Capítulo 13
I'm married to the music
For better or for worse
You say that I'm privileged but
My gift is my curse
I can't recall the last time
Someone asked me how I was
Last I checked I was a fucking wreck
I called for help and no one showed up
I sit in the dirt
Bite My Tongue - You Me At Six
Naquele dia em específico, Leonardo acordou cinco horas da manhã.
Seu objetivo era pôr-se de pé antes que Helena acordasse. Ao levantar-se, observou que ela dormia com um sorriso no rosto; Usual ou não, ele não se importou. Logo foi ao banheiro e tratou de cuidar de sua higiene pessoal. Penteou os cabelos, tomou um banho...
E logo notou um problema: Não havia trazido roupas.
一 Droga! 一 Gemeu ele, nu no banheiro da garota.
Leonardo encarou suas roupas sujas. A camiseta, lambuzada do suor do dia anterior. A cueca, traje íntimo que ele não pretendia reutilizar. Não havia outra saída, pensou. O rapaz curvou-se, pegou a roupa íntima largada no chão...
Quando alguém abriu a porta e entrou de supetão. Helena.
一 EI! 一 Ele berrou, levantando-se e cobrindo suas partes íntimas. 一 EU ESTOU PELADO.
Helena logo percebeu que havia chegado em um momento ruim e fechou a porta de uma só vez. Leonardo estava completamente vermelho, envergonhado com a situação em que havia sido pego.
A garota, contudo, não parecia tão encabulada quanto.
一 Que falta de modos. 一 Ela riu. 一 Quase me esqueci de que você estava aqui.
一 Você me viu pelado. 一 Leonardo não queria nada mais do que se materializar para outra dimensão.
一 Eu já vi muitos homens pelados. E mulheres também. 一 Respondeu ela, com um tom brincalhão. 一 Você não é o primeiro e não será o último, Maria-mole. Anda logo, eu preciso fazer xixi.
A ele, não restava nada além do rubor que tomava conta de sua face. Era isso, ele teria que superar esse momento ruim. Pegou a cueca do chão, virou do avesso e a vestiu; Era o que podia fazer. Vestiu a bermuda, que estava usável, mas quando tomou a camiseta do dia anterior nas mãos, o cheiro quase o fez vomitar.
一 E então? 一 Helena bateu na porta. 一 É para hoje?
一 Eu preciso de roupas. 一 Observou ele, nada satisfeito. 一 A de ontem está fedendo.
一 Eu te empresto minhas camisetas. 一 Sendo ele muito magro, as roupas de Helena certamente lhe serviriam. 一 Estão no meu armário. Pode ir lá e pegar.
一 Eu... 一 Leonardo olhou-se no espelho. Sentia-se uma tripa-seca. 一 Vou ter que sair daqui de cuecas?
一 Se você conseguir teletransportar as minhas roupas, fique à vontade. 一 Ironizou, brincalhona como sempre havia sido.
Ele respirou fundo. Tinha vergonha de seu corpo e, mais ainda, vergonha de como Helena reagiria ao vê-lo. Mas não havia outra opção; Era hora de mostrar seu torso nu para o mundo.
Abrindo a porta do banheiro, o garoto torceu para que o vapor cobrisse seu corpo. No entanto, não foi bem sucedido; Assim que pôs os pés para fora, Helena esquadrinhou seu corpo de cima a baixo, com um sorriso travesso no rosto. Era como se ela estivesse analisando-o.
一 Helena? 一 Leonardo estranhou o comportamento da garota. 一 O que você está fazendo?
Como sempre, ela riu.
一 Devolvendo a indelicadeza de ontem. 一 A garota piscou e, em seguida, lançou um tapa contra a bunda de Leonardo, esgueirando-se para dentro do banheiro e não dando ao garoto tempo para protestar.
Ele, extremamente confuso, apenas permitiu-se entrar no quarto de Helena, ainda processando o que havia acabado de acontecer.
Abriu o guarda-roupa de Helena e buscou uma camiseta de uniforme, das mais folgadas, porque não queria marcar seu corpo magrelo e sem volume; Notou que, fora dos uniformes da escola, a garota se vestia quase que exclusivamente de preto. Além das camisetas, Helena também tinha calça jeans, saias pretas, meias arrastão e sapatos, dos mais variados tamanhos; Os que não eram tênis, eram também da cor preta.
O garoto se vestiu; As roupas de Helena eram perfeitamente confortáveis para ele. Roubou uma meia da gaveta, usou o tênis do dia anterior e permitiu-se correr os olhos pelo quarto. Havia uma guitarra em um canto sem luz, como se a garota quisesse escondê-la de olhares indesejados.
Foi naquele exato momento em que a porta do banheiro se abriu.
一 Você quer que eu te empreste uma escova de dentes? 一 Ela trazia o objeto, ainda na embalagem, na mão esquerda. 一 Está novinha. Nunca foi usada. Se precisar...
一 Você ainda toca aquela guitarra? 一 Não se importando muito com o assunto que ela estava tratando, Leonardo desviou os rumos da conversa.
O olhar de Helena imediatamente foi desviado para o instrumento. Apesar de não ser muito nova, a guitarra estava em excelente estado.
一 Todos os dias. 一 Admitiu ela. 一 Era da minha mãe.
一 Sua mãe tocava? 一 Leonardo não conseguia imaginar essa cena, embora não conhecesse a mãe de Helena.
一 Não. Minha mãe nunca teve muita vontade de aprender. 一 Helena suspirou. 一 Foi uma recordação do meu tio, irmão mais velho dela. Tio Fabrício, me lembro bem. Ele nunca a abandonou, mas morreu muito cedo, em um acidente de carro. Isso foi no começo de 92, ele tinha uma banda na época.
一 E sua mãe tinha muito carinho por ele. 一 Adivinhou Leonardo. Helena concordou com a cabeça.
一 Quando meu avô a expulsou de casa por ter engravidado tão nova, minha mãe lamentou a morte do meu tio. 一 Helena parecia, agora, soturna. 一 Tinha certeza de que ele a apoiaria. Eu tenho minhas dúvidas, mas o fato é que agora ele está morto e ela também. E essa é a única recordação que eu tenho dos dois.
一 Você sabe tocar? 一 Tornou a perguntar Leonardo. Helena assentiu.
一 Aprendi de maneira autodidata. 一 E, pela primeira vez na conversa, esboçou um sorriso. 一 Desde criança eu gostava de mexer na guitarra. E minha mãe incentivava, queria que eu fosse como o tio Fabrício. Sei que já tirava melodias simples com uns treze anos, pouco antes dela morrer. Aprimorei minha técnica com vídeos na internet, mas infelizmente ela não está mais aqui para ver o meu progresso.
一 Uau. 一 Leonardo suspirou. 一 Eu... Queria ver.
Helena ergueu uma sobrancelha.
一 Queria ver o quê?
一 Você tocar. 一 Lançou ele. 一 Aposto que você é muito talentosa.
Ela esboçou um sorriso tímido com o elogio. Não estava acostumada a ser incentivada de maneira tão doce.
一 Talvez outro dia. 一 Tentou se esquivar. 一 Eu não sou tão boa assim. Preciso melhorar muito.
一 Bem... 一 Começou ele. 一 Você disse que tinha composto uma música para mim. Eu acho que tenho o direito de ouvir.
E ostentou um sorriso nos lábios, esperando que aquela desculpa fosse o suficiente. Helena ergueu uma sobrancelha, mas não disse nada; Tomou a guitarra em suas mãos, verificou se ela estava na afinação correta e lançou um olhar tímido a Leonardo.
一 Eu não sou a melhor compositora do mundo... 一 Ela tentou se justificar.
一 Ainda assim é melhor do que eu jamais serei, já que eu não faço porra nenhuma. 一 Tentou ele incentivar. 一 Estou ansioso para ouvir.
Helena sorriu; Dedilhou a guitarra e lançou os primeiros acordes. Leonardo estava com medo que a música tivesse um tom sombrio, tal como os sons que ela estava acostumada a ouvir, mas a música composta por Helena tinha uma atmosfera leve, acolhedora e alegre.
Então, ela começou a cantar:
一 Um sorriso de verdade, garoto, eu te peço... 一 A voz da moça era deliciosamente harmônica e delicada. Bem diferente do que Leonardo estava acostumado nas salas de aula. 一 Antes de dormir eu me recordo do brilho dos teus olhos...
Ele sorriu, esperando até a parte em que tudo faria sentido. Helena abriu a boca novamente para cantar, mas um berro irrompeu do outro lado da casa:
一 QUE BARULHO INSUPORTÁVEL É ESSE? 一 Leonardo definitivamente não o achava insuportável.
Helena interrompeu o som. Suspirou fundo e revirou os olhos.
一 NÃO É DA SUA CONTA. 一 Ela devolveu.
一 PARE COM ISSO AGORA. 一 O rabugento respondeu. 一 EU QUERO VER TV.
Helena estava borbulhando de raiva. Aquele homem a tirava do sério.
一 É só isso que ele faz, no final das contas. 一 Sussurrou, alto o suficiente para que Leonardo ouvisse, baixo o suficiente para que o dono da voz sequer suspeitasse que aquela reclamação havia sido feita.
一 Quem é esse cara? 一 Leonardo sussurrou de volta. Sequer se deu conta de que estavam acompanhados.
一 É meu padrasto. 一 Ela disse, por entre os dentes. 一 Ele é um grande estraga-prazeres. Vou ter que te mostrar sua música em outra ocasião.
一 Como vamos explicar... Você sabe... Eu? 一 Ele não estava muito disposto a pular pela janela. 一 Ele vai achar que...
一 Você transou comigo? Sim, ele vai achar. 一 Helena guardou sua guitarra no mesmo canto escuro de onde a havia tirado. 一 Mas deixe achar. Ele não se importa, e eu me importo muito menos.
***
Helena saiu do quarto carrancuda, evitando encarar Francisco nos olhos. Arrastou Leonardo consigo, fingindo que ele era apenas mais um acessório, fugindo das reações que o padrasto teria.
O pão estava à mesa e João Lucas sentava-se lá como um anjinho. Sequer parecia filho daquele monstro que era Francisco.
一 Achei que você ia me deixar surdo com aquele barulho. 一 A cozinha era conectada com a sala. Da mesa, Helena conseguia ouvir os grunhidos de seu padrasto. 一 Por que você não jogou fora aquela maldita guitarra?
一 Não é da sua conta. 一 Helena partiu o pão e deu metade para Leonardo, ainda sem deixar claro para o padrasto que havia uma quarta pessoa na casa.
一 Você sabe que eu não gosto daquele som horrível. 一 Ele não parecia se atentar muito ao que estava acontecendo. 一 Um dia, eu jogo fora aquela maldita guitarra.
一 Tente entrar no meu quarto. Só tente. 一 Ameaçou Helena. 一 Se preza pela sua vida, é melhor não fazer isso.
Francisco abriu a boca mais uma vez para responder, com a latinha de cerveja na mão, mas naquele exato momento o celular de Leonardo tocou. Era Leonor.
Ele se desesperou; Havia mandado uma mensagem para a avó no dia anterior, mas ela lhe pediu para telefonar de manhã e ele se esquecera. Quando a chamada apareceu no visor de seu celular, o garoto se desesperou, mas não havia muito o que fazer além de atender.
一 Oi, vó. 一 Ele respondeu, um pouco sem graça. 一 Sim. Estou bem. Estou aí de tarde, ok? Beijo, também te amo.
E desligou o celular, mas já era tarde. Francisco o encarava com o cenho franzido, as sobrancelhas unidas, uma expressão de poucos amigos. Ele não era bem-vindo ali.
一 Que porcaria é essa? 一 Indignou-se ele. 一 Minha casa virou motel, é?
一 Exatamente. 一 Helena respondeu, raivosa. 一 Já tinha virado há muito tempo, quando você trazia as suas putas para dormir aqui, lembra?
一 Tem um menino bebendo água na cozinha e eu sequer sei quem é ele! 一 Bufou Francisco.
一 Leonardo, esse é o meu padrasto, Francisco. Francisco, esse é o meu amigo, Leonardo. 一 Apresentou. 一 Satisfeito agora?
一 Eu sei que tipo de amigo ele é, Helena. 一 Francisco tomou um gole de sua cerveja. 一 Ele te comeu a noite inteira. Pensa que eu sou bobo?
一 Que bom que você sabe. 一 Ironizou Helena. 一 E, só para esclarecer, minha vida sexual não é da sua conta.
一 Vai acabar igual à sua mãe. 一 Francisco provocou. 一 Grávida aos 18 de um filho sem pai.
一 Eu tenho pai. 一 Ela grunhiu. 一 Ele era um babaca. Mas pelo menos não é você, seu velho nojento.
Francisco soltou um arroto que fez a casa tremer.
一 Tanto faz. 一 E voltou sua atenção à televisão novamente. 一 Só mantenha essas putarias longe do meu filho.
Helena revirou os olhos e se levantou para coar o café.
一 Como se ele se importasse... 一 Sussurrou.
Leonardo pareceu então notar a presença do rapazinho. João Lucas, não mais do que onze anos. Vestia-se com o uniforme da escola e estava a postos, terminando de degustar seu pão. Era uma graça de garoto, tinha uma cabeleira bonita e olhos penetrantes.
一 Ei, garoto. 一 Ele chamou. Até então, João parecia alheio ao que acontecia ao seu redor; Deveria ser seu mecanismo de defesa. 一 Como você está?
João lançou um olhar para Helena. Ela, com uma caneca de água fervente em mãos, assentiu com a cabeça, como se permitisse a interação. João sabia que não era com todos que poderia contar.
一 Oi. 一 Ele ofereceu a mão para Leonardo. 一 Eu sou o João Lucas.
一 Eu sou o Leonardo. 一 Sorridente, o rapaz cumprimentou o menino. 一 Você gosta do Batman?
E apontou para a mochila do super-herói que o garoto tinha. João Lucas fez que sim.
一 Você gosta? 一 Aquele era um terreno fértil para Leonardo. Saberia conduzir uma conversa daquele tema com maestria.
一 Uhum. Eu tenho várias revistinhas dele. 一 Os olhos do rapaz brilhavam. 一 E também gosto do Homem de Ferro. O que acha dele?
Ao contrário do que o garoto esperava, João não respondeu sua pergunta.
一 Você é namorado da minha irmã? 一 Ele retornou com outro questionamento.
Helena estava com o bule de café em mãos, servindo à mesa, e não pode deixar de sorrir. Leonardo, contudo, ficou encabulado com a pergunta.
一 Somos apenas amigos. 一 Foi ela quem respondeu. 一 Mas Leonardo é um amigo muito especial.
一 Vocês transam? 一 Perguntou João.
Leonardo quase se engasgou com um pedaço de pão, mas Helena apenas riu.
一 Isso não é pergunta que se faça, rapazinho. 一 Repreendeu. 一 Mas, respondendo, não. Somos apenas bons amigos.
João Lucas deu de ombros e levantou-se da mesa, pegando uma caixa de leite na geladeira.
一 Que pena. Achei que vocês combinam. 一 Ele disse, simplesmente, e retornou silencioso para o seu assento.
Helena apenas fingiu que não tinha ouvido e mudou de assunto, conversando com João sobre futilidades, e Leonardo nunca havia se sentido tão encabulado em toda a sua vida.
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