Capítulo 47 - Guardiões
Contém 3700 palavras.
Boa leitura 💜
O momento de tensão ainda queimava em minhas veias como brasas incandescentes, apesar de não ter feito esforço algum, a exaustão era um peso físico, me esmagando, me deixando incapaz de mover um músculo sequer. Hécate, apesar de tecer inúmeros feitiços para me reestabelecer, achou melhor que meu útero se estabelecesse naturalmente. Estava limpa, deitada sob os lençóis brancos, mas ainda assim me sentia imunda, contaminada por algo mais profundo do que o sangue que ainda impregnava minhas narinas, era a lembrança da vulnerabilidade, a perda de controle sobre meu próprio corpo, a sensação de ter sido rasgada por dentro.
Um medo profundo, algo que jamais imaginei sentir, me invadiu: a possibilidade de perder meus filhos. Seria capaz de oferecer minha vida sem reservas para que ambos ficassem bem. Enquanto nos aproximávamos da sala de jantar, uma estranha sensação de mal-estar já me invadia. As pontadas nas minhas costas, antes sutis, agora se tornavam golpes agudos, como facas afiadas cravadas na minha carne. Eram constantes, implacáveis, crescendo em intensidade a cada passo. Mas foi somente quando senti a água quente escorrer entre minhas pernas que percebi o tamanho do problema, como se o próprio universo estivesse me alertando para a tempestade que estava por vir.
Algo estava terrivelmente errado. Uma dor lancinante me percorreu, não apenas na região da barriga, mas irradiando pelas minhas costas, como se mil agulhas estivessem perfurando minha carne. Minha intimidade latejava de uma maneira estranha, uma pulsação intensa e dolorosa que me deixava sem ar. A confirmação veio com a visão do sangue nas mãos de Hades, vermelho vivo e espesso, como se meu próprio corpo estivesse se desfazendo. Era como se algo estivesse rasgando meu interior, algo que não conseguia controlar, uma força incontrolável que me esmagava.
Acontece que, com todos os acontecimentos durante minha gravidez, o ataque de Perséfone me atingiu mais do que o esperado, principalmente aquele último confronto que resultou no ferimento de Hades. A fúria dela, sua magia cruel, deixou marcas profundas em meu ser, danos energéticos sutis que passaram despercebidos sob a máscara da minha nova força divina. Minha gravidez, antes delicada, se transformou em um risco extremo. A transformação em deusa, embora me fortalecesse fisicamente, não curou os danos ocultos causados pela magia de Perséfone.
A força divina encobriu a fragilidade, uma fragilidade que se manifestou com toda a sua intensidade durante o estresse extremo do parto. "Logo não podemos ver antes do tempo," Hécate disse, sua voz carregada de pesar, seus olhos cheios de uma compreensão profunda da minha dor, "era por isso que seu parto foi tão complicado." Seu olhar era um misto de compaixão e admiração pela minha força, pela minha capacidade de suportar o insuportável.
Mas tudo isso se perdia ao vê-los. A pequena Raven segurava meu peito com tanta força, como se temesse que fosse capaz de fugir dela. Enquanto ela se alimentava, sorri ternamente, acariciando seus sedosos cabelos cinzentos, sentindo a suavidade deles entre meus dedos. Já Daemon dormia tranquilamente nos braços de um Hades, que exibia um sorriso radiante, o orgulho transbordando em cada linha de seu rosto.
A porta se abriu abruptamente e os irmãos de Hades entraram com um estrondo, assustando os bebês e a mim. Pulei inesperadamente, fazendo uma careta, a dor interna ainda latente, lembrando-me de que, por fora, parecia bem, mas meu corpo estava em recuperação.
— Está tudo bem? — perguntaram em uníssono, a preocupação estampada em seus rostos.
Raven soltou meu peito com uma indignação que me faria rir, se não fosse o choro estridente de Daemon ecoando pelo local. Hades lançou um olhar irritado para os irmãos, que sorriam sem graça, claramente sem perceber o impacto de sua entrada repentina.
— Cacete, vocês não sabem o significado de bater na porta? — Hades resmungou, voltando a embalar o pequeno, sua voz um misto de frustração e amor.
Daemon, ao ouvir a voz de Hades, calou-se imediatamente, não pude evitar um sorriso diante da cena. Raven voltou sua atenção para o alimento, sugando meu seio sem dar atenção aos tios que estavam babando.
— São meninos? — Adamanto perguntou, aproximando-se lentamente de Hades e olhando com admiração para o sobrinho.
Hades sorriu amorosamente, mostrando melhor o pequeno, e Adamanto suspirou, admirando a fragilidade do bebê.
— Esse é Daemon — Hades apresentou, colocando o pequeno nos braços do irmão. — E ele não gosta de barulho estridente.
Adamanto segurou o pequeno com extremo cuidado, observando-o quieto em seu colo. Um sorriso radiante se espalhou em seu rosto ao ver os irmãos olhando com fascínio, e a atmosfera no quarto parecia se encher de amor e alegria, um contraste perfeito com a tempestade que passamos.
— E essa é a Raven — Hades se aproximou de mim, seus olhos brilhando com a mesma luz que refletia nos da pequena em meus braços. Raven, fascinada com o pai, desviou sua atenção para ele, suas pequenas mãozinhas se esticando em direção a Hades. — Ela é a mais velha por alguns segundos.
Os irmãos de Hades se aproximaram, sorrisos largos iluminando seus rostos.
— São lindos! Ambos são a sua cara, apenas Daemon tem os olhos de Sarah! — Poseidon declarou, sua voz embargada de emoção.
Sorri amena, olhando discretamente para Hades, que parecia ter o sorriso costurado na face, um reflexo da alegria que preenchia o ambiente.
— Poseidon, venha cá — chamei-o suavemente, um convite que ele atendeu com curiosidade.
Ele se aproximou e coloquei Raven em seus braços. Ele a pegou com cuidado e admiração, os olhos brilhando intensamente enquanto a pequena o olhava com atenção, como se reconhecesse a bondade que emanava dele.
— Não estou favoritando ninguém, mas preciso dizer que você foi um apoio muito importante para mim. Nunca tive irmãos, mas você se encaixaria perfeitamente no papel, só poderia ser menos irritante — sorri ao ver seu revirar de olhos, um sorriso irônico e divertido em seu rosto. — Por isso, sei que você será a escolha perfeita para a nossa Raven. Então, escolhemos você como guardião.
Poseidon me olhou surpreso, a expressão em seu rosto mudando de incredulidade para um largo sorriso, enquanto olhava para a pequena que sumia em seus braços.
— Obrigado, Sarah... eu... me sinto honrado! — Poseidon agradeceu, seus olhos brilhando com lágrimas não derramadas. Para evitar que o vissem assim, ele mirou nos olhos roxos da pequena, que refletiam os mesmos traços do irmão. Um sorriso amável se espalhou em seu rosto quando ele deu um singelo beijo na testa de Raven, sussurrando: — Cuidarei de você e do seu irmão com minha própria vida!
A pequena esticou as mãozinhas, tocando sua face com curiosidade, e Poseidon arregalou os olhos, as lágrimas escorrendo pelo seu rosto. Para disfarçar, virou-se de costas, mantendo a atenção na pequena, a emoção transbordando em seu coração.
Hades observava tudo com um sorriso amoroso, e não pude deixar de sentir que estávamos certos ao escolher Poseidon. Apesar de sua fachada robusta, não havia ninguém melhor do que ele para cuidar da nossa pequena. A profunda conexão entre eles era palpável, e sabia que Raven estaria em boas mãos.
Os irmãos dele observavam a cena com uma mistura de surpresa e admiração. Hades voltou sua atenção para Adamanto, que sorria, seus olhos arregalados refletindo uma combinação de espanto e alegria.
— Adamanto, você é o mais impulsivo de nós quatro, mas ainda assim é o que mais tem sentimentos. Quando penso em alguém forte, capaz de tudo para proteger meu filho, sei que você é excelente para o papel. Por isso, queremos você como guardião de Daemon.
Adamanto arregalou ainda mais os olhos para Hades, um sorriso radiante se espalhou em seu rosto enquanto ele olhava para o pequeno em seus braços.
— Obrigado! Prometo protegê-los sempre! — Adamanto declarou, sua voz cheia de determinação, referindo-se a ambos os sobrinhos, assim como Poseidon fez.
Sorri abertamente, meu coração aquecido pela certeza de que eles eram guardiões perfeitos. A confiança que sentia em relação a eles era um bálsamo para minha alma, e a atmosfera ao nosso redor parecia vibrar com amor e proteção.
Porém, ao voltar meu olhar para Hades, percebi a tristeza em seus olhos enquanto ele olhava para o irmão mais novo. Entendo sua culpa, mas era a escolha certa e Hades sabe disso.
"Segurá-los ao mesmo tempo, em meus braços, era uma sensação única. Apesar de estarem comigo sempre, agora era diferente, era como se cada batida de seus pequenos corações pulsasse em uníssono com o meu. Hades mantinha um sorriso terno, seus olhos brilhando de amor e orgulho, sem perder nenhum movimento, mesmo enquanto ambos dormiam tranquilamente em nosso pequeno refúgio.
— Amor, estive pensando e já escolhi os guardiões — declarei animada, sentindo uma onda de expectativa. Ele ergueu a sobrancelha, um sorriso sarcástico dançando em seus lábios, e ri debochando. — Claro que quero sua opinião...
Ele balançou a cabeça em negação, a expressão divertida nunca saindo de seu rosto.
— Quer minha opinião? — ele retrucou, a ironia clara em sua voz.
Revirei os olhos, rindo.
— É que sei que você concordará comigo, então por que temos uma discussão? — retruquei, com um sorriso travesso.
— Certo, o que pensou? — Hades perguntou, sua curiosidade evidente.
— Não possuo amigos, nem tenho irmãos, e Hécate não seria escolhida, pois já é a avó. A única pessoa que posso ver como família, que sinto como um irmão, embora possa ser estranho para você, é Poseidon. Ele esteve presente quando precisei e foi de suma importância para que aguentasse quando estava ferido. Além disso, ele ama você incondicionalmente. Sei que ele cuidará da nossa pequena, então pensei nele como guardião de Raven.
Hades ponderou cuidadosamente, seus olhos fixos na pequena em meus braços, uma expressão de consideração em seu rosto.
— Acho perfeito, uma doce princesa para amolecer o coração gelado do meu irmão — ele piscou maroto, não consegui conter um sorriso. — E quanto a Daemon? — ele perguntou, mesmo já sabendo a resposta.
Mordi os lábios, nervosa.
— Primeiro, quero deixar claro que guardião é aquele que vai proteger e cuidar da criança na ausência dos pais, uma figura de respeito que guiará a criança — respondi ansiosa, sob seu olhar atento. — Juro que não é pessoal, mas não quero Zeus. Ele nem cuida dos próprios filhos, imagine o nosso!
Hades assentiu, pensativo.
— Escolheu Adamanto então? — ele perguntou, a curiosidade evidente.
— Sim! Pelo que conheço dele, Adamanto é centrado, calmo e amoroso. Sei que ele cuidaria perfeitamente de Daemon e da Raven também.
Hades assentiu, mergulhado em pensamentos, sem responder nada.
— Não é pessoal. Perdoei-o pelo que fez, não esqueci, mas perdoei. Não por ele, mas por mim mesma, pois não quero guardar mágoas! — resmunguei, embalando os pequenos. — Mas pense comigo, ele não procurou a própria filha e sei lá quantos filhos tem por aí! Fora que é um tarado, pervertido, doido e tem o acréscimo de Hera, que é insuportável.
Hades começou a rir suavemente, o som leve preenchendo o ar.
— Isso que não tem nada contra ele — ele zombou, me olhando de lado. Corei sob seu sorriso divertido. — Dulce meum... concordo com você, acho Adamanto a escolha perfeita para Daemon."
Um nó se formou em minha garganta, mesmo entendendo, foi pesado ver a tristeza em seu olhar.
— Zeus, você é tio deles e nada fará com que isso quebre, mas guardião é como pai, e não fico segura em dar meus filhos para ficarem sob sua tutela tendo Hera como esposa — declarei, minha voz séria, mas com um toque de compaixão.
Ele assentiu, um sorriso triste em seus lábios. Seus olhos, porém, revelavam uma ponta de decepção que não conseguia ignorar.
— Entendo... — ele sussurrou, sua voz baixa.
— Não sei o motivo desse desânimo, ainda pode ser o tio preferido deles — pisquei, tentando quebrar a tensão com um toque de humor.
Ele olhou para Hades, um brilho de divertimento em seus olhos, antes de sorrir para mim. A luz suave da lua iluminava o quarto, criando sombras dançantes nas paredes enquanto as risadas de Hades e Zeus ecoavam pelo espaço.
— Que nada! Espero o próximo! — Zeus brincou, sua voz carregada de uma alegria que contrastava com a tristeza anterior.
Hades sorriu maliciosamente, erguendo a sobrancelha em malícia para mim.
— Nem vem! — resmunguei, fazendo-os rirem, o som de suas gargalhadas preenchendo o quarto.
༺۵༻
Os pequenos dormiam tranquilamente em seus berços, presentes generosos de Poseidon. Eram peças clássicas, com detalhes em ouro branco entalhados na madeira escura e polida. Uma atmosfera mágica pairava no quarto, uma mistura de tranquilidade e mistério. A luz filtrada do oceano criava um brilho etéreo, quase surreal, sobre os pequenos. Observá-los dormindo tão serenamente nesse ambiente único me enchia de um amor tão profundo que quase me esmagava. Cada detalhe entalhado na madeira, delicadas conchas e algas entrelaçadas, cada curva esculpida com uma precisão impressionante, parecia sussurrar uma promessa de proteção e segurança. Os berços estavam lado a lado, em um quarto amplo e aconchegante, com uma grande janela que oferecia uma vista deslumbrante para o reino subaquático de Poseidon. Um silêncio quase absoluto pairava no quarto, quebrado apenas pelo suave respirar dos bebês e pelo som distante das correntes marinhas.
"Olhei aturdida para Hades, meus olhos se arregalaram em surpresa, as sobrancelhas arqueadas em incredulidade. Um sorriso involuntário se formou em meus lábios enquanto meu coração batia forte no peito, uma mistura de gratidão e admiração me inundando. Dois servos de Poseidon, imponentes e silenciosos, entraram no quarto poucas horas depois que ele saiu, seus braços carregados de berços. Seus trajes, feitos de um tecido azul profundo, pareciam se fundir com as sombras do oceano, e seus movimentos eram tão suaves e precisos quanto a dança das águas.
— Hades, o que está acontecendo? — questionei, minha voz carregada de espanto.
Hades riu, me olhando de canto, um brilho de divertimento em seus olhos.
— Poseidon achou melhor os bebês terem uma cama própria para dormir — ele explicou, divertido.
Sem que precisasse de ordem, os servos montaram os berços rapidamente sob meu olhar espantado e um sorriso divertido de Hades. O som suave da madeira polida contra a madeira, como um sussurro delicado, preenchia o ar. O cheiro fresco e leve da madeira se misturava ao aroma salgado do mar, criando uma fragrância única e encantadora.
— Céus! — exclamei ao vê-los, meu sorriso se alargando ainda mais.
Poseidon entrou no quarto com uma postura ereta, o orgulho irradiando de seu olhar. Um sorriso largo iluminava seu rosto, e seus olhos brilhavam com uma alegria contagiante. Ele parou ao ver meu olhar surpreso.
— Meus sobrinhos não vão dormir em qualquer coisa! — Poseidon declarou com uma voz vibrante, sua animação contagiante. — Este ouro aqui é o mais raro encontrado, ouro branco, o nome diz tudo e parece ser símbolo de amor, união e eternidade. Hades comentou que você, como bruxa, é ligada ao poder das pedras, então pensei que seria bom ter uma rara em seus berços.
Não pude deixar de sorrir com sua atitude doce. Estava o conhecendo gradualmente, mas essa foi a primeira vez que o vi tão alegre, tão genuinamente feliz.
— Foi muito atencioso de sua parte — declarei ao meu cunhado, que ficou levemente vermelho, envergonhado com o elogio."
Hades se aproximou silenciosamente, a graciosidade de seus movimentos contrastando com a força imponente de seu corpo. Seus dedos longos e fortes envolveram minha cintura com um carinho que me fez suspirar. O cheiro familiar de sua pele, uma mistura inebriante que o cercava, me acalmou instantaneamente, dissipando a tensão que me oprimia. A sensação de segurança em seus braços era tão profunda que me fez fechar os olhos, sentindo o ritmo constante de seu coração batendo contra meu ouvido.
— O que foi, meu amor? — ele perguntou, sua voz suave como um sussurro, quebrando o silêncio do quarto e me trazendo de volta à realidade.
— Seu irmão é mais do que aparenta — inclinei a cabeça em direção aos berços, um sorriso suave em meus lábios enquanto observava nossos pequenos dormindo tranquilamente, seus rostos serenos e delicados.
Hades sorriu amavelmente, seus olhos escuros e penetrantes cheios de uma ternura, a intensidade de seu olhar me fez sentir profundamente amada e segura.
— Poseidon é como o oceano: profundo, complexo, obscuro e perigoso, sim, mas também cheio de belezas ocultas, de mistérios fascinantes e de uma força inabalável. As pessoas costumam ver apenas sua superfície agitada, as ondas impetuosas que se chocam contra as rochas, e julgam seus atos por isso, mas seu abismo é muito maior do que se possa imaginar. Ele é sentimental, sim... apenas esconde muito bem, mas hoje foi a primeira vez que o vi em lágrimas.
As lágrimas de Poseidon eram uma prova de que mesmo o mais imponente dos deuses pode ser tocado pela emoção. Provavelmente foi um momento único que nenhum dos irmãos dele já viu. Foi mesmo um momento especial, sei que Poseidon foi agraciado com um amor sem igual, assim como Adamanto.
Hades suspirou, um som profundo e ressonante que vibrou em seu peito. O peso da preocupação e da tristeza era palpável, seus ombros estavam curvados sob o fardo de suas emoções, podia sentir a tensão em seus músculos, como se ele estivesse segurando o peso do mundo em suas costas.
— O que foi, stella mea? — perguntei, observando seus olhos tristes.
— Pensando em Zeus, me senti um pouco culpado... — ele respondeu, sua voz carregada de pesar.
Suspirei profundamente, consciente da complexidade da situação.
— Ele é tio das crianças, mas se insiste tanto, podemos dar Cérbero para ele ser guardião! — resmunguei, tentando aliviar a tensão com um toque de humor, mas fazendo-o suspirar.
— Dulce meum, não seja assim! — ele retrucou, puxando-me mais para perto, seu abraço me envolvendo em um calor reconfortante.
Seu olhar encontrou o meu e suspirei, compreendendo-o melhor. Ele era um ótimo irmão, claro que ficaria assim ao ver seu caçula triste, mas apesar de entender, ainda estou firme da minha escolha, principalmente se tratando de Zeus.
— Desculpa, mas não posso confiar meus filhos a alguém que não liga para os próprios filhos! — retruquei, deitando sob seu peito, meu corpo cansado encontrando descanso em seu calor.
Os atos de Zeus são lendários, não eram algo que possa esquecer com facilidade. Quando Zeus se importou com sua prole? Nunca! Ele sempre visava Hera, mesmo a traindo constantemente, seus filhos gerados com suas amantes eram sempre alvo dela e ele nada fazia. A indiferença de Zeus para com seus filhos era um ato de crueldade que não conseguia compreender. Como posso confiar em alguém assim?
Entendo os sentimentos dele por seu irmão, mas não consigo ter culpa nisso, não quando sei que tenho razão. Se algo ocorrer conosco, são os guardiões que cuidarão de Raven e Daemon. Como Zeus teria uma responsabilidade desse nível?
O aroma suave do oceano ainda pairava no ar, misturando-se ao cheiro de madeira polida dos berços. O silêncio do quarto era quebrado apenas pelo suave respirar dos bebês, um contraste com a tempestade emocional que pairava entre nós.
— Não gosta dele, né? — ele perguntou, sua voz suave, mas com um tom de compreensão que me tocou. Seus olhos, escuros e penetrantes, pareciam procurar a minha alma.
— Não, para mudar minha opinião sobre ele, teria que ver alguma mudança e não vi nenhuma — respondi, minha voz firme, mas com um toque de tristeza. Ele ficou pensativo, seus dedos traçando desenhos abstratos em meu braço.
Ele usou uma mulher contra a vontade dela, além de estragar sua vida, ainda permitiu que sua esposa a caçasse, ainda ferindo a filha que teve com a mulher. Mudanças nele? Seria preciso ele realmente mudar radicalmente, ou ao menos fazer algo útil, quando disso me refiro a algo por alguém que ele feriu e ele jamais faria isso.
— Ele está tentando ser um bom cunhado — ele defendeu o irmão, sua voz carregada de um afeto que entendia, mas não compartilhava.
— Ele é um bom cunhado, mas isso é por sua causa e nada mais. Se ele quer que mude de visão sobre ele... teria que primeiramente parar de ver as mulheres como um buraco onde ele pode meter a hora que quer e, principalmente, cuidar de seus filhos. Aliás, isso seria o mínimo! — retruquei, minha voz carregada de uma frustração contida.
Hades suspirou, sem respostas, seus olhos fixos em nossos filhos, dormindo tranquilamente. O silêncio entre nós era pesado, carregado de emoções não ditas.
— Diga-me que nunca pensou na sua sobrinha que está por aí? — perguntei, minha voz baixa e carregada de uma dor que não conseguia esconder.
Hades engoliu em seco, seus olhos se desviando dos meus, percebi o seu desconforto. Ele sabe que tenho razão, que a menina está por aí e Zeus sequer procurou saber sobre. Aliás, a menina estava viva porque meus pais se sacrificaram por ela e a mãe dela, além de que fiz um feitiço impedindo que os deuses a tocassem. Ele nem trabalho teve!
— Ele sabe ao menos se ela está bem alimentada, segura e se não está precisando de nada?
Hades suspirou pesadamente, seu olhar foi para nossos filhos, dormindo tranquilamente. Sei que agora ele sabe exatamente como era ser pai, que não pensava em abandoná-los por aí.
— Concordo com você, como pai agora... não posso pensar na hipótese de abandonar meus filhos — ele beijou suavemente minha testa, sua voz carregada de uma ternura profunda.
Sei do amor dele pelos irmãos, mas ele sabe que não podemos confiar em alguém que não cuida dos próprios filhos para ficar responsável pelos nossos. Jamais colocaria os meus em perigo por isso. A segurança de meus filhos era minha prioridade máxima.
— Então sorria, odeio vê-lo triste! — resmunguei, cutucando sua barriga.
Ele sorriu largamente, segurando minha mão e levando até seus lábios.
— Amo você! — ele murmurou rouco, sua voz carregada de emoção.
Me estiquei, beijando suavemente seus lábios, sob seu sorriso terno.
— Também te amo.
Seus dedos subiram até meus cabelos, acariciando suavemente minhas madeixas, enquanto me olhava intensamente. O toque suave de seus dedos em meus cabelos me fez arrepiar.
— Tive um medo absurdo de perder você e nossos filhos, percebi que meu amor por você cresce a cada dia e agora se multiplicou com os gêmeos. Sou completamente louco pela nossa família.
Meu coração disparou loucamente, puxei-o para mim, beijando-o ternamente, enquanto as lágrimas escorriam livremente, não foram necessárias palavras, ele sabia que meus sentimentos estavam iguais, meu amor por ele só crescia a cada dia.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro