Capítulo 01: Noite Estranha, Geral Sentiu?
Aquela era para ser mais uma semana comum, pois as férias se aproximavam. O Natal estava quase beirando a porta. A jovem estudante terminava sua residência na clínica, onde recebia sua mentoria. Cássia, estava no auge de sua juventude, não era a mais popular da universidade, mas era igualmente bela.
Seu corpo esbelto, os cabelos encaracolados, os olhos amendoados e os lábios carnudos, despertavam em muitos rapazes as mais diversas fantasias. Cássia sempre gostava de estar por dentro da moda, se a carreira de Psicologia não fosse sua primeira opção, com toda certeza teria tentado uma em moda.
A jovem retornava para seu apartamento na zona oeste de São Paulo. Havia algumas poucas pessoas dentro do ônibus em que ela estava, algumas eram conhecidas apenas de vista, já que sua rotina sempre permitia que pegassem o mesmo coletivo. Cássia lia um livro de Zygmunt Baumann, para uma de suas provas finais, portanto, sua atenção era pouco voltada para os acontecimentos de dentro do ônibus.
Não percebera, no entanto, que uma pessoa diferente tinha entrado no ônibus, e enquanto passava ao seu lado, o estranho a tinha encarado por um breve momento. Depois, ele seguiu seu trajeto até a parte traseira do ônibus, onde se sentou alguns bancos atrás de Cássia. Minutos após a entrada daquele sujeito, a jovem levantou-se e apertou o sinal, descendo em uma rua paralela a um beco, que levaria até a rua de seu apartamento.
Ao adentrar o beco, teve a impressão de alguém a observava de longe. A sensação lhe fez que os cabelos de sua nuca se levantassem, e um estranho frio naquela região também parecia estar presente, mesmo que aquela fosse uma noite comum de fim de primavera. Cássia olhou para trás, porém nada viu. Ela estava sozinha ali e aquele fato a fez caminhar mais depressa.
Fazer aquele trajeto nunca fora um problema, pois estava acostumada. Vivia naquele bairro há pelo menos um ano, e as pessoas já a conheciam, de certa forma. Entretanto, a sensação de perigo iminente a deixava atenta ao menor sinal de uma outra pessoa que por ventura a estivesse seguindo.
O coração estava batendo depressa, sua respiração também parecia mais pesada e ela se sentia ofegante. Cássia decidiu espiar uma vez mais antes de dobrar a esquina para sua rua. Deparou-se com apenas a figura de um enorme cão negro que a observava.
Mesmo que fosse apenas um cachorro, não diminuíra o fato de que estava assustada, pois sabia que se não corresse ou fizesse algo que assustasse o animal, ele não a atacaria, afinal vivera na casa de seus pais cercada por cachorros.
As luzes de sua rua finalmente lhe brindaram com um pouco mais de segurança, ainda restava, no entanto, a questão do enorme cachorro que parecia lhe seguir a uma distância segura. A jovem passava pelo bar local, que tinha algumas pessoas que comemoravam o fato de já ser sexta-feira, o que era praticamente fim de semana.
Cássia cordialmente os desejou boa noite, e seguiu em direção do portão de seu prédio. Olhara para trás, o enorme cão não parecia segui-la mais, o que a fez pensar em o quão estranha era aquela situação, pois não lembrava de ter visto um cachorro daquele tamanho perto da entrada do beco. De certa forma, aquilo não lhe assombraria por mais tempo, já que sabia que ficar pensando em coisas do tipo, apenas a deixaria ainda mais ressabiada.
— Ei, vocês sabem se o cachorro de alguém escapou? — Cássia perguntou para um dos homens que bebiam na mesa de bar do lado de fora do pequeno estabelecimento de procedência bem precária.
— Cachorro? Não vimos cachorro nenhum. — disse o homem de baixa estatura e barriga saliente, com o peito cabeludo amostra.
— Mas ele tava me seguindo agora... mesmo — A garota disse desconcertada ao olhar uma vez mais em direção de onde viera, e perceber que não tinha cachorro algum.
Cássia seguiu derrotada até seu prédio, felizmente já podia sentir o gosto do merecido descanso. E sem dúvidas iria tomar um banho bem quentinho e demorado, para poder enfim relaxar.
— Boa noite, Severino! — cumprimentou o porteiro que estava na guarita. O homem estava na casa dos cinquenta. Cássia o considerava muito gente boa, já que sempre fazia questão de perguntar-lhe como tivera sido o seu dia. — Meu dia foi bem corrido, mas estou grata que já está acabando — disse com um tom mais descontraído, enquanto caçava as chaves da porta de seu apartamento dentro de sua mochila.
Cássia passou pela portaria e seguiu em direção ao estacionamento que dava acesso aos blocos de seu prédio. A jovem morava no quarto bloco, no quinto andar. Passou por algumas pessoas que voltavam de seus serviços ou universidades, assim como ela. O vizinho do andar de cima, estava fumando enquanto levava o cãozinho para passear.
— Boa noite, Cássia! — cumprimentou o homem acenando com o cigarro entre os dedos, e seu cachorro parecia esconder-se assustado entre as pernas do homem.
— Boa noite! — respondeu tímida.
Cássia foi de encontro a porta de seu bloco e logo adentrou o saguão, caminhou de maneira automática até o elevador, onde apertou o botão para chamá-lo, mas notou que estava demorando. Nenhuma pessoa passou por ela ou até mesmo retornou para o bloco, o que lhe chamou atenção, pois aquela noite estava começando a ficar deveras estranha. Finalmente foi vencida pelo cansaço e impaciência, decidiu por subir até seu andar pelas escadas.
Para quem tinha enfrentado um dia cansativo, aquilo era só mais um obstáculo entre seu merecido descanso e seu tão esperado banho quente. Empurrou a porta de ferro maciça com um pouco de dificuldade, porém conseguiu seguir o seu trajeto. E uma vez mais, aquela sensação de estar alerta, de que algo espreitava na escuridão, estava lhe invadindo.
Não sabia o que estava acontecendo, e queria acreditar muito que era apenas o estresse de fim de semestre que estava deixando-a alarmada daquele jeito. Continuou a subir os degraus, contudo, sentiu que algo não parecia estar certo. O tempo que normalmente levara, parecia ter dobrado e Cássia parecia nunca chegar em seu destino. Olhou o visor de seu celular e via que ele marcava vinte e duas horas e trinta e dois minutos, depois o guardou novamente no bolso de sua mochila.
Notou que passara pelo terceiro andar pelo menos umas duas vezes.
Isso não está certo!
Olhou em seu telefone uma outra vez, e o visor marcava vinte e duas horas e trinta e dois minutos.
— Cássia... — Ouviu uma voz desconhecida sussurrar e seu nome ecoou por toda escadaria, deixando-a ainda mais nervosa.
Seu coração agora batia freneticamente, suas têmporas suavam, mesmo que a temperatura não tivesse caído nada desde que tinha chegado em seu prédio. Sua pele estava toda arrepiada, sentiu uma leve pontada atrás da nuca como se algo ou alguém estivesse próximo de si.
Virou-se de repente e nada encontrou, esfregou seus olhos, deu alguns tapinhas no rosto, e logo percebeu que estava diante da porta do quinto andar. Abatida a jovem saiu das escadarias e caminhou até a porta de seu apartamento. Tinha segurado o molho de chaves com tanta força até o metal marcar sua pele, que acabou deixando cair no chão ao tentar abrir sua porta.
O que está acontecendo comigo hoje?
De qualquer maneira ligaria para portaria para averiguar a situação do elevador irregular. Cássia pegou as chaves do chão e finalmente abriu a porta de sua casa. O aconchego do lar lhe fez sentir-se uma vez mais em segurança, fechou a porta atrás de si e suspirou.
— Credo! Que noite mais esquisita! — disse a si mesma enquanto trancava a porta.
Seguiu até sua sala de estar, jogou a mochila sobre a cadeira ao lado de sua mesa de vidro, depois seguiu até seu quarto, onde escolheria uma roupa mais leve para usar. Levou alguns minutos procurando as peças que tinha em mente, depois seguiu para o banheiro, onde fechou a porta atrás de si e despiu-se.
Cássia levou alguns minutos debaixo do chuveiro, a água morna que caia sobre seu corpo lhe dava uma sensação única que esperou sentir desde que saíra da clínica. A jovem saíra do banheiro, já estava vestindo seu pijama confortável estampado com flores pequenas, seus cabelos estavam enrolados em sua toalha. Agora restava uma única coisa e por fim poderia dormir.
Caminhou até sua cozinha, pegou o interfone e discou o número da portaria, aguardou alguns segundos até ouvir a voz rouca de Severino do outro lado da linha.
— Portaria. Em que posso ajudar? — Severino respondeu enquanto Cássia ainda pensava sobre todo o ocorrido desde o beco até as escadarias de seu bloco. — Alô? — perguntou Severino confuso, pois não ouvira nenhuma resposta do interfone. — Se não disser nada, irei desligar!
— Severino! Não! É a Cássia!
— Cássia, está tudo bem?
— Está sim, só estava pensando em umas coisas, mas deixa pra lá... Queria pedir pra você verificar o elevador do bloco D. Acho que ele parou de funcionar.
— Cássia, os elevadores estão funcionando normalmente. Nenhum morador abriu reclamação, mas posso pedir para verificarem amanhã, pode ser? – Severino respondeu com toda calma e simpatia que eram característicos do homem.
— Tudo bem então, Severino. Quando terminarem a vistoria, por favor, me avise. Tenha uma boa noite! — disse Cássia prestes a encerrar a ligação, quando Severino lhe chamou atenção.
— Aliás, suas correspondências chegaram. Se quiser retirá-las é só passar aqui na portaria.
— Posso ver isso amanhã? Tive uma noite muito fora do comum e tô bastante cansada – Cássia respondeu e mesmo que não pudesse ver o homem, tinha certeza de que ele havia anuído. Despediram-se e a jovem desligou o interfone.
O que tá acontecendo hoje?
Cássia indagou-se ao seguir até seu quarto, antes de dormir colocou o telefone sobre a penteadeira para carregar, deixou seu abajur ligado e deitou-se. Esperou chegar o sono que tanto aguardou desde que saíra da clínica.
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