a mais certamente seriam de grande serventia. Eu mesmo estou disposto a me desfazer de alguns, contanto que consiga o que almejo... Pense bem, Philip, aposto alto em você. O seu nome ainda é o primeiro da minha lista.

Em seguida, Dramovic bateu em retirada, deixando Philip; agora pensativo; para trás...