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69º Capítulo - Clara

_ Clara? – soava uma voz ao longe, fazendo-me querer abrir os olhos.

_ Sim? – sussurrei, erguendo as pálpebras lentamente, lutando contra a luz artificial que invadia o ambiente.

_ Graças a Deus! – exclamou seja lá quem fosse. – Lucy? Lucy, venha cá!

Minha cabeça pesava feito chumbo. Passos soaram pelo quarto, apressados, seguidos pelo som da porta sendo escancarada brutalmente. Com dificuldades, forcei-me a sentar.

_ Clara? – berrou mamãe ainda do corredor. – Clara, minha filha!

_ O que foi? – perguntei impaciente, sentindo a cabeça latejar. – Estou com dor de cabeça, poxa...

Subitamente ela irrompeu dentro do quarto com o rosto encharcado por lágrimas. Imediatamente gritou:

_ Nani, traga comida!

_ Mãe, não grite! – implorei. – Minha cabeça vai explodir...

_ Graças a Deus! – exclamou, ignorando meu comentário. Sem pensar duas vezes, jogou-se em minha cama, envolveu seus braços por meu pescoço e começou a me encher de beijos molhados.

_ Mãe, para! – reclamei. – Para com isso!

A contragosto, ela se afastou um pouco, encarando-me e ainda segurando meu rosto. O choro era contínuo e enlouquecedor. Soluços entrecortavam sua respiração.

Confusa, encarei-a.

_ Dois dias... – foram as únicas palavras que saíram de sua boca.

Arrepiei.

_ O quê? – exclamei, desviando o olhar e focando a janela, observando a noite escura que se estendia lá fora.

De repente, papai irrompeu no quarto.

_ Ah, meu Deus! – exclamou, correndo em minha direção como mamãe fez. – Nani, traga comida! – berrou, já abraçado a mim.

Senti a cabeça vibrar.

_ Paaaai! – reclamei. – Não grite, minha cabeça está...

_ Lucy, pegue um pano úmido. – interrompeu-me. – Ela ainda está quente.

_ Eu estou quente? – perguntei, me desvencilhando dos braços de papai e mamãe para tocar o próprio rosto. – Eu não estou quen... Meu Deus. – interrompi a mim mesma. Eu estou muito quente.

Minhas bochechas ardiam como brasa e minha testa pegava fogo. Mamãe não demorou a levantar e fazer o que papai havia pedido.

_ Você apagou por dois dias, filha... – murmurou papai, tocando meu rosto seguidas vezes, escancarando preocupação em seus olhos sem vergonha ou medo. – Sonhou com alguma coisa?

Franzi a testa tentando lembrar, mas nada me vinha a mente. Imediatamente sacudi a cabeça em sinal negativo.

_ Acho que não... – minha voz saiu rouca. Tossi, limpando a garganta. – Ao menos não que me lembre.

Meu pai assentiu. Neste momento, mamãe chegou com o pano e entrou desesperada no quarto.

_ Aqui está! – sua respiração estava acelerada. Provavelmente correu como louca pelos corredores do palácio. – Ela ainda está muito quente?

Papai assentiu, tomando o tecido de suas mãos e pressionando-o contra minha testa. Arquejei com o contato frio da superfície macia.

Minha cabeça girou.

_ Aaaaaai! – reclamei, empurrando sua mão para longe de mim. – Minha cabeça, pai!

_ Vou pegar um remédio... – sussurrou ele, apertando os lábios, transformando-os numa linha reta que evidenciava tensão. – Lucy, continue pressionando o pano sobre o rosto dela.

_ Certo... – murmurou mamãe. – E peça a Nani que traga logo a comida.

_ Ok. – respondeu papai, retirando-se.

_ Desculpe, meu amor... – pediu mamãe baixinho enquanto pegava o pano e o levava rumo a minha testa. – Sei que vai incomodar, mas precisamos tentar reduzir sua febre.

Assenti com pesar.

Nova onda de enxaqueca invadiu meu sistema nervoso quando a compressa impiedosa começou novamente. Praguejei mentalmente.

_ Por que apaguei de novo? – perguntei, tentando ignorar o terrível desconforto que já atingia meu pescoço.

Mamãe suspirou.

_ Eu não sei... – a expressão que circundava seu rosto transbordava impotência. – Queria saber, mas ninguém faz a menor ideia do motivo...

Engoli em seco.

_ Lucy? – chamou aquela voz desconhecida ainda do corredor.

_ Entre, Nani. – convidou mamãe.

_ Que horas são? – questionei, observando a janela e o céu enegrecido logo adiante, pontilhado de várias estrelas muito brilhantes.

_ Quase duas da manhã. – respondeu mamãe.

Arregalei os olhos.

_ Meu Deus! E vocês estão acordados por minha culpa?! – exclamei envergonhada.

As duas mulheres riram. A tal Nani aproximou-se da cama lentamente com uma farta bandeja nas mãos.

_ Não estamos tristes com isso, pode ter certeza. – afirmou ela com doçura. Um leve sorriso escapava-lhe os lábios. Aproveitei para observá-la.

Seu tom de pele bem moreno chamou-me a atenção. Seus fartos cabelos negros lembravam-me alguém, bem como seus olhos brilhantes que mais pareciam jabuticabas. Pela aparência, devia ser um pouco mais velha que mamãe.

Estremeci.

_ Você me lembra alguém... – estreitei os olhos, forçando a memória para lembrar. – Já te conheço?

_ Acho que não. Talvez tenha me visto de soslaio alguma vez pelos cantos da sede, mas nunca fomos apresentadas. – a mulher piscou e abriu um sorriso sincero, colocando a bandeja cuidadosamente sobre a cama para estender a mão a fim de me cumprimentar. – Sou Suzane, mas todos me chamam de Nani. Minha aparência deve lembra-la de Dylan. Sou mãe dele.

Meu mundo caiu. Engoli em seco e perdi a cor. Incrédula, encarei mamãe e murmurei:

_ Ele nunca me disse nada sobre ter uma mãe na Luz... – vergonha e culpa consumiam minhas palavras.

_ Acho que nunca surgiu a oportunidade para ele te contar, filha... – interveio mamãe.

Assenti, baixando os olhos.

_ Mas ele me disse muito sobre você! – exclamou a mulher, tocando meu rosto. – E ele tinha razão, você é muito bonita.

Corei e sorri, agradecendo timidamente com o olhar.

_ Mas não é hora de falar sobre isso! – afirmou. – Trouxe sopa, alguns pães, geleia, torradas e suco de laranja. Não sabia o que iria querer.

Lancei um olhar para aquele monte de comida e senti o estômago apertar.

Não queria nada... Pensei, mas sabia que precisava comer, então forcei um sorriso e murmurei:

_ Vou querer tudo, Nani! Obrigada...

A mulher assentiu e piscou para mim. Engoli em seco e puxei a bandeja para mais perto.

E lá vamos nós...

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