Capítulo 25
O olhar predatório de Miguel, mesmo mascarado, era inconfundível. Ele estava ali, como um animal à espreita, aguardando o momento certo para agir. O silêncio que pairava no ambiente era cortante. A única coisa que quebrava o ar pesado era minha respiração ofegante e o zumbido incômodo da dor que irradiava pela minha perna. Cada segundo contava, não só para mim, mas para Marcus, que estava lá fora, em algum lugar, vulnerável.
Com a arma em mãos, mantive a mira firme em Miguel. Ele, por sua vez, segurava sua pistola com uma confiança fria, seus olhos fixos em mim por trás da máscara improvisada. O frio da arma contra minha pele suada parecia quase simbólico da tensão que pairava no ar.
— Não precisa ser assim, Miguel — minha voz saiu mais rouca do que o esperado. Cada palavra parecia um esforço. — Ainda dá tempo de parar com isso. Você não precisa afundar mais.
Ele soltou uma risada amarga, distorcida pela máscara, cheia de desprezo. O som de sua risada ecoava pela sala, criando um contraste inquietante com o silêncio.
— Parar com isso? — Ele deu um passo à frente, seu tom venenoso. — Depois de tudo que você fez? Isso aqui não é mais sobre território, Lucas. Não é sobre dinheiro ou poder. Isso é pessoal. Eu quero ver você sofrer como eu sofri.
A raiva em suas palavras era palpável, atravessando o ar. A frieza em seu tom fazia com que cada palavra parecesse um golpe físico. Em algum momento, éramos mais do que apenas rivais, talvez até amigos. Mas esse tempo havia ficado para trás, enterrado sob camadas de traições e ódio. Agora, só restava destruição.
Miguel levantou a arma, os olhos carregados de fúria, prontos para apertar o gatilho. A adrenalina corroía meu corpo, e antes que ele pudesse reagir, apertei o gatilho primeiro. O som do disparo ecoou pela sala, e o tempo pareceu parar. A sensação do recuo da arma, o impacto, tudo parecia acontecer em câmera lenta.
Miguel cambaleou para trás, surpreso, levando a mão ao ombro onde o tiro o havia atingido. Ele caiu contra a parede, sua arma escorregando dos dedos, mas o ódio em seus olhos permaneceu.
— Você... vai pagar por isso... — ele murmurou, a voz falhando à medida que o sangue escorria pelo braço. A dor em seu olhar parecia quase uma confirmação de que eu havia atingido o alvo certo, mas a situação ainda não estava resolvida.
A dor na minha perna aumentava a cada passo, a sensação de peso e pressão se tornando quase insuportável. Cada movimento era uma luta contra a exaustão que me dominava. A visão estava começando a turvar novamente, e a sensação de estar em um pesadelo não parecia ter fim. Quando finalmente me aproximei, sentia a respiração de Miguel em meu rosto, cada movimento dele era um lembrete do perigo iminente.
Miguel, com uma força desesperada, se lançou para cima de mim com uma faca, seus movimentos rápidos como um animal encurralado. Desviei por pouco, mas senti a lâmina raspar de leve minha lateral. O calor do sangue escorrendo se misturou à dor, e a sensação era quase como se o tempo tivesse desacelerado, cada segundo esticado ao máximo.
Sem pensar, me lancei sobre ele, e os dois caímos ao chão em um emaranhado de golpes, socos e grunhidos. Ele lutava com a fúria de quem não tinha mais nada a perder, seus olhos mostrando um desespero feroz. O chão sujo parecia uma extensão da nossa luta, e cada golpe trocado parecia trazer um pouco mais de dor, mas também um pouco mais de determinação.
O tempo parecia se dilatar enquanto trocávamos golpes no chão sujo. Os músculos doíam, a exaustão pesava, mas não havia espaço para ceder. Em um movimento desesperado, Miguel tentou me imobilizar, pressionando o braço contra minha garganta. O ar ficou escasso, e a visão começou a escurecer. Senti o desespero me consumir, a sensação de asfixia começando a tomar conta.
Com um último impulso, consegui acertar uma cotovelada nas costelas dele, forçando-o a me soltar. O ar voltou aos meus pulmões em um suspiro doloroso, e eu me dei conta de como era precioso cada segundo de respiração. Sem perder tempo, rolei por cima dele e o soquei com todas as forças que me restavam. O primeiro soco quebrou o nariz dele; o segundo fez com que o sangue escorresse de sua boca. E então eu parei.
Miguel estava deitado no chão, completamente derrotado, o rosto desfigurado pelos golpes. Ele me olhava com um misto de ódio e algo que eu não conseguia identificar. Talvez fosse o fim. O silêncio que seguiu o confronto era quase absoluto, exceto pelo som pesado da minha respiração e pelo zumbido persistente da dor.
— Acaba logo com isso... — ele murmurou, cuspindo sangue. Suas palavras eram um sussurro quase inaudível, uma aceitação resignada do seu destino.
Minha mão tremia, o punho ainda erguido. Seria tão fácil... Tão fácil acabar com ele e terminar tudo de uma vez. Mas então pensei em Marcus, no que ele diria, no que ele pensaria de mim se eu seguisse esse caminho. Fechei os olhos, tomando fôlego, lutando contra a exaustão que ameaçava me consumir.
— Não vou ser igual a você, Miguel — falei, minha voz firme, mas cansada. Soltei meu punho e me levantei com dificuldade, sentindo cada músculo do meu corpo protestar. O ambiente parecia girar, a dor na minha perna se tornando quase insuportável.
Ele riu de forma fraca, quase inaudível. — Fraco... — sussurrou, num último ato de desafio. Sua voz era uma sombra do que fora antes, uma expressão final de sua luta.
Antes que pudesse pensar, vi a faca dele no chão. Num impulso, a peguei e cravei no coração de Miguel. Seus olhos se arregalaram em surpresa, o sorriso desaparecendo lentamente enquanto a vida se esvaía de seu corpo. O olhar de ódio foi substituído por uma expressão vazia.
— Eu não sou fraco... — murmurei, mais para mim mesmo do que para ele.
Dei um passo para trás, observando Miguel cair, o sangue escorrendo para o chão ao redor. O som pesado da respiração dele cessou, e o silêncio voltou a preencher o ambiente.
Não havia mais volta. O silêncio que seguiu o confronto foi profundo e opressor. A única coisa que quebrava a calma era o som da minha respiração pesada e o zumbido persistente da dor na minha perna. Cada passo que dava para fora da casa parecia ser um esforço monumental, e a sensação de estar caindo aos pedaços me acompanhava a cada movimento.
A casa estava devastada, o chão coberto de manchas escuras de sangue e detritos. Quando finalmente alcancei a porta, o ar frio da noite bateu no meu rosto, uma breve e bem-vinda fuga do calor opressivo dentro da casa. Mas a dor na perna estava cada vez mais insuportável, e eu sentia que minhas forças estavam se esvaindo rapidamente.
Empurrei a porta com um esforço final, saindo para o exterior. A noite estava clara, mas a escuridão parecia se espreguiçar ao redor, misturando-se com a minha visão turva. Eu mal conseguia manter o equilíbrio, e a sensação de fraqueza era quase esmagadora.
Foi quando vi Marcus aparecer do lado de fora, correndo em minha direção. Seus passos eram rápidos e apressados, e sua expressão era uma mistura de pânico e alívio. Ele parou abruptamente ao me ver, seus olhos fixos em mim com uma preocupação desesperada.
— Lucas! — A voz de Marcus era um grito estrangulado, carregado com uma dor evidente. Ele correu para me alcançar, seu olhar se movendo freneticamente sobre o meu corpo ferido. — O que aconteceu? O que você fez?
Eu tentei abrir a boca para responder, mas as palavras não saíram. A dor e a fadiga haviam tomado conta de mim, e tudo o que eu conseguia sentir era a exaustão avassaladora. A visão estava embaçada, e a sensação de frio estava começando a dominar. Os policiais entraram na casa, e eu conseguia ouvir de longe as ambulâncias. Um dos policiais gritou que Miguel estava morto.
Marcus se aproximou, seu rosto machucado e visivelmente desidratado. Ele se ajoelhou ao meu lado, seus braços se envolvendo ao redor de mim com uma urgência desesperada. As mãos dele tremiam, mas eram firmes, e ele me segurou com força enquanto eu vacilava, meu corpo desabando sob o peso da dor e do cansaço.
— Não, não, Lucas, fique comigo! — Sua voz estava cheia de pânico, quase como se ele estivesse lutando contra o tempo. — Você está ferido, precisamos de ajuda!
Eu não consegui responder. Minhas forças estavam se esvaindo rapidamente, e o mundo ao meu redor estava se tornando um borrão indistinto. A última coisa que consegui perceber foi o rosto de Marcus, seus olhos brilhando com lágrimas não derramadas e sua expressão carregada de uma dor silenciosa.
Então, o escuro começou a se fechar ao meu redor, e eu senti meu corpo afundar em uma sensação de ausência de peso. Marcus me segurou firme, seu rosto se contorcendo em uma expressão de terror e frustração enquanto eu mergulhava na escuridão.
O mundo ao redor desapareceu, e eu me deixei ser engolido pela escuridão, com a última coisa que senti sendo o calor dos braços de Marcus envolvendo-me, o que parecia ser o único refúgio que restava no caos.
O primeiro sinal de consciência foi o murmúrio distante de vozes. O som era abafado, como se eu estivesse submerso em um líquido espesso. Lentamente, comecei a distinguir palavras e frases, embora parecessem distantes e distorcidas.
— Dr. Marcus, a autópsia do paciente 302 saiu, pode verificar por gentileza? — A voz da enfermeira era formal, mas um pouco distante, como se estivesse falando de um lugar longe de onde eu estava.
O som de um monitor cardíaco e o zumbido suave de equipamentos médicos preenchiam o ambiente, criando uma sinfonia de ruídos hospitalares. Aos poucos, comecei a perceber mais detalhes. O aroma de antisséptico no ar, o som de passos leves, e o murmúrio contínuo das conversas nas proximidades.
Eu estava tentando me mover, mas meu corpo parecia pesado e imóvel. A sensação de estar preso em uma névoa espessa começou a se dissipar lentamente. Meu esforço para abrir os olhos era quase hercúleo, e a primeira visão que tive foi a de formas vagas e indistintas, sombras que se moviam suavemente ao redor.
Então, a voz de Marcus cortou através da névoa. Era uma voz conhecida, mas com um tom de preocupação e exaustão que eu nunca havia ouvido antes.
— Lucas, por favor, acorde. — A voz dele era baixa, mas cheia de emoção. — Você está no hospital. Eu estou aqui.
Havia algo em sua voz que me impulsionava a reagir. Com um esforço tremendo, comecei a abrir os olhos lentamente. A luz do ambiente hospitalar era ofuscante a princípio, mas com o tempo, comecei a distinguir as formas mais claramente.
Marcus estava ao meu lado, sua expressão preocupada e cansada. Ele estava vestido com um jaleco branco, e seus olhos estavam vermelhos, como se ele tivesse passado a noite acordado ao meu lado. Seu olhar se fixou em mim com uma intensidade que falava mais do que palavras poderiam expressar.
— Lucas, você está acordado! — Sua voz estava carregada de alívio e um pouco de desespero. Ele pegou minha mão, apertando-a com uma força gentil, como se temesse que eu pudesse desaparecer novamente. — Você me deu um susto enorme. Estava preocupado demais.
O ambiente ao redor começou a se tornar mais claro. Eu percebi que estava em um quarto de hospital, com paredes brancas e equipamentos médicos dispostos ao redor. O monitor cardíaco ao meu lado bipava suavemente, marcando o ritmo da minha recuperação.
— Marcus... — Minha voz estava rouca e fraca, quase um sussurro. — O que aconteceu?
Ele respirou fundo, a tensão visível em seus ombros.
— Você... você foi ferido. Miguel... — A voz de Marcus falhou por um momento. — Ele estava tentando te matar, e você ficou muito ferido. Mas você está seguro agora. Estamos em um hospital.
Senti uma onda de alívio misturada com a dor e desespero. O medo que senti antes parecia ter se dissipado um pouco, substituído por uma sensação de conforto, mesmo que a dor ainda fosse intensa. Tentei levantar, mesmo com a presença de Marcus alí, eu ainda era um foragido da policia. — Preciso ir embora daqui, eles vão vir atrás de mim.
— Não se preocupe com isso agora, Lucas. — Marcus continuou, sua voz firme, mas carregada de preocupação. — Você precisa descansar. Eu vou ficar aqui com você. Tudo vai ficar bem.
Eu fechei os olhos por um momento, tentando absorver tudo o que estava acontecendo. A presença de Marcus ao meu lado era reconfortante, e saber que ele estava ali me dava forças para enfrentar o que estava por vir.
/// NOTA DO AUTOR ///
Se você chegou até aqui, saiba que estamos quase no fim dessa história. Espero que estejam gostando e se apaixonado assim como eu.
Beijo, até o próximo capitulo!!!
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