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27 • Incandescente poder da cura

Não contei a ninguém a respeito de meu tenebroso pesadelo. Os dias passaram como um nevoeiro, e todos estão mais focados nas provas de admissão e na formatura que será em junho. Mediante a tudo isso, ainda não sei o que colocarei na cápsula do tempo da escola.

— Com certeza, o meu VHS do "E o Vento Levou" — Lara confessou-me certa vez. 

— Vou entregar o álbum da Copa do Mundo de 1970 — Jake disse. — Pertence ao meu pai, mas acho que ele não vai se incomodar. 

A minha única preocupação, no entanto, é fazer com minha mão esquerda volte a mexer. Paralisou-se por completo. Mesmo depois das extensas sessões de fisioterapia, mesmo depois dos medicamentos, a progressão da doença avança sem piedade.

 "Minha graça é suficiente a você, pois o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza"³⁶.

Hoje é Domingo de Páscoa. Cantarei Amazing Grace na Igreja no culto à noite. Ensaiei da forma como pude, dentro das paredes do meu quarto, embora minha voz sumisse algumas vezes.

 Penteio o meu cabelo com a força que ainda tenho na mão direita. A escova de cabelo vai ao chão. Reafirmando o meu vão esforço em fazer uma tarefa tão simples, tia Ellie ajuda-me a pentear o meu cabelo. Auxilia-me também com o laço em meu vestido branco. Optei por usar minhas meias listradas outra vez, pois só esta semana caí mais de dez vezes, e os hematomas estão por todas as extensões de minhas pernas.

Em pouco tempo, estamos na Igreja recepcionando aos demais membros. Lara e Jake, infelizmente, avisaram-me com antecedência que não iriam ao culto pois ambos visitariam parentes longínquos no feriado. Contudo, para a minha enorme surpresa, John Walker veio ao culto dominical, vestido a rigor com seu terno preto e gravata vermelha. Vejo o Sr. Robert, a Sra. Susan, e a Lucy, que muito amigável, entrega-me um pirulito vermelho embalado em plástico transparente. Agradeço-a, apesar de estar em uma severa abstinência de doces. 

— E hoje estamos aqui, graças Àquele que deu a Sua vida por nós. Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie. Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas³⁷.

Meu tio Carl inicia o culto com sua voz quebrantadora. 

Oramos e logo em seguida, é a minha vez de louvar. Tudo estava indo bem, todavia quando eu fui atingir as notas mais altas, a minha voz desapareceu. Eu não conseguia mais continuar. Um som de chiado arranhava em minha garganta. Daisy Ryan, uma das meninas do coral, imediatamente continuou o refrão, enquanto eu me retirava do púlpito, envergonhada comigo mesma. 

Resolvi tomar um copo de água, e tia Ellie veio averiguar se eu estava bem. Fui para o lado de fora da Igreja, sentar-me nas escadarias e tomar um fôlego. Fiz alguns exercícios de respiração e a minha voz retornara.

— Está tudo bem contigo, Marshall?

Reconheço aquela voz tão carregada de preocupação, e assinto. Era John. Acho que já passamos por isso antes. Eu, sentada na escadaria, ele, em pé com seu terno, totalmente despreocupado. Naquela época, éramos meros estranhos um para o outro. 

— Está muito chique, Walker.

— Robert obrigou-me a vestir o paletó. Comprou um novinho para mim. Ainda assim, eu queria aparecer na Igreja com minha camisa do Superman.

— Não seria nada elegante para um garoto de dezessete anos.

— Legalmente, Marshall, tenho dezoito anos. Meu aniversário foi no dia 31 de março.

— E você não contou para mim? Por quê? — minha voz expressa mais decepção do que o normal. — Passou a semana inteira em silêncio na escola! Podia ter me contado quando estávamos no observatório, John.

— Eu me acostumei a não comemorar mais os meus aniversários. E já faz algum tempo. Ora, não vejo razão nenhuma para isso. Meus pais se divorciaram no meu aniversário de 4 anos, acho que fiquei com traumas de aniversários por causa deste ocorrido. Susan até tentou comprar um bolo para mim, e Lucy empolgou-se para encher as bexigas, mas eu não deixei. 

John solta um longo suspiro e senta-se ao meu lado na escadaria, fazendo-me companhia. Oferece-me uma pastilha de menta e eu aceito.

  — Parei de fumar oficialmente — anuncia, um tanto pomposo. — Obrigado e de nada.

— Essa é realmente uma ótima notícia, John.

— Porém, estou viciado em chicletes e pastilhas de menta. Logo, logo, terei mais cáries que a Lucy. Estava pensando com os meus botões, o que acha de jogarmos four square³⁸?

— Aqui? Sem quadra, sem bola e só nós dois? E, também, eu nunca fui boa nesse jogo, além do quê, estamos em um culto ainda. Conseguiu recuperar a sua jaqueta?

— Lara devolveu a minha jaqueta na quarta-feira, e o meu botton também. 

— Eu avisei que ela lhe devolveria a jaqueta, junto com o botton. Lara é uma garota MUITO cuidadosa.

— Fez até questão de lavar a minha jaqueta, apesar de não haver necessidade.

— Ela gosta de você — digo, sendo uma espécie de "cupido". 

— Também gosto dela. Lara é uma pessoa divertida e bastante confiável.

— Mas não é esse tipo de gostar... Lara gosta, gosta mesmo de você.

— Seria bom se ela não gostasse de mim dessa forma.

 Com um suspiro profundo, interrogo-o:

— Você não quer ela seja sua namorada?

— Não.

— É por causa da Bonnie Tyler?

John olha com uma expressão assombrada. Ele estava pálido, e se eu não o conhecesse, neurótico.

— Como você sabe a respeito da Bonnie?

— Billy Carson contou-me que viu em uma notícia de um jornal local, que você se envolveu em um acidente de carro em que uma garota faleceu. Óbvio que não acreditei nele. Ele deve ter se confundido, e certamente foi outra pessoa que se acidentou, afinal, devem haver outros "Johns Walkers" por aí.

— Ele não mentiu, Mary. Eu realmente matei essa garota.

Meu sangue gela diante daquela frase tão mórbida dita por John.

A expressão esqueletos no armário, significa literalmente quando escondemos segredos embaraçosos ou mistérios do nosso passado que ao revisitarmos nos assombram dos pés à cabeça.

Revelou-me quem era a famigerada Bonnie. A garota de belos cabelos escuros sempre amarrados com um laço vermelho, olhos fascinantes e boca desejosa. Contou-me sobre sua paixão — ou ao menos pensou ser isto —, que sentiu por ela. Disse-me que ela o idolatrava por ser o astro do time de basquete do colégio que frequentou em Los Angeles. Segredou-me que ela, apesar de ser mais nova que ele, era mais inteligente, mais experiente, mais sedutora. Confessou-me que fora com Bonnie que lhe apresentara o álcool, cigarros, festas, enquanto o ingênuo John morria aos poucos, dando lugar a um ser moldado pelas mãos nefastas de Bonnie.

— Achei que Bonnie fosse minha escada para o céu, quando na verdade, era minha bola de ferro e grilhões puxando-me para o inferno. — disse ele.

Levanta-se, ficando de costas para mim. Certamente não sei por que estou tão triste. Talvez, por estar decepcionada comigo mesma por achar que o relato do jornal local sobre o acidente grave que John sofreu fosse falso, e por constatar, que no fundo, John ainda está abalado emocionalmente por causa da morte de Bonnie Tyler. 

— Eu gostava dela, Mary. Gostava de verdade. — John passa os dedos nas mechas petrificadas de gel. — Puxa, eu me gabava para todo mundo sobre a namorada maravilhosa que eu tinha. Achei que fosse sortudo por estar namorando a garota mais bonita e perfeita da escola. Todos sentiam inveja por mim. Tinha uma namorada maravilhosa e era o astro do meu time. Nada poderia me deter. O céu era o limite.

Sorri, amargo.

— Exceto que Bonnie nunca foi perfeita ou maravilhosa pelas costas de seus pais e professores. Eu tinha um melhor amigo, Joe. Sempre contava para ele, meus planos estúpidos. Acredita que eu havia planejado uma vida inteira com Bonnie? Eu era muito ingênuo. Estava cego de amor. Obcecado por Bonnie.

Aperto as minhas mãos. Não consigo sequer medir as batidas do meu coração nesse momento. John ainda permanece de costas para mim, narrando seu infortúnio roteiro. Quero dizer que está tudo bem, espantar as lembranças ruins de perto dele, mas fui eu quem ocasionei a indesejada volta de suas horríveis recordações.

— O que eu sentia por ela, era como um veneno. Sabia que estava me matando, mas eu não conseguia largar. Foi então, que aconteceu. Bonnie simplesmente, do nada, parou de falar comigo. Evitava-me, como se eu estivesse possuído por lepra. Recusava as minhas ligações. E eu não sabia o motivo — John soltara uma risadinha amarga. — Foi então, que eu descobri uma verdade inoportuna.

— O que aconteceu, John? — incentivo-o a continuar a história, afundada em minha doentia curiosidade.

Não se vira um instante para me encarar. Com um suspiro pesado, John continua sua confissão. Tornou-se não mais uma conversa entre ele e eu, mas um monólogo dolorosamente dividido em arcos dramáticos dignos de uma tragédia grega.

— Na semana seguinte, quando coloquei em minha cabeça que deveria esquecer de Bonnie e seguir com a minha vida, vi ela no carro com outro garoto. Ela havia parado de falar comigo a cerca de dois ou quatro dias. Sequer atendia o telefone. Considerei que estivesse tudo bem com ela, quem sabe, aborrecida por causa de todas as Feiras de Ciências que ela participava. Pensei que Bonnie quisesse privacidade. Até fazer a maldita descoberta que me abalaria profundamente.

Eu não deveria ter me exasperado. Não deveria ter cobrado tanto dele. John está em cacos e minha inquisição só o faz ficar ainda mais quebrado, partido em milhares de fragmentos. É doloroso olhar para ele e sinto-me estúpida por tê-lo obrigado a desvelar um passado tão fatídico.

— Naquela mesma semana, quando o colégio entrou em recesso de aulas, descobri que Bonnie estava me traindo. Aquilo me deixou no chão. Traindo-me com meu melhor amigo, Joe. Aquilo era inaceitável. Uma dupla traição. Ela me ignorava como um trapo velho, só para andar de carro para cima e para baixo com aquele pavão exibido. Ela era a minha namorada, ou era apenas eu que achava aquilo. O que ela estava pensando? Bonnie estava me destruindo, me transformando em uma espécie de chacota, em um palhaço. Briguei com meu melhor amigo, nos esmurramos, e depois daquilo, nunca mais tornei a falar com ele.

— John, não precisa continuar...

Ele não está mais ouvindo-me. Sei disso, pois John continua a contar sua trajetória, enquanto o rosto transborda em aflição.

— Resolvi encarar aquela situação. Enfrentei ela. No último horário, entrei em seu carro, sentei no banco do passageiro, deixando-a parcialmente constrangida. Apenas pedi à ela que me desse uma carona, e que deveríamos conversar de forma madura e civilizada. Não demorou muito para estarmos aos gritos, com os ânimos exaltados, desferindo palavras duras um contra o outro. Ela me acusava de não dar a devida atenção à ela, negligenciando nosso namoro, e viu em Joe, um escape. Estávamos nervosos, destruídos por nossas próprias mentiras. Bonnie continuava a acelerar o carro, sem se preocupar com o que vinha à frente. Sabe o que ela me disse?

Meneio a minha cabeça em negação, mesmo sabendo que ele não verá a minha resposta, pois está concentrado demais em repassar-me os detalhes sórdidos de seu passado.

— Bonnie disse: "você foi o pior erro da minha vida". Gastamos todo o nosso vocabulário com palavras sujas e tolas. Ela dirigia sem olhar para estrada, enquanto um caminhão vinha em nossa direção. Tentei, desesperado, tomar o volante de suas mãos. Mas foi tudo tão rápido...

Estou entristecida, Deus. Não quero mais que ele continue a se torturar.

— Ela morreu naquele acidente — John vira-se para mim. — Morreu! Quanto a mim, apenas fiquei com escoriações e sequelas no meu braço direito quando fiquei preso nas ferragens. Isso destruiu o meu sonho em continuar no time de basquete. Passei meses no hospital me recuperando dos meus ferimentos, e quando enfim retornei para a escola, todos me olhavam com ares de julgamento, incriminando-me pela morte da perfeita Bonnie. Os pais dela não quiseram me processar, pois foi averiguado que o carro dela estava com problemas no freio, mas ainda assim, carrego aquela morte em meus ombros. Após isto, minha vida foi uma interminável queda livre, e acabei me tornando tudo aquilo que as pessoas me taxavam. Delinquente, rebelde, imprestável...

Jamais imaginei que o passado de John pudesse me afetar tanto quanto agora. Não há como suavizar o seu semblante contorcido na mais tênue dor. Diferente de mim que necessita de medicamentos variados para tratar minha doença, não sei qual o remédio para apaziguar o intrínseco sofrimento de John. Sua dor não pode ser vista. É invisível e letal. O consome devagarinho, criando em volta de seu coração, uma casca tão dura quanto titânio. 

Retorna a sentar-se perto de mim, exaurido por suas confissões.

— Por muitas vezes, eu pensei em acabar com a minha vida, acredita? Minha mente estava cheia de pensamentos obscuros e degradantes. Um pouco de veneno, uma faca, um salto de um prédio... Alfred procurou de todas as formas ajuda psiquiátrica para mim. Foram semanas e mais semanas de terapia. Até que mamãe decidiu que eu deveria afastar-me daquela escola e daquela cidade, e residir por um tempo em Paradise. Respirar novos ares. Começar de novo...

— A morte de Bonnie não foi culpa sua, John. Você não a matou! — falo conforme a minha voz o alcança. — Eu não deveria tê-lo forçado a contar coisas tão íntimas e que te machucam tão profundamente.

John, enfim, fixa o seu olhar para mim. Nossos olhares se chocam, mas no fundo, estamos sumindo, como estrelas que findam no céu noturno.

— Não queria te fazer sofrer — sussurro para ele.

Observamos pontos cintilantes a dançarem na escuridão à nossa frente. São vagalumes estrelados a desvanecer e a ressurgir com seu brilho. 

— Posso imaginar que esses vagalumes são estrelas cadentes e fazer um pedido?

Sou tão idiota. Temo que essas más lembranças o persigam novamente. Se o coração de John fosse um pedaço de pano, de bom grado, com a linha e agulha em mãos, o remendaria com anelo.

— Nunca percebi o quanto essa cidade é linda — John sorri para o céu, há pouco contara o seu passado, mas sequer parece. — Estou feliz e nem sei a razão. 

Esfrega as mãos no rosto, tentando ocultar as suas lágrimas de mim. Não se preocupe, John. Não direi a ninguém que você também pode chorar.

— Acho que já descobrimos o seu superpoder — diz, mudando de assunto.

— E qual seria, John Walker?

— O poder inestimável de curar corações estilhaçados.

Um sorriso desenha-se por todo o meu rosto.

— Tenho certeza de que a cura de seu coração não foi nenhum mérito meu, John.

 Continuamos a ver os vagalumes em silêncio. Sem que ele soubesse, sigo o conselho dele e finjo que aqueles vagalumes são estrelas cadentes, e desejo do fundo de meu coração, que toda a dor que ele carrega em seu peito seja sanada. 

— Soube que o Cometa Halley fará uma visita à Terra no próximo ano... E ele só passa a cada 76 anos! Será esse cometa o seu "grande milagre", Mary?

— Talvez, John. Continue tentando e um dia você acerta. Vai ver o Cometa Halley comigo?

— Minha mãe quer que eu passe o Feriado da Independência com ela... — John fica cabisbaixo. 

— É em julho... muito tempo depois da formatura.

— Acho que ela quer que eu retorne para Los Angeles. Para a minha antiga casa.

— E você quer retornar para lá?

— No começo, quando pisei meus pés outra vez em Paradise, desejei tanto retornar para Los Angeles, porque eu detestava essa cidade. Quando Billy me infernizou, quis voltar correndo para lá. Mas conforme os dias passaram, eu... — John interrompe-se.

— Ainda quer voltar para Los Angeles, não é mesmo?

John não responde a minha pergunta, ainda fitando com muito ímpeto os vagalumes dançantes. O culto encerra-se e mal percebemos que passamos tanto tempo do lado de fora da Igreja a desvelar nossos segredos. A escadaria, antes silenciosa, testemunha de nossas confidências, enche-se de vozes e passos. No meio dessas pessoas, tia Ellie, que avista-me com John e faz uma expressão de negação. Despeço-me dele e John vai embora com sua família. Queria mostrar ao meu amigo que nada estava perdido. Que havia um Amor maior esperando por ele. Os planos de Deus eram grandes para ele.

• • •

Quando retornamos para casa, recordo em cima da hora que ainda tenho dever de casa a ser feito. Informo aos meus tios que jantarei depois e que estou sem fome.

— Mary, querida, o que tanto você falava com aquele garoto?

— Nada demais, tia. Apenas jogando conversa fora.

— Sei que vocês são amigos, Mary, e que Carl gosta deste rapaz de alguma forma, mas eu não confio nele. Não quero que ele seja uma má influência para você. Sei que é errado julgar as pessoas sem conhecer e já sondei o meu coração tantas vezes, no entanto, eu não consigo dar segundas chances a este tal John.

Entendo as preocupações da tia Ellie, porém acho que ela deveria enxergar além da superfície. 

Tiro o meu vestido branco, com muita dificuldade, e guardo-o com carinho no cabide, selando a porta do guarda-roupa. Visto um moletom amarelo com a estampa de um alce feita em crochê marrom, além de minha calças jeans, e óbvio, meias, desta vez, meias comuns. Faço tudo isso com apenas uma mão.

Minha mão esquerda ainda não mexeu nenhum pouquinho, e tento não ficar alarmada.

— Estou bem — digo a mim mesma, encarando o meu reflexo no espelho, e vou para a sala de jantar.

A sopa de tomate que o tio Carl fez estava boa, mas sorvê-la foi muito difícil. Pareciam haver pregos em minha garganta. Quatro colheradas e dei uma desculpa qualquer de que ainda precisava terminar o dever de casa, pois ainda teria aula no dia seguinte.

Sento-me de frente para a minha escrivaninha, acendo o abajur, e vou desvelando os meus deveres de casa, mergulhando nas equações, e após, nas fórmulas químicas, e mais à frente, na composição de poemas. Assim que finalizo tudo, espreguiço-me, embora não esteja tão tarde assim, pois são apenas 21h00, segundo o visor do meu despertador.

Aproveito para organizar os meus preciosos livros — O Pequeno Príncipe, O Peregrino, Os Miseráveis, Uma Dobra no Tempo, Heidi - a menina dos Alpes, Os irmãos Karamázov, Moby Dick, Viagem Ao Centro da Terra, Orgulho e Preconceito, Alice no País das Maravilhas e Um Conto de Duas Cidades. Eu simplesmente poderia perder horas e mais horas folheando as mesmas páginas, surpreendendo-me com as mesmas histórias, perdendo-me em lágrimas sobre os mesmos parágrafos e finalizando com um sentimento de solidão ao cerrar a capa de couro envelhecida, enquanto vejo meu companheiro de aventuras ser recolhido pela estante.

Sento-me na cama, sentindo que fiz um bom trabalho, mesmo que tenha o feito apenas com um braço.

Ah, já sei o que eu posso colocar na cápsula do tempo da escola! Arranco a foto Polaroid que Cynthia havia tirado de mim e dos meus amigos do espelho da penteadeira, retorno para a escrivaninha e deixo o meu Caderno de Milagres aberto, e sem pressa, colo a fotografia no meu Caderno dos Milagres. Sinto-me inspirada a escrever sem parar. Então, deparo-me com a foto 3x4 de John que ele deu-me de bom grado quando tiramos a foto para o anuário da escola. Acho que ele ainda possui a minha foto. Com a cola bastão finalmente colo a foto dele em meu Caderno. 

Levanto-me da cadeira e subitamente sinto algo errado comigo. O movimento de minhas pernas não é fluido, meu equilíbrio esvanece, e a gravidade pesa em meu corpo.

Dói demasiado. Rasga-me de dentro para fora. Os ossos, a carne, minha cabeça, tudo dói.

O poder inestimável de curar corações estilhaçados.

Não, John, eu não possuo poder algum. Se eu possuísse algum poder, não estaria nestas condições. Meu corpo é como um vaso em cacos, remendado com fita adesiva.

Tento voltar para a minha cama. A caneta tremula em minha mão, caindo ao chão. Tento alcançá-la a tempo, mas em minha realidade distorcida, meu corpo todo insiste em desobedecer-me. Paralisada, escuto apenas ecos. Enquanto a escuridão oprime minha visão, segue-se um baque forte que tranca-me em um pesadelo perpétuo.

Minha mente não trabalha direito. Palavras confusas e difusas misturam-se em meio ao meu desespero.

De repente,
não sinto
n    a    d    a.


Estilhaços da minha alma.

Meu corpo em fragmentos.

Eu estou morrendo.

E
Ninguém pode me
ouvir.
Porque a minha
voz
desapareceu.

Perdoe-me, Lara, acho que não viverei até os cem anos.



˚ . ˚ . * ✧🌌🌠✧˚ . ˚ . *

💫Nota 36: Referência a Coríntios 12:9.

💫Nota 37: Referência ao livro de Efésios 2:8-10.

💫Nota 38: O four square pode ser um jogo divertido para crianças e adultos, mas geralmente é jogado por crianças na escola. Trata-se de quatro crianças cada uma em cima de um quadrado. Ele consiste simplesmente em jogar a bola para alguém para que possam jogar de volta para você. 


E a partir dos próximos capítulos, John voltará a narrar...

Beijos de cereja e vejo vocês na terceira e última parte de Nós!


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