Capítulo 46 - O Outro Lado da História
A chuva ácida lavava a areia enquanto Alec ouvia Lynx, quase em um estado de transe, absorvendo cada palavra que saia de sua boca, e ficando cada vez mais incrédulo conforme ele avançava na história. Ele tinha sido um príncipe. Nathan era seu melhor amigo, mas tinha traído ele por cobiçar o trono, e contratado Lynx para matá-lo. Lynx que tinha morrido por ele, tentando ajudá-lo a não perder tudo. E para tentar trazê-lo de volta, Alec tentara invocar um anjo, mas em vez disso, libertou Azazel acidentalmente. Ele era o culpado por toda essa desgraça. Não tinha nenhuma lembrança sobre as coisas que Lynx narrou com mínimos detalhes, mas agora suas visões faziam sentido. Eram visões de seu passado, enterradas em seu subconsciente.
—Por algum motivo, eu consegui ficar perto de você por um tempo mesmo depois de morrer, por isso vi quando invocou Azazel, mas depois que ele apareceu... Eu sumi, quando recobrei a consciência, já estava na Cidade Fluorescente. — Lynx contou. —Por isso, acho que foi nesse momento que ele me sequestrou também. Lembro poucas coisas, mas não por ter esquecido com o tempo, é mais como se estivessem me faltando memórias. Provavelmente, Azazel mexeu na minha cabeça também.
—Mas então... — Alec se virou para ele com os olhos arregalados. —Se você viu Azazel naquela época, como não o reconheceu depois que virou anjo da morte?
Lynx balançou a cabeça.
—Naquela época, ele usou uma voz diferente, e estava envolvido em muita luz quando foi invocado. Acho que precisava criar um efeito de que realmente era um anjo então veio como um, a luz era tão forte que não o vi com clareza. — ele respondeu. —Na verdade, cheguei a conclusão de que era Azazel agora pouco. Quando Nathan disse que você estragou tudo, que a culpa era sua... Quando ele disse que você não aguentou, eu sabia que ele estava se referindo a minha morte, então é a única coisa em que consigo pensar.
—Faz sentido. — Alec não conseguia pensar em uma palavra que descrevesse o quão mal ele se sentia. O quão culpado e idiota. Ele tinha causado tudo isso. —Então... eu tentei invocar um anjo para te trazer de volta, e acabei invocando um demônio. Não só um demônio, mas um dos setes príncipes do inferno, um anjo caído poderoso que agora quer me destruir e a tudo que amo. — Alec colocou a cabeça entre as mãos. —Uau. Eu sou muito burro. Eu libertei aquela coisa... Por que o céu não me puniu ou sei lá? Minha nossa, como eu pude fazer isso!
—Não foi culpa sua! — Lynx apertou o ombro dele. —No fim, foi tudo culpa de Nathan.
—Talvez. — Alec discordava. —Mas ainda tem algo que não se encaixa. Se Azazel queria meu poder, deve ter descoberto ele na hora em que me viu, então por que não me prendeu naquela hora? Para que tudo isso? Você... Por que envolveu você nisso? Por que nos manipulou por setecentos anos?
—Isso eu não sei. — ele ficou pensativo. —Tudo que sabemos é que ele esperou todo esse tempo para que seus poderes estivessem maduros, mas quanto ao resto...
Alec queria vomitar.
—Meu D... Será que é errado falar meu Deus no inferno? Não posso ir pro inferno mais do que já estou, né?
—Adoro sua capacidade de brincar nessas situações.
—É por que estou nervoso. — ele olhou para a chuva. —Eu estou muito confuso. Se já não sabia quem eu era antes, descobrir tudo isso não ajudou nem um pouco. Pior ainda é eu não lembrar de nada.
Ele olhou para Lynx com pesar, e disse:
—Mas você lembra.
—Queria poder esquecer algumas coisas.
—Claro... — Alec ficou sem graça. —Tipo a parte de você ter morrido no meu lugar.
—Não é isso! — Lynx sentou ainda mais perto dele. —Nunca me arrependi do que fiz, Alec. Foi a única coisa certa que já fiz na vida.
—Como eu era naquela época? — Alec perguntou se sentindo extremamente esquisito por perguntar a alguém sobre si mesmo. Lynx começou a sorrir.
—Não muito diferente de agora. — respondeu, e sua expressão virou uma mistura de tristeza e nostalgia, diversão também. —Você era ainda mais ousado do que hoje em dia, mas era porque naquela época, você se escondia um pouco atrás de uma fachada, por causa da sua realidade. Não deixava ninguém se aproximar de verdade e conhecer quem você realmente era.
—Deixei você, aparentemente. — ele ergueu uma sobrancelha. —Um assassino ainda por cima.
Lynx riu.
—Até hoje não entendi o que você viu em mim. — disse como se o fato realmente o surpreendesse. —Mas eu amei você desde o primeiro instante quando te reencontrei. Já o admirava antes...
—Reencontrou? Ai meu pai, tem mais nessa história?
—Nos vimos algumas vezes quando criança, você me dava frutas e doces. Até Nathan dizer que eu estava roubando, ai fui proibido de chegar perto do castelo, e de você. — ele suspirou. —Depois disso, fui levado para a guilda. Passei o inferno lá, até não me sentir mais como uma pessoa. E ai acabei recebendo a tarefa de executar você. — ele estremeceu, seus olhos estavam distantes. —Já tinha desistido antes mesmo de entrar por aquela janela, mas queria vê-lo mais uma vez. Fiquei realmente em choque quando você me deu aquela chance, poderia simplesmente ter me matado e contratado um espião de verdade.
—Talvez eu tenha gostado dos seus olhos. — Alec sorriu erguendo as sobrancelhas.
—Eu sabia que não tinha sido pela minha inteligência. — ele riu. —Dai em diante, nos tornamos cúmplices. Continuei seguindo ordens da guilda para manter as aparências, mas todo dia só queria acabar logo meu serviço para ir ver você. Você foi realmente minha salvação, Alexander.
—Queria me lembrar de tudo, não acho justo você carregar essas lembranças sozinho.
—Eu não me importo. — Lynx falou. —Quando digo que tem coisas que gostaria de esquecer, estou falando das coisas ruins, mas se elas são o preço que tenho que pegar por me lembrar dos momentos bons com você, vale a pena.
O coração de Alec doeu. Estavam sentados lado a lado. Alec moveu a mão até a nuca dele, puxando-o para perto e beijando-o. Não sabia o que dizer, e tinha muito para processar, mas tinha que ser aos poucos, ou sentia que sua cabeça era capaz de explodir. Agora tudo fazia sentido. Porque desde o começo ele havia confiado tão facilmente em Lynx, se atraído e se envolvido tão rapidamente. Era porque os sentimentos já existiam, apenas estavam enterrados em baixo de séculos de separação e memórias obstruídas. Mas quando Lynx apareceu, essas emoções vieram a tona tão intensamente que Alec ficou sem saber como processar, e foi obrigado a recorrer a negação.
Com os lábios nos dele, Alec começou a pensar que talvez o passado não importasse. O que importava era que finalmente estavam juntos agora, no presente, e fariam cada segundo valer, recuperariam o tempo perdido. O beijo se tornou intenso, e Alec não tinha mais medo de machucá-lo então não o fez. Seus poderes tiveram que aprender a entrar na linha rápido e forçosamente com toda a situação da guerra, e foi assim que permaneceram, calados, enquanto Alec tentava tirar a roupa de Lynx.
—Alec... Espera, não temos nada...
—Shh... Cala a boca, e me beija.
E assim como ordenado, ele o fez.
—Acho que somos as únicas pessoas que vão poder se gabar por ter transado no inferno. — Alec sentiu Lynx tremer ao seu lado, rindo. Eles estavam deitados em cima das próprias roupas, mas a chuva tinha parado, então eles logo se vestiram para tentar sair dali.
—Levi com certeza vai ficar com inveja.
Juntos, saíram da caverna. O chão estava lamacento e o cheiro no ar era ainda pior agora. Depois de andarem pelo que poderiam ter sido horas ou minutos, eles finalmente avistaram uma construção no meio daquele deserto. Parecia-se com um castelo em ruínas. Eles adentraram a construção, e o salão lembrou o do castelo de Luce, fazendo Alec estremecer. Obviamente, não havia uma saída, e em um momento de pânico Alec pensou que talvez aquela fosse ser sua nova casa.
—Estamos presos. — ele disse meio apavorado.
—Vamos encontrar uma saída. Fique calmo, Alec. — apesar disso, ele próprio não parecia nada calmo.
—Não temos saída, não temos comunicação. Como vou ficar calmo? — Alec se desesperou andando de um lado para o outro. —Como vamos sair daqui?
—Com a minha ajuda, é claro. — a voz familiar veio antes de o portal surgir, e Castiel sair de dentro dele. Alec e Lynx se viraram abruptamente para a porta de entrada onde o portal foi aberto e brilhava convidativamente.
—Castiel! Você está vivo! — Alec sentia uma mistura de alegria e alívio ao vê-lo. Lynx estava igualmente relaxado e sorria para o amigo. Mais uma vez, salvos por ele.
—Sua cara está péssima. — Lynx falou para ele.
—Bom te ver também, Lynx. — Castiel riu e se contraiu ao esticar um corte feio na boca.
De fato. O rosto dele estava todo machucado, cheio de cortes e hematomas, ele mancava um pouco.
—Azazel me espancou até a morte. — disse e então deu um sorriso diabólico. —Pelo menos, foi o que ele pensou. Mas vaso ruim não quebra. É o que dizem.
—Como nos achou? Como sabia que estávamos aqui? — quis saber Alec.
—Fui até a Cidade dos Mestiços depois de me recuperar, Azazel realmente pegou pesado... Vi a destruição, e fui atrás do pessoal. — o rosto dele ficou sombrio. —Houve mais ataques, e Luce ainda está desacordada. Os ataques são de Azazel.
—Sabemos.
—E ai eu soube que Lynx tinha sido levado e que você tinha ido atrás dele, então rastreei você. Quem diria que essa coisa realmente seria útil? — ele tirou o próprio celular do bolso, e Alec se lembrou que ele havia pegado o dele antes de sair de casa, e se parabenizou mentalmente. O portal ainda brilhava atrás de Castiel. —Então, vamos? Esse lugar me dá arrepios.
Alec e Lynx concordaram.
—Obrigado, Castiel. — Lynx o agradeceu sinceramente. —Você sempre aparece na hora certa.
—Sem problemas. — Castiel estava de costas, indo em direção ao portal brilhante.
Alec o seguiu, com Lynx logo atrás dele. Realmente agradecido por Castiel ter aparecido. Se não fosse por ele, talvez passassem a eternidade naquele lugar. Alec ainda tinha muitas coisas sobre as quais queria conversar com Lynx, mas tinha outras preocupações no momento. Ele foi sugado pelo portal, girando em círculos até sentir os pés em chão firme. No entanto, ficou confuso, ele esperava ver as bordas da floresta da cidade ou até mesmo o castelo de Luce quando saísse do portal. Em vez disso, deu de cara com um brilho ofuscante, quando a visão se ajustou, o coração de Alec afundou no peito.
Um pátio aberto no topo de uma torre. Um teto curvado sustentado por pilares grossos e uma cidade ardendo em luz branca ao redor. Um trono com um Príncipe do Inferno sentado nele.
—Aqui estão eles. — disse Castiel. Ele não era mais um anjo desengonçado vestindo jeans e camisetas de nerd. Estava mais alto e forte, vestia um terno branco, os cabelos ruivos em cachos impecáveis. Seus rosto estava imaculado, sem nenhum ferimento. Ele caminhou pelo salão até parar ao lado do trono de Azazel, então sorriu. —Sinto muito, tivemos que tomar um pequeno desvio no caminho. Espero que não se importem, amigos.
Foi como se o chão tivesse desabado sob os pés não só de Alec, mas de Lynx também. Alec olhou de lado para ele, e seus olhos estavam repletos de traição e dor. Ele nunca tinha visto o anjo com uma expressão tão machucada.
—Mas... — Lynx deu um passo inseguro para frente. —Você era meu amigo... Você me ajudou. Nos ajudou diversas vezes. Não entendo...
—Ah qual é, Lynx? — Castiel inclinou a cabeça. —Não me olhe assim. Não tenho culpa se você é tão ridiculamente ingênuo, esse sempre foi seu maior defeito e ainda vai ser sua ruína.
Em todos os cenários trágicos que Alec podia conjurar, ele não conseguia imaginar isso em nenhum deles. Castiel era um traidor também. Castiel. O anjo que ajudou eles inúmeras vezes, que parecia tão amigável e gentil. Alec se sentia um idiota, pior ainda por que não conseguia falar. Não conseguia defender Lynx e se defender, ele estava em completo choque mais uma vez. Quantos tombos ele ainda aguentaria naquela noite?
—Você é o Arcanjo. — disse quando conseguiu montar uma frase.
—Sim, obviamente. — Castiel sorriu para eles, e pela primeira vez, Alec não se sentiu reconfortado com isso. —E meu nome não é Castiel. Meu nome é... Bem, não importa, não é mesmo?
—Quando terminar ai me avisa, Castiel, quero conversar com Alec também. — disse Azazel analisando as próprias unhas. —Temos muitas coisas a resolver.
Alec olhou ao redor. Eles estavam mesmo na Torre de Prata, o mesmo lugar de antes, exceto por uma diferença bizarra no recinto. Havia uma espécie de tanque no canto, com um líquido azul transparente, e flutuando dentro dele havia uma mulher nua com longos cabelos escuros. Alec sentiu uma pontada na cabeça, e então se lembrou. Era a princesa de suas visões. Ele olhou para Azazel que o encarava com os olhos prateados cheios de ódio. Tentou encaixar as peças, mas nada fazia sentido. Por baixo de toda aquela pose sarcástica, Azazel parecia desprezá-lo muito, e Alec também não entendia o motivo.
—Já acabei na verdade, não tem nada que eu queira dizer a esses ai. — Castiel falou. Simples assim. Ele enganou os dois durante todo esse tempo, e agora os descartava como se valessem menos que lixo para ele.
—Por quê? — quis saber Lynx, a voz tão ferida quando o olhar. —Só... Por quê?
—Poder. Diversão. — Castiel chacoalhou os ombros indiferente. —O céu acaba ficando entediante depois de alguns milhares de anos. Você vai entender quando tiver passado tanto tempo que você nem se lembra mais quantos anos tem.
—Não. — a expressão dolorosa de Lynx se transformou em ódio frio. —Nunca vou entender, porque não sou como você.
—Ai, que seja. — Castiel deu as costas para eles, apreciando a paisagem. —Anda logo com isso Azazel.
—Aposto que você tem muitas perguntas, Alec. — Azazel se dirigiu a Alec, parecendo irritado com aquela tagarelice toda. Toda aquela personalidade zombeteira dele estava ausente. Ele não estava fazendo seus teatrinhos, parecia muito sério, mas também ansioso.
—Só uma, na verdade, por que você manipulou minha vida desse jeito?
—Parece que Nathan atualizou um pouco você sobre os fatos. Como foi no inferno? — Azazel sorriu com um prazer frio. —Nathan se achava muito inteligente, mas uma barata tem mais Q.I do que ele. Tentou me manipular muitas vezes, mas no fundo ele era só mais um dos meus fantoches. Ele era o teste final. E se você está aqui, é porque passou.
Testes. Azazel achava que ele era algum tipo de rato de laboratório?
—Ah sim, você queria me testar para despertar os meus poderes. — Alec encarou ele, tentando entender aquela criatura. —Mas por que toda manipulação? Não teria sido mais fácil simplesmente me prender e esperar?
—Não teria ajudado. — Azazel se manteve sentado enquanto falava. Tranquilo, como se tivesse todo tempo do mundo. Seria convincente, se não fosse a avidez em seu rosto atemporal. —Você estava morto por dentro quando nos encontramos. Eu precisava estimular você, não te prender.
—As minhas memórias...
—Quase todas as suas lembranças são uma mentira. — Azazel interrompeu. —Suas memórias de infância? Uma fraude. Você não teve infância, pelo menos, não uma recente. Sua infância de verdade aconteceu há mais de setecentos anos.
—Isso eu também já sei. — Alec rangeu os dentes. —Você está se esquivando das minhas perguntas. Eu quero a verdade, você me deve ao menos isso.
—Eu não devo nada a você, garoto. —Azazel sibilou. Castiel, que tinha se virado para eles de novo, observava toda a cena com uma frieza distante, e Lynx encarava ele como se estivesse decidindo se o jogaria de cima da torre, embora não fosse ser muito útil.
O Príncipe do Inferno se recompôs, e então pareceu ter se lembrado de algo.
—Ah, não! Espera... — Azazel coçou o queixo. —Você me libertou, então sim, sou grato. Muito bem, vou te contar algumas coisinhas antes de acabar com você.
Ele disse isso de propósito, apenas para ver o olhar de culpa no rosto de Alec, e se deleitou com isso. No fundo, Alec ainda esperava que Lynx tivesse se enganado, mas ele realmente tinha libertado Azazel.
—Atualmente, — começou Azazel. — seu corpo é apenas uma casca carregando algo de que preciso muito. Seu poder entrelaçado a sua alma, e a essência que ambos carregam.
—O que eu quero saber — Alec nem conseguia mais expressar raiva, ele apenas se sentia muito, muito cansado. — é para quê todo esse teatro? Toda a perseguição... Testes. Não entendo. Tudo isso é tédio?
—Bem, um pouco. Você tem noção de como é ser imortal? Um saco. — ele revirou os olhos. —Mas não é só isso. Você não estava pronto, se eu tivesse tentado extrair seus poderes antes, não teria sido nada útil, você só ia morrer. Devia me agradecer por ter ao menos deixado você viver uma breve vida.
—Nossa, muito obrigado? — Alec falou cheio de incredulidade.
—Disponha. — Azazel sorriu gentilmente.
—Por que você envolveu Lynx em tudo isso? — perguntou enquanto fantasiava sobre chutar a cara de Azazel até ele perder todos os dentes. —Se queria só a mim, não precisava...
—No começo eu achei que ele era realmente só uma pedra no caminho, sabe? — o príncipe infernal interrompeu. —Mas eu estava errado, Lynx tem tudo a ver com isso, ele é o catalisador. Quando você me invocou, estava acabado, sem vida, em grande parte por causa da morte de Lynx. Você teria se desenvolvido naturalmente naquele época... Já estava acontecendo, mas o choque que a morte dele causou em você congelou seu desenvolvimento. Congelou seus poderes.
—Então você usou Lynx para conseguir o que queria de mim. — o nojo era evidente na voz dele.
—Sim! — Azazel respondeu alegremente. —Ele era necessário para o seu despertar. Armei muitas situações durante os séculos, mas nunca funcionava, você continuava fraco e inútil, porque faltava Lynx. Quando finalmente percebi isso, armei toda essa situação onde ele precisava te matar. Eu sabia que ele não mataria, mas era estar ao lado dele que fortaleceria você. Que faria você descongelar.
—Não foi por minha causa que Alec despertou. — Lynx entrou na conversa, sua expressão era de descrença. —Foi por ele mesmo. Ele amadureceu sozinho, nunca precisou de mim para nada.
—Vocês pode ser um anjo agora, mas ainda é cego como um humano quando se trata da natureza das pessoas. — Azazel falou como se ele fosse o maior expertise no assunto. —Alec tinha algo pelo qual lutar, alguém que queria proteger. E esse alguém era você.
Lynx não respondeu, apenas olhou para Alec parecendo querer dizer muitas coisas, mas não era o momento. Alec sentia tanta raiva, que estava reunindo todo seu autocontrole para não voar na garganta de Azazel. A forma como ele tinha usado Lynx, como se fosse apenas um peão em um tabuleiro de xadrez, deixava Alec colérico, mas ele não podia perder o controle ainda. Tinha coisas que precisava saber.
—Aquela coisa ali — Alec apontou com o queixo na direção da mulher flutuando em líquido azul. — presumo que seus objetivos tenham a ver com ela.
—Não é uma coisa! — ele sibilou se descontrolando.
—Tá bom. — Alec falou calmamente. —Aquele cadáver apodrecendo, aposto que tem algo a ver com seus objetivos.
Azazel respirou fundo e apertou a mão em punho, reunindo paciência.
—Vou contar uma história...
—Nossa que bom, — Alec disse com sarcasmo. — eu estava doido por uma historinha, justo agora.
—Ah, mas essa você vai adorar ouvir. — Azazel sorriu venenosamente. —Há muito tempo, existia um reino governado por um rei muito fraco. As pessoas mais o odiavam do que respeitavam. O rei tinha uma bela esposa, que ao contrário dele era amada por todos. E então havia um anjo caído. Ele passava seus dias trancafiado no inferno observando a bela rainha. Já tinha caído por causa de uma humana antes, mas a tentação era grande demais. Porém, ele estava preso justamente por ter sucumbido as tentações. Não demorou muito para que ele se visse completamente encantado pela rainha, então ele quebrou os portões do inferno e subiu na terra. A rainha não era bem tratada pelo rei, mas aquele anjo caído a amava de verdade e a tratava como merecia, então logo a rainha retribuiu seus sentimentos. Obviamente, eles não podiam ficar juntos, ele pertencia ao inferno, e ela a um mundo cruel como um. Contudo, o anjo caído foi preso novamente, e dessa vez as amarras de sua prisão eram milhões de vezes mais fortes. Tudo que restou ao anjo caído foi passar seus dias no inferno, observando sua amada. Até o dia em que ele notou que ela estava grávida... e o filho não era do rei.
—Eu não quero mais ouvir. — Alec deu vários passos para trás até tombar em Lynx, que o amparou pelos ombros e olhava para ele com tristeza e a mesma compreensão que devia estar surgindo no rosto de Alec naquele momento.
—A princípio, — Azazel continuou como se ele não tivesse dito nada. — o anjo caído ficou feliz. Embora ele tivesse se envolvido com muitas mulheres humanas no passado, era a primeira vez que engravidava uma e por isso seu crime era ainda mais grave do que antes. Nefilins não deveriam existir. E era ai que morava outro problema. Ele era um anjo caído forte, e ela apenas uma humana fraca. O bebê era um híbrido ainda mais forte e a consumiu lentamente, por fim, a rainha morreu no parto.
Alec ouvia a história completamente paralisado, mas sentia seu coração batendo violentamente nos ouvidos. Involuntariamente olhou para a mulher flutuando no tanque. Não era uma princesa.
—Aquela é a rainha. — ele constatou, sua voz não mais que um sussurro. —E você é o anjo caído.
—Sim, e aposto que a essa altura, consegue imaginar quem é o bebê. — a voz de Azazel não continha nada além de raiva e amargura. —Meu filho.
—Não... Não... Você... — Alec tampou os ouvidos como uma criança fazendo birra, as lágrimas corriam aos montes pelo rosto. —Mas eu tenho pais! Eu os vi morrer!
—São apenas marionetes, cascas vazias que faziam o que eu mandava! — Azazel vociferou. —Eu sou seu pai. Infelizmente. E você matou sua mãe, sugando até o último pedaço da alma dela. Você é um parasita!
—E você é um maníaco nojento! — Alec rebateu. Sua cabeça estava girando e ele só queria sair correndo dali. Ele não sabia o que dizer, e acabou repetindo coisas aleatórias. —Manipulou Lynx e a mim. Você... roubou minhas memórias... Eu...
—Tecnicamente, essa parte foi eu! — Castiel se intrometeu, animado. —Azazel controlou a mente de Amarantha para ela entrar em contato comigo no céu, então formamos uma aliança. Eu disse a você quando nos conhecemos que minha especialidade era entrar nas mentes das pessoas, e a sua foi a primeira mente que deformei.
—Aquele dia em que apareceu no meu apartamento para tentar me ajudar a tirar o bloqueio mental de Nathan Não tinha sido Nathan, foi você o tempo todo. — Alec percebeu. —E você não me deixou ver o rosto dele de propósito.
—Se você visse, poderia acabar se lembrando do passado, mas não estava pronto ainda. — Castiel explicou. —Você entendeu tudo agora? Azazel precisava que você reagisse, por isso você não poderia lembrar do passado e da morte de Lynx, se não ia ficar para sempre em um estado de depressão, nadando na própria saliva. De nada, inclusive. Fizemos um favor a você.
—Você me dá nojo. — Lynx disparou, mas foi ignorado.
—Foi a pedido de Azazel que prendi você em um loop, Alec. — ele continuou a explicação como se fosse um professor dando aula, e não um doente manipulador. —Implantei falsas memórias e informações na sua cabeça através dos anos. Não forjei sua personalidade ou seus gostos. Apenas adequei você a realidade em que estava vivendo. Meu trabalho seria impecável se você não fosse tão teimoso. Em algum momento você sempre se lembrava de tudo, e então eu tinha que começar de novo antes do esperado.
Aquilo prendeu atenção de Alec brevemente. Então em algum momento ele iria se lembrar de tudo. Não que fosse importante agora. O estrago já estava feito, independente de ele lembrar ou não.
—Como você pode? Lynx confiava em você. Eu confiava.
—Ora, Alec, não é pessoal. — Castiel limpou um grão imaginário de sujeira da manga do paletó imaculado. —Azazel só é o único que podia me ajudar a conseguir algo que eu sempre quis... A Cidade dos Mestiços. Foi por isso que aceitei ajudar Azazel, ele mandou Amarantha ao céu, e eu sabia da ligação dela com Luce e sabia que em algum momento isso seria útil para mim.
—A Cidade dos Mestiços está destruída agora, por sua culpa. — acusou Alec odiando admitir que ele tinha sido muito inteligente, e paciente. Esperando durante séculos por algo que desejava, e disposto a enganar qualquer um por isso.
Os olhos de Castiel brilharam.
—Exatamente. — ele estava em êxtase. —E então um anjo benevolente simplesmente vai surgir lá e reconstruir tudo, esse anjo sou eu, é claro.
—O esquadrão jamais vai permitir isso. — Alec rebateu. —E Luce...
—Aquela vadia está praticamente morta. O veneno já deve ter tomado conta do corpo dela.
—Luce não vai ser derrubada por qualquer veneno. — Lynx se pronunciou.
—Mas não é um veneno qualquer, é uma mistura especial que inventei misturado com veneno de demônio. — Castiel mexeu nos próprios bolsos, ele pegou um frasco pequeno e sorriu agitando ele nos dedos. —Alias, eu tenho o antídoto. Tive que fazer, caso algo desse errado e eu tivesse que adiar meus planos.
—Nossos planos. — corrigiu Azazel. Castiel descartou ele com um aceno de mão.
—Que seja. — falou. —O mais engraçado é que Alec poderia salvá-la, se tivesse tido tempo de aprender a usar os próprios poderes.
—Então, eu Sou o quê? Um nephilim?
—Não apenas um nephilim. — disse Azazel como se ele fosse ignorante. —Você é o primeiro nephilim. O mais poderoso de todos. Mas não por muito tempo.
—Você vai me usar para trazer ela de volta, né? — perguntou. Ele não conseguia dizer minha mãe. Ele não conhecia ela, mas pensar nisso o deixava muito triste. A mulher que passou a vida acreditando ser sua mãe, não passava de uma marionete, suas lembranças com ela, uma mentira. E a verdadeira mãe tinha morrido por causa dele, e ele jamais tinha a conhecido. O que era pior? Não ter conhecido a verdadeira mãe que morreu para que ele pudesse nascer? Ou ser filho de um anjo caído demoníaco que queria destruir você e a pessoa que você amava? Alec não tinha as respostas, só sentia dor e uma miríade de sentimentos angustiantes que pareciam querer engolir ele inteiro.
Azazel sorriu como se sentisse seu sofrimento.
—Pelo menos, minha inteligência você herdou. Ela teria orgulho de você, sabe? Era uma mulher tão amorosa. — a expressão dele escureceu. —Você consumiu a alma da sua mãe para conseguir nascer, ela está interligada aos seus poderes, por isso preciso deles para trazê-la de volta. Você é uma aberração de qualquer forma, não deveria ter nascido. O mínimo que pode fazer é reparar esse erro e trazer sua mãe de volta para mim.
As palavras atravessaram Alec como uma flecha em chamas. Ele já sentia o gosto da derrota. Azazel era um Príncipe do Inferno, e Castiel um Arcanjo. Que chances eles teriam?
—Olha, eu faço o que você quiser, mas deixa o Lynx ir embora. Não machuque ele.
—Alec! — Lynx protestou. Ele estava tão quieto o tempo todo que Alec até estranhava, mas sabia o motivo. O baque da traição de Castiel tinha lhe tirado as palavras. —Como pode dizer isso? Não saio daqui sem você!
Azazel encarou eles, entretido.
—Castiel te disse que sequestrei anjos do céu. Mas na verdade, só sequestrei um. Sabe que tipo de anjo Lynx era? — ele fez uma pausa esperando um palpite de Alec, mas só recebeu uma expressão confusa com o rumo do assunto. Ele continuou: —Lynx era um anjo da guarda. Seu anjo da guarda, foi o cargo dado a ele quando morreu por você.
—O quê? — a voz de Alec soou mortalmente baixa. Lynx ficou extremamente pálido, mas as mãos se fecharam em punhos.
—Achei que seria engraçado transformá-lo em um ceifeiro. — Azazel falou. —No começo, a intenção era mantê-lo longe de você, então eu o sequestrei para mantê-lo sob meu comando, mas depois achei que seria divertido dizer a ele que era um anjo da morte. E quando percebi que o que faltava em você era ele, dei seu nome a ele. O Ceifeiro do Príncipe, na vida e na morte, e ele falhou nas duas vezes. Que lindo o amor.
—Você é a coisa mais repugnante que já vi. — Alec falou com frieza. —Faz sentido que o céu tenha chutado você.
—Eu esperava um insulto mais criativo de você depois de tudo que eu te contei, mas tudo bem. A conversa já se estendeu demais. — Azazel Sorriu. —Vamos ao que interessa?
—Você não vai colocar essas mãos podres nele. — Lynx se colou na frente de Alec.
—Castiel. — Azazel soou irritado.
—Não sou seu lacaio, sabe? — Castiel reclamou igualmente irritado, mas se moveu. Rápido como o vento, e subjugou Lynx. O anjo caído era poderoso, mas Castiel — esse não era seu nome — era um Arcanjo, e naquele momento, Lynx estava extremamente vulnerável. Castiel torceu os braços de Lynx atrás de suas costas e permaneceu segurando ele. Alec tentou ir até ele para lutar com Castiel e libertar Lynx, mas Azazel disse:
—Um passo e Lynx morre. — Alec congelou.
—Vá logo com isso, Azazel. — Castiel reclamou. —Tenho mais o que fazer.
Azazel levantou-se de seu trono, e suas asas se libertaram. Eram escuras, mas não feitas de penas macias e brilhosas como as de Lynx, pareciam-se com asas de morcego, encouraçadas e com garras nas pontas. O verdadeiro pai de Alec, avançou contra o filho. Ele tentou se esquivar, mas Azazel foi mais rápido, pegando Alec pelo pescoço. Ele engasgou conforme a mão de Azazel o puxava em direção ao centro do espaço.
—Você pode ser poderoso. — Alec falou com muito esforço. —Mas é extremamente previsível.
Alec pressionou a mão em cima da de Azazel envolta em seu pescoço. O príncipe infernal chiou e soltou ele bruscamente, com uma queimadura na mão. Cheio de raiva, Azazel avançou novamente, dessa vez com a mão fechada em punho, e acertou um soco no rosto de Alec, ou melhor, teria acertado, se Alec não tivesse treinamento. Ele desviou de Azazel com um movimento giratório, e desferiu um chute no estômago dele, que fez o anjo caído soltar um engasgo e cambalear um pouco, mas logo se recompôs e atacou novamente. Por um momento, pai e filho se tornaram um borrão de movimentos. Alec se recusava a apanhar dessa vez. Talvez não pudesse realmente matar Azazel, mas não cairia sem lutar. Pelo menos, o treinamento estava servindo para que ele evitasse levar uma surra sem conseguir reagir.
—Por que você está se segurando? — ele provocou Azazel. —Se demorar muito, não vai sobrar nada da minha mãe para você reviver.
Azazel avançou contra ele exibindo os dentes com raiva, mas Alec também era rápido. Ele nem sabia ao certo porque estava se dando ao trabalho de falar com Azazel, mas ver a expressão dele piorar foi um pouco satisfatório.
—Se eu não precisasse de você inteiro, já teria quebrado todos os ossos do seu corpo. — falou. —Quanto mais machucado você estiver, menos efetivo vai ser o ritual.
Por um momento, Alec contemplo pular da torre. Se ele estivesse morto, Azazel teria seus objetivos frustrados. E se não fosse por Lynx, ele teria pulado.
Passou um bom tempo apenas desviando e se defendendo de Azazel que queria prendê-lo no centro do pátio, até que finalmente conseguiu acertar um soco. Bem na cara de Azazel. O pescoço dele voou para trás e quando seus olhos encararam Alec de novo, estavam cobertos de fúria, mas também havia uma pontada de surpresa.
—Eu preferia fazer isso do jeito mais fácil, mas aparentemente, você gosta de sofrer. — ele se virou para onde estavam Lynx e Castiel, que assistiam a luta com expressões completamente opostas. Diversão e horror. Azazel gritou: —Castiel!
—Tá, tá. — ele jogou Lynx de joelhos e esticou a mão. O rosto de Lynx se contorceu com dor, e ele gritou em seguida. Suas asas foram libertas contra sua vontade, e se esticaram dolorosamente enquanto Castiel manipulava elas com seu poder.
—Se não parar de se comportar como um jovem rebelde e fazer o que eu quero, Lynx vai perder as asas. — sibilou Azazel. Alec parou e se afastou aos poucos, cauteloso. Anjos raramente sobreviviam a ter as asas arrancadas. Ele se endireitou, saindo da posição de luta.
—Eu faço. — Alec ergueu as mãos, parado no lugar. —Por favor... Não faça isso. Eu faço o que você quiser.
Ele odiava implorar para Azazel, mas por Lynx, ele não se importava.
—Muito bem. — Azazel se recompôs do soco, limpando o nariz sangrento na manga do terno branco.—Vá para o centro do salão.
—Devia ter feito isso antes de levar um soco na cara. — Castiel falou com deboche. Azazel lançou um olhar de ódio a ele.
Alec obedeceu. Quando ele pisou no centro, uma espécie de pentagrama brilhando em vermelho se acendeu. Os símbolos demoníacos pintados nele doíam os olhos.
—Vou me aproximar agora. — alertou Azazel. —Se tentar alguma gracinha, Lynx morre.
Azazel adentrou o círculo e ele brilhou ainda mais intensamente, pintando a brancura da Cidade Fluorescente de vermelho sangue. O anjo caído com asas de morcego agora estava frente a frente com Alec. Pai e filho, e um ódio imenso entre eles. De repente, no meio daquela cena, Alec se lembrou de algo aleatório. Madame Lara dizendo que em breve ele teria uma reunião de família e uma briga feia com o pai. Achou que tinha a ver com o que tinha acontecido no inferno com Nathan, mas agora sabia. Ele olhou para ao tanque onde sua verdadeira mãe flutuava e sentiu um vazio tão intenso que parecia que seu corpo era feito de ar. Azazel seguiu o olhar dele.
—Você me lembra um pouco ela. — ele disse com amargura, e ódio. —E eu o odeio por isso também. Por que você tinha que sobreviver e ela não? Se não fosse isso... Em outras circunstâncias, eu poderia ter te amado. Como eu amo sua mãe.
—Não. — Alec abalançou a cabeça. —Você nunca amou ela. Você ama a ideia de ser amado por ela, deve ser a única coisa que o impediu de se sentir tão patético e vazio naquela época. Ser adorado. Não é mesmo? Eu sei disso porque se você realmente amasse ela, não estaria tentando matar seu filho agora. Não conheci minha mãe, mas duvido que mãe alguma gostaria de voltar a vida sabendo que o pai matou o próprio filho para conseguir isso.
Alec viu o descontrole nos olhos prateados dele. A mandíbula rangendo. Ele sabia que Alec estava certo. Azazel se controlou com algum esforço.
—Você tem razão. — disse. —Você não a conhece.
Azazel levantou a mão, se preparando para continuar o ritual, seja lá o qual era o próximo passo. Então Alec viu sua chance. Manteve ela escondida durante todo esse tempo, para que pudesse usá-la quando tivesse a oportunidade certa. Ele conjurou Defensora pronta para enterrá-la no peito de Azazel.
Mas então, o inimaginável aconteceu.
Uma sombra adentrou o círculo, e a próxima coisa que Alec viu foi Defensora cravada fundo no peito de Lynx, seus olhos dourados cheios de choque e dor.
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