Capítulo 6- Sensações... antigas
Contém 3800 palavras.
Boa leitura 💜
Com apenas dois dias desde a luta estúpida, posso dizer que estou me recuperando rapidamente, considerando o estrago que foi feito em meus órgãos. Mesmo sendo uma bruxa, se não fosse o fator da imortalidade, é provável que eu estivesse morta durante o processo de recuperação. Por isso, me sinto feliz por estar melhor a cada dia, embora pensar demais nisso azede meu humor.
Sinto uma raiva imensa ao lembrar do empate. Não por causa de Hades, mas pela minha ingenuidade em esquecer das malditas correntes. Deveria ter previsto que ele as usaria ao estar prestes a perder, pois nunca seria uma opção me dar a liberdade. O subestimei, e agora estou pagando o preço por isso.
Droga!
A luta não foi nada além de uma demonstração dos meus poderes. Ele ganhou antes mesmo de ela começar, e isso me deixa completamente furiosa. Agora, adquiri a atenção dos Deuses, e como consequência, Hades quer me conquistar.
Malditos!
A arrogância deles é tão sem limites que, mesmo odiando os humanos, Poseidon é um exemplo claro disso. Eles me querem ao lado de Hades como sua propriedade, para que ele tenha um poder ilimitado, já que nenhum Deus pode contra mim. Isso daria aos deuses uma arma perfeita, totalmente devotada a eles.
Eles realmente acreditam que eu deixaria isso acontecer?
Se acham que vou facilitar para eles, estão muito enganados. Hades, principalmente!
O Senhor do Submundo é um tolo se está de olho em meus poderes, pois ele pode esquecer. Jamais me aliaria aos deuses, rebaixando-me a suas vontades. Prefiro passar a eternidade como prisioneira a sucumbir a esses idiotas.
Deuses arrogantes de merda!
Somente me veem como um prêmio a ser conquistado, e isso só me dá mais nojo deles. Está claro o quanto eu sempre estive certa sobre eles. Nenhum realmente se importa com nada além de seus próprios objetivos, fazendo tudo ao seu alcance para consegui-los, sem se importar com as consequências.
Poder... ganância... soberba...
É engraçado vê-los cheios desses defeitos, julgando a humanidade exatamente pelo mesmo motivo!
Eles se enganaram comigo. Posso ser cabeça quente, mas não sou ingênua ao ponto de cair em seu conto!
Vou manter a mente fria para lidar com a situação da melhor forma, mesmo que precise de esforço extra para conter meu gênio, pois me deixar dominar pelas emoções é me autossabotar, e isso não é a maneira mais inteligente.
Suspiro cansada.
A água fria da banheira já está machucando minha pele, visto que estou há horas imersa nela, sem vontade alguma de sair, mas é preciso. Lentamente, saio, tentando evitar movimentos bruscos, pois, apesar da melhora visível, ainda tenho dificuldades para caminhar. Recusei a ajuda dos servos de Hades, insistindo em fazer tudo sozinha.
Nem morta vou deixá-lo me bajular!
Provavelmente, ele usaria isso contra mim!
Depois da sutil ameaça de morte, seus servos decidiram apelar para seu senhor para conseguirem me ajudar. Como Hades está tentando me conquistar, achou que seria bom não contrariar minha vontade, e isso me irritou ainda mais.
Ele acredita mesmo que vai me conquistar? Que, fazendo tudo isso, eu vou cair em seus pés?
Ele é um tremendo idiota!
Confesso que meus sentimentos estão girando rapidamente, tanto que não consigo acompanhá-los. A cada instante, eles se tornam mais confusos, especialmente quando se trata dele. É uma mistura de emoções que não consigo identificar, me deixando mais e mais mergulhada na irritabilidade.
A única certeza que tenho é o quanto sou diferente em sua presença. Não é igual aos sentimentos que possuo pelos demais Deuses, por mais que me doa admitir isso. Nojo é a última coisa que sinto por Hades, e isso apenas me deixa mais irritada com ele.
Meus sentimentos são mais intensos, e isso é terrível, pois me deixa totalmente vulnerável diante dele, o que é mais perigoso do que qualquer animosidade.
Talvez seja um karma!
— Maldito idiota! — resmunguei irritada.
Quanto mais penso nele, mais meus pensamentos se intensificam, a ira comanda meu coração. Não posso permitir que isso aconteça!
Fique fria, não deixe os sentimentos dominá-la!
Coloco um vestido verde de tecido leve, com um decote profundo, e um colar de quartzo verde para me proteger.
— Hortor sanationem in hac petra — cantei o feitiço no colar, para fortalecer os efeitos da pedra.
Quartzo verde é uma pedra da cura, com propriedades calmantes e desintoxicantes. Ela acalma o corpo, a mente e o coração, aumentando a paciência e o equilíbrio emocional, ou seja, tudo que preciso no momento.
Talvez assim meus pensamentos fiquem mais calmos...
Ao colocar o colar, olho fixamente no espelho por alguns segundos, até soltar um suspiro de desgosto. Não consigo crer no quanto ele é um idiota. Sento na cama, onde deixei os livros que estava tentando ler antes do banho, virando para olhar o canto escuro do quarto.
Ele me julga tão idiota?
O ambiente ficou sufocante, um aroma forte preencheu o local. Notas amadeiradas e picantes, combinadas ao couro, evocaram uma sensação de poder, confiança e sedução, além de uma mistura envolvente de pimenta negra com cardamomo, alternando entre frescor e sofisticação.
É a fragrância mais intensa e cativante que já senti, revelando muito do dono dela.
Tremi levemente ao senti-lo me rodeando, trazendo uma forte sensação de melancolia, mas também um leve sentimento de... ansiedade. Minha mente começou a doer com as emoções despertadas, gerando cada vez mais sentimentos conhecidos, mas dolorosos de admitir.
É como se ele me envolvesse em um abraço que me deixasse plena, mas, ao mesmo tempo, mergulhada na melancolia.
Por que o aroma provoca memórias de sentimentos felizes, mas também uma profunda tristeza?
Esse idiota precisa ficar longe de mim!
— Estou sentindo seu perfume no ar. O que quer, se esgueirando na escuridão, Hades? — perguntei, séria, para o deus que se escondia nas sombras, me observando atentamente.
Não gosto dos sentimentos que ele desperta em mim, especialmente ao ver o quão alegre ele fica por isso.
O maldito sabe o quanto me afeta e se sente bem com isso!
— Interessante o fato de ter decorado o meu perfume — ele sorriu, saindo das sombras e aproximando-se da cama.
Cretino!
— Por favor! Estou sozinha aqui neste quarto, sei exatamente qual é o meu cheiro! — resmunguei, com desdém.
Um sorriso idiota surgiu em seu rosto, aumentando minha raiva.
Por que ele se sente tão contente em me provocar?
Os olhos roxos focaram nos meus por longos minutos. Sem tirar o maldito sorriso do rosto, ele se sentou ao meu lado. Meu corpo se movimentou abruptamente em resposta, saltando para longe dele, o que ocasionou uma careta de dor, pois doeu pela movimentação repentina. O semblante dele mudou ao ver meu rosto mergulhado na dor, seu olhar adquiriu um tom de preocupação.
— Como está? — seu olhar ficou mais gentil.
Ele muda numa velocidade um pouco impressionante!
— Estou melhor que ontem, mas ainda sinto dores.
— Posso curá-la se deixar — ele começou, evitando me olhar, mas um sorriso maroto brincou em seus lábios. — Sei que não consegue usar seus poderes na totalidade por estar se recuperando e que recusou a ajuda de Hécate, mas posso ajudá-la.
Suspiro descontente.
Óbvio! E o quanto isso me custaria?
— Não quero sua ajuda. Posso me recuperar sem a interferência divina! — resmunguei, olhando irritada para ele. — Não sei se sabe, mas a maioria dos humanos sofre o tempo inteiro. É comum que consigamos nos curar sem precisar de vocês!
Ele suspirou pesadamente, parecendo se controlar para responder, mas seu olhar firme já falava por ele.
Então, sua tática é conter seu gênio e agir como um cavalheiro de armadura reluzente?
Não vai funcionar, meu caro. Quanto mais você é gentil, mais me irrita, pois tudo isso é apenas um jogo, e nada é sincero!
— Ao menos aceite a ajuda de Hécate! — ele retrucou, irritado.
Reviro os olhos, fechando as mãos em punho.
— Você é surdo? Não quero ajuda de nenhum Deus!
Ele cruzou os braços, me olhando mais seriamente.
— A culpa de estar assim é minha. Não tive a intenção de machucá-la — murmurou irritado, parando ao ver meu riso irônico. — É a verdade! Somente queria pará-la, mas infelizmente usei força demais. Isso não me impede de ajudá-la.
Ajudar?
Como os Deuses conhecem essa palavra!
Quando foi a última vez que eles fizeram algo sem querer retribuição?
— O que isso me custaria? — perguntei, mordaz.
— Não começa! Estou sendo gentil! — ele respondeu ríspido.
— Já disse que estou bem!
Ele suspirou, resignado. Embora seu semblante estivesse irritado, não acrescentou nada.
— Consegue andar? — ele perguntou repentinamente, sorrindo ao me ver confusa. — Está há tantos dias neste quarto, quero que respire um pouco de ar puro.
— O ar puro do Submundo? — repliquei, ácida.
— Trégua hoje! — Hades pediu, sério.
Olho para ele por longos segundos. Uma parte minha está disposta a atender seu pedido, por simplesmente estar cansada de estar neste quarto, mas a outra é orgulhosa demais para admitir isso em voz alta.
Merda!
Sinto anseio de esganá-lo, pois a vontade de sair daqui está vencendo meu orgulho, já ferido.
Levanto-me um pouco cambaleante ao constatar que ainda não estou tão firme ao ficar ereta. Demorei muito no banho, e isso ajudou a dor a voltar. Meus órgãos estão se reconstruindo, o que me faz ficar curvada e ter dificuldade para andar normalmente.
Hades fez um enorme estrago!
— Levo você — ele me segurou com uma delicadeza incomum em seu colo, saindo do quarto devagar para não me machucar com o balanço que seu corpo faz ao caminhar.
Pisco, atordoada, mas tento controlar meu rosto para não corar diante da situação.
Ele é um idiota!
— Aonde vamos? — perguntei, aturdida.
Não estou gostando da maneira como meu corpo está arrepiado somente por estar nessa situação com ele, principalmente por vê-lo divertido. Seus olhos brilhavam em malícia, fazendo meu esforço para manter meu semblante neutro ruir. Senti meu rosto ficar quente, provavelmente corando vergonhosamente.
Que droga! Não consigo evitar!
Viro o rosto na direção contrária, para evitar olhá-lo. Não quero que ele veja minhas emoções, mas seu riso leve ecoou, me fazendo suspirar irritada.
Não tenho como esconder. Ele percebeu o que se passa comigo!
São momentos como esse que me dão raiva por ser imortal, pois entregaria minha vida de bom grado a Thanatos, se isso significasse ser tirada dessa situação.
— Quero mostrar um lugar especial — ele murmurou, misterioso, atraindo meu olhar curioso.
Mordi a língua para perguntar, evitando conversar mais com ele.
Os braços fortes ao meu redor provocaram sensações perturbadoras. Hades sorria o tempo todo, me fazendo corar ainda mais. Caminhamos, ou melhor, ele, por longos minutos, até chegar a um muro enorme. Ao ultrapassá-lo, a paisagem se transformou em um extenso campo verde e florido, repleto de paz e tranquilidade.
Olho fascinada para Hades, que mantinha o semblante neutro, mesmo que seus olhos brilhassem em alegria.
— Que lugar é esse?
— Campos Elísios — ele respondeu, sorrindo.
Não consegui conter o deslumbramento, é o lugar mais belo que já vi em minha vida.
Admirá-la passou a ser um dos meus passatempos favoritos. Obviamente, ela não percebia isso durante os primeiros dias, já que estava mais focada em sua recuperação. Somente depois passou a ter uma percepção melhor do entorno.
Estou invadindo sua privacidade, sei bem disso, mas não consigo me controlar, ainda mais porque sei que ela está nessa situação por minha causa e não aceita ajuda nenhuma, pois é uma teimosa!
Ao menos posso levá-la para tomar um pouco de ar puro, e valeu o esforço, pois seus olhos tempestuosos brilharam de alegria durante o caminho pelo campo, contemplando cada local com uma atenção extrema, quase minuciosa.
Caminho até a árvore mais velha e linda dos Campos Elísios, extremamente alta e de beleza incomum, deixando a bruxa em meus braços completamente deslumbrada, embora tentasse esconder isso, sem sucesso.
A coloco delicadamente aos pés da árvore, revelando um piquenique que faremos ali.
Sarah olhou quase com uma curiosidade infantil para a toalha estendida no chão, ocasionando uma certa euforia em meu interior, além de um pouco de receio. Ao longo da toalha, as mais variadas frutas e doces estavam espalhadas, harmoniosamente, criando um ambiente único e aconchegante. Mesmo sem saber como, sinto que os gostos dela são simples.
— Está tentando me conquistar pelo estômago? — ela perguntou, divertida.
Olho para o cenário romântico da mesma maneira que ela, mas, pela primeira vez, não foi para conquistá-la, não exatamente, pois um simples piquenique não seria suficiente para arrebatar seu coração, e sei disso, sendo totalmente honesto comigo mesmo. Apenas quero sua companhia.
— Não é o tipo de mulher que é conquistada com algo simples assim — retruquei, divertido, olhando-a intensamente.
Ela revirou os olhos levemente, irritada, analisando tudo com um certo receio que me deu nos nervos.
— Então...
— Nem sempre tudo tem um motivo nefasto! — interrompi, completamente carrancudo pela falta de confiança. — Apenas queria que saísse daquele quarto e desfrutasse da sua companhia.
Os olhos incrédulos dela em minha direção quase me fizeram suspirar em desespero.
Que droga de mulher difícil!
Qual é o problema em querer a companhia dela?
— É errado querer sua companhia sem ter nada envolvido?
Pelo semblante dela, parece que é errado sim!
Aposto que, tudo que eu fizer, ela vai pensar que é um plano para conquistá-la, e nada será genuíno ou espontâneo, como se fosse um plano para obter seu poder.
Como se eu quisesse me casar com ela por isso!
A arrogância dela é totalmente sem limites, Sarah claramente se acha a pedra mais preciosa do universo e tem a audácia de falar dos Deuses, como se ela fosse perfeita!
Nesse meio tempo, posso citar inúmeros defeitos dela.
Ela não aceita opiniões, não gosta de estar errada e menos ainda de não ter a última palavra. Está sempre certa, e todo o resto deve se curvar às suas vontades. Não tem o mínimo de respeito por seus superiores, mesmo sendo os deuses que ela não suporta, ela deve respeito, e não faz isso.
Mulher arrogante e orgulhosa!
Dito isso, sou masoquista ou burro para querer alguém assim!
— Hades?
Olho de relance, observando seu semblante ansioso para o horizonte.
— Qual é o real motivo de querer casar comigo? — ela perguntou, evitando me olhar, mas o nervosismo é evidente em seu rosto. — Ao contrário dos demais, não o vejo sendo um Deus tão desprezível a ponto de querer meus poderes, estou errada?
Pequena bruxa, seus poderes não são nem um por cento do meu interesse por você...
Se fosse o caso, não iria dispor de minha boa vontade em conquistá-la, iria simplesmente tomá-la à força. Mas quero-a por livre e espontânea vontade, e isso não tem nada a ver com seus poderes!
Os olhos dela brilharam com sentimentos contraditórios, assim como os meus...
Ela sente algo, mesmo que seja apenas desejo, mas se contém, por quê?
— Por que tem tanta raiva dos deuses? — provoquei, tentando fugir do assunto.
— Não me respondeu! — ela resmungou, irritada.
— Nem você! — retruquei, divertido ao ver que ela fica facilmente zangada comigo.
O rosto vermelho pela raiva, tentando se controlar, é algo absurdamente lindo.
Porra! Ela é linda!
— Os deuses abusam dos seus poderes, veja seu irmão Zeus como exemplo: decidiu tomar uma mulher, roubou-a no dia do seu casamento, forçando-a a ficar com ele. Ela engravidou e depois ele fugiu. Hera, ao invés de culpá-lo, resolveu perseguir a humana e sua filha. Elas não tinham culpa da perversidade de seu irmão!
Droga!
Não tenho como nos defender nessa questão.
Ela tinha que citar justamente os piores deuses?
Os abusos dos meus irmãos são lendários, e não falo apenas de Zeus, pois Poseidon também entra na equação. Embora, em comparação com o mais novo, ele seja mais ameno, não é o mais sensato, tanto que foi capaz de matar o próprio irmão e baní-lo do Olimpo, mesmo que Adamantine estivesse planejando uma guerra pelo poder.
Nenhum deles é exemplo de bons deuses!
Ela poderia ter citado outros, como Hécate ou... até mesmo eu. Não saio por aí para atrapalhar a vida alheia, normalmente fazem isso comigo.
— Nem todos os deuses são assim — resmunguei.
Sarah sorriu maliciosa ao me ver desconfortável.
— A cada mil anos ocorre a reunião em que os deuses decidem o destino da humanidade. Baseado no comportamento de alguns, os humanos podem viver mais mil anos ou serem extintos. Nem todos os humanos são desprezíveis, mas somos julgados como um todo, certo? — Sarah cantarola, maliciosa.
Sua pequena praguinha!
Sinto meu sangue ferver, pois novamente não posso contrariar os fatos. O destino de alguns é baseado em um conjunto de fatores, pois eles são um todo, logo, não podem ser julgados separadamente, ao menos não mais...
Desde que Hércules se tornou Deus, isso não ocorre. Antigamente, poderíamos castigar apenas aqueles que mereciam, mas, após a ascensão dele como Deus, isso não foi possível, dado o trato dele com Zeus.
Sarah não sabe disso, obviamente.
— Está certa sobre isso, mas não pode nos comparar com os humanos! — respondi, emburrado.
Ela sorriu sinceramente, fazendo-me suspirar.
— Você está falando isso porque sabe que estou certa.
A visão dela sobre os Deuses não me ajuda em nada, apenas piora a situação. Dito isso, como devo ser honesto?
Tudo que eu falar vai parecer algo feito exclusivamente para atraí-la. Embora seja parte do meu objetivo, não é o conjunto inteiro da obra. Não sou egoísta, não totalmente. Sinto-me atraído por ela, e, a cada instante, esse sentimento cresce. Apenas ao mirar seus olhos, sinto um ímã que me puxa em sua direção.
Mas adiantaria eu falar isso para ela?
Jamais quis um laço eterno, mas com ela eu quero. Tanto que não me importam seus defeitos, pois tenho a certeza de que ela é tudo que desejo.
Olho decidido em sua direção, fazendo-a arfar levemente ao mirar meus olhos.
— Sendo completamente honesto com você, não sei dizer o motivo de querer você. Sim, fiquei muito surpreso ao ver um pouco da extensão de seus poderes, mas não é por isso que a quero para mim. Não preciso deles e pude comprovar isso na nossa luta, não? — sorrio, malicioso.
O olhar de ódio dela em minha direção somente me fez rir, pois ela, apesar de tentar parecer uma leoa furiosa, mais parece uma gatinha, embora eu saiba que ela também arranha.
— Vamos, Sarah, supere isso! Ganhei porque usei meus poderes antes da luta. Foi ingenuidade da sua parte pensar que não usaria isso a meu favor, afinal, nós, deuses, abusamos dos nossos poderes — usei suas palavras contra ela, fazendo-a ferver de raiva.
A qualquer momento, ela vai me matar!
— Sim, fui muito ingênua em confiar em um Deus — ela retrucou, provocativa.
Sorrio ladino em resposta.
Bruxinha... nem tem ideia!
— Então... você admite que perderia para mim, Senhor Hades? — Sarah murmurou lentamente, de forma maliciosa.
Porra! Por tudo que existe de sagrado, não chame suplicante e diga meu nome dessa forma, não com esse semblante malicioso!
Fecho brevemente meus olhos, buscando me concentrar, mas, ao abri-los, foi impossível conter a surpresa. Ao olhá-la, me vi em seu olhar, completamente em chamas, como a própria encarnação da tentação, transbordando desejo apenas por ela.
Mas o doce deleite foi ver suas pupilas dilatadas, olhos prateados como uma tempestade brutal, as bochechas rosadas e a boca entreaberta, entregue ao desejo que despertei.
Ela está afetada por mim!
— Se quer que continue sendo um cavalheiro, não deveria me chamar assim — respondi, rouco, e me aproximo lentamente. — E nem me olhar com tanto desejo. Posso atender seus pensamentos.
Seguro seu queixo com delicadeza, puxando-a em minha direção, em uma lentidão torturante, passo a ponta da língua no contorno dos seus lábios, fazendo-a ofegar um gemido em resposta.
O corpo inteiro dela tremulou junto ao meu. Senti uma vontade imensa de me jogar em seus braços, mas não ultrapassarei a linha, não até ela pedir. Posso ver o desejo estampado em sua face e em cada célula do seu corpo, com o coração batendo loucamente, mas isso não é suficiente.
Ela precisa falar que me quer, com todas as letras, e não vejo a hora dela dizer!
— Hades... para! — ela suspirou, me empurrando levemente.
Sorrio malicioso ao ver seu rosto ruborizado, os olhos em chamas pelo desejo despertado. Apesar de ela tentar manter uma certa racionalidade, não é suficiente para apagar tudo que sente.
Ela luta contra, mas ainda sente tudo, isso apenas torna as coisas mais intensas.
— Como quiser, minha bruxa — peguei sua mão, depositando um singelo beijo.
— Não sua! — ela retrucou, afastando a mão da minha em um empurrão, sem conter os resmungos. — Ainda não respondeu à minha pergunta!
Suspiro descontente, tentando raciocinar perto dela, o que confesso não tem acontecido com frequência.
— Eu... não sei explicar o motivo, mas sinto que algo me puxa para você — confessei, segurando novamente sua mão.
Tão pequena e delicada em contraste com a minha, encaixando com tanta precisão, como se feita sob medida. Entrelaço nossas mãos, sentindo um sentimento intenso de familiaridade tomar conta do meu coração, tão forte que me sinto triste por alguns instantes, como se a falta disso fosse sufocante demais.
Olho para ela, sem surpresa, ao notar que também me olha com a mesma intensidade, compartilhando as mesmas sensações. O tempo ao nosso redor ficou suspenso, nada importando além daquele olhar tão lindo, deixando tudo confuso.
Por que me sinto tão atraído por ela?
Por que sinto falta de algo que nunca vivi com ela?
Tudo deixa de ser racional. Começo a agir pela emoção ao seu lado, provocando-a a todo instante, mesmo sabendo o quão furiosa ela pode ficar. Ainda assim, é interessante esse contato, como se eu soubesse até que ponto ir para irritá-la.
Mas ela ainda retém seus sentimentos, pois vejo o quanto me deseja. Mesmo assim, prefere ser rude e tempestuosa, agindo sempre na defensiva, nunca me dando uma chance.
— Nunca fiz nada gratuito contra você, então por que é tão arisca comigo?
Anseio saber, pois sinto seus sentimentos, sejam desejos ou raiva. Por mim, parecem multiplicados. Entre todos os deuses, sei que sou o que mais a irrita, como se tudo fosse feito exclusivamente para tirá-la do sério. Mas nunca a vi antes dela aparecer no submundo e não abuso do meu poder. Logo, não sou um dos deuses podres que ela descreve.
— Acredito que a minha alma reconhece a tua, talvez na outra vida não nos dávamos bem — ela retrucou, divertida, apertando suavemente minha mão.
Na outra vida... não nos dávamos bem?
Um latejar atravessa minha cabeça, como um raio, rápido e totalmente destruidor, me deixando ofegante e perdido.
— Hades... — a voz dela pareceu tão longe.
Minhas mãos vão automaticamente para minha cabeça, tentando conter o latejar irritante.
"Os fios negros como seda dançavam em meio à claridade da lua, tão preciosos como as ondas que os contornavam, longos e esvoaçantes."
Que porra está...
"Sorrindo alegremente em minha direção, ela fez tudo simplesmente paralisar, o vestido perolado em contraste com a luz criou uma aura totalmente hipnotizante.
Os passos em minha direção eram seguros, com uma pitada de sua personalidade forte. Ela não tirou o lindo sorriso daquele rosto esculpido pelos deuses. Os olhos, em um prateado nebuloso, me deixaram completamente no chão, pois jamais vi tanta graciosidade em apenas um lugar.
— Stella mea, está atrasado, como devo castigá-lo?
Os olhos faiscaram em desejo puro e brutal, quase me deixando em estado de êxtase somente com a frase."
Meu corpo deu um salto abrupto enquanto aquelas imagens preenchiam minha mente sem parar um segundo.
"— Stella mea! Não seja curioso, não pode ver meu vestido!
Ela segurou com firmeza a porta, tentando me impedir de olhar, mas a culpa preencheu meu olhar, pois rapidamente ela soltou a porta e parou para me bater.
— Foi sem querer, juro!
Tento segurar suas mãos, sem conter a careta ao vê-la tão brava.
— Hades, já disse que não era para aparecer aqui! Estamos arrumando os últimos detalhes, e você viu o vestido de noiva! — ela resmungou, irritada.
A puxo para meus braços, sem conter o riso ao escutar seus resmungos contrariados.
— Dulce meum, juro que foi sem querer. Falei com Hécate, tinha algo a lhe entregar e ela disse que poderia deixar no quarto. Foi um mal-entendido!
— Mamãe esqueceu que troquei o lugar do vestido para meu quarto — ela resmungou.
Sorrio, puxando-a para um doce beijo, talvez o colar de diamantes a faça esquecer o episódio."
— Hades! — Sarah gritou, chamando minha atenção.
Olho para ela sem piscar, completamente confuso diante das lembranças e da imagem em minha frente.
Os mesmos olhos como prata derretida, cabelos negros como a noite sem estrelas, mas não tão ondulados, dessa vez, mais lisos. A pele mais rosada ao invés da pálida como o luar. O corpo também é diferente de outrora, pois agora é mais delicado, não tão desenhado e robusto, além do rosto mais anguloso, oposto de antes, que era mais arredondado.
— Você... eu... conheço... eu...
Outras memórias começam a preencher minha mente em uma velocidade anormal, aumentando a pressão dos meus pensamentos, levando-me ao colapso. Somente vejo seus olhos preocupados antes de me entregar por completo à escuridão.
Hortor sanationem in hac petra - Encorajo a cura nessa pedra.
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