• Capítulo 2 •
OVELHA NEGRA NOS NEGÓCIOS
Imediatamente fecho meu notebook e o coloco sobre o criado-mudo, subo meus óculos sobre a ponte do nariz e bufo. Amanda e eu somos bem próximas, quase melhores amigas e, apesar de ela ser um lembrete constante de que sou a ovelha negra da família, simplesmente por não querer ficar atrás de uma mesa — ocupada demais administrando a empresa quando poderia estar com as mãos em um belo teclado de computador que carregue nossa marca, o cacho de mirtilos — e sim fazendo algo de útil como criar sites, jogos, apps e cuidar da manutenção de cada conteúdo digital. Até já ajudei em vários softwares¹ e criei — sem meu pai saber — o sistema operacional² da BC, mas papai acha que meu cérebro é grande demais para agir como uma "nerd antissocial" — como ele me chama —, e quer que eu use meus "dotes" intelectuais para comandar todo o seu império, assim como Amanda, que já é gestora de finanças na BC com ele.
É claro que ele não leva em consideração que ele não teria o império pra comandar se não tivesse criado seu primeiro "computadorzinho". E eu só quero criar conteúdos digitais para somar ainda mais no império tecnológico...
Ele não tira da cabeça a ideia de que cuidar da tecnologia é para quem é subordinado e não para quem está no comando. Meu querido avô o traumatizou com isso. E isso é outra coisa que me revolta, afinal, seu medo de que sejamos entregues aos mesmos erros que ele cometeu no passado é o que o torna um maníaco por controle e queira nos fazer de bonecos enquanto ele é o único ventríloquo que pode fazer qualquer coisa. Quer dizer, "sejamos" não, porque tudo isso é aplicado a mim. Aparentemente, somente eu preciso de cordas, uma vez que basta que ele espirre para que Amanda apareça com um lenço e ainda assoe seu nariz... Chega a ser ridículo!
Maaas, se minha amada irmã quer viver sua vida desse jeito, então que seja. Só desejo que ela seja feliz com suas escolhas...
Enfim, melhor deixar isso de lado, pois venho perdendo essa briga desde que aprendi a digitar, então, vou focar em algo que posso fazer agora. Que é saber o que está acontecendo com minha irmã.
— Ok, desembucha, Manda. O que você tem? — pergunto e dou tapinhas leves na minha perna, já livre do notebook, para que ela apoie sua cabeça, como costumamos fazer uma com a outra. Ela rapidamente solta um longo suspiro e joga sua cabeça sobre meu colo, espalhando seu lindo cabelo castanho, que delicadamente vou acariciando.
— Ah, Majú, fiz uma besteira tão grande... — Ela tapa o rosto com as mãos e apenas rio para ela.
— Fala sério, Amanda. Você é incapaz de fazer qualquer besteira, você é a filha perfeita, esqueceu? No quesito ovelha, sua lã é alva mais que a neve.
Ela ri, mas não é um sorriso de verdade.
— Bom, levando em consideração que estou grávida, talvez isso não seja mais verdade...
Por um nano de segundo me imagino em um universo paralelo em que eu estivesse louca e imaginando coisas. Mas então me lembro de que isso é impossível e só uma ilusão do multiverso cinematográfico que a Marvel torna tão real, e então, apenas paro de fazer carinho no cabelo da minha irmã e tento entender o que ela disse.
— VOCÊ O QUÊ?! — questiono quando meu cérebro retoma as funções.
— Ai, Majú! Meu cabelo! — Ela reclama e só então percebo que estou com um pouco do seu cabelo entre meus dedos, puxando-o.
— Desculpe, é que por um momento achei que você tivesse dito que está grávida — solto seus cabelos junto com uma risada forçada de nervoso. Afinal, Amanda é a filha perfeita, o modelo que meu pai sempre diz que devo seguir para me tornar alguém melhor, principalmente na empresa e blá blá blá.
— Na verdade, eu disse. — Ela se levanta e me olha com seus olhos castanhos suplicantes. — Majú, por favor, me ajuda! Meus pais vão me matar!
Minha irmã perfeita está me pedindo ajuda. Quer dizer, aquela que meu pai se gaba de ser sua imagem nos negócios, está aqui, me pedindo ajuda porque está grávida e nossos pais — que sempre prezaram muito o valor do casamento por causa da história de ambos, principalmente mamãe por causa de Deus, religião e tal — não sabem. Seu Benício, inclusive, já até tem o noivo perfeito para Amanda, até então imaculada e imagem da perfeição.
— Amanda, por Deus! Achei que você nem gostava do Joaquim!
Este, por acaso, é seu noivo, futuro marido. Quer dizer, prometido desde a infância, mas nada oficial.
— E não gosto! — Ela diz de cara. — Aliás... — Em seu rosto, branco como um fantasma desde que chegou ao quarto, as bochechas ganham um tom avermelhado. — Ele não é o pai...
É, parece que ela levou a sério essa história de ser como nossos pais. Só faltou fugir com o pai da criança — que aliás, não faço ideia de quem seja — e se casar.
Não que eu deseje qualquer coisa de ruim pra minha irmã, nunca, mas pensar na ironia que seria de que meu pai se gaba tanto do quanto Amanda se parece com ele e vê-la repetindo sua história em todos os sentidos, seria realmente engraçado.
Trágico, mas engraçado.
Mas não. Não seria assim. Quer dizer, estar grávida sem estar casada não é algo que fará nossos pais pularem de alegria, claro, só que fugir, casar e não dar para minha mãe o prazer de fazer uma festança e para o meu pai o prazer de esfregar na cara de todos os seus amigos executivos que sua filha querida, além de bem-sucedida, é uma mulher bem casada, ah, isso com certeza seria o pior. Não gosto nem de pensar...
1. Programas que rodam em computadores, celulares, tabletes e afins, permitindo a execução das funções dos mesmos.
2. Basicamente, é um software ou conjunto de softwares que administra e gerencia os recursos de um sistema.
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