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Capítulo 4 - Tentando Desvendar o Anjo

Não havia tecnologia no céu. Lynx tinha dito que as casas lá eram equipadas com o básico do básico. Sofás confortáveis para descanso, poltronas para leitura e prateleiras com livros sobre leis e história celestial. Em seu relato breve ele tinha dito que o céu era quieto demais, pacífico demais. Do ponto de vista de Alec, tirando a ausência de Wi-Fi, isso não parecia tão ruim. Ele gostava de paz. E afinal, não era assim que o céu deveria ser?

Mas talvez para Lynx paz equivalia a tédio.

E de repente ocorreu a Alec que até aquele momento Lynx talvez nunca tivesse precisado tomar banho em sua vida como anjo. Talvez antes pudesse se livrar de qualquer sujeira com apenas um estalar de dedos, mas agora que seus poderes angelicais estavam se esvaindo, usar o pouco que restava para algo tão simples fosse desperdício. O fato era que ensinar a um ser sobrenatural qual era a função de uma televisão havia sido um pouco engraçado, mas sobre o chuveiro nem tanto. Alec se distraiu ficando de costas para Lynx por meros segundos enquanto explicava como usar o chuveiro e quando olhou para trás ele havia tirado a roupa.

Toda a roupa.

—Por que você tá pelado? — A mente de Alec estava em branco e ele se esforçou bastante para que seus olhos acidentalmente não escorregassem para baixo. As tatuagens de Lynx desciam pelo corpo indo até além da cintura. Não que ele estivesse reparando.

—Você disse pra eu tirar as roupas, jogar a camiseta no lixo e colocar o resto no cesto. — Lynx respondeu com a maior inocência do mundo. No entanto, Alec não tinha certeza se ele era sem noção mesmo ou se estava sendo provocado de novo. Se fosse a segunda opção, esse anjo estava começando a passar dos limites.

O humano franziu as sobrancelhas e esfregou a testa se sentindo exausto. Tinha esperanças de quando acordasse aquilo tudo não teria passado de um sonho muito louco.

—Sim, mas depois que eu saísse! — Sua voz soou meio desesperada. —Futuramente, não tire a roupa na frente de outras pessoas, é considerado um crime, sabia? Anjos não tem nenhum pudor? Pelo amor de...

—Tudo bem, Alec. — Ao menos ele parecia um pouco envergonhado agora. —Não foi minha intenção, eu não achei que...

—Não quero conversar com você assim! — Alec cortou ele bruscamente e bateu a porta do banheiro ao sair. Pelo menos ele o chamava só de Alec agora. Não que melhorasse alguma coisa.

Ele ficou parado por um tempo do lado de fora da porta do banheiro e quando ouviu o chuveiro sendo ligado soltou uma risada nervosa. Então começou a gargalhar enquanto andava até a cozinha. Ele provavelmente parecia um doido. Por que tudo isso estava acontecendo com ele? Alec adorava sua rotina tranquila e silenciosa quando estava sozinho em casa, mas tinha um péssimo pressentimento que o anjo sem noção dentro de seu banheiro arruinaria ela por um bom tempo. Ele sabia que era imprudente abrigar um estranho, ainda mais um que nem era humano para começar, mas além do principal motivo que era precisar da proteção dele contra anjos malvados que queriam restaurar a ordem, a verdade era que Alec não conseguiria simplesmente jogar ele na rua de qualquer jeito. No entanto, não era só isso. Havia uma verdade escondida que ele não ousaria admitir nem para si mesmo no escuro, e era que ele estava intrigado a respeito do anjo e queria ver onde essa história ia dar.

Talvez Alec realmente fosse doido. Pois estava disposto a correr o risco de manter alguém perigoso de baixo do seu teto por simples curiosidade.

Uma vez na cozinha, ele vasculhou seus mantimentos procurando algo comestível. Farinha, condimentos, ovos, milho enlatado, leite, um queijo com aparência e cheiro questionáveis e algumas laranjas na fruteira E muitas embalagens de miojo. Era tudo que ele tinha. Ele não se alimentava só de miojo realmente, era só que ainda não tinha tido tempo de fazer as compras do mês. Aquele não era um alimento saudável para humanos, mas Lynx não era humano, será que faria mal para ele? Será que ele precisava comer? Enquanto se questionava sobre a dieta de um anjo, mais perguntas começaram a surgir na cabeça de Alec, uma mais absurda que a outra. Nenhuma com uma resposta imaginável. Fechou a porta do armário com um baque. Pegou o telefone em cima da mesa e decidindo que ia pedir comida.

—O que você gosta de comer? — Perguntou quando viu Lynx saindo do banheiro. Ele estava descalço e caminhava em direção a sala como se estivesse totalmente em casa.

—Eu não como. — Lynx coçou a cabeça, os cabelos molhados encharcavam os ombros da camiseta. Ele se sentou ao lado de Alec no sofá.

—Ah, eu imaginei... Bom, mas você deve estar cansado e com sono... — Alec olhou para ele. Lynx estava com uma expressão estranha no rosto, um misto de divertimento e pesar.

—Eu não durmo.— Agora ele sorria mostrando os caninos, como se tivesse achando graça da frustração estampada no rosto do outro.

—Ah, claro que não. — Alec murmurou se sentindo perdido. —Então você vai simplesmente ficar acordado a noite inteira olhando pra parede? Anjos fazem o quê no tempo livre?

—Alguns meditam, — Ele respondeu. — eu não tenho paciência, não consigo ficar parado e não pensar em nada. Na maior parte dos dias eu ficava vagando lá em cima quando não vinha pro mundo mortal. Era um saco, mas se eu passasse mais tempo aqui em baixo, teria que trabalhar mais Eu era considerado preguiçoso, mas, na verdade, eu só não era muito fã do meu trabalho.

Como Alec havia suspeitado, Lynx era do tipo que se entediava fácil e precisava estar sempre em movimento. Diferentemente dele, que não era um sedentário, mas poderia sentar no sofá durante horas sem fazer absolutamente nada. No entanto, parecia que o anjo preferia encarar o tédio do que cumprir com suas tarefas. Alec se surpreendeu um pouco com a confissão.

—Que triste pra você. — Alec riu com pena. —Não tinha nada pra fazer além de meditar? Nadinha mesmo?

—Tinha uma biblioteca gigantesca. — Revelou o anjo depois de pensar um pouco. —Mas pra quê eu ia querer ler livros sobre anjos se já sou um? Além disso, não tenho paciência pra livros também, tem palavras demais.

Alec pensou que ele daria tudo para ver tal biblioteca. E também tinha reparado que, ao contrário dele, Lynx era uma pessoa extremamente agitada. Sempre se mexendo, agitando a perna, mordendo os lábios, brincando com o próprio cabelo ou girando os anéis em suas mãos. As vezes ele lembrava uma criança curiosa e hiperativa, assim ficava difícil acreditar que ele era um ser celestial que estava brincando com a vida de Alec. Ele também estava se mostrando totalmente diferente de sua primeira impressão dele, de maníaco psicopata, embora Alec tivesse certeza de que ele poderia ser perigoso se quisesse. Persuasivo. Malicioso. Talvez até cruel. E era por isso que sentia não devia confiar muito.

—Mas e quando você vinha aqui pro mundo humano? — Alec perguntou, deixando a cautela de lado um pouco. —Não tinha nada que gostava de fazer aqui?

—Eu só podia vir pra cá pra cumprir meus deveres. — Sua voz se tornou sombria. —Os Observadores estavam sempre de olho em mim e nos outros anjos da morte, e qualquer desvio em nosso caminho era reportado. Eles pegavam ainda mais no meu pé porque sabiam que eu não concordava com as regras.

—Já sei, os Observadores são anjos que observam, né? — Alec brincou, mas, no fundo, achava que isso era muito injusto.

—Sim. — Lynx riu. —Um bando de fofoqueiros, se quer saber minha opinião.

—Então Você meio que não tinha escolha, a não ser matar pessoas. — Não era uma pergunta. Do jeito que Lynx falava Era como se ele fosse um soldado que não tinha escolha a não ser cumprir ordens dos superiores. Independente de qual fosse a verdadeira face desse anjo, pensar em alguém tendo que viver a mercê da vontade dos outros, sem poder fazer nada e ainda ser obrigado a cumprir tal tarefa, fazia ele se sentir muito mal pela pessoa.

—Algumas pessoas eu realmente matei, sem remorso nenhum. — Lynx admitiu, e sua expressão e tom de voz denunciavam que ele realmente não sentia culpa. —Pessoas que fizeram coisas que eu não tenho nem coragem de dizer em voz alta, mas algumas... Prefiro pensar que apenas dei paz a elas. Afinal, se alguém lá em cima disse que chegou a hora, quem sou eu pra discordar?

Alec conteve um sorriso.

—Você percebe o quão irônico isso é, né? Considerando a situação agora... — Ele apontou para si mesmo ali, vivo, são e salvo. Graças a Lynx se este estivesse falando a verdade.

—Eu adoro ironias.

Lynx deu de ombros sem olhar nos olhos dele. Alec, na verdade, queria encontrar uma brecha para desvendar os mistérios do anjo, mas parecia que não ia ser fácil.

—Queria poder fazer essas coisas de novo, sabe... — Lynx falou de repente. Ele parecia nostálgico e pensativo. —Comer, dormir, ser normal. Faz tanto tempo As vezes sinto como se sempre tivesse sido um anjo, mas, ao mesmo tempo, me lembro exatamente de como era ser mortal.

—Você já foi humano? — A pergunta foi meio que retórica. Alec apenas tinha ficado surpreso com isso, apesar de que agora que sabia, começou a pensar que fazia sentido. Ele começou a sentir um pouco de pena de Lynx. Do jeito que ele falava era como se o anjo fosse apenas uma ferramenta sem vontade própria.

—Sim, faz um tempo. — Lynx disse como se não fosse nada demais.

—Quanto tempo mais ou menos? — Alec percebeu que em algum momento todo seu choque diante da situação tinha se transformado em curiosidade. Queria saber mais sobre Lynx e sobre o mundo do qual ele fazia parte. Mas ele sentia que havia algumas coisas que não podia perguntar e mesmo se perguntasse não obteria respostas.

—Não sei dizer com precisão... — Lynx franziu o rosto tentando resgatar algumas memórias perdidas. —A última vez que contei tinham se passado setecentos anos.

Setecentos anos. Contudo, ele parecia ter a mesma idade de Alec, talvez um ou dois anos mais velho. Se ele havia se tornado um anjo após morrer, Alec lamentou que ele tivesse morrido tão jovem.

—Então todos os humanos que morrem viram anjos? — Alec achou a ideia meio incrível, até lembrar qual era a função de Lynx.

—Nem todos. Alguns também podem virar demônios. — Ele explicou. —Alguns anjos são criados no céu mesmo, mas eles são diferentes, não entendem muito sobre as emoções humanas. São como robôs. Alguns demônios são criados no inferno, mas surpreendentemente entendem mais sobre humanidade do que os anjos.

—Talvez porque eles precisem conhecer muito bem algo que pretendem corromper. Não é isso que demônios fazem? Saber tudo que motiva, enfraquece e abala uma pessoa pra depois usar contra ela. — É claro que Alec estava falando isso mais baseado em seu vasto conhecimento sobre ficção do que religião de fato. Esse era basicamente o conceito de demônio que a maioria dos filmes e livros retratavam. Seres malignos que queriam levar humanos a perdição. Mas ele também tinha uma imagem completamente diferente de anjos, então talvez devesse repensar seus conceitos.

—Isso faz sentido. Você é muito inteligente, Alec. — Lynx tinha um sorriso caloroso no rosto. E Alec não sabia se seu rosto estava quente pelo elogio exagerado ou por causa desse sorriso. —Mas nem todos os demônios são assim, conheço alguns melhores que muitos anjos.

—Então não dá pra confiar em nenhum dos dois, aparentemente. — Alec não estava surpreso com essa descoberta.

—Todo ser com uma consciência é capaz de fazer tanto o bem quanto o mal. Todos esses rótulos são inúteis, fazer coisas boas ou ruins não dependem de ser um anjo ou um demônio, depende de qual é o seu caráter. — Lynx tinha a cabeça abaixada enquanto falava. Alec percebeu que ele parecia autodepreciativo, como se achasse que seu próprio caráter era duvidoso.

—Talvez não dependa só do caráter. — Disse Alec fazendo Lynx levantar o olhar para ele. —Talvez também dependa das circunstâncias na qual você é colocado. Sua situação por exemplo, você não tinha escolha.

—Sempre tem uma escolha, Alec. — Lynx discordou. —Eu só demorei pra entender isso.

A conversa tinha tomado um rumo sério demais e Alec começou a se questionar porque estava tentando com tanto afinco justificar as ações de Lynx. Talvez ele só quisesse convencer a si mesmo de que Lynx não era mau, mas não sabia porque isso importava.

—Bom, você não sabia o que era uma TV e um chuveiro. — Alec provocou mudando de assunto. —Tem certeza que já foi humano?

—É diferente. — Lynx ergueu as sobrancelhas, mas agora havia divertimento em sua expressão também. —Como eu disse, eu não tinha permissão pra ficar perambulando pelo mundo mortal e nem me intrometendo na vida dos humanos. Essa é a regra mais severa do céu, não podemos nos relacionar com humanos e nem usufruir de coisas mundanas. Claro que isso não me impedia de tentar bisbilhotar e aprender algumas coisas, me atualizar um pouco de como o mundo é hoje em dia, mas era difícil. Por isso não conheço muito sobre as coisas que não são da época que eu nasci... Mas as emoções e sentimentos são diferentes, não é? As pessoas ainda sentem amor e ódio, inveja e vingança da mesma forma que sentiam a setecentos anos atrás.

—Isso foi bem profundo e filosófico, mas acho que você tem razão.

Mais uma vez, Alec sentiu pena dele. Imaginou como seria deixar de ser humano e saber que o mundo continua evoluindo sem você poder fazer parte dessa mudança.

—Sinceramente... — Lynx fez uma pausa. —Têm sido muito mais legal depois que fui banido. Tirando a parte que o céu me quer morto agora, tem muitas coisas diferentes que andei descobrindo e muitas coisas que ainda quero aprender e conhecer. É quase como ser humano de novo.

Alec estava surpreso com a franqueza dele em contar tudo isso. Ele não conseguia ter uma impressão concreta sobre Lynx. Em alguns momentos ele parecia uma criança birrenta, em outros um maníaco, e então se transformava em alguém todo descontraído e até mesmo um pouco bobo. E agora ele parecia de fato alguém com mais de setecentos anos de idade, no modo como falava, e nas sombras dançando em seus olhos. O que só ressaltava sua verdadeira natureza humana, ele tinha várias facetas e Alec havia visto um pedaço de cada uma dela em poucas horas. O que o levou de volta a questão do motivo pelo qual o anjo salvou sua vida e parecia tão confortável perto dele.

Contudo, o mais estranho — e preocupante — mesmo é que Alec involuntariamente começou a se sentir confortável perto de Lynx também, a ponto de ter que ficar se lembrando toda hora que ele mal o conhecia e que isso não era normal.

Claro, sem contar o pequeno detalhe de que ele podia estar mentindo sobre tudo que disse. No fim, Alec só conseguia pensar no quanto a situação era bizarra, tão estranha que chegava a ser cômica. Algumas horas atrás estava quase pulando do último andar com medo de um anjo da morte, e agora estava com esse mesmo anjo simplesmente tendo uma conversa casual como duas senhoras tomando chá.

—Antes você disse que não era a coisa mais medonha andando pelas ruas. — Alec lembrou. —O que você quis dizer? É tipo... Monstros?

—Se quiser pode chamar assim, acho. — Lynx respondeu. —São demônios, alguns menos inofensivos do que outros.

—Eles não deveriam ficar presos no inferno ou algo assim?

—Deveriam, mas são demônios, Alec. — Lynx riu. —Não são exatamente conhecidos por seguirem as regras. Apesar de que eu não sou ninguém pra falar de regras agora, já que estou agindo como um deles. — O rosto dele se contorceu em uma expressão desgostosa e Alec achou isso curioso. Ele não parecia nada preocupado por ter quebrado as leis celestiais, pelo contrário, parecia orgulhoso e tinha praticamente acabado de admitir que estava feliz em ser banido. Então por que parecia infeliz por estar agindo como um deles?

—Por que agir como um deles parece tão ruim pra você? Você acabou de dizer que nem todos os demônios são do mau. — Alec resolveu perguntar de uma vez já que estavam tendo uma conversa mais franca.

Lynx pensou um pouco na resposta.

—É meio complicado de explicar. — Respondeu por fim. —Não gosto muito de ser um anjo da morte, mas tem alguns demônios... Que me fazem agradecer por não ser da mesma raça que eles. Não faz muito sentido, né?

—Acho que entendo. — Alec raciocinou e disse ironicamente: —Você quer dizer algo tipo Sou ruim, mas ainda me acho melhor do que você?

—Exatamente. — Lynx riu um pouco sem graça. —Acho que isso soa um pouco egocêntrico, mas é por esse caminho mesmo.

—Todo mundo é um pouco egocêntrico as vezes. Faz parte. — Disse Alec. —Mas e esses demônios, eles ficam andando entre a gente? Podemos ver eles?

—Sim e sim, mas eles podem ficar invisíveis também se quiserem, assim como nós anjos. — Ele respondeu. —Existem anjos que são responsáveis por caçar eles, mas alguns demônios são mais inteligentes e poderosos, e se misturam facilmente com os humanos.

—Fascinante. — Disse Alec. —Espero que o carteiro não seja um deles.

Lynx soltou uma gargalhada.

—Só por precaução, não confie nele. — O anjo brincou.

—Não confio em ninguém. — Alec não tinha a intenção de que isso soasse como uma indireta, mas foi o que pareceu. Lynx olhou seriamente para ele, sem revelar nada em sua expressão. —Mas então, além da falta de tecnologia, como é o céu? Estou tendo a oportunidade de entrevistar um anjo, quero detalhes.

—Acho que vou te decepcionar porque não tem nenhum detalhe emocionante que eu possa compartilhar. — Respondeu Lynx se desfazendo da expressão séria. —Pelo menos de onde eu vim. A Cidade Fluorescente. É projetada pra ser um lugar bonito, e é bonito, mas também é vazio, em todos os sentidos. É um lugar sem vida, artificial. E isso faz com que pareça mais sombria do que bela de fato. Anjos da morte são ocupados demais com, você sabe, mortes, então raramente tem alguém lá. E também não tem nada pra fazer além de ficar perambulando.

—Ou meditando e lendo livros sobre anjos. — Alec Lembrou. Lynx deu um sorriso breve e recostou a cabeça no encosto do sofá olhando para o teto.

—É, bem diferente do meu verdadeiro lar que nem existe mais — Sua voz saiu carregada de uma tristeza antiga que deixou Alec curioso.

—Você lembra da sua vida como humano? — Perguntou cautelosamente, com medo de aquele ser um assunto delicado para o anjo.

—Algumas coisas lembro como se fosse ontem. — A resposta foi meio fria.

—Como você era? — Alec pressionou.

Lynx soltou uma risada, mas dessa vez não havia alegria ou brincadeira no tom, era o tipo de risada que fazia o outro se perguntar que tipo de desgraça ele havia passado em sua vida humana para conseguir transformar um som que deveria ser feliz em algo tão amargo.

—Você não acreditaria se eu contasse. — Lynx parecia querer encerrar o assunto ali e Alec sentiu que não devia perguntar mais por enquanto, embora essa resposta tivesse deixado ele extremamente curioso.

Na manhã seguinte, Alec não se lembrava exatamente de como adormeceu, mas acordou se sentindo completamente desorientado. Ele e o anjo se envolveram em uma conversa sem fim, quando Alec se deu conta estava amanhecendo e então ele apagou no sofá. A última vez que dormiu no sofá e acordou na cama ele devia ter no mínimo uns seis anos, e a ideia de que Lynx tinha carregado ele até ali fez com que experimentasse uma onda de vergonha logo cedo.

Alec não se lembrava exatamente sobre o que eles tanto conversaram. Um pouco de tudo, e muito de nada. Lynx contou mais curiosidades sobre anjos e demônios. Como por exemplo, uma raça que era resultado dos dois e tinha que viver escondida para que não fossem caçados e mortos. Também existia outros tipos de híbridos que tinham que viver nas sombras, resultados de relacionamentos entre anjos e humanos, assim como demônios e humanos. Alec falou sobre coisas mundanas, e se Lynx já tinha ficado impressionado com a TV, ele entrou em êxtase quando Alec ligou o Xbox. Pensando em tudo isso agora, ele se sentia estranho. Se fosse fazer uma analogia, era o sentimento de ter adotado um gato selvagem que podia ser fofo, demonstrar carinho, mas sempre com a possibilidade de te arranhar.

Depois de se trocar colocando jeans e moletom, lavar o rosto no banheiro e ir para a sala barra cozinha, que eram basicamente um cômodo só, foi que notou o cheiro no ar, como se alguém tivesse assado alguma coisa. Lynx estava ali, mexendo nos armários e na geladeira, e Alec ficou observando ele por um momento. Então não tinha sido tudo um pesadelo, nem alucinação. Aquilo tudo havia sido real. E Alec não sabia exatamente como se sentia a respeito desse fato, provavelmente mais calmo e conformado do que uma pessoa normal deveria.

—Bom dia, Alec. — Falou Lynx quando notou a presença dele ali.

—Bom dia. O que você tá fazendo? — Alec puxou uma cadeira e sentou lentamente à mesa.

—Eu estava entediado, e também me lembrei que você não comeu nada ontem a noite, então resolvi fazer seu café da manhã... — Ele estava receoso, como uma criança que não sabia se ia ser elogiada ou repreendida. Alec olhou para a frente. Havia uma caixa de leite quase vazia em cima da mesa, uma jarra de suco de laranja e um bolo que parecia ter acabado de sair do forno. Ele reprimiu um sentimento extremamente emotivo.

—Onde você arrumou esse bolo? — Ele não sabia o que esperar quando fez a pergunta.

—Eu fiz. — Lynx respondeu, suas mãos torciam ansiosamente o pano de prato que ele segurava.

—Você... Você fez? Mas você sequer sabia ligar um chuveiro Você usou o forno? Como?! — Alec tentou manter a voz calma. Ele podia ter explodido o apartamento!

—Eu vi na TV... — Ele apontou para tela. Alec se virou para olhar para a TV e viu um familiar programa matinal de culinária.

Alec começou a rir. Tanto que quase ficou sem fôlego.

—Você tá me dizendo que aprendeu a fazer bolo vendo um programa de culinária sem nunca ter mexido em um fogão antes? — Disse entre risadas.

—Não é tão difícil. — Lynx parecia satisfeito com a reação do outro, seus lábios estavam curvados nos cantos. —Eu aprendo rápido, e... Eu mexi nas suas coisas e achei o manual do fogão.

Alec notou a bagunça que ele havia deixado para trás. Gavetas abertas e reviradas, uma pilha de louça suja e alguma coisa queimada dentro de um pote de água. Era uma visão e tanto, mas ele não conseguiu ficar bravo.

—Você é inacreditável. — Alec balançou a cabeça se levantando da mesa para fazer a única coisa crucial que ele não tinha feito: café. Quando voltou para mesa e começou a comer, Lynx se sentou de frente para ele e ficou o observando.

—Vai para o trabalho hoje? — Perguntou o anjo.

—Estou de folga. — Alec respondeu antes de dar uma mordida em um pedaço de bolo.

Ele tentou não ficar com inveja do fato de que ele era um desastre na cozinha enquanto esse cara, que mal sabia ligar um chuveiro, aparentemente, tinha um talento natural. O bolo era de laranja e estava delicioso. Alec bebeu um gole de café pensando que Lynx provavelmente era bom em tudo que fazia. Ele também era gracioso até no modo como se mexia, e havia algo em seus olhos de gato que fazia com que você quisesse confiar nele mesmo se ele estivesse te guiando até a beira de um precipício. Isso era muito, muito ruim. Talvez fosse isso então, talvez ele estivesse enfeitiçando Alec.

De repente, ele se sentiu irritado com toda essa perfeição a sua frente, e mais irritado ainda porque estava cada vez menos convencido de que Lynx tinha qualquer intenção ruim em relação a ele. No dia anterior estava todo desconfiado e alerta, bastou uma conversa de algumas horas e um bolo para ele sentir até empatia pelo seu suposto assassino. Tem algo muito errado comigo. Pensou enquanto bebia outro gole de café.

—Aquela mulher que trabalha com você é alguma de suas parceiras sexuais? — Lynx perguntou do nada, cortando seu fluxo de pensamentos tão bruscamente com uma pergunta tão ridícula que Alec quase cuspiu o café na cara dele.

—Que pergunta é essa? — Ele perguntou incrédulo a princípio, mas então sentiu vontade de rir. —Ela não é nada desse tipo, só minha amiga. E como assim parceiras sexuais no plural? De onde você tirou isso?

—Ah, ouvi dizer que nos dias de hoje é normal se relacionar com várias pessoas ao mesmo tempo. — Lynx falava tão calmamente dando de ombros, como se estivesse perguntando a Alec qual era sua cor preferida e não sobre sua vida sexual.

Alec pousou a caneca na mesa respirando fundo.

—Pelo amor de... Ok. Você estava ouvindo a nossa conversa aquele dia no café, não estava? Então devia saber que eu e ela não temos nada desse tipo, além disso, eu não gosto de mulheres. Sou gay. Você sabe o que isso significa pelo menos, né?

Inesperadamente, o rosto de Lynx ficou vermelho e Alec franziu os lábios para não rir, mas também estava surpreso com a reação dele. Ao menos ele sabia que tinha feito uma pergunta sem noção.

—Eu não ouvi tudo. — Lynx desviou o olhar, seus dedos batucavam um ritmo inquieto em cima da mesa. Seu rosto se tornou ainda mais vermelho. —E eu sei o que significa... Então... Você tem namorado?

Alec não aguentou e soltou uma risada alta. Qualquer outra pessoa fazendo essas perguntas o deixaria irritado ou no mínimo sem vontade de responder, mas havia algo nas expressões e reações de Lynx que fez aquela situação ser extremamente engraçada para ele. Era estranho, no entanto. Lynx já tinha provocado ele, chamado Alec de fofo e literalmente tirado a roupa na sua frente, e agora estava todo envergonhado por causa de algumas perguntas que ele mesmo havia feito. Ele era um enigma.

—Por que você tá interessado nisso?

O anjo cruzou os braços e olhava para todo canto menos para seu rosto. Alec não era ingênuo, mas não era possível que o ser celestial estivesse interessado nele. Considerando a falta de noção de Lynx, provavelmente estava perguntando por motivos completamente diferentes.

—Vamos passar um tempo juntos, eu só queria te conhecer melhor. — Lynx estava na defensiva.

—Nesse caso deveria me perguntar quais são meus hobbies ou meu filme favorito e não se estou transando com alguém.

—Eu ia chegar nessa parte... — Lynx parecia se sentir injustiçado.

—Seeei. — Alec continuou rindo.

—Então, se não vai trabalhar hoje, vai fazer o quê? — Perguntou o anjo mudando de assunto com o rosto ainda levemente corado.

—Eu planejava descansar e fazer vários nada, mas com você aqui meus planos foram arruinados. — Alec não queria ser rude, mas era a pura verdade. Como ele ia descansar com um ser celestial parado ali olhando para sua cara? Como ele conseguiria relaxar com todo esse lance sobrenatural pairando sobre sua cabeça?

—Posso ficar fora do seu caminho se você quiser. — Lynx parecia ressentido. Então ele sumiu. Literalmente. Ele ficou transparente a princípio e então o lugar em que ele estava sentado ficou vazio.

Alec revirou os olhos.

—Eu não te vejo, mas sei que você ainda está ai então não faz muita diferença.

Ele ouviu a risada melodiosa de Lynx no vazio, então o sorriso dele foi a primeira coisa que reapareceu quando ele se tornou visível novamente. Alec se lembrou do gato de Alice no País das Maravilhas.

—Tem razão. — Lynx desviou o olhar apoiando o queixo na mão com os lábios curvados para baixo, seu rosto naquela expressão manhosa que Alec já vira antes. —Se quiser posso sair da sua casa, fico em cima do telhado do outro prédio caso precise de mim, vou conseguir ver se estiver em perigo.

Alec franziu a testa levemente. No dia anterior ele só faltou agarrar na perna do humano implorando para ficar, e embora estivesse fazendo chantagem emocional agora, parecia mesmo disposto a sair se ficar ali fosse incomodo para o outro. Sério, esse anjo tem algum distúrbio de múltiplas personalidades? Pensou Alec.

—Quer saber? Mudei de ideia. — Alec disse de repente tomando uma decisão. —Nós dois vamos sair. Parou de chover, quero aproveitar o dia pra variar, tenho ficado muito em casa nos últimos tempos.

Lynx se endireitou como um cachorro que tinha ouvido a palavra passear.

—Aonde vamos? — Perguntou com os olhos curiosos.

—Bom, você disse que tem coisas no mundo humano que queria conhecer e também disse que queria me conhecer melhor, então vamos a um lugar que vai fazer um pouco dos dois ao mesmo tempo.

Um sorriso genuíno se abriu no rosto de Alec. Ele não queria pensar em coisas ruins naquele momento. Não queria pensar em perigos e desconfianças por enquanto. Queria apenas desfrutar de seu dia de folga com sua nova companhia... A realidade era que, apesar de não estar infeliz com sua vida, Alec não queria admitir, mas foi só Lynx aparecer que ele percebeu o quão solitário se sentia.

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