Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

Não me deixes

Manuel sentia-se especialmente nostálgico naquele dia. Ajeitou o espelho do seu carro e olhou para o reflexo. Estava já com uma lágrima matreira, que se escapara sem a sua autorização, no canto do olho.

Viu uma cliente e rapidamente a limpou, ao mesmo tempo que engolia os soluços que lhe começavam a chegar à garganta.

Uma mulher com uma criança entraram no carro.

-Pode levar-nos para o Príncipe Real, por favor?

Manuel acedeu com um grunhido, ligando o motor. Ligou o rádio para não ouvir as conversas que iam lá atrás e seguiu para o local indicado.

Não costumava ser muito comunicativo com os clientes, mas naquele dia ainda menos. Não se sentia disposto a fazer conversa num dia tão triste como aquele era para ele. E para mais, a miúda lembrava-lhe a filha que tanto desejara ter ao pé de si.

Lembrava-se daquele dia em que a mulher que ele amara por apenas uma noite lhe dissera, num tom ácido, quando a encontrara pela última vez, há cerca de 8 anos, «Tens uma filha». Manuel perguntara-lhe onde estava esta, mas a resposta que obteve não foi a esperada.

A filha, a sua filha, tinha ido para o Brasil para lá ser adotada. E ele, impotente, sem dinheiro para a poder resgatar, sem saber para onde a criança poderia ter ido.

Desde essa altura, nunca mais encontrou a mãe da sua filha, supôs que ela tivesse emigrado ou ido viver para outra cidade.

Sabia que nesse momento, a rapariga que partilhava o seu sangue teria 8 anos e viveria, contente, supôs ele, com qualquer outra família. E...

A sua cadeia de pensamentos foi interrompida pela senhora que levara ao Príncipe Real estender-lhe a mão, que continha o pagamento.

-Tenha um bom dia! - murmurou ela, alto o suficiente para que ele ouvisse.

Quando a senhora e a menina sairam, Manuel arrancou até à praça de táxis mais próxima. E, sem nada para fazer de novo, voltou-lhe à memória a filha que adoraria ter ao pé de si.

Talvez a pudesse levar às cavalitas, como via tantos pais fazer, e se calhar, até gostaria de lhe mudar a fralda, quando ela era mais nova.

Deixando-se de pensamentos que o entristeciam, pegou no jornal que estava no tablier e começou a lê-lo, porém o que faltava era paciência para ler tantas coisas tristes numa altura em que precisava de algo feliz.

Abriu o porta-luvas, pondo lá dentro o jornal e saiu do táxi, encostando-se à porta aberta para conversar com os outros taxistas.

Não havia nada que realmente o interessasse que incluisse falar com eles, por isso, voltou para dentro do carro. Pegou outra vez no jornal e, escondendo a cara atrás dele, adormeceu.

E sonhou.

Sonhou que via a filha crescer, que a vestia, que lhe dava banho, que a ajudava nos trabalhos da escola, que a ensinava a andar de bicicleta, embora ele próprio não o soubesse fazer.

Foi um bom momento e Manuel gostou do sonho.

Mas acordou com um homem a bater no vidro. Rapidamente, o taxista recompôs-se e abriu a porta ao homem, levando-o para onde ele queria.

Chegou a casa muito tarde e, entrando, sentou-se confortavelmente na poltrona cheia de nódoas.

Decidiu ligar àquela que fora a sua companheira, talvez ela soubesse onde estava a filha. Não estava de bom humor, mas precisava de notícias reconfortantes, nem que viessem daquela mulher que agora lhe parecia odiosa.

Abriu a agenda cheia de números e letras rabiscados em todas as páginas e procurou a página dos contactos. E lá encontrou o número dela.

Pegou no seu telemóvel e lentamente começou a digitar o número escrito na agenda. As lágrimas chegavam-lhe novamente aos olhos.

Lentamente, mais do que queria, carregou no botão de ligar e o telefone começou a tocar.

E foi nesta altura que se ouviu uma voz feminina dizer: «O número para o qual ligou já não existe.»

***

Nessa tarde, Tomás chegou a casa triste. A namorada, Clara, tinha acabado com ele, ele que já namorava com ela havia três anos.

Estava uma tarde um pouco chuvosa, e, enquanto ensopava os ténis de pano, o adolescente lamentava-se da vida.

Todo ele pingava água quando chegou a casa. Estranhou ver a porta de fora aberta, posto que havia um pequeno aviso colado a dizer para os moradores não se esquecerem de fechar a porta.

O rapaz começou a subir as escadas, na espectativa de poder passar um agradável serão a beber leite com chocolate quentinho enquanto desabafava sobre a sua vida com os seus pais.

Já sentia até o calor da manta em que se ia embrulhar quando chegou ao seu andar. À frente estava uma vizinha, uma velha, bastante simpática, mas que o tratava por «menino Tomás».

-Ai, menino Tomás, nem sabe a grande desgraça que aconteceu.

O rapaz não acreditava nas grandes desgaças da Dona Alice. De cada vez que chovia, nemque fossem apenas uma pinguinha, ela anunciava «uma grande desgraça». Porém, para não ser indelicado, perguntou-lhe:

-Que desgraça foi desta vez?

-Ai, menino Tomás, foi uma grande desgraça, uma grande desgraça, digo-lhe eu. - afirmou a senhora, abanando a cabeça para cima e para baixo.

Tomás seguiu em direção à porta, tirando a chave da mala, quando reparou que a porta estava aberta. Entrou e a primeira coisa em que reparou foi na desarrumação.

A sua mãe nunca deixaria a casa assim, muito menos o seu pai, um conhecido professor catedrático.

Havia papéis espalhados pelo chão, cadeiras e mesas deitadas abaixo, quadros com a moldura ou o vidro partidos e, a última coisa que ele notou, um rasto de sangue pelo chão.

Cada vez mais preocupado, seguiu o rasto e encontrou o seu pai, um homem grande, gordo, de barba ruiva e cabelo preto, com alguns fiozinhos brancos, deitado no chão, com uma enorme ferida na barriga, que jorrava muito sangue.

Mais à frente, na cozinha, encontrou a sua mãe, estendida em cima da ilha, uma ferida deitada sangue na cabeça e uma pistola ao lado.

Levantou o seu rosto, pegando-lhe com a mão. Podia ser já mais velha, mas continuava a ser bonita.

Ao tocar na sua pele, sentiu o frio da morte, algo que ele nunca havia sentido, mas que, com toda a certeza, não queria voltar a sentir.

Embora possa parecer estranho, Tomás não falou, não chorou, não fez nada. Apenas olhou, incrédulo para o corpo da sua mãe, sem poder acreditar.

Pegou no seu telemóvel, ligando para a polícia, para os bombeiros e para o hospital, pedindo-lhes que viessem depressa.

Embora não chorasse, a sua voz estava embargada pelas lágrimas.

Saiu e voltou a ouvir a voz da Dona Alice, mas nem percebeu o que ela dizia. Correu para fora do prédio onde morava e, correndo, desceu a rua até ao jardim.

As lágrimas já lhe tinham enchido os olhos, chorava amargamente, sem emitir qualquer ruído, não cessando de correr.

Encontrou um banco de jardim isolado. Precisava de apanhar ar, de sentir uma brisa na cara e de alguém que lhe dissesse que aquilo não era real. Mas ninguém apareceu. Um silvo ouviu-se, vindo das folhas que rumorejavam com o vento, como que sussurrando algo que ninguém poderia alguma vez ouvir. Talvez lamentando-se por ele.

E era a isso que Tomás estava atento, aos sons da natureza que apenas uma tristeza imensa lhe permitira ouvir.

Nunca pensara que aquele dia pudesse chegar, mas chegara.

E soube que nesse dia, algo se perdera dentro dele. A vontade de viver.

O rapaz passou nesse banco o resto do dia, e a noite, que lhe parecera acolhedora, tornou-se um mundo escuro, destruído, cheio de escombros e ruínas de algo que ele nem sabia o que era.

Por volta das 11 da noite, o guarda pediu-lhe para sair e Tomás assim fez, mas ficou a dormir em casa da Dona Alice, pois a sua vontade era nunca mais entrar naquela casa onde sabia que seria perturbado por imagens aterradoras do seu pai e da sua mãe. Mortos.

Passados uns dias foi o funeral. A polícia investigou o caso, mas nunca descobriram o culpado.

E, depois de Tomás prestar as suas últimas homenagens aos pais, fez uma decisão que mudaria tudo. Decidiu acabar com a sua própria vida.

***

Era já tarde. Tomás estava sentado na margem do rio. Ainda não tinha a certeza se devia fazer ou não aquilo. Tinha trazido pedras com as quais encheria os bolsos.

Não estava ninguém a passar e, sem ninguém que o impedisse, começou a enfiá-las nas algibeiras.

E foi nessa altura que passou um táxi. O vidro abriu-se e o homem lá dentro, espreitando, perguntou:

-O que é que estás a fazer?

O rapaz, ignorando-o, continuou a sua tarefa mais rapidamente. Não lhe apetecia nada que o taxista aparecesse ali para o chatear.

-Queres conversar?

Ele continuou a enfiar pedras nos bolsos, ignorando o homem.

Manuel já sem paciência, saiu do carro e sentou-se junto ao adolescente, as pernas a pairar sobre o rio.

-Vais contar-me o que aconteceu?

-Vai sair daqui? - perguntou o rapaz, de forma pouco educada.

-Não, não vou enquanto não me contares o que aconteceu para quereres fazer... - Manuel não gostava daquela palavra. - Isso...

-Nada de importante.

-Ouve, eu não vou deixar-te enquanto não me contares o que se passa, por isso acho melhor despachares-te. E não queres tirar essas pedras do bolso? Não parece nada confortável.

Tomás esboçou um sorriso irónico, mas tirou as pedras do bolso. Secretamente, desejava ter alguém com quem partilhar a sua dor.

-Vais dizer qualquer coisa ou queres que eu conte a minha história primeiro?

O rapaz acenou com a cabeça em sinal de concordância.

-Eu sou taxista em Lisboa. Vivo na outra margem e tenho uma filha. Só soube que ela existia seis meses após o seu nascimento. Foi a minha companheira que me disse, faz hoje sete ou oito anos. Em recém-nascida, ela foi para outro país para ser adotada e agora vive com outra família, noutra casa, e eu nunca mais a verei.

Uma lágrima solitária rolou pela cara do taxista que a limpou com a mão. Não estava minimamente à vontade para contar aquilo mas, sabendo que podia estar a salvar uma vida, fê-lo na mesma.

-Que triste!

-Pois é. - respondeu Manuel melancolicamente, mas recuperando toda a sua energia logo a seguir. - E tu, vai contar-me a tua história?

-Pode ser. - várias lágrimas desceram até ao pescoço, salpicando a t-shirt, mas ele não se importou. - Ontem à noite, cheguei a casa, triste. À porta estava a minha vizinha a dizer que tinha havido uma grande desgraça. Não fiz caso. Entrei e encontrei os meus pais. Mortos! - Tomás, de um momento para o outro, começou a chorar compulsivamente, as pernas a abanarem sobre os limos da pedra de que era feita a margem.

O taxista passou-lhe um lenço, que ele aceitou, limpando as lágrimas e assoando-se depois.

-Como é que te chamas?

-Tomás.

-Então ouve-me, Tomás. Achas que os teus pais quereriam que tu morresses já, tão novo? Eu sei que te sentes triste. Perder alguém é... Um grande abalo, mas não o suficiente para pores fim à tua própria vida, percebes?

Tomás abanou a cabeça afirmativamente. Percebia perfeitamente o que Manuel queria dizer.

Levantou-se e abraçou-o, um abraço forte, mas ao mesmo tempo inseguro, caloroso, como um abraço de um filho ao seu pai.

A Tomás, soube como ao abraço que lhe faltara dar aos seus pais. A Manuel, soube-lhe como ao beijo da filha, que tanto desejava.

O rapaz partiu, deambulando pela cidade no intuito de chegar a casa e o taxista subiu para o seu táxi, partindo para o seu lar.

Passados 10 anos...

Manuel estava sentado na sua poltrona, já esburacada pelo tempo, mas com o mesmo conforto e a mesma comodiade de sempre.

Tocaram-lhe à porta e ele foi abrir. Era o correio.

Olhou para a parte de trás do envelope, enchendo-se de regozijo e, sentando-se de novo, abriu.

Começava com uma dedicatória que o encheu de ternura: «Querido pai».

Leu a carta.

«Querido pai,

Escrevo-te de França onde estou a passar férias com a Mariana e com os miúdos, o Pedro e a Catarina. Têm saudades tuas e querem ver-te depressa.

Digo-lhes sempre que és como um pai para mim, por isso acho que da próxima vez que te virem te vão chamar avô.

Deixei os negócios da empresa por uns tempos, mas quando voltar, prometo-te que tratarei deles.

Já visitámos Paris e vamos fazer uma viagem pelo Norte. Envio-te outra carta, acho que é um método mais divertido de nos correspondermos.

Mando-te umas fotos também.

Um abraço

Tomás»

Era uma carta breve, mas para Manuel, uma palavra a mais que fosse, estragaria o encanto que nele produziu.

Tirou as fotos do envelope.

A primeira era deles ao pé da Torre Eifell. Mariana era uma rapariga amorosa, loira, de cabelos curtos e olhos verdes, umas sardas por baixo dos olhos e um nariz arrebitado. Os miúdos eram muito diferentes, um loiro parecido com a mãe, a outra de cabelos e olhos escuros, puxava mais ao pai. E Tomás, no meio de tudo aquilo, era um pai de família, orgulhoso e feliz.

Vendo as outras fotos, o taxista concluiu que agora tinha uma família verdadeira.

Voltou a sentir os abraços que Tomás lhe dava, nunca sentira uns iguais. E as palavras ecoaram-lhe de novo na mente: «Querido pai».

2141 palavras

Publicado em novembro de 2020

Conto vencedor do 2.º lugar no Concurso Fantástico - Amarelo Fantástico

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro