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Com a boca

Johnny Wally, recém-chegado ao Oeste, sabia ainda poucas coisas sobre aquela nova terra, embora a que sempre lhe saltava à vista era a ganância do homem.

Um dia, dando um passeio por Denver, se deteve diante da vitrina de uma loja. Dois homens, dois cowboys quaisquer, passaram por ele conversando. O pintor os acompanhou de esguelha e, assim, naqueles trajes surrados, pareceram muito interessantes... Johnny, nesse dia, sondava um assunto que pintar.

― Então, senhores ― ele estava agora no saloon, numa mesa com uma garrafa, sentado junto aos dois atentos cowboys quaisquer de há pouco ―, eu sou pintor. Pinto pessoas, panoramas.

A dupla, tipos carrancudos, nem piscava.

― Bom... O que lhes quero propor, claro, uma vez que por sua bela cidade tenho passado, é que posem para mim!

― Como é? ― um deles, o louro mais jovem, de barba, perguntou.

― Posar, sabe? ― explicou. ― Ficar parado enquanto lhes pinto.

Ali, os dois acabaram aceitando, é verdade.

Uma vez no quarto de hotel do pintor, com a janela aberta ao máximo para dar luz, os três então se preparavam. Johnny com o cavalete e as tintas; os dois cowboys, no aguardo de instruções.

― Então, moço ― um deles pigarreou a um dado momento ―, como é que temos que ficar?

― Nus!

― Epa ― o outro foi dizendo. ― Você falou que a gente só tinha que ficar parado!

― Sim ― foi a confirmação. ― Só que nus!

Os dois se entreolharam, desconfiados.

― Vamos, rapazes! ― Johnny apressou, impaciente. ― Não temos tempo a perder! Tirem as roupas!

Sob ares de alguma tensão, os dois obedeceram. O pincel de Johnny então foi circulando, instruindo, delineando as opulências varonis, os detalhes da pele, do pelo, do pau, os contornos da luxúria.

O rapaz louro de barba, o jovem e também o mais falador dos dois, tinha a pele nervosa. Nervosismo, aliás, era a estampa dos seus olhos fixos no vaivém devasso dos olhos de Johnny Wally. Nervoso. E Johnny ia tingindo o branco da tela com os tons da sua nudez: a barba malfeita, de dias e dias, o cabelo caindo nas têmporas, o peito e a trilha que os pelos faziam, o suor escorrendo pelas coxas, o pau que, nervoso, enrijecia.

Já o outro, um moreno do tamanho de um armário, mais velho que o louro uns dez anos (teria ele uns 35?), calado feito túmulo, parecia mais à vontade. Revidava a petulância chique de Johnny com aquele seu olhar de diamante negro. Certo, severo, incisivo. E o moreno da sua pele também manchou o branco da tela. O pincel foi correndo pelas coxas, subindo pela cintura, contornando braços e peito fortes, o sexo bailando e bailando entre as pernas, como se tirado para uma dança.

Uma vez pronta, a pintura fulgurava e Johnny sorria para ela.

Os peladões, impacientes da sua nudez, já foram logo se mexendo, se vestindo. Com a mesma irritação, tinham pressa. Cobraram o seu dinheiro, que o tempo rugia e não podiam gastar o dia todo ali. Mas Johnny, que tudo fazia por arte, se surpreendeu:

― Mas não tenho dinheiro, senhores!

O louro cerrou as sobrancelhas num assombramento e foi logo sacando a sua pistola do estojo. Foi o companheiro, o moreno, que o deteu:

― Não... Tem outra coisa que ele pode fazer pela gente.

E os dois se entreolharam, cúmplices. Depois olharam para Johnny.

Aqui, o inglês aprendeu uma dura lição sobre homens americanos e negócios. Não importa de que natureza sejam, precisam envolver dinheiro de modo estritamente direto. E, nesse caso específico, como Johnny andava desguarnecido, as calças desceram aos tornozelos e o pintor teve de pagar com a boca a beleza e a nudez daqueles rapazes.

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