Capítulo 63
Olá pra quem acompanha essa história!
Preciso pedir desculpas a vocês pela imensa demora.
Infelizmente eu tive um bloqueio fortíssimo: falta de inspiração somada à falta de tempo. Sorry!
Mas O Amor E A Razão está saindo desse hiatus hoje e pretendo não deixar que isso volte a acontecer. Não vou estabelecer dias de postagens, mas garanto a vocês que os capítulos não demorarão mais tanto a sair.
É isso, boa leitura! ♥️🍷
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Os olhos de todos os presentes naquela mesa de reunião permaneciam fixados em Virgínia. Assim como todos os outros, César e Heloísa, seus pais, também haviam sido pegos de surpresa.
" Mas o quê?" Pensou Mariana, interrompendo a escrita da ata.
Obviamente, a intromissão da garota a desagradava demasiadamente. Afinal, tratava-se de algo extremamente importante. Era uma excelente oportunidade para Martín e, uma vez que estavam juntos e pretendiam se casar, tudo o que era relevante para ele, também o era para ela.
- Virgínia, minha sobrinha querida - Eleanor a olhou, com certa complacência. - Eu não duvido de que seja capaz de fazer um bom trabalho. Mas acontece que eu já…
- Tudo bem, dona Eleanor - disse Martín. - Eu não me oponho à idéia da senhorita Virgínia. Afinal de contas, trata-se de uma empresa de família e ela…
Martín evitou a todo custo o olhar de Mariana sobre si. Sabia o que ela deveria estar pensando. Mas a última coisa que queria era entrar em conflito com aquela moça de nariz empinado. Conseguia lidar com a sinceridade fria e cortante de Anabella, era até acostumado a isso. Agora, com a petulância desafiadora que via no olhar de Virgínia, ele não conseguia, ou pelo menos preferia não lidar.
- Ela não é quem eu escolhi para ocupar este cargo. - A senhora Montenegro o interrompeu. - Eu sou a dona desta Vinícola, e eu tomo as decisões aqui. Portanto - seu olhar e voz sérios não deixavam margem para contestações. - Martín será o novo presidente.
- Tia, eu... – Virgínia se calou ao vê-la erguer a mão.
- É minha decisão final. Anotou isso, Mariana?
- Anh, s- sim, senhora. Está anotado.- Mariana assentiu enfaticamente, mal conseguindo esconder sua satisfação.
Virgínia levantou-se de forma abrupta. Deteve seus olhos por um breve instante sobre a tia e então saiu da sala de reuniões, sem dizer uma única palavra.
- Virgínia, filha! – Heloísa disse, mas o marido fez-lhe um gesto, para que deixasse o assunto para depois.
César confiava na decisão da irmã, e no fundo, não acreditava que a filha estivesse pronta para assumir uma responsabilidade como aquela.
- Todos de acordo? – Eleanor fitou os presentes e, obtendo acenos afirmativos, concluiu:
- A reunião está encerrada.
Virgínia esbarrou em um funcionário da Vinícola, o que fez com que os papéis que este carregava, se esparramassem no chão do corredor. Virgínia não ficou para ajudá-lo a recolher. Continuou andando apressadamente, até alcançar a saída do prédio.
Seu peito subia e descia, uma pequena demonstração do quão furiosamente seu coração batia. Sentia raiva.
Pela segunda vez em sua jovem vida, havia sido preterida em relação a outra pessoa.
Primeiro Sérgio, que a havia rejeitado por causa de sua prima. E agora, sua tia lhe negava a oportunidade da sua vida.
Ninguém nunca ficava do seu lado, nem mesmo seus pais. Nunca!
" Ainda vão se arrepender disso. Todos vocês. "
🍷
Laerte observou a bela mulher que se espreguiçava na cama enorme do quarto de hotel. A peça superior da lingerie branca mal comportava os seios fartos. Ainda custava-lhe acreditar que tivera uma mulher como Susan Lins só para si.
Lembrava-se de intimamente ter sentido pena dela durante a Festa Da Uva, em São Bento do Amaral, ao vê-la tão mal por causa de Vicente Montenegro.
Pretendia ajudar de alguma forma ao fazer o convite para que ela o acompanhasse naquela viagem, mas sequer sonhava que Susan pudesse querer algo com ele. Não mesmo.
- O que é isso? – A voz dela o fez interromper seus pensamentos.
Susan apontava para a charmosa sacola de um tom vermelho escuro, que ele segurava em suas mãos.
- É um presente pra mim?
- Acertou. É um presente pra você, sim. – Laerte caminhou até a cama, e sentando-se, entregou-a.
Com uma expressão de agradável surpresa em seus olhos, Susan espiou o interior da sacola, só para notar um embrulho dentro da mesma.
- Você não fez isso! – sua voz tornou-se fina e elevou-se alguns decibéis, em vista da euforia que ela sentiu.
- Fiz, sim – disse Laerte, observando ela desembrulhar o presente.
- Uau! – Susan ergueu o par de sapatos pretos em frente ao rosto e Laerte sorriu. – Um Jimmy Choo!
- Você gostou?
Susan o olhou, parecendo incrédula.
- Se eu gostei? Que pergunta é essa? Meu Deus, não acredito que gastou uma fortuna em um par de sapatos para mim, Laerte!
- Não foi nada.
- Foi sim. Tudo que é Jimmy Choo, é caro. Eu sei! E não diga que não foi nada, porque você não é rico, não precisa ficar gastando dinheiro assim.
- Então você não gostou? – Ele pareceu ligeiramente decepcionado.
- Eu amei! – Susan afirmou, admirando os sapatos. – Só estou dizendo que...
- Shhh... – Laerte lhe calou, pondo um dedo em seus lábios. – Não importa que eu tenha gastado. Você merece. Lembra que eu estraguei seu sapato na Festa Da Uva?
- Imagina se eu ia fazer caso de um sapato... – Susan riu ao falar, porque de fato havia ficado chateada quando o vinho sujou seus sapatos naquela noite. – Mesmo assim, eu só...
- Você só merece ser tratada como a rainha que é, Susan Lins. – O homem olhava-a como se fosse uma peça rara e caríssima, digna de admiração e adoração.
Ela o abraçou, agradecendo o presente. Susan jamais havia se sentido assim em toda a sua vida. Jamais havia sido olhada daquela forma, como se de fato valesse alguma coisa, como se realmente fosse importante para alguém.
- É muito bom ser bem tratada assim. Desde que chegamos aqui você só me mima.
- E se você deixar, pretendo mimar muito mais.
Susan o beijou rapidamente nos lábios e sorriu.
🍷
Como forma de comemorar sua promoção à presidente da Vinícola Montenegro, Martín levou Mariana juntamente com as crianças e os pais de ambos para jantar em um restaurante.
Jamais havia se permitido ter regalias como aquela, mas a ocasião merecia uma comemoração à altura. Não era qualquer coisa. Era um cargo importantíssimo e que lhe roubara completamente a noite de sono anterior, enquanto revirava-se na cama, pensando em como seria e se daria conta do recado.
Mariana havia lhe acalmado, afirmando que não conhecia ninguém mais capaz do que ele para aquilo. Ela tinha sido maravilhosa. Aliás, ela era maravilhosa. Apoiava-o em tudo e o fazia se sentir realmente capaz.
Martín observou-a colocar um pouco de comida na boca de Analu enquanto brincava com ela, e não pôde deixar de pensar na sorte que teve. Ele esfregou as mãos na calça jeans que usava, sentindo certo nervosismo.
- Nada contra a comida desse lugar – disse seu Benício. – Mas se tivéssemos nos reunido lá em casa mesmo, eu teria feito um verdadeiro banquete!
- Ah, pai. Para de reclamar!- Martín disse e Mariana riu do sogro, abanando a cabeça.
- Eu adorei a comida – opinou Dido, com um ar satisfeito. – A gente nunca tinha comido em um restaurante, né, Mari?
A irmã acariciou-lhe os cabelos, contente por vê-lo feliz.
- Verdade. Você gostou?
- Muito! Agora que o tio Martín vai ter bastante dinheiro, podemos vir almoçar e jantar no restaurante todos os dias?
- Dido! – Mariana exclamou.
- O Martín mal começou no novo cargo e você já quer falir ele, moleque? – Élio deu um tapinha na cabeça do garoto, que encolheu os ombros.
Martín, que havia dado bastante risada com a cena, disse:
- Olha Dido, eu não garanto que vamos vir todos os dias ao restaurante, mas de vez em quando, sim.
- Oba!
Analu se remexeu inquieta no colo da mãe, estendendo os bracinhos para Martín.
- Quer vir para o meu colo, princesa? – Ele se derreteu ao ver como era requisitado pela pequena. – Então vem, vamos terminar esse papá.
Mariana a entregou à ele, ajeitando-se novamente na cadeira, para continuar seu jantar.
Estava feliz por ter a família ali reunida e sabia que por hora, não havia mais nada que pudesse desejar.
Ao fim do jantar, quando a sobremesa foi servida, Martín entregou uma Analu mais calminha ao pai, e levantou-se.
Ninguém entendeu sua atitude e ele apressou-se em se explicar.
- Preciso dizer algo importante – Ele hesitou, olhando para a namorada.- Quer dizer, preciso fazer algo importante.
Mariana franziu a testa e logo após, cobriu a boca com a mão, ao vê-lo se ajoelhar diante dela.
- Martín... – Sussurrou.
Ele fez com que ela girasse o corpo na cadeira, mesmo sentada, de modo que ficasse de frente para ele.
- Me escuta, Mariana – disse, de forma doce.
Dido havia esquecido por um momento da sobremesa à sua frente, e os observava, assim como Élio e Benício.
- Eu não reuni vocês aqui hoje somente para comemorar o meu novo cargo na Vinícola Montenegro. A verdade é que essa é uma forma que encontrei de agradecer a todos vocês por fazerem parte da minha vida e me proporcionarem momentos tão bons. Somos uma família e isso é tudo o que eu sempre quis ter. Sei que meu pai também se sente da mesma forma porque por um longo período de tempo fomos só nós dois. Mas a solidão foi dando lugar aos poucos à alegria que hoje temos por ter vocês conosco. Esse cargo de presidente é mais uma coisa boa que vem para somar nas nossas vidas.
Martín parou para tomar fôlego, e mal se dava conta de que algumas pessoas também olhavam para ele, ajoelhado daquele jeito, no meio do restaurante. Mas pouco importava.
- E Mari – ele segurou suas mãos. – Você foi a melhor coisa que me aconteceu nos últimos tempos. Um verdadeiro presente; alguém que eu tenho aprendido a amar a cada dia. Eu quero me casar com você. Quero aumentar ainda mais a nossa família e viver o resto dos meus dias ao seu lado.
Mariana engoliu em seco, tentando desfazer o nó que havia em sua garganta. Segurou o choro.
- Você quer casar comigo? – Martín perguntou.
- É claro que eu quero, você já me pediu isso! – Ela riu, com os olhos brilhantes devido as lágrimas que já queriam escapar.
- Não – Martín tirou uma caixinha de veludo do bolso. – Agora é oficial.
Mariana ficou trêmula ao ver o anel prateado. Era simplesmente lindo e ela não conseguia imaginar quanto dinheiro ele deveria ter economizado, nem por quanto tempo, para comprá-lo.
Jamais imaginara que um dia seria pedida em casamento daquela forma e muito menos que estaria completamente apaixonada quando isso acontecesse.
O pai, o sogro, as crianças e todas as demais pessoas ali naquele restaurante pareciam ter sumido. Ela só conseguia enxergar Martín, ajoelhado à sua frente, com aquele anel estendido, enquanto sua outra mão apertava a dela, suavemente.
- Casa comigo, meu amor.
- Sim! Sim, sim, sim! – Ela exclamou, mal dando a Martín a chance de colocar o anel em seu dedo, e puxando-o para um beijo.
Foram surpreendidos ao ouvir as palmas, percebendo que praticamente todo o restaurante havia acompanhado o desenrolar da cena. E todos pareciam felizes por vê-los felizes. Nada mais bonito de se ver do que um casal verdadeiramente apaixonado.
Até Analu pulava irriquieta no colo de seu Benício, enquanto dava gritinhos eufóricos.
- Eca! Eles não vão parar? – Dido reclamou, voltando sua atenção novamente para a sobremesa, ao ver que Martín e Mariana continuavam se beijando.
- Se depender de mim, nunca... – Martín sussurrou no ouvido da noiva. – Eu te amo muito.
- Eu também te amo... – Mariana disse, certa de que nunca havia sido tão feliz antes.
🍷
Eleanor sentou-se na cama com o álbum de fotografias da última festa de aniversário das gêmeas, tiradas pouco antes da vida de todos ter se tornado uma catástrofe infindável, permeada por tragédias e tristezas.
Seus dedos percorreram o rosto de cada uma das filhas. O mesmo rosto, os mesmos traços – os lindos traços que tanto amava – e as belas expressões, cada uma com sua singularidade e perfeição.
- Sinto tanta falta delas... – disse e sentiu a mão da cunhada afagar-lhe o ombro. Heloísa estava ali com ela, já fazia algumas horas, desde que haviam terminado o jantar.
- Primeiro perdi Ana Lúcia e agora... – suspirou. – Sinto como se tivesse perdido Anabella também. Para sempre.
- Não. Não fala assim. Não é verdade.
- É verdade sim, cunhada. A única filha que me restou me odeia e eu não posso fazer nada, porque...
- Querida – Heloísa fitou-a. – Anabella vai te perdoar. É só questão de tempo e ela vai perceber que você foi tão vítima em toda essa situação assim como ela.
- Ela saiu daqui tão revoltada, tão indignada comigo. Todos os dias me arrependo por ter sido tão omissa e ter deixado as coisas chegarem à esse ponto. Às vezes começo a achar que nada nunca vai voltar a ser como era antes...
" E talvez seja melhor assim. "
Heloísa a abraçou.
- Dê tempo ao tempo. Tudo vai se ajeitar...
🍷
Anabella pôs sua mão sobre a de Oliver, aceitando a ajuda para sair do carro. O cavalheirismo do velho senhor a fez sorrir. Logo adiante, Nancy os esperava.
Anabella perdeu o fôlego com a visão do lugar à sua frente: o cemitério onde Rosalie havia sido enterrada, aos dezesseis anos.
O lugar por si só já era belíssimo, mas a folhagem outonal fazia com que tudo ao redor se tornasse ainda mais encantador. O vento frio daquela tarde de outono em Vancouver fez com que ela se sentisse contente por ter escolhido o sobretudo azul escuro para sair de casa.
Caminhou ao lado de Oliver e Nancy por entre os túmulos, até pararem diante do que disseram ser o de Rosalie.
Nancy se abaixou para substituir as flores secas e murchas que ali estavam, pelas novas flores, frescas e bonitas, colhidas naquela manhã no jardim.
Anabella leu o nome da amiga inscrito na lápide de granito e deixou escapar um suspiro pequeno. Percebeu que sentia saudade. Rosalie mesmo em tão pouco tempo havia marcado sua vida de forma positiva, e embora o desfecho de sua história não tivesse sido feliz, ela deixara marcas de uma amizade sincera em Anabella. Era disso que sentia falta. As aventuras, o companheirismo e as confidências.
" É, Rosalie, você realmente faz falta aqui. "
E então, enquanto Oliver e Nancy se abraçavam juntos perante o túmulo da filha, seus pensamentos voaram até Ana Lúcia. Um maldito tumor cerebral levara sua irmã cedo demais, e apenas se arrependia de não ter sido mais próxima dela. Poderiam ter sido grandes amigas, mas sua reclusão e auto isolamento a tinha afastado das pessoas e principalmente daquela que era sua gêmea, uma extensão de si mesma mais sensível, delicada e cheia de amor.
" Sinto saudade, Ana... "
Anabella beijou a ponta dos dedos e os colocou sobre a lápide de Rosalie.
Não conseguia entender porque elas.
Por que justamente Rosalie e Ana Lúcia, tão cheias de sonhos e com corações tão gigantescos tinham que partir tão cedo. Parecia injusto.
" É injusto. "
- Concordo. Pessoas como Rosalie não deveriam ir embora assim.
Anabella se sobressaltou ao perceber que havia falado em voz alta. E surpreendeu-se ao ver que alguém estava parado ao seu lado, de frente para o túmulo.
Ele era um pouco mais alto que ela; sua pele branca chegava a ser rosada nas maçãs do rosto. Os poucos raios de sol que penetravam por entre as folhas das árvores refletiam sobre as madeixas finas de seu cabelo loiro e, mesmo de perfil, Anabella pôde notar que seus olhos possuíam uma coloração cinzenta, conferindo-lhe um semblante sério e compenetrado. Isso se evidenciava pela forma como o desconhecido contemplava o túmulo de Rosalie, como se não houvesse nada além dele ali que pudesse prender sua atenção. Em uma das mãos, segurava um ramalhete de rosas.
Ela não soube o que dizer. Procurou por Nancy e Oliver e percebeu que eles haviam se afastado, andando por entre as árvores do belo e vasto cemitério.
- Quem é você? – perguntou.
O estranho pareceu não tê-la ouvido. Permaneceu com os olhos fixos no túmulo, o que fez Anabella franzir a testa, confusa.
Ao cabo de alguns minutos, o homem pareceu se desligar da complexidade de seus pensamentos, fossem eles quais fossem, e a olhou.
- Sou Liam, muito prazer – disse, porém não estendeu a mão livre para ela. Esta, permaneceu no casaco preto que ele usava.
Anabella notou que a voz dele, embora tão séria quanto seu rosto, possuía uma suavidade agradável aos seus ouvidos.
- Sou um antigo amigo da família – ele disse e voltou a olhar novamente o túmulo. – E de Rosalie.
Ela compreendeu enfim o porquê daquele homem estar ali.
- Ah, entendo. Bom, eu sou...
- Anabella. Eu sei.
Ela o olhou com as sobrancelhas arqueadas, porém mais uma vez entendeu a situação.
- Claro. A Nancy e o Oliver devem ter falado sobre mim.
- Não. A Rosalie me falou. Quer dizer, ela me escreveu.
- Como?? – Anabella perguntou, aturdida.
Liam se abaixou para deixar as rosas sobre o túmulo, depois de beijá-las. Ao se levantar, deu alguns passos, afastando-se do túmulo.
Inconscientemente, Anabella começou a segui-lo, e logo estava ao seu lado. Lentamente, foram se afastando do túmulo da amiga.
- Disse que a Rosalie te escreveu...
- Sim. A Rosalie e eu éramos muito próximos. E quando ela foi para o Brasil, nossa proximidade foi reduzida a cartas e telefonemas esporádicos. Mas ela sempre escrevia, porque eu pedia. Adorava a letra dela. Aliás... – houve um suspiro quase imperceptível. – Eu adorava tudo nela.
Anabella notou como a expressão séria dele pareceu se suavizar, ao falar de Rosalie.
- Então vocês... Vocês...
Ele negou brevemente com a cabeça.
- Não. Pelo menos não da parte dela. Ela me via apenas como um grande amigo. E isso de fato eu era. Mas não era só isso. Eu... – novo suspiro. – Não importa mais.
Liam se deteve, levando Anabella a fazer o mesmo.
- Certo dia, Rosalie me escreveu dizendo que havia encontrado o grande amor da sua vida – a voz dele se tornou sombria. – O mesmo amor que a matou, meses depois.
Anabella o ouviu engolir em seco e, finalmente, Liam a olhou diretamente nos olhos. E ela percebeu que havia muito a ser desvendado, muito mais do que aqueles olhos cinzentos lhe permitiam enxergar.
🍷
O homem despejou todo o conteúdo da lata de cerveja em dois grandes copos de plástico, com alças ainda maiores e empurrou um dos copos para o lado.
Sérgio deu alguns goles, pensando no quanto sentia falta de um uísque ou de um bom vinho.
Bem, não ia demorar muito para que voltasse a beber o que bem tivesse vontade, e quando quisesse.
Também sentia falta de sua vida em São Bento do Amaral, antes de se tornar um foragido da polícia. Lá, embora ainda não estivesse no patamar que sempre almejou, ao menos tinha o emprego na publicitária. Isso é claro, além de sua parceria com Vicente, que lhe rendia uma boa grana.
E era com essa grana que estava se virando, enquanto estivesse na casa daquele homem, um antigo cliente de Vicente, que não lhe negara “hospedagem”.
Lembrava-se com exatidão de detalhes do dia em que sua vida havia começado a mudar e embora as circunstâncias fossem desafiadoras, considerava que a mudança seria positiva.
- Flashback On - Dia da invasão policial ao porão da Vinícola
Sérgio ouviu as sirenes muito antes de conseguir avistar as viaturas, que adentrariam os portões da Vinícola em breve.
Sabia que tudo estava acabado ali. Descobririam os crimes de Vicente, mas logo ligariam os narcóticos e as armas à ele, assim que investigassem um pouco mais a fundo.
- Não vou deixar que me peguem – murmurou consigo mesmo.
Olhou ao redor, para traçar mentalmente o percurso na direção em que correria até seu carro, evitando bater de frente com os policiais.
Foi neste momento que viu a caixa transparente contendo frascos de fentanil, e ampolas; escondida em um canto, perto dos pés de uva.
Sérgio não entendeu como aquilo teria ido parar ali. Tampouco poderia imaginar que a astúcia do velho José em retirar uma das caixas para que coubesse no grande caixote sem que os homens de Vicente o vissem, seria o que o possibilitaria recomeçar lá adiante.
Olhou em volta novamente e, sem pensar mais, apanhou a caixa, correndo em seguida em disparada, até seu carro.
Não o achariam. Jamais.
A princípio, apenas fugia à esmo. Seu destino era incerto, até se lembrar do cliente que morava no interior de São Paulo e do qual Vicente se dizia ser “amigo”.
- Um dia, caso esteja em apuros, pode procurar pelo Régis. Ele me deve alguns favores, e não negará ajuda à você. Basta dizer que trabalha comigo e estará tudo certo.
- Vamos ver se esse Régis realmente pode me ajudar – Sérgio procurou puxar pela memória o endereço correto do sujeito. – Quem diria que no final das contas você me seria útil, Vicente.
Sérgio apenas não sabia ainda que Vicente àquela altura já estava morto.
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Antes mesmo de chegar ao destino, havia comprado tinta no primeiro estabelecimento que achou na estrada e, num banheiro imundo de rodoviária, dera adeus ao seu cabelo escuro, substituindo as mechas pretas por mechas castanhas e claras. Não era muito, mas já ajudava a compor o disfarce que pretendia usar dali por diante.
Apenas uma certeza ele tinha: não se deixaria ser pego.
- Flashback Off -
🍷
Sérgio deu mais alguns goles na bebida quase quente e deixou o copo sobre a mesa de madeira. Régis fez o mesmo.
- Vou te passar o contato do seu primeiro cliente. Ele é gente fina e importante. E paga bem.
- Ótimo – Sérgio se levantou. – Já não era sem tempo.
- Bom, não pode reclamar da demora em confiarem em você. Por mais que trabalhasse para Vicente, para eles, você ainda era um desconhecido.
- Eu não trabalhava para ele, trabalhava com ele – disse ríspido e ergueu um pouco mais a cabeça.
Seus olhos escureceram-se, embora estivesse de costas para o homem, e este não pudesse ver seu rosto.
- Vicente está morto – sua voz era sombria. – E se ele um dia foi grande, eu serei maior ainda. Vou me reerguer e ser respeitado, aonde quer que eu vá. Vou montar o meu império. E ele será muito maior do que o de Vicente Montenegro.
Virou-se para o homem, que o observava.
- Pode anotar isto. Você vai ver. Eu vou me reerguer. Ou não me chamo Sérgio Foster.
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