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[00] Prólogo

🐉

Os tons alaranjados pintavam cada folha daquela vasta floresta que passava pelos olhos dos dois homens de relance; galopavam em seus cavalos há dias e quase nenhuma parada era feita.

Enfrentaram nevascas tenebrosas, de ir por atalhos no interior de geleiras, torcendo para não serem empalados por pingentes de gelo; atravessaram um deserto impiedoso, de pouco ou nada de vento, o sol escaldante era capaz de causar insolação até nas peles mais experientes e nem mesmo a noite, quando a temperatura chegava ao negativo, eles pararam.

Subiram morros íngremes, cruzaram riachos de águas violentas, enfrentaram animais peçonhentos em que a casca grossa aos poucos se acostumou ao veneno.

Tudo isso para não deixarem a visita à espera.

Cada segundo era crucial e eles não podiam deixar tudo a perder.

― Tem certeza de que já ocorreu? ― o homem de longos cabelos castanhos escondidos por baixo do capuz negro, perguntou. Os seus olhos dourados brilhavam em aflição, comparava-se a um citrino.

― Talvez não tenha fenecido, ainda.

― E se a pessoa sobreviver?

Mate-a ― sentenciou o de cabelos ruivos encaracolados, este que escondia a face por uma máscara branca. Sua expressão não podia ser vista pelo outro, mas sua aura era sombria; arrepiava até mesmo aquele já tão acostumado. ― A alma não conseguirá transmigrar se o seu portador ainda estiver com vida.

O encapuzado suspirou, usando da língua para cutucar o interior de sua bochecha.

Mesmo que fosse parte da missão, nunca era uma tarefa fácil pintar as mãos em vermelho.

Mais milhas atravessaram, a noite já caía quando viram a fumaça nos céus e uma claridade forte no fim da floresta. O cheiro de carne queimada poderia ser sentido a quilômetros de distância.

― Chegaram antes de nós. Desgraçados!

― Não deve ter sobrevivido ― o mascarado sorriu. ― Ainda bem.

― Como você pode sorrir tão facilmente numa situação dessas?! ― perguntou, descrente. ― Além do mais, eles podem ter levado o corpo. Não seja tão confiante...

― Não levaram. Eu posso sentir ― tocou o próprio colar com pingente prateado em formato de dragão antes de puxar as rédeas. ― Vamos!

Pararam seus cavalos assim que visualizaram um reino em chamas. Nem mesmo as ondas se quebrando rudemente no litoral eram capazes de camuflar o som da madeira se fragmentando em lascas. O céu estava nublado por cinzas.

Nas sombras das árvores, ambos homens suspiravam em amargura por ver mais uma bandeira caída.

Viviam numa guerra, afinal.

― Eles foram embora, mas o cheiro de enxofre está por todos os lados.

― Mais um reino caiu ― o mascarado suspirou, passando as digitais de leve pelo pingente como se ponderasse algo. ― Vá em frente. Encontre o corpo e traga-o para cá.

― E você?

― Preciso me comunicar com os Celestiais.

― Como eu saberei quem é?

― Use esse seu nariz de cachorro para alguma coisa! ― o mascarado zombou, sendo respondido por um rosnar do outro. Até mesmo em situações como aquela, o mandante ainda tinha a carapuça de fazer uma piada. ― A força vital do portador se sobressai, nenhuma outra se compara. Você saberá quando o encontrar.

O encapuzado estalou a língua, desanimado com a resposta vaga de seu parceiro, porém tratou de amarrar as rédeas do cavalo numa das árvores, retirando a espada de seu cós e prendendo-a no arreio.

Deu um passo à frente e tratou de tirar o capuz, os sapatos e o resto das vestimentas. Completamente nu.

Aos poucos a queimação já tão familiar se alastrou, sentia-se febril e os seus dedos pinicavam; gradualmente, seus ossos estalaram, a corcunda cresceu, a pelugem negra surgia em tufos, juntamente das presas tão ferozes de uma besta.

As patas pousaram no chão em forma de animal quadrúpede, sob luzes alaranjadas e a lua resplandecente, o lobo exalava feracidade.

― Lembre-se: traga-me o corpo sem vida ― o mascarado ditou firme, segurando o pingente como se fosse a própria vida. De fato, era. ― Feras reconhecem Feras, Jungkook.

Os olhos flavescentes do lupino cintilavam, assassinos; com um uivo, atravessou o reino em chamas atrás do portador. Da Escolhida.

Ou melhor dizendo, do Escolhido.

A Profecia tem o seu início.

#HeróiMedíocre

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