Capítulo 15: Não olhe nos olhos dela
New Chamor, 20 de dezembro de 2011
O relógio na parede da sala de madeira em New Chamor marcava exatamente meia-noite quando um rangido agudo cortou o silêncio. Luna, Caroline, Bianca e Letícia se entreolharam com expressões confusas. Elas sabiam que algo estava errado, mas não conseguiam identificar o quê. Já Daniel e Paulo estavam acostumados a lidar com aquilo, pois, estiveram ali o tempo inteiro.
— Isso não pode ser real! — Murmurou Bianca, com sua voz tremendo.
De repente, o fogo na lareira se apagou abruptamente, deixando a sala mergulhada na escuridão. O vento lá fora parecia sussurrar segredos sombrios enquanto a neve continuava a cair implacavelmente. A criatura ainda estava lá, estática, observando o grupo prestes a torná-los suas próximas vítimas.
— O que está acontecendo? — Sussurrou Letícia, com seus olhos arregalados de medo.
— Vocês não percebem? — Paulo questiona finalmente, soando estranhamente distante. — A Lacuna está nos vigiando há semanas! Desde os desaparecimentos na cidade, tudo ficou estranho. E agora, todos mortos!
Um arrepio percorreu a espinha de todos os presentes enquanto a verdade sinistra da situação se desdobrava diante deles. Eles não eram personagens comuns em uma cidade coberta de neve próxima ao Natal. Eram viajantes de realidades alternativas, perdidos em um pesadelo do qual não conseguiam escapar.
— Isso é loucura! — Protestou Carol, com sua voz tremendo de incredulidade. — Eu quero ir embora! Eu vou matar o André!
— Precisamos encontrar André e o pêndulo do tempo. Talvez assim consigamos ir embora, mas acho que.. — Luna interrompe sua fala, parecendo estar prestes a ter uma recordação drástica, que mudaria todo o destino dos seus amigos. — Acho que o relógio quebrou.
— O quê? Como assim? — Bianca questiona receosa e surpresa, sem acreditar no que havia ouvido.
— André estava transformado em um burro e estávamos brigando pelo colar e então ele caiu no chão e viemos parar aqui! — Luna explica, mas a reação de todos entregou que a situação estava casa vez mais complicada.
— Será que a Brunilda existe nesta realidade? — Questiona Carol, com um ar que trazia esperança ao ambiente.
— Provavelmente não. Aqui não é um universo de fantasia. — Luna respira fundo, tentando convencer a si mesma de que havia outra saída.
Com a queda repentina da luz na casa de madeira, Daniel e Paulo agiram rapidamente, entregando lanternas equipadas com luzes infravermelhas para os outros. As lâmpadas emitiam uma luz intensa, capaz de prejudicar a criatura que eles logo perceberam estar à espreita.
Enquanto tentavam se acalmar, um rangido vindo da chaminé fez todos se virarem em alarme. Uma figura escura e retorcida emergiu, seus olhos brilhando com uma malícia sinistra. Era a Lacuna, a criatura que os perseguia implacavelmente e que causava um medo intenso aos que a olhavam.
— Não olhem nos olhos dela! — Paulo alerta, mas o medo intenso fazia com que todos perdessem o raciocínio rapidamente.
Luna deu um grito abafado enquanto os outros recuavam, com as lanternas tremendo em suas mãos. A luz infravermelha lançou uma sombra distorcida sobre a Lacuna, que recuou temporariamente, emitindo um rosnado gutural.
— Rápido, pela porta dos fundos! — Gritou Daniel, liderando o grupo em uma corrida frenética pela escuridão.
Os passos ecoavam no chão de madeira enquanto eles se esforçavam para fugir da criatura que os perseguia. A Lacuna não desistia, lançando-se atrás deles com uma ferocidade inabalável.
O vento uivava lá fora, ecoando os gritos dos personagens enquanto corriam desesperadamente em direção à van estacionada nas proximidades. O frio cortante da noite os envolvia enquanto eles se espremiam no veículo, respirações entrecortadas pela adrenalina da fuga.
Mas a sensação de alívio foi breve. Do lado de fora, sombras sinistras começaram a se mover na escuridão, revelando uma horda de criaturas que os perseguia implacavelmente. A Lacuna liderava o ataque, sua figura distorcida avançando com determinação assassina.
— Vamos, temos que chegar ao abrigo! — Gritou Daniel, acelerando o motor enquanto as criaturas se aproximavam perigosamente.
O caminho até a igreja parecia interminável, com as criaturas se multiplicando em número a cada momento. O suspense era quase palpável, enquanto os personagens lutavam para escapar das garras da escuridão que os engolia.
Finalmente, a igreja apareceu à vista, sua luz reconfortante brilhando na escuridão. Com o coração batendo descompassadamente, os personagens se aproximaram da porta da igreja, suas mãos trêmulas tentando desesperadamente abrir o pesado portão de madeira. O som das criaturas se aproximando era cada vez mais audível, um eco sinistro que ecoava na noite gelada.
— Rápido, precisamos entrar! — Gritou Luna, com sua voz embargada pelo pânico.
Daniel e Paulo redobraram seus esforços, empurrando com todas as suas forças contra a porta que parecia resistir teimosamente. O tempo parecia se arrastar enquanto as sombras se aproximavam perigosamente.
Finalmente, com um rangido de dobradiças enferrujadas, a porta cedeu, abrindo-se para revelar refugiados aterrorizados dentro da igreja. Com um suspiro de alívio, o grupo se lançou para dentro, buscando abrigo no interior sagrado, com a ajuda de um senhor que estava refugiado junto com outras pessoas.
Mas, antes que pudessem fechar a porta atrás deles, um grito agudo cortou o ar. Bianca foi arrastada para trás por uma força surreal, com seus dedos se agarrando desesperadamente à soleira da porta enquanto Lacuna emergia da escuridão, com seus olhos brilhando em azul com uma fome insaciável.
— Bianca! — Gritaram os outros, horrorizados, mas era tarde demais. Com um último suspiro, ela desapareceu nas garras da criatura, seu grito ecoando na noite.
Um silêncio pesado se abateu sobre o grupo, enquanto eles absorviam a terrível perda. Mas não havia tempo para lamentações. As criaturas ainda estavam lá fora, esperando por sua próxima vítima.
— O que faremos agora? Precisamos ir atrás dela! — Letícia grita horrorizada, na tentativa suicida de sair por aquelas portas e salvar sua adorável paixão.
— Não! — Daniel a impede, segurando-a com força. — É tarde demais. Não tem o que ser feito. Já perdemos pessoas demais com isso, precisamos ficar juntos.
— Luna?
Luna imediatamente identificou a voz suave que vinha dos fundos da igreja. Ao se aproximar, suspirou de alívio ao ver Elly junto com os demais. Elly se aproximou de Luna e a envolveu em um abraço carregado de saudades e conforto.
— Oi, Luna.
No mesmo clima de reencontro, Luna, Carol, Letícia e Paulo ficam incrédulos ao perceberem a presença de André, que agora não era mais um burro, e sim um garoto qualquer que estava tão assustado quanto o resto.
— Seu desgraçado, olha o que você fez! — Letícia se atira em uma explosão de fúria para cima de André, até Daniel e Paulo a segurarem.
— André, onde está o colar? — Luna questiona se aproximando, mas André parecia arrependido.
— Aqui. — O garoto tira o objeto do bolso do casaco que vestia e entrega nas mãos de Luna.
O relógio estava quebrado, os ponteiros não dançavam mais entre o tempo. Não havia mais esperança para os perdidos entre as realidades. Não tinha mais como voltar para casa.
— Está quebrado! — Carol diz observando o objeto, e então encara André. — Como iremos embora?
— Eu não sei. Acordei aqui há dois dias, e desde então... esse terror. Tentei consertar o relógio, mas nada adiantou. — Ele diz, preocupado com o que aconteceria daqui em diante.
— Luna, acha que consegue consertar? — Carol questiona para a amiga, que demonstra incerteza.
— Eu não sei. Vocês precisam ir atrás da Bianca! Ficarei aqui com os outros e darei um jeito de irmos embora. — Ela responde com determinação, fazendo nascer uma luz no fim do túnel. Ninguém era tão capaz de lidar com a magia tanto quanto Luna.
— Temos a van, sei onde é o cativeiro dela. — Um homem vestindo uma farda policial se aproxima dos jovens, chamando a atenção deles. — Sou o xerife Stewart, enfrento essas coisas há muito tempo. Já dei de cara com o cativeiro e consegui levar algumas pessoas que estavam presas lá, mas a Lacuna está sempre à espreita, cada vez se multiplicando mais e mais.
— Pode nos levar até o cativeiro? Temos luzes infravermelhas. — Paulo diz, e o xerife Stewart se aproxima e lhe entrega uma espingarda.
— É perigoso, garoto. Mas podemos tentar. Minha filha foi levada há dois dias, mas não consegui ir atrás dela. Qualquer tentativa é suicídio, a Lacuna é inteligente demais.
— Certo. Paulo, Letícia, o xerife e eu iremos. Você e Daniel fiquem aqui e vejam o que conseguem. — Carol diz na frente de Luna e a encara com esperança nos olhos.
— Eu também vou. — Surpreendentemente André dá um passo à frente e se voluntaria. — Isso é culpa minha. Preciso ajudar de alguma forma.
• • •
Bianca acordou em um porão úmido e escuro. Suas mãos estavam presas e havia rastros de sangue por todo canto.
— Você está bem? — Ela logo percebe que não estava sozinha.
Haviam outras pessoas presas, no mesmo estado de desespero e terror. A garota ao seu lado era jovem e loira.
— Estou. Onde estamos?
— No cativeiro dela. — Um som da porta é ouvido, e logo a figura estreita se aproxima. — Ah, não!
A Lacuna agora aparentava ser uma mulher comum, bem vestida e com um largo sorriso no rosto. Ela se aproximou da garota ao lado de Bianca e ergueu suas garras, ficando-as na jovem e arrancando seu fígado. Ela se deliciava com o corpo da jovem, que agora já não tinha mais vida.
Gritos de desespero e socorro ecoavam no cativeiro, mas era isso o que ela fazia. A Lacuna grudou os dedos dentro do globo ocular do cadáver da loira, levando-o até uma parte do seu crânio onde havia uma lacuna a ser preenchida. Em questão de instantes, seu corpo assumiu a forma jovem e vívida da garota.
— Está com medo? Você será a próxima. — A Lacuna sussurra e sorri para Bianca, que suava desesperadamente.
"Eu preciso ser forte", ela pensou, pois se negava a acreditar que seu fim seria presa dentro de uma história de terror.
O pequeno e embaçado vidro, coberto de neve, é quebrado em uma pequena janela que ficava na parede do porão. Uma luz vermelha atinge o rosto da Lacuna, fazendo-a recuar imediatamente.
O xerife Stewart pula a janela e atira com sua pistola incansáveis vezes na criatura, que agora parecia estar ainda mais furiosa. Paulo e Letícia entram logo em seguida, consecutivamente, e começam a soltar as pessoas que estavam lá presas — e com vida.
— Ai meu Deus, achei que você tinha morrido! — Diz Letícia, feliz por reencontrar Bianca viva.
O Xerife Stewart, ao olhar para o lado, reconhece imediatamente o corpo fresco do cadáver da sua filha, Lily. Então, ele reconhece-a naquela criatura, que possuía a forma de quem um dia ele amou. O choque no seu corpo o fez travar, fazendo com que a Lacuna tivesse brecha para enfim atacá-lo.
Nesses segundos, Paulo conseguiu arrombar a porta e fazer com que todos saíssem de lá. Ainda haviam outros seres daqueles lá fora, assombrando a cidade de New Chamor em um pesadelo sem fim.
Ao entrarem na van, André dirigiu rapidamente de volta até a igreja, onde Elly, Luna e Daniel permaneceram juntos na tentativa de consertarem o relógio.
— Acho que consegui alguma coisa. Olha, os ponteiros estão rodando! — Luna comemora, após, com toda sua determinação, consertar o objeto que era manuseado pelas mãos da magia, não de um ser humano qualquer.
— Isso serve para que mesmo? — Elly questiona confusa, pois ela não fazia ideia da situação em que estava inserida.
— Vamos voltar para a nossa realidade, onde esse pesadelo não existe.
De repente, Daniel fecha os olhos firmemente e põe as mãos na própria barriga, se apertando contra seu próprio corpo.
— Você está bem? — Luna questiona preocupada, largando o relógio de lado e se aproximando do garoto.
— É só uma dor no estômago. Não se preocupe. — Daniel toca levemente o rosto de Luna, na tentativa de acalmá-la, mas fazia tempo que Luna havia notado algo de errado com o garoto.
O grupo chegou à igreja exausto, com o alívio estampado em seus rostos após o resgate bem-sucedido de Bianca do cativeiro sombrio da Lacuna. Apesar de terem perdido o bom xerife Stewart, sua memória ficaria para sempre nos corações dos jovens. Luna, com mãos trêmulas, ativou o relógio mágico, um artefato antigo e misterioso que os transportaria de volta para a segurança de sua realidade. Com um estalar de dedos, o relógio começou a emitir um brilho pulsante, envolvendo o grupo em uma esfera de luz etérea.
E assim, a cena se desvaneceu em meio às sombras da noite, deixando para trás apenas um silêncio inquietante e a sensação de que algo sinistro ainda pairava sobre New Chamor. O livro de terror se encerrou com um suspense palpável, sugerindo que as criaturas não haviam sido totalmente contidas e que o perigo ainda rondava os cantos escuros da cidade, aguardando pacientemente por sua próxima oportunidade de emergir.
• • •
— Acho que funcionou! — Comemoro, ao acordar em outro lugar. Não parecia ter terror, nem anões, nem nada do tipo.
Porém, não estávamos em Três Luas. Nós estávamos em uma rua repleta de prédios verdes e muitos gatos. Não havia sinais de magia, mas aparentemente não estávamos nem perto de casa.
— Ei, vamos ver se aquela garota pode nos ajudar. — Carol diz, apontando para uma jovem garota que estava parada na frente de um dos prédios.
Ela era branca, baixa e magra. Tinha os cabelos curtos, lisos, escovados e em um castanho escuro. Seus olhos eram castanhos também, e ela usava uma roupa comum, um short jeans e uma blusa preta de alça.
— Olá. Sabe me dizer onde estamos? Acabamos nos perdendo. — André se aproxima da garota, que nos encara em choque.
— Não pode ser. — Ela diz gaguejando, nos encarando como se não pudéssemos ser reais. — Vocês não existem! Não podem ser reais. São... são exatamente como eu escrevi!
— Como assim? O que você quer dizer com isso? — Pergunto, sentindo que as coisas estavam ficando mais confusas.
— Meu nome é Eyshila. Sou a criadora de vocês, e este é o mundo real.
Continua...
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