1. Quinze segundos
Quanto tempo é necessário para o curso de uma vida mudar completamente? Quantas palavras são precisas para que a verdade seja compreendida sem contestações? Se ações dizem mais que palavras, quais atos poderiam comprovar a existência de um sentimento real e não apenas desejos carnais? Jimin estava parado, há exatos quinze segundos na calçada, no mesmo lugar onde viu Junghoon desaparecer de vista como um pássaro que está apenas de passagem. Se perguntava inúmeras coisas, se amaldiçoava por não ter ouvido Taehyung há dois meses, e sentia tanta vergonha de si mesmo, que quis enfiar a cabeça num arbusto.
Sempre soube que Jeon Junghoon era problema, e talvez fosse aquele seu jeito despreocupado, como se fosse um forasteiro da vida, que chamou sua atenção. Gostava do tom ilícito que sua voz carregava, e amava sentir-se nas nuvens por aquele corpo. Fantasiava um futuro distópico onde Junghoon deixaria ele se aproximar mais que o corpo, onde pudesse saber seu sabor de sorvete favorito ou como ele era ao acordar. Contudo, isso nunca aconteceu, e quando estava prestes a confrontá-lo sobre isso — afinal, dois meses eram muito tempo para um lance casual —, Jimin viu algo que jamais imaginou presenciar.
Junghoon tinha as mãos sujas de sangue, o olhar vazio e um sorriso sádico no rosto ao socar um cara num beco com toda a ira que o mundo poderia conter. Sua boca bonita xingava, seu cabelo longo cobria-lhe a face de modo sombrio, e seu braço nunca parava de espancar o homem. Jimin não conseguiu se mover, não disse nem uma palavra e apenas observou-o afastar-se dali, abandonando o homem inconsciente no beco. Pessoas surgiram, uma ambulância levou-o, mas Jimin continuava preso no mesmo lugar, amaldiçoando-se por ter se apegado a alguém como Jeon Junghoon.
Que tipo de pessoa ele era, afinal? Que ser humano machuca outro e o abandona como se não fosse nada? Até os cães merecem ser tratados melhor, quem dirá uma pessoa.
O chef finalmente conseguiu erguer o pé para afastar-se daquela calçada, desviando os olhos do beco que ainda continha resquícios de sangue e a presença fantasmagórica de Junghoon. Ele deu apenas três passos, mas sentiu-se enjoado e rapidamente correu até uma lixeira próxima, esvaziando seu estômago ali. Sentia-se estúpido, as pessoas que passavam lançavam olhares preocupados, mas nenhuma se aproximava para ver como estava. Quis chorar, quis gritar, ou apenas vomitar mais, contudo, não teve forças para nada. Mal se mantinha de pé, deveria ter comido melhor no café da manhã, deveria ter pegado outro caminho até o restaurante, deveria nunca ter cogitado a ideia de conhecer Junghoon melhor.
Jimin limpou a boca com a manga do casaco e olhou em volta, desejando mais que tudo estar em casa, no conforto do seu edredom e no colo do melhor amigo. Continuou andando, até parar em frente a uma faixa de pedestres à espera do sinal abrir. Lembrou de todas as vezes que fantasiou um romance com Junghoon, sua visão embaçou e seu estômago embrulhou novamente. O semáforo dos pedestres ficou verde, as pessoas seguiram seus caminhos e Jimin suspirou. A vida continua, o mundo não parou para que ele sofresse por um coração partido, seu restaurante ainda precisava de gerência, suas contas ainda viriam. Por esse motivo, acompanhou as pessoas pela faixa, mas parou no meio dela ao sentir uma vertigem lhe atingir em cheio. Seul começou a girar como se ele estivesse em um carrossel e suas pernas perderam o equilíbrio, ao mesmo tempo que a fraqueza lhe consumiu.
Droga, sabia que deveria ter se alimentado melhor.
Jimin caiu no meio da rua, incapaz de continuar aguentando o peso do próprio corpo e sentindo-se inexplicavelmente cansado. A última coisa que viu antes de suas pálpebras se fecharem por completo, em meio a multidão de pernas e pés apressados, foi um par de sapatos sociais correndo na sua direção.
Jimin odiava hospitais, somente o cheiro de álcool etílico era o suficiente para embrulhar seu estômago. Portanto, ao abrir os olhos, e se dar conta de que estava em um, quis chorar. Como se já não bastasse a vergonha de desmaiar no meio da rua, entre tantas pessoas. Cobriu o rosto com as mãos, se dando conta de que recebia soro em uma delas, desejou ser invisível. Contudo, uma voz estranhamente familiar lhe obrigou a voltar à realidade, forçando-o a retirar a mão da face.
— Como se sente? — ele perguntou, num tom de voz doce e Jimin não conteve o arquejo ao encará-lo.
— Junghoon? — inquiriu, recebendo uma careta desgostosa do homem.
Ele era idêntico ao Junghoon, o mesmo tom de pele clara, mesmos olhos negros, e a boca em formato de arco de cupido. Mas... definitivamente não era Jeon Junghoon. O cabelo estava mais curto, não havia tatuagens, ou piercings, e seu olhar não continha malícia, era puro como um cervo. Lhe fez pensar no Bambi. Vestia um terno azul marinho que em nada se parecia com as jaquetas de couro que Junghoon usava, e havia uma pequena cicatriz na bochecha que o outro não tinha.
— Vejo que conhece meu irmão. — disse ele, lançando-lhe um olhar analítico. Jimin sentou-se na cama, sentindo a cabeça girar e resmungou, fazendo o homem desfazer a pose retraída, para encará-lo com preocupação. — Você está bem? Você desmaiou no meio da rua...
— Eu tô bem... — Jimin encarou o homem, dando de cara com aquele par de olhos grandes e brilhantes sobre si. Por alguma razão, sentiu-se zonzo e nada tinha a ver com o mal estar de antes. — Como vim parar aqui?
— Eu te trouxe, o hospital não era longe. — desdenhou, como se não fosse nada demais e Jimin quis rir.
— Obrigado, senhor...
— Jungkook. — ele completou, olhando em seus olhos de uma forma intensa demais para uma mera interação de estranhos. — Jeon Jungkook.
— Obrigado, Jeon Jungkook. — murmurou, atrapalhando-se nas sílabas do seu nome e sentiu-se ainda mais patético. — Jimin. Park Jimin, é o meu nome.
Jungkook abriu a boca para dizer alguma coisa, mas a chegada do médico em seu leito o fez interromper seu próprio ato, lançando perguntas sobre o estado de saúde de Jimin como se o conhecesse.
— Ele está bem, foi apenas uma fraqueza devido a má alimentação. Só precisa tomar o restante do soro e será liberado. — o homem de meia idade recitou, anotando algo numa prancheta. — Por sinal, não deveria pular refeições na sua condição, Sr. Park.
— Minha... condição? — Jimin perguntou, confuso e estranhamente temeroso. Estava doente e não sabia?
O homem trajando jaleco branco lhe encarou, parando de escrever e franziu a sobrancelha.
— Oh... Você não sabia? — Jimin negou, ainda confuso, engolindo em seco. Contudo, o homem sorriu docemente na sua direção, não parecia prestes a dar uma notícia trágica. — Você está... bem... soa estranho dizer essa palavra no gênero masculino, me desculpe.
O sorriso do médico se tornou constrangido, e Jimin ignorou sua possível fala transfóbica, pois a ansiedade começava a corroê-lo como uma praguinha numa folha.
— Doutor? — impressionantemente, a fala afobada veio de Jungkook.
— Ah, sim. Me desculpe. — ele encarou Jimin, seu olhar se tornando terno e a expressão suave. Novamente, o sorriso de quem vai dar uma ótima notícia se fez presente. Contudo, Jimin não conseguia ver nada de bom saindo da boca de um médico, ainda mais um velho transfóbico. Droga, apenas fale de uma vez. — Sr. Park, você está... grávido de oito semanas. Parabéns, papai.
Quanto tempo é necessário para o curso de uma vida mudar completamente? Quantas palavras são precisas para que a verdade seja compreendida sem contestações? Quinze segundos. Uma única palavra.
Papai.
Jimin sentiu novamente seu mundo ruir, o tempo parou e essa única palavra ecoava pela sua mente infinitamente. Isso não podia estar acontecendo, só podia ser um pesadelo ou uma brincadeira de muito mal gosto do médico na sua frente. Ele não podia estar... Podia? Sempre foi tão cuidadoso, nunca deixou de tomar as malditas pílulas, então como isso foi acontecer? Ele encarou o doutor, com as lágrimas acumuladas nos cantos dos olhos e quis gritar com ele.
— Me diz que isso é uma brincadeira, por favor.
— Não é, seu exame de sangue prova isso. — o homem mediu-o com um olhar piedoso, e Jimin quis bater nele com o suporte do soro. — Você não planejava...
— Porra. Caralho. Cacete. — o chef cobriu o rosto com as mãos, sentindo as lágrimas escorrerem pelos seus dedos e grunhiu como uma criança fazendo birra.
— Eu vou... deixar vocês à vontade. — o médico murmurou desconcertado, e só então Jimin se deu conta que Jungkook ainda estava ali, observando-o cair no fundo do poço.
— Puta merda. — ele soluçou, incapaz de tirar as mãos do rosto e encarar o maldito rosto de Jungkook.
Isso lembrava-o que Jeon Junghoon foi a única pessoa que dormiu nos últimos dois meses e que aquela coisinha dentro de si era fruto dele. De um homem que tinha as mãos sujas de sangue e sabe-se-la-o-que fazia da vida. Não podia ter aquele filho, não tinha psicológico para colocá-lo no mundo, correndo o risco dele se parecer com Junghoon e lembrá-lo constantemente do modo como ele machucou aquele homem. Não conseguia contar a sua família, a Taehyung que eles sempre tiveram razão a respeito do homem problemático que Jimin saía.
— É dele? — Jungkook perguntou em um sussurro temeroso, como se pisasse em um ninho de cobras e Jimin quis ser invisível, ou apenas que o Jeon sumisse da sua frente.
Ele retirou as mãos do rosto, encarando o nada com uma expressão vazia e os rastros salgados das lágrimas que queimavam suas bochechas. Não conseguiu responder a pergunta, quis negar e se fazer de desentendido, mas não teve forças para nada. Contudo, encarou Jungkook, vendo ali o rosto tão idêntico ao do homem responsável por fazê-lo chorar, mas ao mesmo tempo, tão diferente. Nenhuma palavra foi necessária para que o irmão de Junghoon obtivesse sua resposta, mas ele soube assim que encarou os olhos nublados de Jimin. Ele suspirou e passou a mão no rosto de forma nervosa, sua expressão dizia que conhecia Junghoon muito bem e por isso concordava em o quanto aquela notícia era péssima.
— Porra. — sussurrou ele, para a surpresa de Jimin.
— Precisa marcar sua próxima consulta e dar início ao pré-natal. — a moça da recepção disse, de forma robótica, quando Jimin finalmente terminou de tomar o soro. Ele a encarou, incapaz de dizer qualquer coisa logo de cara. Quantas vezes ela já havia dito essa frase naquele dia? E quantas respostas diferentes obteve?
— Eu não... não quero ter o bebê.
A mulher lhe encarou com desinteresse ao empurrar um papel na sua direção.
— Nesse caso, preencha essa ficha. — ela digitou algo no computador, agindo sempre como um personagem NPC de um jogo. — Vou marcar um horário com o obstetra especialista nisso.
Jimin encarou o papel, viu as letras dançarem na sua frente e a visão embaçou. Sua mão tremia ao segurar a caneta e ele soluçou ao preencher o primeiro tópico. Não deveria ser assim, a notícia de uma vida dentro de si deveria causar alegria, ele deveria estar eufórico e não desesperado.
— Quinta-feira às nove, precisará de um acompanhante e... — a moça começou a listar uma série de coisas que Jimin não conseguiu ouvir, pois só escutava o zumbido no ouvido, e as lágrimas não paravam de descer pelo rosto de forma tortuosa.
Jungkook permanecia à sua sombra, como um fantasma, e Jimin sequer tinha forças para mandá-lo ir embora. Quando terminou de preencher a ficha, se virou para ele com um olhar frio.
— O que ainda faz aqui?
— Imaginei que não quisesse ficar sozinho.
— Imaginou errado.
Jungkook sorriu amargo, desencontrando-se da parede e encarando um ponto qualquer do teto.
— De nada, Park. — ele lhe encarou, seu olhar duro desestabilizou Jimin por alguns segundos, mas ele nada disse a respeito. Apenas seguiu seu caminho, sendo seguido pelo espírito perseguidor que se denominava Jeon Jungkook.
Queria tanto acordar desse pesadelo.
fortes emoções, hein?
me diga, quais foram suas primeiras impressões da fic? conte-me tudo!
caso queira falar da estória no x, use a tag #gemeobonzinho que vou estar respondendo todes!
não se esqueça de votar no capitulo, que sua estrelinha ajuda muito no engajamento da fic.
nos vemos na proxima segunda!
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