13 - Cores em luz
No final das contas, eu não podia ter ficado mais grata por ter recebido aquele convite para sair. Quando John chegou para me buscar, eu estava me sentindo alguma coisa perto de... deprimida. Ele conseguiu sem nenhum esforço me tirar de lá.
— Que cara é essa? — perguntou quando entrei no carro dele e nem precisou de uma resposta. — Nada disso! Hoje é sexta-feira. Pode ir tirando essa sua carinha de preguiça daí. Nós vamos nos divertir hoje!
— Assim espero! — falei sentindo uma pontada de animação.
Chegamos à pizzaria que eu estava super curiosa para conhecer. A placa toda preta e com suas luzes em neon formando o cartaz de boas-vindas ao clube com o nome Caleidoscópio já dava sinais do que teria lá dentro. A música pulsava já na recepção em volume baixo. Na verdade, Isabel falou que a gente já tinha ido sim, na estreia, mas... eu não me lembrava da experiência, é óbvio.
Com John eu podia ser completamente espontânea. Na companhia daquela pessoa alegre e divertida, sentada do outro lado da mesa, eu me esquecia de que não me lembrava de mais de um ano da minha vida e isso anestesiava algum tipo de dor estranha que eu carregava na alma. A ausência dentro de mim simplesmente desaparecia. Eu podia ser eu mesma, sem medo de estar desapontando ninguém. Eu não precisava pensar se estava agindo como deveria. Eu só agia, e isso era o suficiente. Eu era o suficiente. Eu estava gostando daquilo... mais do que poderia imaginar.
Depois do jantar era a hora da verdadeira festa. A pista de dança ficava adjacente. Inúmeras tigelas exibiam as tintas que poderiam ser usadas para compor a nossa pintura corporal. Um aviso destacava que as tinturas manchavam tecidos e por isso tínhamos a opção de vestir uma capa plástica fina e transparente sobre as nossas roupas para fazer os desenhos. Eu fiz os desenhos no John e ele fez em mim. Naquela luz as tinturas pareciam normais, mas... entrando na sala escura... a mágica acontecia!
O arco-íris de cores luminosas e fosforescentes quase me cegou, tamanho foi o seu brilho. Sob o efeito da luz negra, as cores tomavam novas dimensões. Elas assumiam vida e personalidade própria, com seus modelos desaparecendo e sendo relegados a meras telas. O espetáculo de cores foi maravilhoso! A pulsação da música eletrizava o meu corpo.
Perdida em meio à diversão, um silêncio absoluto obstruiu todo o som que entrava pelos meus ouvidos. O caleidoscópio de cores vivas foi substituído, uma fração de segundo apenas, por um outro parecido: uma floresta escura e cheia de luzes brilhantes. A música voltou. Eu pisquei e voltei a ver aquela visão tatuada sob minhas pálpebras. Cada vez que eu fechava os olhos me desconectava da realidade, mergulhando em imagens de fantasia.
Me senti zonza e me desequilibrei. O que estava acontecendo comigo? A sala desapareceu.
As pessoas se foram. Estou na minha própria cabeça, vendo imagens de um mundo diferente. O barulho inconfundível de uma floresta viva sob a luz da noite cantou com suavidade e mansidão. Cores fosforescentes de uma floresta mágica. O som da água correndo, talvez um riacho, um grilo cantando, um sapo coaxando. Eu sabia, mesmo sem entender como, que já estive ali. As cores. Ainda eram as mesmas cores. Brilhantes e ofuscantes. Insanas e magnéticas! Cores de um... arco-íris noturno.
— Alma? — alguém chamava o meu nome de um lugar distante. — Alma? Alma! Você está bem? — as mãos de John me seguraram e me trouxeram de volta.
O outro mundo desapareceu. A suavidade da floresta se foi. A realidade do clube me atingiu. O escuro e as cores piscando nas pessoas me afogaram. A música absurdamente alta feriu os meus ouvidos e parecia errada e claustrofóbica depois de visitar a sensação de vigor e frescor de uma floresta mágica sob o manto da lua.
— Alma? Fala alguma coisa comigo! Por favor! Você está bem? — o tom de desespero do rapaz me fincou na realidade porque o meu subconsciente desejava com veemência se perder outra vez.
— Estou. — nem eu mesma ouvi — Estou! — gritei por cima do barulho abrasador. Aquilo não era música, era caos! Já estava assim quando cheguei?
— Você está sentindo tonteira? — ele devolveu.
— Não! Estou bem! — cada vez que eu piscava podia ver um flash daquela paisagem perdida e incandescente, mas agora não era mais vivo e real como antes. Ainda assim me dava frio na barriga de empolgação. E o cheiro... ainda podia senti-lo no nariz, o cheiro fresco do ar puro. — Podemos ir para casa agora?
Será que alguém tinha me drogado? Essa ideia me horrorizou. Eu estava me sentindo tão normal! Mas eu alucinei, sem dúvida nenhuma! Cheguei a sentir o frio da brisa arrepiando os meus braços e o mato molhado de orvalho. Um mundo que os meus olhos nunca viram em lugar nenhum. Já expressei minha opinião anteriormente sobre ter controle de mim mesma. Espero de verdade que ninguém tenha me drogado!
John me levou para casa. O caminho foi absorto e avoado, embora meus olhos estivessem no exterior exibido pelas janelas do carro, minha mente tentava com afinco retornar àquele lugar mágico. Eu não conseguia mais ver e sentir as imagens, apenas me lembrar delas. Foi só quando o movimento do veículo mudou que eu percebi que estávamos em frente ao meu prédio.
— Já chegamos?! — levei um susto. O carro estava parado, com o motor desligado e o motorista me olhando com preocupação.
— Já. Já chegamos. — a mão dele pousou suavemente sobre a minha. — Tem certeza que está se sentindo bem? Você não respondeu a nada do que eu falei com você o caminho todo. Estava completamente distraída.
— Desculpe. — fiquei um pouco envergonhada. Isso não tinha sido muito educado da minha parte. — Eu... acho que fiquei enfeitiçada com as cores. — isso era verdade, só que não eram as cores do lugar de onde ele pensava. Arco-íris noturno... de onde conheço isso? Eu sabia que o nome daquela floresta era esse, arco-íris noturno.
— Acho que isso é bom, então. Não tenho muita certeza. — franziu a testa.
— Eu estou bem, juro. — abri a porta ao mesmo tempo em que desabotoava o cinto de segurança. — E adorei, John. — falei com um sorriso. — Foi mesmo muito divertido, obrigada.
— Eu te levo até à porta.
— Não precisa. — recusei.
— Nada disso, eu faço questão. Vai que alguém te sequestra no meio do caminho. — protestou caminhando ao meu lado.
— Nos vinte passos que separam o carro do portão?! — gozei.
— Mas é claro! Eu faria isso se tivesse a chance. — devolveu rindo.
— Certo. — a chave encaixou na fechadura e o portão se abriu. — Então aqui estamos. — ele fez menção de entrar. — Agora você já pode ir para casa.
— Eu disse até à porta. — John respondeu.
— Aqui já está bom. — coloquei a mão no peito dele e bloqueei a passagem. — Tenho certeza que posso subir as escadas sozinha. Em segurança! — frisei.
— Não posso subir? — ele parecia meio ofendido.
— Não precisa e não seria um comportamento adequado entre dois amigos. — passei para trás do gradeado branco antes que ele tivesse tempo de pensar em fazer mais alguma coisa. A nossa noite já estava encerrada.
— Então é isso. — ele enfiou os dedos pelas gretas abertas e encostou a testa no metal. — Fazer o que? — os olhos escuros como os meus expressavam um pouquinho de pesar e muita resignação. — Boa noite, Alma.
— Boa noite, John.
Fui direto para o chuveiro tirar o suor do corpo. A água quente começou a escorrer pela minha pele numa agradável sensação de conforto. Rapidamente a minha mente voltou ao assunto que a estava seduzindo. Arco-íris noturno. Cores feitas puramente de luz. Aquelas cenas ficaram estampadas no meu cérebro feito marcas de carimbo. Aquelas cores estupendas e eletrizantes em faíscas loucamente fosforescentes no frescor de uma floresta viva. Só tinha uma cor dentro daquelas imagens que ficou ainda mais fortemente gravada em mim. Só uma cor tinha um magnetismo ainda mais fantástico do que o arco-íris noturno. Só uma cor me fascinava com uma magia maior e mais profunda. A cor do sorriso dourado dentro daquelas pedras de esmeraldas olhando fixamente para mim.
Gael Ávila. Eu ainda não tinha visto os olhos dele sorrindo assim.
Cores feitas de luz? Eu sabia que aquilo não existia, e sabia que aquilo era real. Eu já tinha ido àquela floresta com ele. Eu já estive lá... e ele foi o meu guia.
Alma se lembrou lá do livro 1! Será que esse é só o começo?
Por hoje é só, espero que tenham gostado. Nos vemos de novo semana que vem.
Monte de bjos!
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro