A FESTA DE BOA PESCARIA (PARTE 1)
#pratodosverem | Descrição da imagem: sobre uma toalha vermelha, vê-se um farto prato de comida. bastante colorido, há carnes, ervas, batatas, cenouras, molho e outras especiarias. O aspecto é suculento e chamativo.
***
SÂMIA, LITA E ERWANK ESTAVAM EXAUSTOS. Após deixarem a estufa Ó Midhir, realizaram uma peregrinação por quase todas es estufas de Arcéh. Da costa leste à costa oeste da ilha, enfrentaram estradas cobertas pela neve, temperaturas que quase os fizeram desistir, caminhos por entre florestas onde passavam horas sem ver viva alma. Nas bagagens, fome, sede e uma vontade de desistir a cada novo "não" recebido por Lita Delgo. Em algumas terras, foram recebidos com amenidade, mas, na maioria dos lugares, o intuito de contrapor o Unagor Drenton e tirar-lhe algum poder causava receio e portas fechadas.
Ao final, a situação não era tão ruim quanto imaginavam: dos dezesseis Unagor, Madame Lita ganhara o apoio de oito para participar do Bastião sobre as propostas de Paberos. E, como ela tomara posse de seu assento como representante da quinta estufa, Drenton perdera seus dois votos e a conta estava favorável para a mulher: nove votos a favor contra oito contrários.
— Não achar que Madame Delgo pode votar a favor de si mesma.
— É. De fato, eu não posso. - Lita guardou os papeis na bolsa e olhou para Erwank. Estavam em uma estalagem já perto de casa. Haviam acabado de visitar a Primeira Estufa nas proximidades da Torre Norte e recebido o último voto favorável. — Mesmo assim, a situação está em igualdade. Oito a oito. Não é tão mal. Diante da dúvida, eu ainda sou aceita no Bastião. E estarei sentada naquela mesa com muito orgulho.
— Vó, e se esse último Unagor fosse contra?
— Eu iria do mesmo jeito! Ainda mais depois de tanto esforço que nós fizemos. Não passei quase um mês na estrada para fazer graça. - tomou um gole de vinho digno dos beberrões e bateu a caneca na mesa. — Se você entra na guerra, Sâmia, vá até o fim. É o que eu digo!
— Erwank fica impressionado como você mudar tanto em tão pouco tempo. Nem parecer a mesma Madame Delgo que receber Erwank na calada da noite...
Lita pigarreou e, sem fingimentos, calou a boca de Erwank com um pedaço de carne.
— Você já bebeu demais, Erwank... Vai acabar sem condições de conduzir a carruagem. Controle-se! - arrumou o cabelo e, ao perceber a língua da neta pronta para uma saraivada de perguntas, correu para o balcão com a desculpa de reclamar da comida.
O sr. Maxil engoliu o pedaço de carne e tomou fôlego. Sâmia aproveitou a deixa e a ausência da avó para sanar algumas dúvidas de uma vez por todas.
— A escada na janela do quarto da vovó era para o senhor? - mais direta, impossível.
— Claro que não, menina! Erwank ser um homem viúvo, com filhos. Ter um nome nesta cidade. Não ficar andar por aí de madrugada para entrar no quarto de senhoras viúvas. Ainda mais com escada como aquela, que nem poder aguentar o meu peso! O primeiro lance estar muito bom, mas madeira dos outros lances estar bem apodrecida...
Sâmia sorriu por dentro. Procurou por Madame Lita. A avó estava a um canto da taverna junto com um rapaz.
— Ah, menos mal, então.
— Por que?
— Porque aí a vovó pode ficar livre para flertar.
— Não vir com suas palavras juvenis, senhorita Sotein. O que ser "flertar"?
— Aquilo...
Sâmia apontou para o canto e Erwank se virou no momento em que o homem oferecia uma rosa à Madame Lita. A mulher enrubesceu e cobriu o sorriso com o leque. Se o sr. Maxil não sabia o significado da palavra "flertar", agora estava diante de uma aula de troca de olhares e galanteios. Quando o outro tomou a mão da sra. Delgo e beijou-lhe os dedos, Erwank arregalou os olhos, mas logo se conteve ou assim tentou fingir.
— Madame Delgo sempre ser uma mulher elegante, uma atriz de sucesso em toda a região. E agora, com todo despertar, não ser de admirar que tenha tantos admiradores. As pessoas ainda lembrar dos tempos grandes dela.
— Bom, aquele ali não parece ter idade para ter assistido a vovó em alguma peça...
— Ele deve ter visto pinturas...
— Ele está falando algo no ouvido dela.
— ... ou os pais dele devem falar com ele sobre a grande Madame Delgo...
— E agora começou a dançar com a vovó...
— ... ou então... Ela estar o quê?!
Erwank Maxil deu um pulo da cadeira e precisou se apoiar na mesa para não cair. Acompanhou os passos de Lita e do jovem pela área de dança com uma sobrancelha erguida. Os pelos do bigode agitavam-se pelo bufar de raiva do Capitão dos Mensageiros. As pessoas ao redor, já desconfiadas da situação, viravam-se do casal dançarino para o homem bufante na expectativa de ver alguma ação naquela tarde fria. O dono da taverna segurava um bastão já preparado para expulsar qualquer briguento do seu estabelecimento.
— Sr. Maxil...
— O que ser agora? - perguntou sem tirar os olhos de Madame Lita. Parecia uma águia de olho em um casal de coelhos. Sâmia deu uma conferida nas unhas como quem não quer nada...
— Eu acho que a escada, enfim, servirá para alguém.... O rapaz é bem magro, forte. Não terá problemas para subir...
Erwank girou nos calcanhares, encarou a Sotein, pegou a caneca de vinho e virou o líquido de uma vez. Quase morreu engasgado, fingiu altivez, afastou a cadeira e marchou para o salão. Sâmia vibrou. O Capitão tocou no ombro do rapaz e lhe disse algo. O jovem sorriu, respondeu-lhe com uma cara de desdém e puxou Lita para continuarem a dançar.
A taverna estava em êxtase.
Os músicos tocaram mais rápido, tão empolgados quanto a plateia. O taverneiro preparava-se para dar umas boas pauladas nos arruaceiros. Erwank aprumou a camisa, estufou o peito, meteu-se no meio do casal, segurou Madame Lita pela cintura e lhe tascou um beijo digno das grandes peças de teatro.
A plateia foi à loucura.
Os sinos da torre sul festejaram com os seis badalares das duas horas da tarde. Até o taverneiro rendeu-se à cena e jogou o bastão para o alto com aplausos efusivos ao casal. O estômago da garota roncou e ela pôs-se a comer. Seu peito inflamava-se em júbilo. Há dias, desde o sonho motivado pela árvore, ela não sentia fome. Chamou o ajudante e pediu mais um prato de legumes e nacos de carne. O Unagor Ó Midhir tinha razão: "amores de verdade conseguem curar dores antigas sem precisar esconder as cicatrizes."
Uriel Delgo ainda estava no coração da sra. Delgo, mas Erwank Maxil conquistara seu espaço.
Sâmia ganhara um novo avô.
Seu problema agora era decidir-se entre "Vovô Maxil" ou "Vovô Erwank".
Ela gostava dos dois.
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