Capítulo 23
Algumas semanas depois do coquetel de inauguração da obra da nossa nova sede do supermercado, a construção já havia iniciado e tudo corria bem. O projeto era realmente muito bem feito e eu estava super empolgada em acompanhar de perto. Por causa do projeto, claro, não tinha nada a ver com o arquiteto.
Rodrigo aparecia algumas vezes na sede administrativa da empresa, não sei com exatamente qual objetivo e eu ficava com uma expectativa irritante de vê-lo. Quando eu ia visitar a obra, também sentia meu coração acelerar ao aproximar-me do local que sabia que ele estava. Minha cabeça era uma confusão de sentimentos, pois eu me sentia culpada por nutrir essas sensações por ele, como se fosse a mesma Isabela de mais de dez anos atrás.
Certo final de semana, eu, Daniel, Natália e Gabriel combinamos de ir para um barzinho. Chegamos por volta de 20:30 e logo pedimos algumas bebidas. Minha amiga, entretanto, pede apenas um suco, o que acho estranho. Quando ela diz que tem uma novidade para contar, já imagino o que seja e mal consigo segurar a reação de pular da cadeira e abraçá-la com um grito.
Natália tenta engravidar há anos. Inclusive, fez tratamento, depois de muitas tentativas frustradas. Já foi tanto tempo de angústia que eu até desisti de comentar sobre o assunto com ela, a fim de não tornar tudo mais doloroso. Mas, agora, eu conseguia ver o quanto minha amiga e o marido estavam felizes, espero que dê tudo certo dessa vez.
— Já estou no final do terceiro mês, aguardei esse período inicial mais crítico para dar a notícia — ela comenta.
— Caramba, como não percebi antes? Sou tão desatenta assim? — pergunto.
— Ah, a gente não tem se visto muito ultimamente, não é? Muito trabalho para todos nós — Natália diz.
— Verdade!
— Aliás, a construção da nova sede está indo muito bem, né, Isa? Fiquei sabendo — Gabriel comenta.
Ele não falou por mal, claro, mas tenho a impressão de ter se instalado um clima meio chato, já que todos sabemos muito bem por quem ele teve essa notícia. Depois do coquetel, Daniel evitou falar sobre a participação do meu ex no projeto, mas eu sabia que a possibilidade de eu encontrá-lo o incomodava.
— Sim, vai muito bem. Não vejo a hora de finalizar tudo! — Tento dar um prosseguimento normal à conversa.
Felizmente, volta o assunto da gravidez de Natália e o clima fica mais leve. A noite segue tranquila e volto para casa com Daniel, algumas horas depois. Como de costume, Maria Júlia está com os avós paternos e temos a casa só para nós. Logo ao chegarmos, noto que meu marido me toca de maneira provocante e não demoramos a seguirmos para o quarto.
Já de madrugada, deitados na cama, ele me diz:
— Vai ter um congresso de Medicina Intensiva em Fortaleza no mês que vem.
— Poxa, logo agora? Pedi tanto por uma viagem, mas não posso me ausentar de Fonte Nova nesse momento.
— Parece que não temos muita sorte em conciliar horários. Não pode mesmo?
— Não. E, na verdade, não era exatamente esse tipo de viagem que eu planejava e sim uma em que você não estivesse ocupado com nada que tivesse a ver com trabalho.
— É difícil, Isabela.
— Eu sei, Daniel, eu sei...
No mês seguinte, a viagem de Daniel chega e combino com meus pais de me ajudarem com a Maria Júlia pelos dez dias que ele ficaria fora. Eu me sentia meio envergonhada de só contar com eles na ausência do meu marido e sabia que deviam ficar incomodados com isso, era algo que eu precisava mudar.
Apesar de muito trabalho, eu passei a me encontrar mais com Natália, ela já estava quase com cinco meses de gravidez e ficamos muito felizes em descobrirmos que seria uma menina. Nosso sonho, quando mais jovens, era engravidarmos na mesma época e sempre pensávamos em meninas. Claro que a vida não seguiu exatamente o curso que imaginávamos, mas realizaríamos o nosso sonho de uma forma um pouco diferente.
O chá de bebê seria daqui a dois meses ainda, mas eu já havia enchido a minha futura afilhada de presentes. Aliás, eu e Rodrigo praticamente disputávamos quem dava mais. Sim, ele vai ser o padrinho. Mais uma vez, estaremos juntos para abençoar Natália e Gabriel. Como sempre fomos muito próximos, apesar do distanciamento de Rodrigo nos últimos anos, não tinha como ser diferente.
Certo dia, estava fazendo algumas compras no shopping com Natália e ela diz:
— O Rodrigo tá tão animado, Isa! Parece até que a filha vai ser dele! — Ela percebe minha expressão e comenta: — Ah, desculpa, amiga. Eu não queria...
— Tudo bem, Natália, sem problemas. — Interrompo, dando um rápido sorriso.
Depois de ter Maria Júlia, eu já havia superado, em parte, o que aconteceu anos atrás, mas a sensação de tristeza nunca some completamente. Eu me pegava, muitas vezes, tentando imaginar como a vida seria se as coisas tivessem sido diferentes, por mais inútil que isso fosse. Com os acontecimentos dos últimos meses, entretanto, esses pensamentos voltavam com mais frequência.
— Diz uma coisa, você não quer ir para Palmeiras com a gente? — ela pergunta, tentando me animar. — Vamos lá, leva a Majú, ela vai adorar! Daniel tá viajando, não é chato ficar sozinha?
— Ah, não sei, Natália...
Eu ainda resistia em voltar para a cidade que me despertava tantas lembranças e com a presença de Rodrigo, agora mais constante, tudo parecia estar ainda mais vívido na minha mente.
— Vamos, amiga! A Majú tá de férias, você não pode tirar ao menos alguns dias pra ficar lá? — Ainda hesito e ela continua: — Ai, tá bom! Posso, ao menos, levar minha afilhada?
— Tem certeza de que ela não vai te dar muito trabalho, Natália?
— Claro que não! Além disso, você sabe que ela é cobaia para Daniel e eu treinarmos em sermos pais, né?
— É pra eu ficar tranquila com isso? — brinco.
— Claro que é!
Apesar das brincadeiras, eu confiava piamente na minha amiga e seu marido para cuidarem da minha filha, como os bons padrinhos que são. Sendo assim, permiti que a levassem para a casa de praia pela primeira vez. Eu ficava com receio de ela ficar com saudades de mim, mas a menina estava super empolgada. Como havia piscina na nossa casa, ela fazia aulas de natação, então eu não me preocupava tanto, pois já sabia nadar.
O combinado seria passarem cinco dias, pois eu imaginava que mais do que isso seria demais para Maria Júlia. Por mais animada que estivesse, ela tinha apenas cinco anos e crianças dessa idade ficam carentes e manhosas muito facilmente. Natália e Gabriel foram buscá-la na minha casa numa manhã antes de eu sair para o trabalho e senti meu coração pequenininho ao vê-la partir. Nunca havia ficado longe dela, talvez quem mais sentiria falta seria eu.
Depois de quatro ligações diárias nos dois primeiros dias, comecei a ficar mais tranquila ao perceber que tudo estava indo bem e passei a ligar menos, Natália já estava brincando comigo por conta de tanta marcação, dizendo que qualquer problema, ela me ligaria. Por isso, fiquei surpresa quando, certa tarde, vejo uma ligação dela no meu celular.
— Oi, Natália! — atendo.
— Isa, olha só, não precisa se preocupar!
Quando alguém começa uma conversa assim, já sei que existe um problema que devo me preocupar.
— O que foi, Natália? A Maria Júlia está bem??
— Tá sim, ela só teve um pequeno acidente e precisou levar alguns pontos. Mas está tudo sob controle, só liguei pra te avisar mesmo.
— Ai, meu Deus! Mas o que houve?
Natália me conta rapidamente como minha filha estava brincando e acabou caindo e sinto uma dor no peito por não poder estar lá.
— Eu vou até aí, Natália!
— Calma, Isa, tá tudo bem! Melhor você não dirigir nervosa assim.
— Ela deve estar querendo ficar perto de mim nesse momento, preciso ir.
— Tá, eu entendo... ela realmente falou em você. Mas vem com cuidado, tá?
Eu visitava a obra nesse momento e Rodrigo, que estava próximo, parece notar que fiquei nervosa.
— Algum problema, Isabela? — ele pergunta.
— A Maria Júlia sofreu um acidente em Palmeiras, vou até lá.
— Acidente? O que houve? Ela está bem? — ele questiona, preocupado.
— Sim... não sei, acho que sim, a Natália disse que ela já havia recebido atendimento médico, mas preciso estar lá por ela. Você pode me dizer como faz pra chegar lá? Eu não vou desde aquela época.
Ele olha para mim por alguns segundos em silêncio e diz, num tom de voz que carrega uma emoção diferente:
— Eu levo você.
— Não precisa, Rodrigo. É só me dizer o caminho.
— Vem comigo, Isabela. Não é bom pegar estrada que você mal conhece de noite.
— E você realmente lembra? Faz tempo que não vai pra lá também, não? Perguntei, mas nem sei se você está mais perdido do que eu.
— Nunca vou esquecer o caminho para Palmeiras — ele diz, olhando-me com uma expressão que não consigo decifrar.
Odeio a ideia de voltar para essa cidade com ele, não vai ser nada bom, mas não vejo outra saída. Eu realmente não lembro da estrada e angustiada como estou, não vou estar atenta como preciso. Dessa forma, combinamos que eu passaria em casa e Rodrigo me buscaria mais tarde. Quando eu imaginaria que estaria indo com meu ex para a casa que vivemos momentos tão intensos? A vida era mesmo estranha.
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