Capítulo 15 - 5 dias depois - Anna Barganne
Acordo com o primeiro sinal de luz do dia que vejo surgir entre as brechas da janela. Não dormi, de fato, mal consegui pregar os olhos esta noite. Consumi velas e mais velas enquanto lia e relia o mesmo livro, observada e tentava gravar cada pedaço do mapa. O sol parecia me ajudar escondendo-se atrás das densas nuvens e eu agradeci por isso, mas finalmente amanheceu, e eu tenho de pôr meu plano em ação.
Levanto-me e caminho em silêncio para o quarto do Christopher. As velas não estão acesas e a pouca luz da aurora não facilita minha caminhada escada a baixo. Paro em frente à porta. Está entreaberta, posso ver a luz das velas dançando com suas sombras no chão. Bato.
Ouço-o se levantar e empurrar a porta.
- Então... - Diz ao fitar-me com grandes olheiras - Diz-me que também não conseguiste dormir.
- Não consegui. - Digo entrando no quarto - Tentei, mas... No fim, acabei por estudar mais os mapas.
- Ainda acho isso uma loucura.
- Não tens que achar nada.
- Tenho sim. Eu que pagarei o preço quando nenhum dos dois voltarem.
Fito-o. Tremo.
- Vais ajudar-me ou não?
- Como quiseres... - Diz-me enquanto segura uma mochila e põe nas costas - Mas temos de adiantar, Victor costuma acordar cedo.
Sigo para a garagem acompanhando-o em silêncio. Vejo-o pôr a mochila no fundo da caminhonete de Victor.
- É isso. - Diz-me - Está tudo aqui como planejamos. Resta-nos esperar ele sair.
- E a caminhonete dele? - Pergunto.
- Que tem? - Ele olha para a caminhonete nova de Edgar - Ah, sim! Escutes, Anna, acho que se sabotarmos esta caminhonete ele saberá que fomos nós. E isso não o impedirá de partir, só atrasará sua partida. Acho que devemos continuar com o primeiro plano.
- Humm - Murmuro aliviada. Também acho que de nada adiantará sabotar a caminhonete nova. Edgar é teimoso, logo arranjará uma outra maneira de ir - Também acho. Tudo certo, então.
- Precisamos voltar antes que Victor acorde. - Adverte-me.
- Vamos.
Voltamos em silêncio pelo mesmo caminho. As velas ainda apagadas, os corredores ainda escuros. Entro no meu quarto, deito-me. Resta-me agora esperar todos acordarem.
##
Acordo com o som de panelas caindo, outra vez... Levanto-me rapidamente e forço-me a piscar os olhos várias vezes seguidas até sentir o sono ir embora. Eu não podia ter dormido, consegui manter-me acordada a noite toda e de repente quase ponho tudo a perder. Certifico-me de que Edgar ainda está aqui e vou para o banheiro.
- Bom dia, menina Anna. - Victor diz sorrindo quando me vê descer as escadas.
- Bom dia. - Sorrio de volta.
A mesa nunca esteve tão farta em todo esse tempo que tivemos aqui. Desta vez, Victor caprichou. Pena que as razões que o levaram a isso não são nada boas. Sentamo-nos todos à mesa. Eloah, que sabe do meu plano, mas ainda conseguiu dormir, acaba de descer. Nunca vi essa garotinha tão fantástica desse jeito... nem um sorriso, nem um brilho no olhar. Apenas aquelas olheiras. Falando nisso, parece que ninguém dormiu esta noite.
- Bom dia. - Eloah diz sem nenhuma emoção na voz.
- Bom dia. - Todos respondemos. Mas que hipócritas nós somos! Como este dia poderá ser chamado de bom?
Comemos e ouvimos Victor contar mais uma das suas histórias sobre lobos na floresta. Desta vez, ele conta como se nunca mais pudesse contar. Seu olhar nos prende e nos fascina, e eu posso sentir na sua voz a dor que rasga seu peito.
Todos levantam. Fitam uns aos outros e eu fico sem saber o que fazer. Christopher olha-me com um olhar de cúmplice, o que deixa-me levemente mais tranquila.
- Eu... - Edgar diz olhando para Victor - Eu agradeço, Victor. Com todo o meu coração, agradeço-te. Não tinhas nenhuma obrigação de nos aceitar e de nos abrigar, e ainda fizeste mais do que isso: cuidou de nós. Sinto que Juliet esteve comigo guiando-me até aqui, mas agora é hora de seguir.
- Ora, menino, dizes como se algo muito grave estivesse por acontecer. Que há contigo? - Victor diz fazendo a melhor performance de todos os tempos. Vira-se e começa a recolher os pratos da mesa. Apresso-me em ajudá-lo.
- Acho que devíamos visitar Louis e Vianna mais tarde. - Eloah diz.
- Acho mesmo isso. - Victor vira-se bruscamente apontando para Eloah e sorrindo - Devemos todos ir.
Vejo um sorriso contido de Eloah. Sempre admirei o relacionamento pai e filha dos dois, mas, desta vez, conseguiram se superar.
Edgar para e começa a fitá-los com uma expressão de espanto. Põe lentamente o seu prato de volta à mesa e cruza os braços. Olho para Christopher, ele já está olhando-me. Também parece não estar entendendo nada.
- Que estão fazendo? - A voz de Edgar corta o silêncio.
- Por quê estás gritando? - Victor pergunta - Eles salvaram tua vida uma vez. Devias visitá-los mais.
- Sabes bem que hoje irei em busca do Covil!
As palavras e a intonação de Edgar faz meu corpo tremer. Minha cabeça lateja com uma das piores dores que já senti. As vozes que me cercam ficam confusas. Não sei mais quem está a falar ou o quê. Procuro uma cadeira para apoiar-me. Não encontro.
##
- Anna? - Alguém me chama - Anna? Oh, céus! Ela não acorda! - Chritopher, esta é a voz de Christopher.
Pestanejo. Abro os olhos com dificuldade, a cabeça ainda doendo.
- Que houve? - Pergunto.
- Anna? - Ouço a voz de Edgar que chega até mim com formato de desespero. Tento focar minha visão e vejo-o correndo em minha direção. Abraça-me. Lágrimas tomam conta de meu rosto. Não sei o que está havendo. Tenho medo... É a última vez que sentirei seu abraço.
- Amo-te, Anna, amo-te... - Ouço-o sussurrar em meu ouvido no meio do abraço. Levanto-me. Afasto-o de mim.
- Que horas são? - Pergunto.
- Sete e trinta e dois. - Edgar responde-me.
- Não, eu quero saber que horas são! - Sinto a adrenalina tomar conta de meu corpo.
Edgar deixa seu olhar encontrar o meu.
- Está na hora de partir... Gostaria de ficar, mas preciso ir. Sabes bem que Juliet... - Ele dá uma pausa - Eu voltarei, meu bem. - Diz-me passando os dedos por minha face.
Levanta-se e segue em direção à entrada da casa. Fujo dos braços de Christopher que tentam me manter deitada e levanto-me. Corro atrás de Edgar enquanto tudo à minha volta gira. Esbarro-me em um dos candelabros do corredor e todas as velas rolam ao chão. Corro. Corro como se a solução de todos os meus medos estivesse me esperando no próximo passo. Paro em frente à porta. Vejo-o.
A caminhonete está lá. E ele está dentro dela. Vejo o reflexo do seu rosto no espelho do retrovisor. Ele está a chorar. "Juliet" Ele sussurra para mim. Liga o carro e desaparece atrás das árvores.
- Edgaaaaar! - Grito. Corro atrás do carro que já está longe de mais para isso. Ajoelho-me ao chão em meio às lágrimas que insistem em cair.
- Espero que isso faça parte do plano. - Christopher segura-me pelo braço e levanta-me.
Ah, o plano! Havia esquecido-me completamente dele. Ainda há um chance. Uma única chance...
Caminho em direção à casa.
- Esperes! - Christopher grita atrás de mim - Não achas que deixarei-te ir assim, não?
- Assim como?
- Estás doente! - Ele grita - Desse jeito passarás mal antes de chegar à floresta e serás devorada por lobos.
- Eles existem mesmo? - Pergunto incrédula.
- Existem. - Diz ofegante por ter corrido até mim - Mas até onde sei, não é deles que devemos temer.
- Não., não é. - Confirmo.
- Entres.
Olho para a casa. Eloah olha-me da porta.
- Não entrarei lá! Me leves para a floresta agora! Me prometeste, Christopher. - Suplico.
Ele olha para Eloah. Vira-se e volta a olhar para mim.
- Desse jeito em que estás, só deixarei-te ir de uma forma.
- Que forma?
- Ao meu lado.
Olho-o sem dar-lhe uma resposta.
- Anna - Ele pergunta-me -, Edgar não faz por mal, não?
Custa-me um pouco entender o que ele quer perguntar.
- Não. - Digo - Ele acha que é o culpado pela morte da mãe. E acha também que a única maneira de se perdoar é realizando o último pedido de Juliet: descobrir a verdade sobre Dieval.
- Entendo. - Diz com tristeza na voz - Então, aceitas ir comigo?
- Se não atrapalhares.
##
Partimos sem falar com Victor. Eu sei que se olhasse para os olhos daquele velho louco que tanto nos ajudou, desistiria de deixá-lo sozinho. Dei apenas um beijo em Eloah e disse-lhe que a amava. Uma vez no carro e à caminho do Covil, resta-me seguir com o plano.
Desde que Victor entregou à Edgar a caixinha com o livro de lendas e o mapa, observo o mapa e estudo cada palavra da lenda sobre O Covil. Planejava ir atrás dele já há um tempo, mas eu precisava de ajuda, e pedi a Christopher, que me entendeu e decidiu me ajudar. Não foi fácil convencê-lo, mas por fim consegui.
- Precisamos de duas horas para chegar ao ponto onde começa a trilha e seguir com o plano. - Plano... Ele diz como se tivéssemos um plano depois disso.
- Humm.
Seguimos em silêncio até o ponto indicado no mapa. Procuramos um lugar para esconder a caminhonete e acabamos por encontrar a caminhonete de Edgar.
- Ele está aqui. Não faz muito tempo que ele saiu. - Diz Christopher.
- Pegues a mochila!
Christopher pegou a mochila e começou a verificar se tudo estava lá conforme havia colocado. Apanho umas peças de roupas que havia colocado na caminhonete de Victor ainda ontem. Procuro um lugar escondido pelas árvores para trocar-me.
- Não me sigas! - Advirto-o.
- Onde vais?
- Tirar este vestido.
Escondo-me atrás de algumas árvores. Certifico-me de que Christopher ainda está atrás da caminhonete. Tiro o espartilho e o vestido. Visto-me com calças e uma camisa. Calço as botas que Christopher comprou para mim sem Edgar saber e prendo meu cabelo num rabo-de-cavalo.
- Vamos! - Digo. Ele deve já deve estar longe.
- Nunca te vi usando calças. - Ele repara - Estás linda.
- Isso porque não uso. Obrigada. Agora, vamos!
Quando saímos seguindo a trilha quando o relógio marcava 10;11hs. Caminhamos.
Conforme andamos, a floresta fica mais e mais densa. As árvores ficam mais juntas e seus galhos maiores. É difícil de continuar seguindo. Às vezes penso se não estou seguindo o caminho errado, mas afasto esses pensamentos assim que eles chegam. Observei tanto aquele mapa que o decorei.
- Esses galhos! - Christopher grita.
- Calma, já estamos perto.
- Estamos caminhando há oras!
- Ainda não faz duas horas que estamos caminhando.
- Pois parece. Não estás cansada? - Ele encosta-se numa das árvores.
- Estou. Mas não posso esperar mais. Vens comigo ou não?
Ele resmunga. Levanta-se e segue-me.
- Tenho quase certeza de que estamos perdidos. - Diz-me.
- Falta pouco. Não estamos, não.
- Anna, olhes! Que flores mais lindas. Nossa, isso parece um jardim. E no meio da floresta! Victor vai adorar saber disso.
- Um jardim? - Pergunto incrédula - Christopher... - Levanto o olhar e vejo a entrada da caverna. É O Covil. Estava escrito assim nas lendas.
- Eu sei. Estou a ver...
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