Face a face
Por Gisinha Winchester.
Todos os presentes, de Olivia aos recém-chegados, encaravam boquiabertos de susto as duas figuras agora entrelaçadas, uma miúda, o cabelo curto castanho-avermelhado sendo afagado quase com cautela, o temor de que a situação agora vivida fosse apenas um sonho, enquanto o guardião, uma atitude reverente, a beijava devagar, a tensão fazendo-o pressionar a boca dela com força, um tremor que arrepiava os dois, a menina sentindo as faces esquentarem. Um dos braços de Yue cingiu a cintura de Sakura, o corpo pequeno quase colado ao dele, a mão esquerda agora na nuca da garota, os lábios se abrindo ainda mais em resposta, os dois podendo ficar assim por mais tempo caso um pigarro de desconforto não os fizesse levantar os olhos, o beijo faminto interrompido por um olhar assassino do irmão da card captor. Olivia, já recuperada da surpresa de ver a menina e os familiares ali, pôs a mão no rosto, um risinho sendo sufocado a muito custo. Mesmo aquele olhar tenebroso voltado para a jovem não a fez parar de rir.
- Yukito, como você se atreve... ?! – Tomoyo teria gritado a plenos pulmões, não fosse uma mão agarrar seu pulso com força e a mão livre voar até a boca agora coberta, a menina se sacudindo de raiva.
- Aí, seu bando de manés, a minha mãe trabalhou a noite toda ontem, dá pra calarem a boca? – Olly rosnava de fúria, porém com a voz baixa, tentando ao máximo não incomodar a mãe.
Os demais, entendendo a situação, tentaram fazer silêncio o quanto puderam. Tomoyo, após sua garantia de que ficaria quieta, viu-se livre do abraço furioso de Olivia, que agora relaxava ao ver que todos tentavam cooperar para que a enfermeira, que enfrentou uma jornada de pesadas trinta e quatro horas, pudesse dormir o sono dos justos com mais tranquilidade. Sakura, Yue e os demais, incluindo Olivia, se acomodaram na sala de estar, o café revigorante que o guardião desfrutara sendo cuidadosamente servido, a garota fazendo o possível para não haver qualquer ruído, foi quando viu a ampla sacada do apartamento, os vidros que faziam divisória sempre fechados, por proporcionar um confortável isolamento do trânsito e caos tão comuns em Nova York. A vista suavemente ensolarada do Central Park, as copas das árvores parecendo pequenos pingentes com a água da chuva congelada nos galhos, trazia um ar que combinava perfeitamente com a situação que agora os alcançou; Sakura, ainda com o rosto inchado pelo choro, sorria, os olhos brilhantes de felicidade, de mãos dadas com Yue, o sorriso largo no rosto igualmente riscado, duas trilhas peroladas atravessando as bochechas do rapaz. Os dois se entreolhavam até o olhar da menina, acompanhando o de Olivia, deparar-se com uma vista maravilhosa, o fôlego quase roubado dela, a imagem do Central Park em plena manhã fria de inverno.
O sorriso juvenil se ampliou ainda mais ao ver a jovem abrir a vidraça, o ruído do movimento matinal no parque alcançando o apartamento, o sorriso se transformando em uma carranca zangada ao ver que ambos não interpretaram a deixa. Outro pigarro, quase um rosnado (que desejava exatamente o contrário), fez o casal dirigir-se para o exterior, o frio atingindo em cheio o rosto de Sakura, que voltou a respirar, conseguindo pensar com mais clareza. Ela e Yue voltaram os olhos para o cartão postal quase etéreo, a menina inebriada pela beleza ali presente, que traduzia os sentimentos do guardião agora ajoelhado diante dela. O sol ainda tímido que se atrevia a derreter os pingentes delicados que se acumularam na linda e mítica floresta que espalhava preguiçosa naquele ponto da cidade, da mesma forma que foi com o coração do rapaz que agora encarava aquele par de gemas preciosas que o observavam receosos, o medo de Yukito intervir outra vez fazendo a menina pela primeira vez em muito tempo desde que o conhecera não desejar sua presença. Algo similar fez Yue aguardar a agitação do garoto que o hospedava se acalmar antes de se dirigir à dona das cartas outra vez. Uma mesa redonda de madeira bem disposta perto de um conjunto de poltronas de vime muito confortáveis atraiu a atenção de Sakura, que optou por sentar-se na mais próxima delas, o corpo trêmulo de emoção enquanto tentava acalmar as emoções agora confusas, os pensamentos parecendo um redemoinho de tão caóticos que estavam. Enquanto isso acontecia, Yue guardou distância da menina, permitindo que ela pudesse ficar a sós com os próprios pensamentos, algo pelo que ela, ao perceber a atitude respeitosa, ficou extremamente grata.
Os dois estavam sentados, o sorriso da garota mais largo ao admirar o cenário invernal, as pessoas correndo, ou simplesmente caminhando, as crianças acompanhadas dos adultos, jogando folhas de árvores no ar, independente de estarem ou não úmidas, o latido de cães de todos os tamanhos e raças fez a garota contemplar a cena, encantada.
Ainda era manhã de natal nos Estados Unidos e as famílias, alheias ao que se passava no coração de Sakura, se divertiam juntas, a magia daquele feriado especial deixando o ambiente bem mais leve. Enquanto isso, dentro do apartamento, um clima muito mais tenso, Olivia, o irmão e a amiga de Sakura observavam a situação por outro prisma, que logo chegaria a eles, mas foi a meia-irmã de Yukito que verbalizou a preocupação, agora emergente.
- Já pensaram em como vai ser se esses dois engatarem um romance? – apesar da preocupação óbvia, a garota estava feliz pelo casal. – Quer dizer, ela vai crescer, quem sabe, mais lá na frente... bom...
- Já entendi! – Touya rosnou, indignado, um olhar furioso para Yue. – Vai ser um constrangimento enorme! O que quer que a gente faça?!
A garota voltou o olhar para o rapaz, um olhar de soslaio, um risinho abafado com a reação.
- A gente quem, cara pálida? – ela riu um pouco mais. – Eu não tenho nada a ver isso, só dei uns conselhos, e...
- Então você sabia? – Tomoyo, igualmente irritada, confrontou a garota.
Olivia ergueu as mãos para o alto, um sorriso de escárnio.
- Tá parecendo que eu tenho culpa?
Os dois se entreolharam.
- Olha só, vocês é que tem resolver isso, não sou maga, nem tenho talento pra magia, isso aí não é minha praia. – a jovem apontou o polegar para o casal na sacada. – como eu disse, só dei uns conselhos, só isso.
- E você não parou pra pensar que sua intromissão podia virar um problema?
Olivia piscou duas vezes para se certificar que não havia pirado. Um bichinho de pelúcia estava levitando a vários centímetros do chão, falando e apontando o dedo na cara dela?
- É pra eu... – ela começou, a voz hesitante, o dedo igualmente apontado para a pequena criatura, que ficou vermelha feito um pimentão de raiva, a ponto de morder o dedo da garota, que levou imediatamente a mão à boca, um esforço hercúleo para não gritar.
- Ora, você não entende! Ele é um guardião das cartas, Sakura é nossa...!
Olívia procurou rapidamente entre os potes da cozinha e achou um pote comprido de plástico vazio, que ela já desenroscava e prendeu o ursinho de pelúcia, sacudindo-o várias vezes, conseguindo seu silêncio. Touya e Daidouji encaravam Olivia, estupefatos. A garota apenas deu de ombros.
- Eu já disse, façam...! – um gemido fez todos ficarem em silêncio outra vez.
- Liv, querida, mamãe quer dormir!
A garota suspirou, desalentada, o esforço em vão.
- Vou desligar a TV, mãe.
- Obrigada, querida. – e mais um resmungo antes de reinar novamente o silêncio. Dessa vez Yue e uma mesmerizada Sakura encaravam o pote de biscoitos vazio, onde uma vozinha pedindo ajuda era sufocada, Olivia sacudindo o pote de vez em quando, mandando o ursinho se calar.
- Quer que eu sacuda mais uma vez? – Olivia rosnou ao dar com o olhar da irmã de Touya, pálida ao ver o bichinho dentro do pote. – ele estava gritando e depois me mordeu. Ele me mordeu mesmo? – a jovem ainda encarava o pote de biscoitos, os olhos arregalados.
Sakura, baixando a voz duas oitavas, em consideração à mãe de Olivia, estendeu a mão, levemente trêmula.
- Deixa o Kero comigo. – apesar do tremor, a voz era clara.
Olivia olhou para o pote, ainda em dúvida, mas logo em seguida o desenroscou, jogando o bonequinho de pelúcia no sofá, o ser tonto e trôpego na superfície macia.
- Kero, você está bem? – perguntou Tomoyo ao ver a criatura desabando no sofá.
- Ele é todo seu, mas, se fizer barulho de novo, jogo pela janela! – ameaçou a meia-irmã de Yukito. Sakura imediatamente o segurou com as mãos e o pôs na própria mochila e voltou pra sacada, onde Yue a esperava, o olhar ainda distante para a diversão no Central Park coberto de neve. Um suspiro fez a menina retesar de medo.
- Desculpe fazer você passar por tudo isso, Sakura.
Gelada, a garota achou que era Yukito, um suspiro de alivio ao ver o guardião ainda ali. Ele parecia pensar o mesmo. Ambos se olhavam sem jeito, pensando em uma maneira de lidar com a situação nova que estavam envolvidos. Com um suspiro profundo, Sakura abriu a mochila, pondo Kero delicadamente na cadeira de vime, o guardião em miniatura ainda tonto de ser sacudido no pote de biscoito. Os dois, Yue e a card captor encaravam o pequeno, um brilho diferente no olhar da garota. Kero não gostou nem um pouco daquele olhar...
- Kero... como você e Yue foram criados pelo Mago Clow? – algo passou rapidamente pela mente da menina, os dois guardiões muito surpresos.
- Como? – ele empalideceu ao ouvir Sakura.
- Me conta, Kero, por favor. Tem algum jeito de separar o Yue e o Yukito por magia?
Olivia e os outros dois no apartamentos estavam bem ansiosos.
Continua...
Notas Finais
Eita e agora, será que Sakura vai conseguir? Gente, minha nossa, mal posso esperar para o próximo capítulo. Aguardem!
Não permita a morte de unicórnios, duendes e fadas. Incentive o trabalho do escritor.
https://youtu.be/CFAlR7tWekc
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