Capítulo 3
Uma semana fora o tempo que os advogados de Bernardo Salles levaram para reunir as documentações e assim encaminhar as notificações para a leitura do testamento. Documento que fora alterado apenas um mês antes de sua partida definitiva desse mundo.
A leitura aconteceria na sede da Construtora Salles bem no coração daquela cidade que essa família tinha quase que inteira na palma de suas mãos. Silvia não gostou da noticia, ainda se negava a sair do seu quarto, enquanto que Bruno tentava restabelecer a rotina em sua vida e ocupar a mente com o trabalho estava sendo o melhor caminho.
— Mãe! Posso entrar?
Bruno ensaiou aquela batida na porta dos aposentos de sua mãe praticamente a manhã inteira. Durante a semana que seguiu não a viu em momento algum. Estava como medo do que encontraria do outro lado a porta. A verdade é que estava com medo do que ela encontraria deste lado da porta.
— Pode sim, por favor!
Aquela não era a resposta que esperava. Acreditava que teria de ter de bater mais vezes e mesmo assim o silêncio o brindaria. O que aconteceu fora exatamente o oposto. A voz dela não estava embargada pelo choro. Estava limpa. Audível de uma forma animada não condizente com a situação em que se encontravam.
Ela estava com as janelas abertas. O quarto totalmente em ordem exceto por uma caixa florida sobre a cama. Silvia permaneceu sentada em sua penteadeira mexendo em suas caixas de joias quando Bruno entrou em seus aposentos.
— Aconteceu alguma coisa?
— Recebi a notificação do escritório de advocacia do pai, precisam da nossa presença depois de amanhã para poderem fazer a leitura do testamento.
— Ah! Sim. Já esperava por isso.
— Mandarei alguém busca-la, pois eu já estarei na Construtora e não virei para o almoço como usualmente faço.
— O que não entendo é o motivo de fazerem isso lá na Construtora, poderiam fazer isso aqui.
— Entendo mãe. Gostaria que pedisse para mudarem o local?
— Não se preocupe com isso. Vai me fazer bem sair um pouco dessa casa.
Silvia pela primeira vez desde que o filho entrou voltaria seu olhar direto para ele. O que viu não lhe agradou naquele momento. O rapaz estava mais magro e pálido como de costume. Ela sentiu a morte do seu grande, mas ali diante de Bruno constatou que ele estava sentindo mais e um assombro percorreu seu corpo. Ele estava naquele momento incrivelmente a cópia do seu falecido marido.
— Estarei pronta.
Silvia retornou sua atenção para o que fazia antes do rapaz entrar. Desejava que ele saísse de seus aposentos, a constatação da semelhança até então não percebida entre eles estava incomodando e lhe confundindo. A falta de Bernardo a estava deixando confusa, aquele rapaz sempre a deixou dessa forma.
— Como está? Mal nos falamos desde... O enterro.
— Estou melhor. Obrigada.
Ela não encarou novamente. A voz mudou voltando para aquela em que a irritação fica aparente e Bruno percebeu esse nuance. O assunto estava encerrado. E ele não estava surpreso. Com ela sempre fora dessa forma, apenas algumas poucas frases trocadas. Deixou o quarto de sua mãe com a certeza que já sabia: estava solitário. Triste e solitário.
Silvia esperou Bruno deixar seus aposentos. A inquietude lhe acompanharia o resto daquela a deixando em um estado de ansiedade que lhe forçava andar em círculos, tanto no espaço físico do seu quarto, quanto na sua mente.
Estava com medo de Bernardo revelar naquele documento sobre a adoção de Bruno. Via aquele ato como uma crueldade não apenas para o filho e também com ela que teria de responder todos os questionamentos que surgiram. Ele revelaria a mentira e ela a verdade. E por conta disso chamou a única pessoa viva além dela que tinha conhecimento daquela farsa.
— Marisa! Depois de amanhã, nossas vidas mudarão completamente, estou com medo.
— Fica tranquila Sra. Salles, o Sr. Bernardo não teria se empenhado esses anos todos em esconder esse fato para que fosse descoberto assim, são apenas formalidades, o que é de se esperar devido ao legado dos Salles.
— Não sei Marisa algo dentro de mim, diz que algo estranho está por vir. Não sei! Ele andava esquisito nesses últimos meses, e eu seus últimos dias no hospital ele falava dormindo sobre o que teria acontecido com o outro. Que outro? Não estou entendendo, Marisa! Ele teve algum filho bastardo que eu não sabia?
— Não Sra. Silvia o Sr. Bernardo a amava demais, ele nunca teve amantes quem dirá um filho. Se ele tivesse tido um filho jamais ficaria longe dele, isso podemos ver pela forma como era próximo de Bruno.
— Deve ser coisa minha então, estamos todos cansados, essa doença dele prolongou por tempo demais nos levando à exaustão. Sinto por Bruno até esqueceu-se que tinha que viver a sua vida, namorar, casar e ter filhos. Ficou somente se dedicando ao pai, imagino que esteja perdido.
— Ah Sra. Silvia, da pena do rapaz. Ele quando volta para casa do trabalho não sabe para onde vai, fica andando por esses corredores igual a uma alma penada.
— Eu não sei como chegar até ele. Não o conheci quando devia, nunca achamos que ficaríamos sem Bernardo, agora estamos nós dois, completos estranhos. Não sei do que gosta. Não sei nada e é tudo culpa minha, essa minha infantilidade, esse meu ciúme me afastou do presente que Deus me enviou! Um menino lindo, saudável e adorável.
Marisa deixaria Silvia com seus pensamentos de arrependimento. As lagrimas voltariam para seus olhos, agora não mais pela perda de Bernardo e sim pela mãe que foi para seu filho e sentia que estava tarde para recomeçar. Estava tarde para um perdão. Estava tarde para amar.
O sol já dava indícios de sua partida e por conta disso Laura apertava seus passos por entre ruas e becos que passava todos os dias até chegar a sua morada na parte superior da Oficina Mecânica Silva. Estava acostumada com homens diante de sua porta, o que estranho naquele em particular era a roupa que usava. Não se lembrava de ter visto algum cliente de Thiago trajando ternos. Os homens que ali iam usavam roupas simples quando não estavam em seus uniformes de trabalho, os clientes da oficina Silva são pessoas simples na sua grande maioria.
— Posso ajuda-lo?
— Aqui é a residência de Thiago Silva?
— Sim! Acho que ele não deve estar...
— Acredito que sim, já bati algumas vezes.
— É muito urgente?
— A senhora seria?
— A esposa dele.
O rapaz estendeu um envelope com um timbre muito elegante do escritório de advocacia que aquele homem representava. Laura pegou com ressalvas.
— Preciso que assine aqui.
Laura com as mãos trêmulas fez o que o homem solicitava. Este partiria logo em seguida deixando a mulher com vários questionamentos. Sentiu vontade de abrir aquele envelope, mas sabia que não tinha esse direito. Havia inclusive mentido para aquele homem, não era esposa de Thiago e não acreditava que seria tão cedo, seu namorado não dava indícios de que casamento fazia parte dos seus planos.
— Laura! Já chegou?
— Tim! Corre aqui!
Thiago subiria a escadaria que levava ao apartamento deles no segundo andar da oficina com uma chave de rodas em sua mão, pronto para o ataque.
— O que vai fazer com isso?
— Tem alguém aqui com você? Te fizeram mal? Levaram alguma coisa?
Thiago olhava para todos os lados como se revistasse o local em busca de um intruso.
— Não tem ninguém aqui comigo. Por que acha isso?
— A porta da oficina estava aberta e você gritou por mim...
— Ah! — Laura esboça um sorriso tímido e de culpa — Desculpa! Fiquei tão surpresa com aquele homem de terno que esqueci de fechar.
— Que homem de terno?
Thiago largaria a ferramenta em um canto e se aproximou de Laura com o olhar do qual ela não gostava. O olhar que vinha seguido de puxões em seu braço, ou empurrões conta a parede.
— Não sei Thiago! Ele apenas veio deixar algo para você e como não estava me entregou.
— Tem certeza de que é isso mesmo?
— O que mais seria? Sabe que não gosto quando faz esses tipos de insinuações.
— Não são insinuações, são fatos! O que ele te entregou?
— Está sobre a mesa da cozinha, vou buscar.
Thiago a via se afastando com desconfiança no olhar. Por mais que desejasse não conseguia confiar e dessa forma sempre julgava que ela em algum momento o enganaria, tanto que a proibia de ficar andando pela oficina em horário comercial quando os outros funcionários estivessem por lá. Era um alívio para ele saber que o horário do trabalho de Laura não possibilitava esses encontros. Ela saia antes deles chegarem e voltava quando já haviam partido.
— Aqui está!
— Que porra é essa?
— Só vai saber quando abrir. Se meteu em alguma encrenca?
— O que quer dizer com isso?
— Não sei Tim!
Ele a encarou de forma dura. Ela quase podia sentir o peso de sua mão sobre sua pele.
— Vai me matar de curiosidade.
— Já que quer saber tanto porque não abre você mesmo?
Thiago lhe estendeu o envelope. Laura novamente teria posses daquele pedaço de papel que a deixava nervosa. Suas mãos tremiam e o olhar próximo de Thiago só fazia piorar. Ela começou a ler sem dizer uma única palavra. Não conseguia verbalizar nada.
— Deixa ver isso.
Thiago diante do silencio e do olhar espantado dela, arranca bruscamente aquele papel de suas mãos.
— Tim! Eles querem a sua presença em uma leitura de testamento.
— Parece que sim.
— Por que iriam querer que você fosse? Pelo que sei você não tem mais pais.
— Não tenho mais mãe, que foi até tarde, agora pai isso já não sei.
— Você viu o endereço que estão te mandando?
— Que tem ele?
— Thiago! É da construtora Salles!
— E?
— Meu Deus! Será que ele era o seu pai Tim? Se não for porque motivos estão te chamando? Pena que não dá mais para saber de sua mãe já que ela está morta.
— Mesmo se tivesse viva aquela mulher nunca foi de muita ajuda.
— Não fala assim da sua mãe.
— Você não foi criada por ela e no meio de sua sujeira, se tivesse sido não a defenderia. Não passava de uma mentirosa e dissimulada e burra. Se fosse esperta não tinha vivido e morrido na merda em que se encontrava.
— O que você vai fazer? Você vai né, quer que eu vá junto?
— Claro que eu vou. E quanto a você ir junto ainda não sei, preciso pensar.
Thiago pensaria mais do que estava acostumado. Enão apenas se levaria Laura consigo e sim pelos motivos que a aquelanotificação implicava.
xXx
O que será que aquele testamento irá revelar?
Amores não esqueçam de deixar aquela estrelinha se estiverem gostando! Beijos!
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