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O filho do Oceano

"Semelhante a Algum Monstro, Quando Dorme

- O Mar... Era sombrio, Vasto, Enorme...

- Arfando Demorado,

- Imenso sob os Céus!"

Ângelo de Lima, in 'Antologia Poética'

Capítulo 14 -  O filho do oceano

Eles tinham que esperar o anoitecer, para não serem vistos.  Se Max fosse realmente sincero, ele só queria passar o aniversário de Ariel com ele, o último dos dois, mesmo que nenhum deles estivesse realmente no ânimo para comemorar nada. 

Depois desse dia, ele provavelmente não veria mais seu filho.

Max esperou Sam aparecer durante o dia e não sabia ao certo se sentia-se melhor ou pior por ele não ter dado sinal. Sabia que ele tentaria impedir algo que não poderia ser impedido. Não era tolo, os sinais estavam todos lá a dias. Ariel estava...sucumbindo. Se o mandar embora o salvaria, que assim fosse.

Porém, não sem antes saber, em primeiro lugar, a razão por ele ter vindo parar em seus cuidados. Qual perigo extremo que o levou aquele dia ali, uma criança sozinha na sua rede de pesca?

 Havia relutância clara no rosto da mulher, Attina. Talvez fosse a forma como Ariel estava praticamente encolhido ao seu lado na cama, as mãos segurando seu braço firmemente, que a fez finalmente falar. Ela estava lhe tirando tudo. Depois desse dia, alguma história seria espalhada na ilha, de Ariel ter ido nadar no mar e ter sido levado pela correnteza. O corpo nunca seria encontrado. Somente  ele e Sam, provavelmente, saberiam a verdade. E tudo o que restariam seria um quarto vazio e fantasmas quando chegasse ao porto. 

Queria ter a certeza que aquilo tudo seria por um motivo real, não que Ariel acabaria morto lá embaixo também, da mesma forma, pelo o que entendera, de todo o restante da família dos dois.

Ela o devia pelo menos isso.

"Foi um conflito interno anos atrás, nosso pai era o rei que todos sabiam e apesar de dar a resposta final em como vivíamos, nas leis, ele também respondia à outros. Ele acabou acreditando nas pessoas erradas. Na época eu não entendi bem o que havia acontecido. Nossa mãe apareceu de repente. Éramos sete, seis mulheres e Ariel, o mais novo. Fomos levadas de nossos quartos e ela apenas nos mandou nadar e fugir. Alguns amigos nos ajudaram. Eu era a mais velha, ela me mandou cuidar dos outros e acabou ficando para trás para ajudar nosso pai. Eu não entendia, mas fiz o que ela me mandou. Fugimos, nos escondemos. Ela não voltou."

Os olhos dela estavam nos seus, mas pareciam olhar mais longe. Ariel tinha a mesma expressão. Max se perguntou se ele lembrava de algo. Não conseguia nem mesmo imaginar.

"Eu era apenas o que você humanos chamariam de criança." Ela continuou, menos hesitante. "Nunca havia saído de perto dos meus pais. Quando foram atrás da gente, em três ciclos haviam nos achado. Mandaram...monstros. Allana e Aquata foram arrastadas para as profundezas, os gritos delas...os gritos delas eu não vou esquecer. Foi quando eu percebi que não era uma missão de captura, eles estavam apenas nos exterminando, nos executando a mando de alguém. Matando os herdeiros. Haviam traído o rei. Eles...destroçaram Arista logo depois."

 Attina colocou as mãos no rosto, a voz trêmula. 

"Andrina foi logo depois, eu não conseguia fazer nada! Os gritos delas..."

Tocou no ombro que tremia levemente e ela pareceu acordar de um torpor, os olhos foram para Ariel.

"Logo...logo eram só Adella, Ariel e eu. Eu estava o segurando o tempo todo."  A mulher olhou para as próprias mãos, o olhar distante. "Sabia que não tínhamos chance alguma de lutar, mas ao menos se os dois tivessem uma chance...entreguei Ariel a Adella, os mandei fugir. Só para ver segundos depois eles arrancarem Ariel dela. E então...espuma no mar e tanto sangue...Havia tanto sangue, eu apenas pensei...naquele momento que estava sozinha." Ela balançou a cabeça. "No fim, só havia restado sangue na água. Eles não me executaram ali, queriam fazer algo público, eu era a herdeira para eles. Eles achavam que eu era por ser a mais velha."

"Você não era." Deduziu. Ela finalmente desviou os olhos das mãos e o fitou, assentindo.

"Não é assim que funciona. O governante não é escolhido por ordem de nascimento, por gênero ou nada como o mundo de vocês. Quando ele nasce...o oceano apenas sabe. É um comunhão. Você pertence ao oceano e ele também é seu."

"Ariel."

Ela assentiu. Então Max percebeu algo.

"Você disse o rei que todos sabiam."

A mulher o olhou de forma estranha, com escrutínio.

"Você é perceptivo. Sim, que todos sabiam. Assim como eu era a herdeira que todos, exceto o ciclo mais confiável, sabiam."

O homem ficou mais interessado, esquecendo por um momento da situação. Era fascinante. Attina pareceu entender seu sentimento, pois apesar da situação sorriu levemente.

"Ser governante de Atlantis é mais do que comandar um reino: é comandar o oceano, é ter um poder além do que se pode imaginar sobre tudo o que ele alcança. Por isso é dever da corte proteger sua identidade. Isso, apenas os nascidos na corte sabem."

"Seu pai não era o rei de Atlantis."

"Não."  Ela negou. "Minha mãe era."

Todos estavam mortos.

Attina abriu os olhos quando foi jogada contra algo duro. Não conseguia se mover. O choque, as correntes ao redor e o medo a deixavam paralisada.

Sabia que estava em meio a côrte. Sabia que havia monstros ao redor. Por entre os cabelos via os olhos assustados do seu povo, sendo empurrados pelos traidores. Podia ver também, sutilmente na côrte, o sinal leve que lhe davam de que não estava acabado. Seu povo não havia se curvado, apenas estavam esperando uma chance de se vingar do sangue derramado.

E lá, em cima do trono que pertencia a sua mãe, estava ela.

Apesar do pavor, seus olhos faiscaram de ódio ao ver o sorriso do rosto dela. Podia ver o sangue na água. Podia ver a destruição ao redor. O sangue de sua família nas mãos daquela maldita mulher. Que agora lhe ordenava a se curvar a ela. Se curvar para sua execução.

Mesmo na posição que estava. Mesmo nos dias presa no calabouço mais obscuro, logo depois de perder toda a sua família, aquela cena pareceu lhe dar a força que precisava para se erguer mais. Os olhos faiscando, o mar ao redor em polvorosa.

E quase podia sentir sua mãe ali. De alguma forma ela estava li, no mar, ao redor. Sua mãe não havia os abandonado.

Ao redor, sussurros, mais pânico. Os olhos dela nos seus pareciam mais furiosos. Os guardas foram arremessados longe.

"O governante real de Atlantis foi assassinado." Sussurrou, o ouviu gritos ao redor. Estava começando. "O herdeiro do oceano foi arrancado dele. Eu imploro a ele, que faça sua justiça."

" ...ttina"

E o oceano ouviu suas preces.

"Attina?"

Seus olhos se focaram no presente. Lá fora, a tempestade parecia em polvorosa e tentou se acalmar. Ariel continuava agarrado no homem, os olhos também desfocados. Se perguntava do que ele lembrava, o que teria acontecido com seu irmão.

"O que aconteceu?"

"Úrsula, esse era o nome da traidora, tomou o reino. Minha execução foi marcada. Todo a família real foi dada como morta. Algo...algo aconteceu no dia da execução no entanto. Não se pode tomar Atlantis. Como eu disse, um governante de Atlantis não é criado, ou forçado. O próprio oceano tratou de se encarregar deles. A tentativa de tomar o poder falhou, os próprios habitantes se viraram contra o restante dos traidores. Ou quase todos eles. Alguns escaparam. Eu de repente, era a rainha."

A palavra saiu com um tom amargo.

"Mas você disse..."

"Aparentemente, o oceano me escolheu nesse dia. Apesar de eu sempre estar guardando o lugar para outra pessoa. " Ela olhou Ariel e sorriu levemente.  "O oceano sempre soube que o herdeiro ainda estava por ai. Por sorte, eu tive ajuda, ou eu nem mesmo saberia o que fazer. Nós aprendemos uma lição com sangue. O sangue da minha família."

Silêncio. Max não sabia o que falar depois daquilo. Ariel havia removido, relutante uma mão de seu braço e agarrado o da irmã, os olhos atormentados. Attina sorriu para ele, relutante, assegurando algo.

"Eu não faço ideia como ele veio parar com você." A voz dela ficara mais composta, a pose imperiosa novamente no lugar. Mas era tarde demais, Max havia visto o que ela era de verdade. Ele realmente não podia odiá-la. "Mas garanto, com minha vida, que uma vez em Atlantis, nada irá tocar Ariel sem que tenha que me destruir primeiro. Nunca mais...nunca mais vou permitir que algo aconteça. Não sou como o meu pai, eu aprendi bem com os erros dele."

Ariel falara algo, que Max não entendera, mas Attina sim. Ela franziu a testa, respondendo. E quando ele falara mais, a voz hesitante, os olhos distantes, ela ficou pálida.

"O que ele está falando?"

"Ele disse...que viu a nossa mãe, que ela o salvou dos monstros."

"É possível?"

"Ele era tão pequeno, mas...nunca encontraram o corpo dela. Eu sempre pensei que ela havia ido atrás de nós quando descobriu que nosso pai havia sido assassinado, ela havia voltado por ele. Que havia sido atacada antes de chegar a nós. Ela era poderosa o bastante."

"Você acha que ela pode estar viva?"

"Eu...não sei. No dia da execução...eu achei que ..." Ela passou as mãos nos cabelos, em um gesto que via muitas vezes em Ariel quando confuso. "Ariel...eu sempre pensei que havia o perdido também. Que seria impossível sobreviver a algo como aquilo."

Ariel falara algo mais, o nariz franzido, a expressão se distanciando e voltando a mão que recebera o corte. 

Os olhos então foram para a irmã e ele falara algo de forma frenética, terminado em um soluço sentido. Attina ficou ainda mais pálida, os olhos horrorizados se enchendo de lágrimas. Ariel enterrara a cabeça mais ao seu lado, procurando conforto. De forma familiar passou a mão nos cabelos vermelhos, o consolando. Entendendo finalmente os pesadelos de seu pequeno de todos esses anos.

"O que ele está dizendo?" A mulher nem mesmo parecia ouvi-lo, a mesma expressão de tristeza, e também horror a distanciando. Ariel continuava murmurando uma frase, a repetindo a seu lado. Com a mão livre tocou o rosto dela, em um gesto que sempre trazia Ariel de volta para si. Isso a fez o olhar, surpresa  "Attina?"

"Mamãe virou espuma do mar."

...........

O dia pareceu se arrastar depois disso. Max não sabia o que dizer ou o que fazer para arrancar o peso que sentia em seu coração. Ariel continuava sentado perto da lareira, o rosto cada vez mais pálido, resvalando entre a consciência e um sono que não lhe dava descanso algum.

Attina olhava para chuva lá fora. Ela  não havia dito nada após a revelação do irmão. Era como se alguma esperança que tivesse nos olhos dela houvesse se quebrado.
E realmente, não podia imaginar como uma criança havia passado por tudo aquilo e ainda sido obrigada a reerguer um reino pós revolução. Alguém havia a ajudado? Essa mesma pessoa estava lá, enquanto ela estava ali na missão de levar seu filho embora?

Não conseguia nem mesmo odiá-la por isso. Apesar de que perder seu filho para um reino que já havia sido traído, em que mataram suas irmãs, pais e tentaram matá-lo o deixasse com vontade de gritar.

Ao mesmo tempo, não via uma escolha, não iria ver Ariel definhar porque o queria por perto para sempre.

Uma mão gelada o tirou dos devaneios e olhou para os olhos mar do seu filho, que havia finalmente se erguido e ido até ele na cozinha.

"Ariel." Sorriu sem vontade e o garoto desviou os olhos, sentando ao seu lado na mesa. "Eu tenho algo para você, para seu aniversário."

Ariel o olhou, finalmente com uma leve faísca de interesse, bem disfarçada, e Max sentiu uma pontada em seu peito ao ver isso. Ele não veria mais isso, não veria mais seu menino curioso.

"Eu encomendei do continente, chegou dias atrás. O meu esconderijo foi bom dessa vez, se não o encontrou." 

Um leve repuxar de lábios em resposta e se sentiu vitorioso. Se ergueu da cadeira, empurrando a xícara fria da sua frente. Quando abriu o forno da cozinha e pegou a caixa ouviu uma pequena risada, encontrando olhos incrédulos quando retornou.

"Bem, funcionou não foi?"

Ariel quase arrancou a caixa da sua mão e dessa vez riu de verdade. Ele a abriu com cuidado e reverência, como abria cada presente que Max sempre lhe deu, como se fosse a coisa mais preciosa do mundo. 

Max sentiu os olhos marejando, agradecendo por Ariel estar de costas para ele. Ariel não precisava ver o pai assim. Max não podia tornar a vida dele ainda mais difícil. 

Estou fazendo a coisa certa.

Ariel fez um som baixo de surpresa ao remover a bússola. Era antiga, uma relíquia e em ótimo estado. Seu filho passou os dedos delicadamente nos detalhes antes de abri-la, os olhos grandes maravilhados. Max sorriu, tocando seus ombros e beijando a cabeça vermelha.

"Feliz aniversário, Ariel. Use ela . E quem sabe...quem sabe um dia ela traga você de volta para casa."

O ombros dele tencionaram e Max se arrependeu de ter dito isso. Ariel guardou a bússola com cuidado na caixa e puxou o papel e lápis da lista que fazia dias atrás,  rabiscando algo. Ao terminar ele virou o rosto para Max, os olhos grandes e pedintes, enquanto apontava o papel.

Eu não quero ir.

Max sentiu seu coração se partir. O bolo em sua garganta aumentando e o sufocando enquanto olhava do papel para os olhos grandes e tristes do seu filho.

"Eu não quero que vá também." Respondeu rapidamente e os olhos do garoto pareceram mais vivos, em expectativa. Max iria decepcioná-lo. "Mas você precisa."

Ariel negou, o rosto se tornando raivoso, tomando o papel da sua mão e escrevendo rapidamente.

Eu não quero te deixar.

"E eu não quero que você...eu quero que você viva Ariel."

Vamos dar um jeito.

"Attina é sua família." Ponderou e o rosto antes raivoso ficou mais triste.

Ela não vai ficar sozinha, mas você vai.

"Ariel..."

Ela pode vir me ver, você não vai poder. Eu não vou poder voltar. Ele não vai me deixar voltar.

A última frase o surpreendeu e olhou seu filho de modo crítico. Os olhos dele pareciam sérios. Nada da inocência regular. Eles pareciam velhos, cansados. Como às vezes sentia que Ariel estava.

"O que quer dizer?"

Ele escreveu algo e então riscou, um som frustrado saindo de sua garganta. Viu alarmado os olhos dele se encherem de lágrimas.

"Está na hora."

A voz de Attina fez com que ambos saíssem de sua bolha e Ariel se levantou rapidamente, gritando algo para ela, que pareceu surpresa e um pouco magoada.

"Ariel...eu não..."

Ele balançou a cabeça e então murmurou algo mais suavemente. Seja o que for fez Attina arregalar os olhos.

"Não diga isso!"

"O que esta acontecendo, o que ele disse?"

Ariel riscou algo no papel e rapidamente passou por eles dois para sala.

Eu não pertenço ao oceano.

Os dois adultos se olharam sem saber o que fazer.

Quando ouviram o som da porta batendo no meio da chuva, já era tarde demais.

............

Era difícil manter os olhos em Ariel em meio a chuva e a escuridão que já começava. Não sabia quanto tempo havia se passado, ou quantas vezes havia o perdido de vista.

Correu por entre as dunas até voltar a avistar ao longe os cabelos vermelhos em meio a tempestade. Viu que chegava a uma parte da ilha que não havia visto antes. Era uma rede de grutas perto de um penhasco. Seu coração quase parou ao pensar do garoto desastrado escalando em meio a chuva e a escuridão.

"Ariel!"

Gritou em vão, o seguindo, com algum esforço chegou as pedras. Dentro, avistou uma gruta profunda que parecia fazer conexão com o oceano abaixo.

Estava ensopado e com frio ao finalmente alcançar a entrada. Ariel estava logo a frente, olhando para o oceano abaixo com um expressão que não conseguia identificar.

"Ariel."

O garoto se virou rapidamente e viu os olhos tempestuosos de uma forma que nunca vira antes. Intensos, raivosos. Longe do inocente garoto que conhecera nos últimos tempos.

Os olhos focaram nos seus, o corpo pequeno tenso enquanto varria por sua imagem de forma cautelosa. Seu corpo se arrepiou quando os olhos dele fitaram os seus. Por uma estranha razão, aquele menino, frágil, inocente, lhe pareceu algo diferente.

Era quase como ver um predador o espreitando.  Um predador que o repelia e o atraía de igual forma, o que o tornava extramente perigoso.

Eric, pela primeira vez, associou medo à imagem de Ariel.

Eu devo recuar.

"Ariel, esta tudo bem, eu só...só quero ajudar."

O rosto do garoto estava tenso, o corpo se  agachando, os olhos furiosos. Eric deu um passo para trás, seu instinto apitando para sair dali. Havia muito que não sabia da situação, mas seu instinto não o falhava.

Fique.

Aquela voz estranha em comando, em sua mente. Eric não fazia ideia do que estava acontecendo. Seu corpo ficou rígido, sua mente nublou por segundos e balançou a cabeça, tentando dispersar a névoa em sua mente, mas era tão difícil.

Deu um passo em direção a Ariel e pausou, voltando a balançar a cabeça. Ele precisava falar algo, mas não conseguia  focar. Eric não conseguia entender o que era sua vontade  no momento. 

"O que... o que está acontecendo comigo?" Balbuciou, abismado. 

Quando voltou a olhar para Ariel algo havia mudado. O corpo dele estava menos tenso, a expressão confusa. O rosto dele virou de forma calculista em sua direção.

Para sua surpresa, ele pareceu farejar um ar, como um animal. Os olhos clarearam com algum entendimento repentino, como se finalmente  tivesse a resposta para uma longa e complicada charada.

O rosto sério era tão diferente da expressão usualmente inocente que prendeu a respiração. Ele sentia, estranhamente, que aquele ali na sua frente, o fitando com afinco, era o verdadeiro Ariel que tanto queria ver. Era como ver finalmente um ator largar um papel longo e tedioso.

As mãos dele fizeram os sinais devagar, ainda sem se aproximar de Eric, mas sem a hostilidade de minutos atrás em cada movimento.

"Algo.Estranho.Você."

O olhou confuso com a sentença. Não era ele que estava agindo estranho.

Ariel se aproximou devagar, ainda parecendo cauteloso.

"Algo. Ruim. Eu. Sabia"

Tensionou com a frase, mas antes que pudesse rebater, ele estava na sua frente, a mão gelada - tão fria - em seu rosto, o segurando com firmeza. Não compreendia como ele havia chegado tão rápido. 

"Draoidheachd"

Arregalou os olhos ao ouvir a voz suave e cadenciada próxima de seu rosto. Não teve muito tempo para pensar nisso ao sentir uma dor aguda atrás de seus olhos.

Os olhos de Ariel estavam nos seus, firmes, parecendo brilhar de forma surreal e absurda. Tentou se livrar das mãos dele, mas o agarre de tornou mais firme.

"Truailleadh"

Gritou quando a dor se tornou ainda pior, caindo de joelhos. Nem assim as mãos geladas o largaram. Sentiu algo subir por sua garganta, o sufocando.

Ariel largou seu rosto finalmente, a mão se firmando em sua nuca quando vomitou no chão da gruta, com horror, notando que o liquido verde que saia de si não era bile. Era algo...vivo. Que se movia pelo chão, com um barulho horrível, como um animal tentando dar seus últimos suspiros.

Água. Movimento na água. Eric se debateu, procurando Marina ao redor, tentando lutar contra a correnteza. Havia algo a mais na água, mas percebeu tarde demais, sentindo apenas algo pegajoso agarrar sua perna e o puxar para o fundo. 

Impulsos elétricos ao redor. As enguias. Olhos heterocromáticos. Eric tentou segurar o ar,  voltar para a superfície, mas não conseguia se livrar dos animais. O choque percorreu seu corpo por completo, tomando toda a água ao redor. 

Sua boca se abriu em um grito, o oxigênio fugindo de seus pulmões e algo entrando em seu lugar. Algo frio e gosmento, o sufocando mais do que a água enquanto lutava ao redor no redomoinho turvo. 

Eric iria morrer. Marina iria morrer. Dessa vez não havia ninguém ali para os salvar. Dessa vez não havia...

"A.Ariel"

Ariel o largou totalmente, o que o fez cair para trás no chão frio, os olhos ainda arregalados na criatura estranha que se formava da substância esverdeada que saíra de sua garganta. 

E Eric lembrava. Ele lembrava de meses atrás, na praia. Ele lembrava de Marina se afogando, ele lembrava de algo entrar por sua boca.  De aquilo entrar dentro dele.

Eric lembrava.

Ariel falou algo, novamente na voz cadenciada e a coisa parou de se mover em um último esguicho agudo, sumindo completamente. A única prova de que não havia alucinado sendo o buraco que havia se formado no lugar no chão.

Novamente sentiu a dor aguda em sua cabeça, mas dessa vez não houve ânsia, mas uma nova enxurrada de memórias. 

Eric lembrava.  De noites atrás, daquela mulher, aqueles olhos, da praia, do que aconteceu com Marina, da última vez que esteve naquela ilha. De tudo.

"Deus....isso é...uma loucura...Ariel." O garoto estava de joelhos a seu lado, o olhando firmemente.  "Ariel...me desculpe, eu não sei o que aconteceu comigo, eu não..."

"A 'bhana-bhuidseach"

"Você está falando."

Falou em um sussurro, ainda grogue. O outro o olhou como se fosse um idiota e se sentou, ofendido.

" Eu não entendo nada do que diz, e eu não sei porque estou discutindo isso quando acabei de vomitar uma coisa ácida que grita."

Para sua surpresa o menino pareceu divertido, um sorriso leve nos lábios, como se ele fosse uma criança tola. Acabou rindo também e pensou no fundo se não estava tendo um ataque histérico.

"Ariel." Repetiu o nome e o outro o olhou em questionamento. "Ariel, eu...eu não sei mais o que é real."

Deu uma risada baixa e passou as mãos nos olhos, terminando a frase em um soluço.

Sentiu uma mão fria em seu rosto e ergueu os olhos, vendo o outro ajoelhado ao seu lado, a expressão paciente e tão velha. Tão familiar.

Risadas na água. Eric correndo entre os barcos no meio da noite, seguindo os cabelos vermelhos na água. 

"Nós...eu já te vi antes."  Eric murmurou, olhando os olhos cor de mar. Tão familiares. "Não apenas vi. Nós éramos...amigos. Foi real?"

Ariel sorriu de forma calma e assentiu devagar. Eric fechou os olhos, as imagens vindo.

"Mais de dez anos atrás, nessa ilha. Você me salvou. E Marina. De noite eu te vi na água. Eu te vi todas as noites, até ir embora. Real?"

Ariel assentiu novamente.

"Eu prometi que ia voltar. Como eu pude esquecer?"

Murmurou em horror. Em todos aqueles anos, lembrando dos olhos dele na água, achando que tudo havia sido uma fantasia. Como havia esquecido de Ariel? 

Sentiu a mão levantar seu rosto novamente, Ariel acenando devagar com as mãos.

"Culpa. Não. Sua. Minha Mãe."

"Sua mãe?" Ariel assentiu. "Como?" 

O viu hesitar, então tocar um dedo em sua testa.

"Esquecer. Seguro. Mais seguro. Você. Eu."

"Eu não sei se entendi bem, mas sua mãe de alguma forma me fez esquecer de você? Por segurança?"

Ariel assentiu e apontou para Eric, então para ele, fazendo o sinal de proibido.

"Não podíamos ser amigos? Era proibido?"

Ariel concordou, um sorriso triste no rosto. 

"Proibido. Errado. Não Seguro."  Ariel franziu o nariz, em algo tão...Ariel que teve que sorrir, antes dele  fazer outro sinal, apontando para si mesmo. "Teimoso. Todo mundo zangado."

Eric não sabia se havia entendido tudo muito bem, além do fato de que Ariel sabia quem era sua mãe e de alguma forma ela havia feito Eric esquecer dele, porque eles não podiam ser amigos. 

"Essa...coisa. Foi ela?" Apontou para o buraco no chão. Ariel arregalou os olhos e negou rapidamente. Sua expressão mudou, para algo mais sombrio, olhando os restos da coisa no chão. 

Eric fechou os olhos com um suspiro. Era tudo tão confuso. As cenas em sua mente. De antes, de dias atrás. Ele lembrava de beijar Ariel, de machucar Ariel, mas não era ele. Eric lembrava de pegar um avião para esse país, uma balsa para essa ilha, mas também não era ele. 

A última coisa real que lembrava era de voltar a praia depois do enterro de Marina. De entrar na água esperando acabar com tudo. De olhos heterocromáticos na água, os mesmo olhos do dia da morte dela, então mais nada.

Algo havia o arrastado para aquela ilha e Eric não sabia mais o quanto de que havia feito ali era ele ou não, o que era real ou não. Ele nem mesmo tinha certeza se o que estava acontecendo no momento era real. 

Ariel tocou seu rosto novamente, dessa vez com as duas mãos. O sentiu segurar suas bochechas com delicadeza, o fitando com tanto carinho, como se compreendesse sua confusão. E Eric queria chorar por esse gesto. Fazia tanto tempo que alguém o olhava assim. 

Isso era real. Ele sabia. Ariel e o farol e a paz ao redor dele. Risadas na água quando crianças e uma promessa que nunca cumpriu. Aquele sentimento, de anos atrás, que nem mesmo lembrava, mas que havia retornado como se nunca tivesse ido embora, como se estivesse apenas dormente. Aquilo era real, não havia névoa alguma sobre ele. 

Querer machucar Ariel, querer forçar sua presença em Ariel, a raiva que sentia de Max por o afastar dele, nada daquilo parecia claro. Nada daquilo parecia seu.

"Eu não tenho certeza do que está acontecendo, mas...Eu acho que não importa tanto. O que importa é que eu voltei. Eu voltei."

Ariel balançou a cabeça, um sorriso terrivelmente triste no rosto. As mãos dele deslizaram do seu rosto e ele se ergueu.

Eric por um momento temeu ter dito algo de errado, mas não sabia o quê. 

Ariel o fitou de pé, o deixando no chão e virando as costas em direção de onde fitava o oceano logo quando entrou. Demorou alguns segundos, até o seguir, se colocando ao seu lado. 

O corpo dele não parecia mais tenso. Os olhos não estavam mais perigosos, mas pareciam tristes no mar lá embaixo. Cansados. Cada linha do corpo dele mostrava exaustão. 

"Por que está tão triste?"

O outro virou o rosto, as mãos novamente falando por si. Sentiu-se decepcionado por não ouvir a voz cadenciada novamente, mesmo sem entender uma palavra do que ele dizia antes. Eric lembrava, vagamente, de ouvir a voz dele anos atrás, mas as imagens ainda era tão difusas, embaralhadas. Como um bloqueio que se quebrava rápido demais e fosse difícil de processar toda a informação. 

"Ir.Embora."

Olhou alarmado para o outro.

"Quem?"

Ariel apontou para si mesmo e Eric sentiu seu peito afundar. Não queria perder Ariel, agora que havia o encontrado.  Ariel havia sido seu melhor amigo naqueles dias anos atrás. Seu segredo, que havia guardado até mesmo de Marina durante aqueles dias na ilha, brincando entre barcos e saltando na água. Havia ainda algo que não conseguia compreender, um detalhe em sua mente ainda bloqueado sobre ele, algo crucial, mas isso não importava no momento.

"Para onde?"

Ariel não respondeu. Os ombros dele caíram um pouco, os olhos o fitando. A mão gelada tocou a sua e seu coração bateu mais forte. Lembrava do beijo na sua mente claramente naquele momento. E em como Ariel havia fugido quando perdera o controle. Aquilo não havia sido Eric, não era seu. Havia sido real, mas não era seu.

Agora, ali, ali era seu. Os dedos frios entre os seus, a mão pequena na sua. Os olhos grandes o fitando tão tristes. Tão cansados. Tão Ariel.

"Não quero que você vá."

Sua voz saiu em um sussurro quebrado. Eric não queria ficar mais sozinho. Semanas atrás ele havia perdido tudo, ele não queria mais viver, ele não tinha mais nada. Agora ele tinha um motivo. Ariel o fazia sentir que ele tinha um motivo. 

"Você não quer ir."

Ariel o fitou, a expressão indecifrável. A mão apertou a sua, negando devagar com a cabeça. 

Seu melhor amigo, sua conexão com o passado, com um tempo quando era feliz. A única pessoa que havia o feito sentir novamente algo além daquele fazia enorme, que havia o resgatado daquela névoa estranha e sombria. Que havia o salvado, de novo.

"Eu não sei o que está acontecendo. Na verdade, eu não tenho certeza mais de nada e tudo isso pode ser apenas um sonho." Ariel sorriu levemente com isso.  " A única coisa que sei que é real é que quero que fique. Eu voltei, eu quero que fique."

Sua voz saiu mais desesperada do que pensava e o rosto do menino suavizou.

"Me diga o que fazer."

Ariel largou sua mão e sentiu-se machucado, até ele fazer os sinais: "Não me deixe ir."

Se aproximou devagar, tocando o rosto frio, esperando ele se afastar. Diferente da última vez, no entanto, foi Ariel que terminou a distância entre os dois, em um beijo suave, a principio. O deixou o guiar, hipnotizado pelos olhos  mar nos seus, as mãos frias em seu rosto.

Era como se voltasse a respirar depois de muito tempo.

Lá embaixo, o oceano entrou em turbilhão.

.........

Draoidheachd - Mágica

Truailleadh - Contaminado

A 'bhana-bhuidseach - A bruxa

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