Sala de tortura
Fazer uma entrevista, na teoria, é algo simples. Everest , a locutora faz perguntas em prol de respostas do interlocutor -James- ; todavia, sentada ali ,em frente aquele homem, se sente torturada. Uma mulher que já foi reconhecida por ser uma grande escritora, naquele momento ela não é considerada nada. Apenas está ali em função do seu trabalho; logo, depende dessa entrevista para continuar com o emprego de que gosta. Everest então tira o celular da bolsa e liga o gravador. Sua fronte está enrugada, pois sua mente faz muito esforço para enfrentar aquela situação, sozinha, ali, com aquele homem. Ela logo se recompõe e deixa as palavras saírem de seus lábios:
- Farei perguntas simples e espero respostas objetivas.
O homem com a postura perfeita em sua cadeira de braços mantém o olhar calmo para Everest. Ele organiza os lápis na mesa que já estão perfeitamente arrumados.
- E se eu não quiser responder a todas?
Everest vira os olhos levemente e mantém o tom de voz profissional, um sorriso um tanto quanto debochado sai dos lábios finos da mulher.
- Você definitivamente não tem essa opção, aceitou fazer essa entrevista. Foi pago para isso, certo?
James, ainda tranquilo, se inclina um pouco para a frente.
-Tem a língua afiada. Tome cuidado, pois a linha entre a entrevista e o risco de você perder o emprego é tênue.
O homem de cabelo escuro tem um sorriso cordial nos lábios. Eve, com um olhar fuzilante, empurra a cadeira um pouco para trás, engole em seco, comprime os lábios antes de voltar a falar. Ali, em plena tarde, sozinha, naquela sala, com aquele homem, Everest se esforça para ser gentil.
- Certo. Pode me dizer a origem desse lugar tão… encantador?
-Certamente, senhorita Everest! Meus descendentes chegaram aqui há 230 anos. No começo, era somente uma fazenda em que eram cultivados uma agricultura e uma pequena pecuária para subsistência. A terra fértil atraiu vários outros fazendeiros e com o tempo a cidade foi formada.
Everest coloca uma mecha loira de seu cabelo rebelde atrás da orelha demonstrando que a decepção é notória. Ela se inclina um pouco e se mantém indiferente.
- Somente isso? O que eu vou publicar? Isso não é envolvente, não é interessante!
- Mas essa é a verdade e se você quiser saber mais vai ter que me encontrar, amanhã, na sorveteria da cidade, exatamente nesse mesmo horário.
O homem fala levantando-se e vai se aproximando das grandes janelas de vidro. Ele escuta a resposta de Everest que o faz ficar sério.
- Eu já disse-lhe que não estou procurando por ninguém! Além do mais, o que o faz pensar que sairei com você? O quê? É dono de uma empresa no fim do mundo! Grande coisa.
- Eu espero que saia comigo, senhorita Everest, porque desejo conhecê-la e sei que você vai precisar de mais respostas. Você não tem muita opção.
- Ele se vira para a mulher que se mantém fechada, a observa mover os lábios como se fosse falar algo e, instantaneamente, fecha como se tivesse desistido de falar. James logo completa:
- Isso parece um pouco psicopata, eu sei. Eu não sou, apenas quando eu a vi, naquela noite, perdi o fôlego. Foi como se eu tivesse sido atingido por uma onda rápida e pesada que quer me submergir. Adivinhe só, eu não sei nadar. Portanto, não posso evitar esse desejo sufocante de querer conhecê-la.
Everest pega o celular e desliga o gravador. Finalmente ela se levanta, coloca o celular no bolso da calça e se coloca ao lado da mesa. Ela se pergunta como estava se permitindo escutar aquilo? O homem provavelmente está em um surto de carência afetiva ou algo parecido. Ela olha para o lado, como para se refazer, e, logo, fixa novamente o olhar naquele homem.
- Querer não é poder. Já escutou isso? Normalmente, você fala isso para uma criança mimada ou parar quebrar as expectativas do amigo de forma "divertida”. Todavia, não há nada mais simples que isso: você quer e não depende somente disso, pois outros fatores cooperam para isso acontecer. Nesse caso, minha vontade não coopera para acontecer o nosso encontro.
Pensativo, sem se deter em um só ponto, ele a responde:
- Qual sua justificativa para agir de forma grosseira, assim? A vida foi dura demais e você se tornou a garota fria e independente que desdenha de ordem, burocracia e qualquer tipo de gentileza? Enfim, vou esperá-la, amanhã.
Everest se detém, respira fundo e, resignada, se retira da sala sem mais palavras pois não há o que responder. Ao descer pelo elevador, observa que algumas pessoas entram e saem com vários papéis. Talvez ela devesse escrever sobre isso, sobre a facilidade com a qual as pessoas estão a mexer nos papéis, sobre como elas caem em uma rotina e se mantêm na "mesmice".
Já no carro, ela pega o celular e liga para seu editor. Quando ele a atende, ela fala histérica.
-Real? Um idiota. Você me colocou para escrever sobre isso? Não há uma história para esse fim de mundo. Nada.
Thyler , pacientemente, deixa uma risada escapar e logo fala:
- Ó Everest, eu estou bem, também! É adorável receber uma ligação sua todos os dias a cada duas horas. Bom, James pagou uma enorme quantia para aparecer na Revista e fez questão de ser entrevistado por você, eu concordei porque você precisa disso.
Everest fica em silêncio e repassa a "entrevista" em sua mente. Meu Deus, era James que estava pagando para ser entrevistado? Não era a Revista pagando para ele?
Ela então coloca o celular no viva-voz e liga o carro. Precisa tomar distância daquele lugar, urgentemente,
- Isso não faz sentido.
- Não importa, Eve. O cara tem grana e quis pagar pela entrevista. Faça seu trabalho e pronto. Você ganha parte do pagamento.
- Exatamente quanto ele está pagando?
- Alguns milhões.
- Quanto, Thyler?
- 18 milhões.
- Isso é mais do que o capital da Revista. E se eu não quiser fazer?
- Não posso obrigá-la, Eve. A escolha é sua. Essa empresa já fez muito por você, agora, chegou sua vez de retribuir. Essa é uma forma
- Vou pensar no caso. Amanhã, eu decido.
- Certo, Eve! Nos veremos quando você voltar, se cuida.
Thyler logo desliga o celular. No caminho, Everest observa a paisagem que compõe a praça central, velhos e crianças correndo pela praça com total tranqüilidade e segurança. Ao chegar ao hotel ela sobe em silêncio, vai para seu quarto e prepara seu banho de espuma. Ela tira a roupa, pega o celular, entra na banheira, liga o celular na gravação para repetir e ao escutar todo o áudio o coloca sobre a pia que está ao lado da banheira.
- Qual é a sua, James?
Ela recebe o silêncio imperioso do banheiro como resposta. Sendo assim, deixa-se relaxar sobre a água quente que toca em seu corpo como se lhe tirasse todo o peso que sentia. Mesmo assim, fica a pensar se deve ir ou não. Quais são os riscos reais? Que raios esse homem quer? Nada está fazendo sentido! Será que ele é um psicopata? Ou apenas um idiota que acredita em amor à primeira vista e fará de tudo para conquistar a mulher amada?
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