Capítulo 12
O céu mostrava um dia claro sem nuvens. O sol naquele momento brincava de se esconder entre os arranha céus bem diante dos olhos nebulosos de Laura. Seu corpo sentia a presença do outro, mas a sua consciência a impedia de virar e encará-lo.
— Não precisa ter medo. — a voz de Thiago vinha mansa, algo que raramente Laura havia escutado e por conta disso o medo ficou mais intenso. — Meu surto de ira já passou.
— Thiago! Estou com tanta vergonha. — Laura permanecia olhando para o horizonte pedido ao sol sua força. — Não sei o que te dizer.
— Não quero que me diga nada. A culpa de tudo isso foi minha.
O corpo de Laura girou com rapidez assim que processou o que ele havia dito. Não era dessa forma que encarava a situação em que se encontrava. Ambos estavam errados um com o outro e Laura não permitiria que ele carregasse tudo em suas costas.
— Não posso transmitir a culpa do que fiz para você. Quando vim até aqui eu sabia o que estava prestes a fazer. Você facilitou essa aproximação, mas ser o responsável, não!
— Sabe... — Thiago respirou fundo como se pegasse coragem o olhar de tristeza de Laura estava lhe machucando mais do que um soco em seu estômago. — Eu mereço isso. Pessoas como eu não merecem ser felizes pelo simples fato de não saber como. Fui maltratado a minha vida inteira, jogado como um saco de lixo de um lado para o outro e aprendi a viver assim. — ele daria dois passos na direção de Laura inclinando sua cabeça como se quisesse ficar da mesma altura que ela. — Toda vez que estávamos perto disso eu achava uma forma de estragar.
— Tivemos momentos ruins? Sim. Foram vários, mas também tivemos momentos maravilhosos juntos e era neles que eu me apegava para ficar ao seu lado e eles existiram muito mais, quero que saiba disso.
— Eles existiram por sua causa, pela sua persistência. Eu não teria sido tão complacente ou mesmo paciente no seu lugar. Você de alguma forma aprendeu a ignorar meus momentos insanos e toda magoa que lhe infligi. Não entendo porque ficou tanto tempo.
— Porque eu te amo!
Laura veio até seu encontro quase tocando suas mãos. Ele viu que as delas tremiam, mas também sentia que ela dizia a verdade e que era a mesma que a dele. Ele também a amava. E naquele momento soube que era foi à única mulher que amou.
— Por que dormiu com ele?
— Não sei responder essa pergunta. Raiva. Tristeza. Mágoa. Um acúmulo de situações. Ele me fez me sentir especial novamente, foi isso tudo isso que me levou aos seus braços.
— Valeu a pena?
— Não vou responder isso.
— Teve o alívio que buscava? Está se sentindo melhor?
— Estamos chegando ao ponto em que você se transforma, não faz isso.
Os olhos azuis de Thiago estavam ganhando uma cor diferente, as lágrimas que ele mantinha ali presas estavam machucando transformando tudo em vermelho. A dor no estômago ficando cada vez mais intensa e as forças em suas pernas minguando.
— Eu te perdi né?
Ele a encarou com dureza. Desejou dizer que não. Que tudo ficaria bem entre eles, mas ele se conhecia bem demais para mentir. Ele sabia que na primeira oportunidade jogaria toda aquela situação na cara de Laura. Aquele era o ponto de ruptura definitiva naquela história compartilhada.
— Você não vai me responder?
— Agora não posso te dar essa resposta o que precisamos é ir embora. Pega suas coisas. Vou te levar para longe daqui. — Thiago desviou o olhar e colocou as mãos dentro do bolso de sua calça, estava se fechando como fizera toda a sua vida. — Aqui não é lugar para você ficar até porque ele vai acabar te mandando embora.
— Porque diz que ele vai me mandar embora?
— Porque é isso que ele faz Laura!
E ali estava o timbre de voz que Laura conhecia acrescida pelo desespero em seu olhar que entrava pela sua alma como se a visse por dentro. A primeira que aconteceu eles estavam passeando pela orla da praia em uma noite quente de verão. Laura vinha com duas casquinhas de sorvetes em sua mão seguida por um rapaz que não entendia o significado da palavra não. Thiago seria um professor eficaz não apenas para o rapaz, mas também para uma Laura inocente em seus atos. Após isso seriam acúmulos e acúmulos de "incidentes" como Thiago gostava de classificar.
— Vamos Laura!
— Você está me assustando!
— Laura... — Thiago respira fundo tornando a baixar sua voz. — Para que prolongar isso? Eu não vou te machucar. Se fosse eu já teria feito. Eu só quero ir embora daqui com você, apenas isso.
— Eu quero ir com você, mas ainda estou com medo.
— Olha que pessoa horrível eu sou! Sei que já te prometi isso outras vezes e entendo suas dúvidas. Eu não vou te machucar, só quero ir com você daqui em paz.
— Vou buscar minhas coisas.
— Obrigado!
Aquela palavra foi sussurrada como um alívio para a sua alma. Como um aval para mantê-la segura não apenas de Bruno, principalmente dele. Laura sumiu pelo corredor no momento em que Thiago retornou para sala e para o mesmo ar que o outro e novamente sentiu um peso sobre seus ombros ao encará-lo.
— Vejo que conseguiram se resolver.
— Escuta aqui seu bosta! Se você se quer pensar em chegar a um metro dela eu te mato!
— Nossa! Acho que é um pouco tarde para toda essa valentia. — Bruno mantinha um sorriso de canto nos lábios como se estivesse se divertindo com tudo aquilo. — Não vamos brigar por conta disso, afinal ambos já tivemos dela o que queria.
Bruno só percebeu o que estava acontecendo quando as mãos sujas de graça de Thiago lhe seguravam pelo colarinho prestes a lhe esganar. O ódio no olhar era sentido em sua pele e mesmo assim Bruno se fartava com a falta de equilíbrio no outro. Era como uma vitória. Tinha conseguido mais uma coisa que queria tirar a razão do irmão ligado a ele apenas pelo sangue.
— Thiago!
Laura chegou à sala no momento exato de impedir seu companheiro de concretizar aquela loucura.
— Solta ele pelo amor de Deus! Não tá vendo que é isso que ele quer!
Thiago puxou-o para mais perto. Seus narizes se tocavam. Seu hálito de cigarro entrava pelas narinas abertas de Bruno lhe causando náuseas.
— Nunca mais você chega perto dela. Não me importo de morrer dentro de uma prisão, não tenho mais nada a perder, você já me tirou tudo! Então pensa, mas pensa mesmo antes de chegar perto dela de novo porque eu não vou pensar duas vezes antes de te matar!
Thiago o soltou fazendo com que caísse no sofá. Dava para ver em volta do pescoço de Bruno às marcas dos dedos de Thiago, mas também dava para ver o sorriso insistente em Bruno.
— Você é tão podre quanto seu pai! O que você fez ou faz não é tão diferente do que ele fez com minha mãe.
— Meu pai? Sua mãe? Engraçado falar assim deles, não seriam nossos pais?
— Você a conheceu? Conviveu com ela debaixo do mesmo teto? Porque uma coisa eu sei, eu não conheci essa merda de gente que foi seu pai!
— Merda de gente! Acho que a única merda de gente foi a sua mãe.
— Isso ela foi mesmo. — Thiago deu de ombros e encarou Laura que lhe suplicava com o olhar para acabar com tudo aquilo. — Estou vendo que falar desse homem é algo que te tira do sério. Como ele pode trocar a esposa que tinha por aquela mulher, isso não consigo entender. Talvez esteja aí à resposta de você ser como é.
— O que você sabe de mim?
Agora era vez de Thiago sorrir com sarcasmo. Estava ali estampado o que abalava o outro, a menção ao pai perfeito que ele julgou ter e que agora era visto como oposto. Um homem cheio de defeitos e segredos. Sem escrúpulos. O fato era que Bruno estava mortalmente decepcionado com o homem que tinha como exemplo e que de certa forma se culpava por não ser como ele era.
— Thiago vamos embora! — Laura estendeu sua mão em direção a Thiago. — Se isso continuar não vai acabar bem. Ambos querem briga e se alguma coisa acontecer eu não vou me perdoar.
Os dois ao mesmo encaram a mulher em seu desespero. O olhar era exatamente igual e aquilo assombrou a alma de Laura. Thiago pegaria a mala de sua mão e arrastou até o elevador. Laura e Bruno não disseram uma única palavra para outro, mas ambos sabiam que aquela não era a despedida definitiva. O adeus entre eles ainda estava longe de ser concretizado o que ela sabia é que o assunto com Thiago iniciado no terraço esse sim merecia um ponto final e era atrás dele que estava indo.
O silêncio entre eles eram preenchidos por gestos. O cuidado dele com os pertences dela ao prender em sua moto. A forma como ele mesmo colocou o capacete para a proteção de Laura e principalmente quando já sentados e seguindo pelo caminho ele segurou os braços dela em volta de sua cintura a trazendo de encontro ao seu corpo como se necessitasse sentir o calor para lhe dar forças.
As lágrimas corriam pelo rosto de Laura e não somente na dela, ele também parou de prendê-las a libertando como se libertasse um animal que mantinha contido ali dentro desde quando ainda era um garoto. Estava deixando sentir, estava deixando ser vulnerável novamente.
— Para onde está me levando?
Laura no breve momento em que o choro cessou percebeu que o caminho tomado por Thiago não lhe levaria até o lar que compartilhavam. O rumo era o mesmo, mas as ruas não.
— Para casa da Cinthia com Samuel.
— Por quê?
— Até que eu arrume outro lugar para você ficar...
— Não estou entendo. Outro lugar? E a oficina?
— Lá não dá para ficar... — Thiago remexeu sobre o assento e Laura afastaria seus braços do corpo de Thiago — Eu destruí tudo por lá Laura.
— Para a moto!
— Estamos quase chegando.
— Para essa droga eu vou pular!
Thiago percebendo que ela afastava cada vez mais o corpo encosta a moto no acostamento. Ele mal havia desligado o motor e Laura já estava diante dos seus olhos removendo o capacete deixando evidente que havia chorado e que agora estava raiva e ao mesmo tempo confusa com tudo aquilo.
— Porque me tirou de lá se não vai ficar comigo? O que você pensa que é? Melhor o que você pensa que eu sou? Uma incapaz?
— Nunca pensei isso Laura! Sei que você sabe se virar sozinha. — Thiago também remove o capacete revelando para ela mais do que preocupação, também as marcas do seu choro. — Só não tem como te levar de volta porque não tem nada em pé lá.
— Não tem problemas. Vamos arrumar juntos.
Thiago desviou o olhar encarando a estrada a sua frente e sentindo seu peito arder. Ele teria de lhe dizer a verdade e aquilo iria destruí-lo.
— Laura, não dá. Você sabe que não dá.
— Então porque foi lá?
— Porque ele não ia ficar com você e eu não queria que você sofresse mais do que eu te fiz sofrer. Vamos! Sobe na moto.
— Não! — Laura seguiu para parte traseira onde Thiago tinha preso sua mala e começou a soltar as amarras. — Eu vou sozinha.
— Laura não precisa ser assim.
— Quer saber? Eu tenho ódio do dia que a notificação chegou!
— Acha que eu não sinto o mesmo?
— Agora você tá livre para começar uma vida nova.
— Laura...
Laura seguia pela estrada arrastando sua mala, onde cabia tudo que possuía tudo que aqueles anos ao lado de Thiago juntou. Sentia-se minúscula e insignificante. Sentia que havia dado tanto e que agora nada recebia em troca. De volta ao ponto de partida e pior, sem um teto.
Thiago a seguiu de longe até que ela estivesse em segurança na casa da amiga. Despedia dela gravando em sua memória a imagem da mulher que amou e que não soube amar. Tinha raiva de si. Da sua incompetência em demonstrar seus sentimentos, de tê-los reprimido e jogá-los da pior maneira, aquela que ele sentia na pele por sua mãe. Nunca desejou ser como ela e mesmo assim fora no que se tornou.
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