Capítulo 2- O Vagão dos Deslocados
A Plataforma Nove e Meia se enchia de famílias bruxas (ou não) prontificadas a levarem seus jovens bruxos a seu meio de transporte para Hogwarts, a renomada Escola de Magia e Bruxaria. Os Silverstone driblaram alguns gatos preguiçosos e alunos perdidos do primeiro ano para embarcar Phoebe e Clarissa, que empurravam os carrinhos contendo seus malões .
-Pegaram tudo, queridas?- perguntou a senhora Silverstone enquanto ajeitava o cachecol da filha mais velha Phoebe.
-Sim, mãe. Pode ficar tranquila, não somos tão alienadas assim- assegurou Clarissa enquanto abraçava o pai e procurava rostos familiares na multidão de estudantes.
As meninas então subiram a bordo do Expresso de Hogwarts, deixando para trás seus pais acenando enquanto os monitores direcionavam os passageiros desinformados para longe da borda do trem depois de darem um último adeus aos responsáveis emocionados que ficaram na plataforma.
-Tragam a Taça das Casas para a Corvinal esse ano!-gritou a senhora Silverstone de longe, até se tornar um pontinho distante no nada.
----------------------------------
Os vagões estavam quase todos cheios de jovens bruxos e bruxas que conversavam e riam animadamente, fazendo Clarissa sentir-se deslocada. Phoebe havia encontrado algumas amigas.
-Desculpe, irmãzinha. Mas é que aqui já está cheio...- disse ela enquanto sentava ao lado de uma ruiva simpática de olhos castanhos.
Clarissa assentiu. Com um suspiro, ela entrou em um dos últimos vagões. Era o mais sujo, o mais mal-iluminado, o mais esquecido, mas era o seu vagão. Nele havia paz e familiaridade. Só faltava um detalhe...
Clarissa se sentou no banco vermelho desbotado, que tinha o estofamento saindo em algumas partes. A garota puxou sua varinha de cerejeira, apontou para o estofado e recitou:
-Reparo!
Imediatamente, o buraco no banco se remendou sozinho, e Clarissa relaxou. Ficou observando a paisagem mudando constantemente da janela por uns poucos segundos, até que uma voz inquisitiva e amada a chamou:
-Alô, Mal-Humorada! Posso ter a honra de me sentar com Vossa Rabugentice?
-Melanie!- Clarissa sorriu.
Melanie Yang era uma menina de olhos puxados e cabelos lisos tingidos de acaju com mechas roxas e azuis. Sua família era chinesa e muito tradicional, o que fez ela ser um pouco rebelde, esperando quebrar certos paradigmas. Ela tinha a pele dourada e reluzente, sorriso travesso e um físico relativamente atlético, embora detestasse esportes. Trajava o uniforme da Sonserina e segurava uma gaiolinha com um gafanhoto.
-Vovó me obrigou a trazer o Fai- disse a asiática, torcendo a cara com desgosto- "Vai precisar de sorte para sobreviver em mais um ano nessa escola de ocidentais metidos a besta", ela disse. Depois começou a gritar comigo em chinês feito uma maluca, é sério.
Clarissa deu uma risadinha enquanto Melanie se acomodava à sua frente.
-Talvez fosse melhor se você tivesse ido para Mahoutokoro. Iria deixar seus avós menos chateados com você.
Foi a vez de Melanie dar uma risadinha muito mais histérica.
-O quê, você está brincando? Eu amo deixar meus avós chateados comigo! E, fala sério, Mahoutokoro é horrível, só Durmstrang é pior. Me imagine usando aqueles quimonos ridículos ou convivendo num ambiente de "paz e harmonia" cultivando bonsais. Você consegue, Clarissa? Eu estou fora. Prefiro mil vezes Hogwarts. E tem mais: se eu não estudasse aqui, não conheceria você!
Clarissa tinha que concordar. Ela e Melanie eram duas esquisitas juntas. Sem a amiga, ela seria esquisita sozinha.
Passou-se um tempo até meio-dia e meia, tempo que as meninas gastaram conversando. Clarissa contava o que descobrira em livros durante as férias, e Melanie relatava como quase explodiu a casa tentando domesticar um Crupe.
A bruxa sorridente que vendia guloseimas chegou ao seu vagão por volta de uma da tarde. Não era de se esperar o atraso. Afinal, ninguém se lembrava da existência daquele local ou não o considerava digno de interesse.
-Querem algo, queridinhas?-perguntou a bruxa, empurrando seu carrinho. Clarissa catou uns sicles no bolso, se perguntando se a vendedora não ficava com cãibras no rosto de tanto sorrir.
No fim, elas compraram alguns bolos de caldeirão, sapos de chocolate e duas jarras de suco de abóbora. Estavam prestes a lutar pelo último sapo de chocolate, quando alguém apareceu abrindo a porta do vagão abruptamente, como se tivesse sido empurrado.
Um garoto pálido muito alto de cabelos castanhos encaracolados e olhos azuis vivos com um hematoma aparentemente recente na bochecha apoiou o braço na porta, subitamente recuperando o equilíbrio e colocando um sorriso presunçoso no rosto.
-Com licença, moças. Com certeza não se importam que o melhor aluno da Grifinória junte-se a vocês.
Clarissa ergueu uma sobrancelha e estreitou os olhos. Melanie estudou o garoto de cima a baixo e resmungou algo que parecia ser uma praga chinesa. Parece que ele não se importou muito, pois se jogou no assento ao lado de Clarissa e abriu os braços, a espremendo contra a janela.
-E o que o melhor aluno da Grifinória, e aparentemente o mais folgado, estaria fazendo aqui?- perguntou Melanie, com uma nota nada sutil de sarcasmo.
O menino olhou surpreso para ela. Talvez não estivesse tão acostumado a receber contradições, pensou Clarissa.
-Não sei.-ele finalmente respondeu- Senso de aventura. Êxtase pelo desconhecido.
Ao dizer isso, ele comprimiu Clarissa mais ainda contra a janela.
-Ora, ora, parece que temos um filósofo aqui.-ela disse, aderindo ao sarcasmo de Melanie e sendo notada pela primeira vez- e como o Senhor Pensador se chamaria?
Não foi por ser notada que o garoto deixou de ser espaçoso, mas ele aumentou o sorriso. Clarissa detestou aquele sorriso presunçoso de "oi, eu sou o rei do mundo".
- Eu conheço você-afirmou ele, apertando os olhos- É aquela Corvina que sempre está com a cara enfiada em algum livro, não é? Já te vi algumas vezes na biblioteca. A propósito, sou Oliver Nobleman.
Clarissa ficou vermelha. Nunca deixava barato para gente prepotente, então decidiu retribuir o cumprimento amigável.
-Ah, claro, eu também te conheço! Você é aquele Grifinório esquentadinho e temperamental que arranja brigas com todo o mundo e por isso não tem amigos! Prazer, sou Clarissa Silverstone. E eu tenho uma amiga, por sinal.
Oliver estava com as duas sobrancelhas erguidas e a boca formando um "o". Melanie comprimia os lábios para não rir da situação. O garoto inclusive recuou os braços e se distanciou de Clarissa no assento, dando-lhe espaço para respirar.
Quando ele estava prestes a dizer alguma coisa, um garoto moreno e bonitinho da Lufa-Lufa entrou no vagão timidamente.
-Perdão, mas será que vocês... Oliver, aí está você! Fiquei preocupado. Depois que você saiu correndo, o grandalhão do Cesar Serpentshore disse que sua cabeça de pombo não escapava da próxima vez...
Oliver arregalou os olhos como se dissesse "cala a boca!", mas o garoto pareceu não entender.
-Er, para não dizer que não tenho amigos, esse é Liam McConnell.-apresentou Oliver, na esperança de que as meninas esquecessem da parte em que ele foge.
-Ah, mas que belo Grifinório você é!-debochou Melanie.- Fugir de uma briga, essa eu nunca vi.
-Já você é uma perfeita Sonserina- comentou Oliver, em tom venenoso.
-Agradeço-concluiu a asiática.
Liam havia se sentado discretamente ao lado de Melanie-não, ele era educado, portanto não a comprimiu contra a janela- e os quatro se encontravam num silêncio desconfortável pelo que foram algumas horas, até que uma monitora apareceu à porta.
-Já estamos chegando- ela avisou.
----------------------------------
O Expresso de Hogwarts estava parado às margens do Grande Lago, de frente para a esplendorosa Hogwarts. Oliver e Liam saíram na frente, e Clarissa e Melanie demoraram mais um pouco para saírem.
Ao seguirem para os corredores de saída amontoados de gente, Melanie comentou:
-Sabe, o Liam até que parecia legal.
-Por outro lado-completou Clarissa- Espero não ver aquele Oliver nunca mais na minha vida.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro