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União e Separação

Nos últimos anos Kaira esteve se especializando não apenas na arte da medicina e das lutas, mas também em algo mais complicado.

Linguagens de programação.

Tudo o que as pessoas faziam em um computador, num telefone inteligente ou em qualquer aparelho eletrônico tem algum tipo de código por trás ditando o deve acontecer, ou seja, determinando como o computador ou programa que estamos usando deve funcionar.

O interessante era como esses códigos eram escritos, coisa que ela só passou a se importar depois de precisar usar.

Assim como existiam milhares de idiomas no mundo, no ambiente digital existiam milhares de linguagens de programação diferentes e são elas que fazem com que grande parte da tecnologia que usamos funcione.

Cada uma delas é composta por termos e comandos específicos que são usados para criar coisas como páginas da web, aplicativos e, basicamente, qualquer tipo de software.

Linguagens como Javascript, Python e Java eram usadas em sites com diferentes propósitos. Por exemplo, o Javascript era usado para dar interatividade às páginas, enquanto o Java era normalmente usado em servidores da web. Por outro lado, o Python era usado em projetos de "machine learning" e processamento de linguagem natural.

Outro exemplo que estudara era o C ++, que era usado em muitos lugares para fazer coisas como programas de desktop, jogos e servidores web.

Também havia o HTML e CSS. Estas não eram tecnicamente linguagens de programação, mas normalmente Kaira as usava para determinar a estrutura, funções e aparência de um site.

Esses exemplos eram apenas algumas das linguagens mais populares entre os programadores, mas havia muito mais, isso porque cada uma funcionava de maneira diferente.

Para que ela precisava de tudo isso?

Bem, o plano inicial de Kaira era acessar o "mundo sombrio" da Web, mas naquela época ele não fazia ideia do quão difícil seria. Não dava para simplesmente jogar no Google e encontrar, aquilo exigia uma completa preparação de códigos e proteção.

Além de que, com suas pesquisas, descobriu as diversas "camadas" da internet.

No começo ela achava que encontraria os grupos anti-espécie na Deep Web. Bom, havia alguns deles lá, mas na maior parte eram apenas idiotas fazendo farra, porque o verdadeiro mal estava no que chamavam de Dark Web.

Pois é, não dava para pesquisar Grupos Anti-Espécie no Facebook e encontrar uma mina de crimes.

O buraco era bem mais embaixo.

Primeiro ela começou entendendo o que era a Web de fato. Era a parte que acessava todos os dias, em que encontrava sites de tecnologia, serviços essenciais, lojas eletrônicas, redes sociais ou canais de entretenimento, é a World Wide Web ou internet, também conhecida como Surface Web. No entanto, ela é apenas uma parte muito, muito superficial da web como um todo.

Não por acaso, a metáfora mais utilizada para ilustrar a web era a do iceberg: nela a Surface Web é apenas a área aparente, que fica acima do nível do mar. Abaixo dela está a Deep Web, e dentro desta, a Dark Web.

A Deep Web era a camada de sites que fica imediatamente abaixo da Surface Web. Normalmente se entendia que tudo o que não é visto livremente na internet faz parte da Deep Web. Mas atualmente, usa-se a terminologia para se referir a endereços que não são indexados por motores de busca, como o Google e o Bing. Aqueles sites precisavam ser assim por uma série de motivos como segurança e privacidade.

Kaira pensava na Deep Web como os bastidores da internet: era nela que se encontravam dados cruciais para a manutenção da rede, que não podiam ser acessados por pessoas comuns; nesses casos, só quem possuia o endereço e credenciais podiam entrar. Estavam lá os bancos de dados acadêmicos, registros médicos, informações confidenciais de segurança nacional, registros financeiros, artigos científicos e repositórios de algumas ONGs.

Embora não indexáveis, era possível acessar sites que exigem login usando navegador de internet comum. Entretanto, se a pessoa não pretendia ter o seu acesso a eles rastreado, precisaria usar um rede de proteção, como o Tor, um software livre e de código aberto que oferecia comunicação segura ao navegar na Internet. Esse tipo de navegador, além de proteger, também permitia acessar o que não está na superfície.

Quem acessava a Deep Web através de softwares específicos não necessariamente desejava cometer crimes, foi o que percebeu logo, no geral esses indivíduos não queriam ser rastreados e muito menos que seus trabalhos fossem indexados na Surface Web. Isso valia tanto para agências governamentais, quanto para administradores de dados de tecnológicos, jornalistas, ativistas ou qualquer tipo de pessoa que corra algum risco em se expor online.

E então havia aquilo que a Kaira buscava. A Dark Web, onde as coisas começavam a ficar sinistras.

A Dark Web era uma pequena parcela da Deep Web, também composta por sites e redes que não eram indexados pelos mecanismos de busca. Porém, diferente da primeira, a quase totalidade dos domínios nesta parte da web eram voltadas para práticas criminosas, de todo o tipo que podia imaginar e que se mantém escorada na dificuldade de rastreio nas redes.

A maioria dos domínios da Dark Web eram compostos por strings de letras e números sem o menor sentido e apenas quem possuia os domínios e credenciais completos era autorizado a entrar nesses sites. O acesso a essa parte sombria da web exigia o uso de ferramentas poderosas de criptografia e proteção dos dados, já que os ataques direcionados a pessoa que o acessa, caso seja corajoso o bastante para tal aventura, serão constantes.

Na Dark Web havia sites associados a tráfico de drogas, exploração infantil, serviços de assassinos de aluguel, sites com vídeos reais de pessoas sendo torturadas até a morte, domínios voltado a tráfico humano, sites de sexo voltados a preferências geralmente perturbadoras para a maioria das pessoas e por ai vai.

E era nessa parte da web em que se encontravam também os famosos fóruns de discussão de grupos radicais, onde se organizavam criminosos de todos os tipos; crimes de racismo, terrorismo, incitação a crimes e divulgação de materiais ligados à pedofilia.

Era um antro de maldade, sim, ela sabia.

Mas, como Forest havia dito no passado: fique perto do seus amigos e ainda mais dos inimigos.

O seu primeiro objetivo estava completo. Ela havia conseguido entrar na Dark Web e, atualmente, fazia parte de vários grupos Anti-Espécie e o principal e mais importante: encontrara aqueles malditos tatuados.

Para a sua surpresa, ou não, descobrira que não era nada fácil ser uma deles.

Fazia algum tempo que estava criando sua identidade. Falsa, claro. Ela precisava ser alguém no mundo lá fora, ter um histórico com vínculos e informações que parecesse verdadeiro. Fez questão de montar o melhor currículo que podia de si mesma, mas sem exagerar... muito.

Fora necessário um bom tempo e acumulo de dor de cabeça para inserir as informações falsas no sistema de forma que a genuidade da identidade parecesse autêntica e de acordo com  as leis de regulamento aplicáveis ao uso da informação.

Dizer que lera e pesquisara pouco sobre o assunto era mentira.

Com acesso aos grupos do inimigo e com sua identidade falsa, Kaira podia se passar por uma deles com facilidade, espalhando ódio e preconceito nós fóruns da Dark Web, além de se aproximar de perfis que poderiam a "beneficiar" naquele meio.

Dinheiro era outro ponto a ser explorado.

Ela ganhava alguns créditos com o serviço no Centro Médico, mas não era o suficiente para os seus planos e para os acessórios que precisaria, então começou a fazer um serviço... criminoso.

Depois de criar sua própria identidade e histórico falso, percebeu que era muito boa naquilo e não podia jogar aquela habilidade fora.

Era um crime federal? Sim. Uma fraude? Sim. Rendia dinheiro? Sim.

Era o que importava.

Ninguém poderia rastrear seu IP ou descobrir a cabeça por trás da conta bancária. Ninguém além de Aaron, claro, mas lidava com ele.

Não era nada fácil esconder suas atividades dele, por isso, quando estavam sozinhos, Kaira o mantinha ocupado com suas perguntas o máximo possível. O enchia com suas curiosidades e problemas.

Dar brecha para o homem seria o mesmo que entregar seus planos de mão beijada e perder tudo naquela altura do campeonato não era uma opção.

Era difícil e ela tinha um milhão de motivos para desistir e apenas um para continuar: vidas para salvar.

Kaira soltou um suspiro e se levantou da cadeira. Deu uma breve olhada no próprio quarto e não podia dizer que gostava do que via. Era uma zona de livros, cadernos e acessórios, principalmente em cima da cama.

Tinha dormido sobre eles na noite passada, ao chegar morta do serviço.

— Por isso minha coluna dói — resmungou e pegou sua bolsa, saindo do quarto.

Encontrou Leon no meio das escadas, ele estava com aquela carinha emburrada de sempre e com os braços cruzados, ocupando todo o caminho.

— Saí da frente, Golias.

Os lábios dele se crisparam em uma linha de desagrado. Ela o achava uma gracinha, mesmo que sério e agora enorme. Ainda era humilhante que seu irmãozinho a tivesse ultrapassado em altura.

— Pode passar... little miss.

Ela mostrou a língua para ele enquanto descia os últimos degraus.

— Tem que melhorar essa criatividade.

— Prefere que eu te chame de Smurfette? — Leon a olhou de cima a baixo. — Com essa altura e uniforme azul...

Kaira apenas mostrou o dedo do meio e deu as costas ao irmão, passou correndo pela cozinha e com um papel pegou um punhado de batatas fritas.

— Não vai almoçar, querida? — sua mãe perguntou. — Você não deveria comer algo decente?

— Tô atrasada — respondeu de boca cheia. — Vou comer uma bobagem depois.

Stella colocou as mãos na cintura e a perscrutou com seriedade.

— Saco vazio não para em pé, principalmente se for como você.

Kaira revirou os olhos.

— Eu sou enfermeira, dã — soltou risadinha. — A minha saúde está ótima! Tchau! Amo vocês!

🌡️

— Não precisamos de você aqui hoje, Kaira.

Ela acompanhou os passos rápidos de Forest que, com uma planilha em mãos, dava ordens em voz alta.

— Como assim não precisa de mim hoje? — retrucou, imitando a voz grossa e ganhando um olhar duro do amigo. — Posso ajudar com os novatos... aliás, por que raios ninguém me falou que tinha carne nova chegando?

— Se esqueceu do que fez da última vez?

Kaira tampou a boca com a mão, escondendo um riso.

— Não vai acontecer novamente!

Forest se virou e a olhou de perto, franzindo as sobrancelhas.

— Assustar os humanos com histórias falsas não nos ajuda de forma alguma.

— Eu só não queria que alguém tentasse alguma coisa!

— Vá embora — ela revirou os olhos. — Vai ter folga duas vezes na semana agora — Forest leu no papel, sem prestar atenção na expressão dela. — Deveria ligar para o Salvation.

— Por quê?

Forest balançou os ombros.

— Sei lá, ele apenas disse que precisava falar com você.

— Tá — Kaira ergueu as mãos para cima. — Folga, né? — perguntou ironicamente. — Okay!

Ela saiu do Centro Médico e dirigiu até o prédio de criptografia, onde passava o seu tempo livre. Cumprimentou algumas pessoas no caminho e, ao ficar sozinha na sala cheio de aparelhos e fios, pegou o celular e ligou para Salvation.

Não demorou para ele entender.

— Oi, Sal, quer falar comigo?

— Sim, sim! — ele respondeu bem alto. — Que bom que ligou!

Ela jogou a mochila de lado e sentou na frente do computador, girando em sua cadeira de rodinhas.

— Do que se trata?

— Sua irmã.

🌡️

Bravery pulou de um lado para o outro, passando por cima de Noble e subindo na beirada do sofá. O pequeno ficou parado e em silêncio, observando-o e, quando Noble o encarou de volta, Bravery desviou os olhos como se não estivesse tentando nada.

Voltou sua atenção para a televisão, fingindo que realmente se importava com o campeonato de basquete.

— Irmão.

— Irmãozinho — pressionou os lábios com a expressão engraçada na semblante de Bravery. — O que foi?

— Pode mudar de canal? Basquete é muito chato.

Noble olhou para o irmão e riu, então jogou o controle para ele e chegou para o lado, indicando para que Bravery se sentasse.

— O que quer assistir?

— Carros!

Claro que é Carros, pensou consigo mesmo. Noble já conhecia as falas dos personagens de cor, afinal, como não saberia assistindo aquele filme todos os dias? As músicas da Rota 66 estavam gravadas em sua mente.

— Você quem manda, Bravery.

Embora tenha visto umas mil vezes aquele desenho, ainda era engraçado ouvir Bravery dizer que queria ser como O Rei, então Noble brincava, perguntando como ele se tornaria um carro azul e velho.

Estava realmente prestando atenção no filme quando seu celular tocou, então se afastou para atender ao visualizar o nome da Kaira na tela.

Atendeu e, antes que pudesse dizer qualquer coisa, ela começou.

— Eu tenho algo para mostrar a você.

— E ai — sorriu igual a um idiota para o telefone. — Tudo bem?

— Uhum.

— Pensei que você estivesse no Centro Médico, gata. 

— Adicionaram mais alguns funcionários, sem me dizerem — ela reforçou a última parte. — Agora tenho dois dias de folga. Surpresa!

— Então me ligou morrendo de saudades? Quer sexo por telefone?

Kaira bufou do outro lado, ignorando a brincadeira dele.

— Se você tiver algumas horas livres, adoraria compartilhar os detalhes de uma obra-prima.

Noble sorriu maliciosamente.

— Eu conheço todos os detalhes de uma obra-prima.

— Obrigada pelo elogio, mas estou falando de outra maravilha.

— Venha para casa e pode me mostrar o que quiser.

— Não! — Kaira falou algo, quase gritando. — Venha para o prédio de criptografia, o que quero te mostrar está aqui.

Ele tombou a cabeça para o lado, curioso.

— É algum tipo de fetiche estranho? — perguntou, apenas para a provocar. — Dentro do laboratório é frio, eu realmente não quero transar em cima de uma mesa gelada.

— Eu juro, Noble — Kaira resmungou. — Mais um comentário idiota e eu não te mostro nada.

Ergueu a mão livre para cima, encolhendo os ombros.

— Tudo bem, estou nas suas mãos, senhorita. Daqui a pouco estou ai.

Noble se despediu do irmãozinho e partiu para a Reserva.

🌡️

— Cheguei! 

— Finalmente! — Kaira girou com a cadeira e sorriu. — Vem cá!

Ele nunca fora um grande fã daquele laboratório gelado e cheio de fios se espalhando como cobras pelo chão e teto. Computadores não eram o seu forte. Kaira dizia que ele era preguiçoso para lidar com a tecnologia, mas não era verdade.

Noble apenas preferia outras atividades, de preferência no ar livre e não preso em uma sala.

Aproximou-se da cadeira onde a companheira estava e Kaira se levantou. Noble sentou e ela logo depois, sobre suas coxas. Abraçou a cintura dela.

— O que tem para me mostrar?

— Hm... — ela se espreguiçou como uma gata em seus braços e depois se esticou para frente, capturando um objeto em cima da mesa. — Aqui!

Kaira ergueu a mão e Noble estreitou os olhos.

— É um... carrinho de controle remoto?

O rosto dela se contorceu em uma careta.

— Três caixas de engrenagens independentes quádruplas permitem que ele vá de zero a vinte quilômetros em menos de quatro segundos, fiação interna de dez quilômetros — Kaira girava o que para ele era um carrinho com carinho e com um orgulho brilhante nos olhos. — Mil componentes maquinados habilmente e montados à mão, controle perfeito em mais de 300 metros. Mas tudo que o que tem para me dizer é que é um... carrinho de controle remoto?

— Hã... desculpa?

Kaira riu, balançando a cabeça e ele se sentiu incomodado e até mesmo envergonhado por não entender daquelas coisas.

— Eu prefiro chamar de drone.

— Certo, drone.

Ela gargalhou de novo, jogando a cabeça para trás.

— Tudo bem, não estou magoada por ter chamado a minha grande obra de brinquedo — Kaira colocou o drone na mão dele. — Na verdade é para você.

Noble olhou para aquele monte de peças sem entender nada.

— Por quê?

Kaira balançou os ombros.

— Um presente meu para você — ela olhou para o drone. — Eu estive construindo ele há algum tempo — bufou. — Não é nada fácil, na verdade, com tantas peças e a placa, e então a programação, o sistema de controle e mais...

Ele não estava realmente prestando atenção em todos os significados do que Kaira dizia, embora ouvisse suas palavras com devoção. Era adorável quando ela falava por horas e horas sobre seus interesses e trabalho, mesmo que ele já houvesse ouvido antes. 

Noble não entendia metade do que estava ouvindo, mas ainda assim mantinha os olhos nos dela, como se de fato compreendesse.

— Eu precisei comprar as peças de fora, então comprei mais um punhado de coisas. Presentes. Quero os distribuir o mais rápido possível.

— Presentes para quem?

— Para todos! — Kaira passou os braços ao redor do seu pescoço. — Esse drone não é nada se comparado ao que te aguarda.

Os lábios dela se aproximaram dos seus, mas ela se distanciou quando Noble pensou que iria ganhar um beijo.

— Calma, rapaz — ela murmurou, tocando o drone na mão dele e depois seu rosto. Os dedos macios e femininos percorreram sua mandíbula em um carinho suave. — O que é seu está guardado. Apenas espere.

🌡️

Kaira ficou observando as costas de Noble enquanto ele se afastava do prédio. O companheiro havia lhe dado adeus assim que Aaron chegou para trabalhar. Segundo as palavras de Noble, dois nerd's juntos era demais para lidar.

Deixou que ele levasse o drone, ou melhor, o carrinho de controle remoto. Por Deus, ela queria dizer logo a Noble o motivo de ter o deixado com ele, mas não podia.

Noble teria que descobrir sozinho e apenas depois que seu plano desse certo.

Tudo precisava ocorrer de maneira correta.

Ela voltou para dentro do prédio e, por conseguinte, para o laboratório. O calor do corpo de Noble fez falta ao sentir o ar frio contra sua pele quentinha.

Pretendia caminhar até sua mesa e continuar com suas pesquisas, talvez lesse alguns artigos importantes, mas a conversa de Aaron com alguém por vídeo chamou sua atenção. Kaira se aproximou por trás e não se incomodou em se mostrar para sabe-se lá quem.

— Quem é esse? — perguntou para Aaron, que se moveu muito rápido pela chegada dela.

O homem do outro lado da tela a olhou com espanto quando Kaira apareceu na frente do computador, mas depois abriu um grande sorriso e gritou uma palavra em russo.

— O nome dele é Andrei, um amigo do passado.

— "Um amigo do passado" — Andrei gargalhou alto e o bom humor dele fez com que Kaira acenasse. — Eu protegi a sua bunda por muito tempo, T — o cara se levantou do outro lado e ela o observou mais atentamente. Ele era enorme. — Servi por um bom tempo ao lado do seu pai como um escudo, garota, sempre cuidando das costas desse nerdzinho — o homem riu sozinho e depois olhou para ela. — Entendo o porquê de esconder essa gracinha, muito bonita a sua filha, Aaron.

Andrei era um homem de estatura alta e um físico realmente impressionante, com músculos fortes por todo o corpo. Ele estava usando apenas uma calça de couro preta com uma pequena corrente na lateral e uma jaqueta preta aberta e sem mangas, com nada por baixo além de um pingente prateado. Possuia olhos cor de âmbar e uma longa cicatriz sobre seu olho esquerdo, a qual se arrastava verticalmente sobre sua pele, desde a bochecha até acima da sobrancelha; fina e da cor da pele, o que dizia que estava lá por um bom tempo. Tatuagens cobriam seus braços por completo; seu cabelo escuro estava penteado para trás e parcialmente raspado nas laterais e ele tinha uma barba rala na mandíbula.

Aaron ignorou o último comentário do amigo.

— Me lembro de ter salvado sua pele algumas vezes também, Andrei.

— Porra, T. Você chama isso de salvar minha pele? — Andrei apontou para a cicatriz em seu rosto e Aaron segurou a risada. — Você é um merda salvando vidas.

Aaron bufou. 

— Admita que pelo menos isso o ajudou com as mulheres.

— Bom — Andrei sorriu maliciosamente. — Você tem um ponto. Elas sempre estão interessadas na minha história. Papo vai, papo vem... o resto eu te conto quando nos encontrarmos.

Kaira se intrometeu e perguntou:

— Você está vindo para cá?

— Não agora, gatinha — ele piscou. — Estou esperando o convite.

— Ah, cala a bo—

— Pois se sinta convidado por mim — interrompeu Aaron, o que fez o outro rir mais. — Venha nos visitar, Andrei.

— Obrigado, Kaira. É bom saber que existe alguém mais educado nessa família.

Alguém gritou por Andrei do outro lado e ele gritou ainda mais alto de volta, então ele começou a discutir em russo com quem fosse a pessoa.

— Para a infelicidade de vocês estou de saída, parece que Lucis precisa da minha companhia até para ir ao banheiro.

Kaira não estava entendendo nada, mas deu um adeus para Andrei e a tela apagou.

— O que aconteceu aqui? Quem é Lucis?

Aaron soltou uma risadinha e girou na cadeira de rodinhas.

— Lucis é companheiro do Andrei.

— Romanticamente falando?

Aaron negou, rindo ainda mais da expressão dela.

— Eles são bons amigos. 

— Como os conheceu?

— Servi por um tempo com os dois em uma companhia privada. Andrei era um segurança e o Lucis trabalhou comigo na área de programação, mas um belo dia ele decidiu que não queria mais aquilo e saiu fora. Andrei o seguiu sem nem hesitar... eu dei o fora um tempo depois.

— Por que Lucis saiu?

— Bem — Aaron pareceu pensar cuidadosamente nas palavras. — Ele disse que estava cansado de escrever programas para guiar armas. Lucis não queria mais ficar lá, eu o entendo. Havia muito poder nas mãos dele. 

— Você também saiu por isso?

— Não. Eu sai porquê tinha outros objetivos, mas admito que a saída dos dois me motivou.

Kaira se sentou e passou os olhos brevemente pelas pastas sobre a mesa de Aaron. Ela conhecia aquelas páginas de trás para frente. Eram os arquivos de grupos Anti-Espécies.

— E o que significa T? — perguntou. — E a primeira letra do seu nome de verdade?

Aaron estreitou os olhos.

— Você realmente não deixa nada passar despercebido, não é?

— É apenas curiosidade — cruzou os braços, sorrindo. — Então, vai me dizer ou não?

— Eu já disse, Kaira — ele virou de volta para o computador. — Você precisa descobrir sozinha.

Ela se levantou e seguiu até a própria área de trabalho, mas, antes de se sentar, virou-se para Aaron.

— Talvez eu faça uma ou duas ligações para Andrei.

— Não jogue tão baixo.

— Fica difícil com você contando as coisas pela metade — Kaira se virou de costas e fingiu mexer em alguma coisa sobre a mesa. — Qual o motivo de estarem se falando depois de tanto tempo?

— Eles estão fazendo um serviço para mim na Alemanha.

— O qu—

— Assuntos meus, Kaira — Aaron disse sério. — Não se meta.

Alemanha a fazia se lembrar de Gegen Arten, palavras que lera anos atrás nos relatórios de Trey, os mesmos que agora estavam espalhados na mesa de Aaron.

O grupo Anti-Espécie do qual Aurora viera, onde possivelmente outros filhotes estavam.

Grupo com o qual ela estava mantendo contato.

Ela olhou para Aaron rapidamente e depois para os próprios papéis sobre a bancada.

Estava na hora de começar a colocar seu plano em ação.

🌡️

Acompanhou Salvation com os olhos quando passou pela porta, ele retribuiu seu olhar com uma postura tensa e por fim se sentou no sofá, entre Kismet e Forest.

A conversa que tiveram enquanto comiam juntos há uma semana ainda não saira da sua cabeça, mas ela cumpriria com a palavra e o ajudaria.

O motivo por trás de ter aceitado o pedido dele não era muito nobre, mas não era uma tola.

Sua grande oportunidade batia na porta.

— MEUS PRESENTES DA INTERNET CHEGARAM!

Kismet deu um pulo para o lado e colocou a mão sobre o peito, rosnando para ela.

— Que susto — ele resmungou. — Quais presentes, maluca?

— Ela fez algumas encomendas — Noble entrou logo atrás dela, carregando suas caixas. — Parece que tem algo para cada um.

Forest se aproximou e ajudou Noble com as caixas.

— Presentes de Natal adiantados.

— Algo assim — Kaira estava toda sorridente e se jogou no sofá. — Coloquem as caixas no chão e se sentem. Aurora e Leon! — chamou os irmãos. — Sentem-se comigo!

Ela deu uma breve olhada ao redor, certificando-se de que todos estavam realmente na sala, mesmo que apertados.

— Okay, vou começar!

Kaira levantou e foi para a primeira caixa, pegou-a e levou até seus pais.

— Abre o seu primeiro, pai.

Leo tinha um olhar pomposo e estufou o peito, o que a fez revirar os olhos. Era óbvio que ele estava fazendo aquilo para provocar Aaron, que em troca soltou uma risadinha de escárnio. Leo abriu a caixa dele e puxou primeiro a pulseira inteligente, observando-a com interesse.

— Bom, eu pensei que como o senhor gosta de passar a maior parte do tempo com seus animais, correndo para cima e para baixo e dificilmente leva o celular, que poderia usá-la — Kaira colocou a pulseira nele e ativou. — Pensei que seria legal, já que minha mãe passa horas reclamando que você nunca vê as mensagens dela.

— Eu gostei — Stella concordou e lançou um olhar divertido para Leo. — Agora você não tem mais desculpas, querido.

Leo riu.

— Parece que eu fui pego.

— Tudo o que você fizer vai ser registrado aqui, pai, desde a distância percorrida a calorias perdidas. Tem hora, data, notificações de mensagens. Tudo.

— Agora o pai tá tecnológico.

Kismet e Salvation riram alto da piada de Leo.

— Tem mais uma coisa — ela pegou o embrulho da caixa. — É uma almofada  que guarda o controle remoto, já que ele nunca está onde realmente deveria estar.

Leo levantou as mãos para cima, sorrindo divertidamente.

— Talvez eu seja o culpado.

Ele a puxou para um abraço apertado e beijou sua testa.

— Obrigado, princesa. Parece que seus presentes vão ajudar todo mundo aqui em casa.

Virou-se para a sua mãe.

— Agora o seu — Kaira estava especialmente animada com aquele. — Pode abrir.

— Ok... — Stella tirou o embrulho e ao colocar os olhos no presente, soltou um gritinho animado. — Ah, meu Deus, eu queria tanto isto!

— Eu sei!

Era um massageador de pés, com aquecedor e tudo mais, já que sua mãe vivia dizendo que estava com dor nos pés, além de pedir para que todos fizessem massagem nela.

— Outro problema resolvido — seu irmão murmurou do outro lado da sala. — Até que enfim.

— Eu vou agora mesmo colocar ele lá em cima e testar! — sua mãe pegou o presente e deu um beijo estalado em sua bochecha. — Amei!

Todos observaram Stella subir e depois voltaram suas atenções para Kaira. Ela pegou outras caixa e foi até Aaron.

— Para você, T.

Ele estreitou os olhos e bufou, mas pegou a caixa e abriu.

— Uau... — o castanho de suas orbes brilharam. — É muito bonito, Kaira. Obrigado.

Era um estojo de madeira de bambu, carregando dentro tubos de tintas óleo, solventes, borracha, espátula, lápis, pincéis e uma paleta de acrílico para pintura.

— Gostou mesmo?

— Com certeza... você sabe, pintar é especial para mim — ele segurou a sua mão com carinho. — Vou pintar algo legal para você.

Kaira acenou e partiu para o próximo.

Para Leon, seu irmãozinho, agora com quinze anos, Kaira deu um saco de dormir, já que ele passava mais tempo fora de casa, determinado a ser o melhor caçador de todos. Para Forest ela deu um estetoscópio digital.

— Aqui, o seu presente, idiota!

Ela jogou uma caneta para Kismet. O amigo pegou o objeto no ar e a olhou com descrença.

— Sério? Uma caneta? Eu preferia a porra do estetoscópio digital.

— Aperta ela antes de reclamar, babaca.

Kismet apertou o lado contrário da ponta da caneta e um sorrisinho malicioso surgiu em seus lábios.

— Você é uma fêmea muito atrevida — ele gargalhou. — Mas eu adorei essa mulher pelada.

Leon e Forest disseram ao mesmo tempo:

— Deixa eu ver!

— Não seja um pervertido — ela deu um tapa de brincadeira no braço do irmão e pegou a última caixa. — Chocolatinho!

Noble estava sentado sozinho na poltrona, com um copo de refrigerante na mão e sorriu quando ela começou a ir até ele.

— Não sei se fico com medo ou curioso.

— Eu sei que você vai gostar — cantarolou. — É algo bem... dinâmico.

Kaira parou na frente dele e se ajoelhou no chão, sobre o tapete. Estava colocando a caixa nas coxas de Noble quando Kismet soltou um grito alto.

— Espera aí, tem criança na sala!

Noble apenas riu e concordou com a cabeça.

— Cala a boca, Kismet. Já ganhou o seu presente, pode ir embora.

— Quero ver o que o Noblezito ganhou antes.

— Vai ficar querendo — ela resmungou. — Pode abrir, Noble.

— Lá vou eu...

Kaira observava atentamente as expressões dele, ansiosa para a reação de Noble quando visse tudo. Primeiro ele franziu a testa, apertando os olhos para o interior da caixa, então... ele tocou e arregalou os olhos. Depois, sua expressão mudou de surpresa para tímida.

— Então? — a pergunta saiu mais como uma risada, já que ela se segurava. — Interessante?

Tocou a perna dele, subindo os dedos lentamente em direção a sua cintura, até que parou no meio do trajeto.

— Hm... — ele ronronou suavemente. — É um presente muito... — Noble apertou os lábios e soltou uma risada nasal. — Muito... excêntrico.

— Viu que dá para usar em dupla, Noble? — perguntou inocentemente. — Vai ser bem... agradável usá-los com você.

Ele sacudiu a cabeça freneticamente.

— Sim, aposto que vai ser.

Kismet esticou o pescoço.

— O que é?

— Fica na sua — Noble respondeu de imediato e fechou a caixa. Kaira levantou e sentou sobre as pernas dele, até ele passear os braços ao redor dela. — Acabou os presentes?

— Hm, deixa eu pensar...

Salvation soltou uma tosse forçada e Kaira sabia que havia chegado a hora. Ela não podia adiar aquilo, de qualquer forma.

— E o meu?

Aurora perguntou timidamente, olhando para Kaira com curiosidade e ela sentiu vontade de gargalhar e chorar ao mesmo tempo. Suspirou profundamente um momento antes de olhar para Salvation de volta e se levantar.

— O meu presente para você é... é meio complicado de explicar, na verdade — ela se atrapalhou com as palavras. — O meu presente para você depende muito da resposta que vai dar ao Sal.

— Como assim?

Naquele meio tempo ele havia se levantado e agora estava na frente de Aurora. Salvation se ajoelhou e, quando o silêncio se estabeleceu no ambiente, parecia que todos prendiam a respiração.

— Aurora...

— S-Sim?

A voz da sua irmãzinha não passava de um murmurou tímido e ainda assim ela parecia a coisa mais linda do mundo com suas bochechas rosadas e os olhos dourados, pincelados pelo verde e azul da aurora, os quais começavam a brilhar com lágrimas.

— Eu... — ele abriu um pequeno sorriso e ambos se encararam com intensidade, como se nenhum dos outros estivessem presentes. — Eu me lembro da primeira vez que olhei em seus olhos e, de repente, percebi que você não era mais uma simples amiga, mas algo muito maior e importante, um alguém que eu desejava proteger e amparar.... amar. A vida tem sido tão melhor com você do meu lado, minha companheira, que me apoia sempre, que me ajuda a tomar decisões e sempre a fazer o melhor.

Lágrimas finas deslizaram pelas bochechas de Aurora e Kaira suspirou, apaixonada pelas palavras de Salvation.

— Você é tão gentil, amorosa e compreensiva, e eu me esforço e tento me superar todos os dias para ser alguém incrível para você também.

O amigo tirou a pequena caixinha aveludada do bolso e abriu, estendendo-a para sua irmã e expondo a todos o brilho dourado da aliança.

Aurora parecia saber o que estava prestes a acontecer e bastava um olhar para entender que ela estava absorta, talvez inundada por uma confusão de sentimentos bons e ao mesmo tempo assustadores, assim como Kaira se sentia naquele momento.

— Você quer se casar comigo?

— Nem fudendo — Kismet murmurou no fundo, apertando a caneta.

— Cala a boca! — Forest deu um tapão nele. — Não estraga o momento.

— Sim, sim, sim! — Aurora abraçou Salvation e ambos foram parar no chão. — Mil vezes sim!

Kaira bateu palmas, animada, embora Leo não parecesse tão satisfeito, na verdade a expressão dele era de espanto. Pela primeira vez seu pai estava pálido.

— Tudo bem, pai? — apertou o ombro dele. — Não vai desmaiar, não é? Precisa de um copo de água?

— Eu estou bem — ele resmungou. — Salvation...

Leo se levantou de onde estava e cruzou a sala com a feição séria. Ela entrou em pânico por um segundo, pensando que o amigo estava ferrado, mas seu pai segurou a mão de Salvation, apertando-a em um cumprimento.

— É bom que você cuide da minha garota — Leo sorriu perigosamente, tombando o rosto para o lado. — Ou vou matar você.

— Eu dou minha palavra, Leo. Minhas intenções com Aurora são nobres.

Kismet soltou uma risadinha.

— Nobres...

Foi a vez de Noble o acertar com um tapa.

— Cala a boca ou vou colocar você para fora com pontapés.

— Que seja — Kismet cruzou os braços. — Continuem, por favor, quem sabe o meu amigo aqui também não tem um pedido para fazer.

Kaira balançou a cabeça negativamente, enquanto Noble apalpava os próprios bolsos. Todos olharam para ele, esperando algo interessante, menos ela.

— Poxa — ele brincou. — Sem aliança, sem pedido.

Leo respirou aliviado ao lado dela.

— Que bom.

Kaira se adiantou até a irmã e a abraçou.

— O meu presente para você é uma despedida de solteira com direito a todas as bebidas possíveis e strippers gostosos. Vamos ficar bêbadas e apalpar homens alheios!

Aurora gargalhou, ainda mais vermelha.

— Mal posso esperar.

🌡️

Quando as pessoas mentem, tendem a não ser muito boas nisso. Kaira pensava que ao menos precisava ter alguma decência ao fazê-lo.

Bons jogadores de pôquer precisam ser bons em "ler" as pessoas com quem jogam e as atacar em seu ponto fraco, afinal, o jogo de cartas se resumia a quem conseguia enganar melhor.

Uma piscadela, uma pulsação falha na carótida, um lance fugaz com o olhar...

Por anos aprendera aquelas técnicas de desvendar seus adversários apenas por diversão, algo que agora servia como arma em seu plano.

Se ela era boa naquilo, Aaron era melhor.

Enquanto fazia seus planos, Kaira pensara em se manter distante dele, na defensiva, até mesmo dizer que estava ocupada demais com o trabalho do hospital, mas então se lembrou de um fato muito interessante e inteligente que Aaron sempre dizia quando conversava com algum suspeito: os culpados tendem a fugir muito rápido da cena do crime, uma pergunta ou outra sobre o que fizeram antes ou depois, e você pega a mentira.

Então, ao invés de se distanciar dos outros, optou por fazer com que eles o fizessem. Os presentes foram apenas pretextos para manter todos ocupados enquanto se preparava.

Naquele ponto do mês, estavam todos ansiosos com o casamento de Aurora e Salvation; não era novidade ver os amigos saindo para caçar e brincar com Salvation ou sua mãe e Aurora arrumando os detalhes do jeito que a irmã queria. Aaron estava animado com suas pinturas, além de que relaxado por pensar que ela estava se distraindo com o casamento.

Não fora uma ou duas vezes que ele mencionara que logo seria a vez dela.

Kaira apenas revirava os olhos.

Casamento não era uma expectativa de vida, não para ela, embora Noble parecesse especialmente animado com a ideia.

— Você fica tão linda nessa cor, Kaira! — Aurora segurou as mãos dela e sorriu. — Combina com você.

Sorriu de volta para a irmã e se olhou no espelho. Dourado não era sua cor favorita, mas precisava admitir que ficava bonita com o vestido longo e solto, com o cabelo castanho preso para cima em um coque improvisado, enquanto alguns fios escapavam para moldar seu rosto.

— Combina mesmo — piscou para a irmã. — Vou ser a madrinha mais gata de todos.

— Você é a única!

As duas riram juntas e Kaira esperou a irmã sair do quarto para tirar o vestido e o jogar na cama.

Faltava apenas uma semana para a cerimônia e não era necessariamente com a festa que estava nervosa.

Sentou na mesa com o computador e, com sua senha, abriu a conversa que estava tendo há tempos com um homem chamado Jonathan. Duvidava que aquele fosse o seu verdadeiro nome, levando em consideração que o conhecera no fórum de Anti-Espécies.

Não era uma pessoa qualquer, ele tinha a tatuagem com o símbolo dos Espécies cortada ao meio. Careca e alto, com cara de poucos amigos.

Era exatamente igual aos homens que faziam parte do grupo. Aparentemente era um símbolo deles se manter daquela forma.

Para se aproximar dele, Kaira precisou misturar realidade com fantasia. Jonathan sabia que ela era uma enfermeira com o curso finalizado e pensava que a mesma trabalhava em um hospital em Nashville, no Tennessee.

Aqueles dados estavam em sua ficha falsa, mas se ele procurasse aqueles dados facilmente os encontraria em muitas arquivos falsos que ela espalhou.

Tinha uma ficha completa e perfeita, mesmo que falsa.

Claro que em seu perfil estava marcado de traços asquerosos, como se de fato tivesse participado de muitas manifestações contra Espécies, como se realmente os odiasse.

— Irônico, não? — murmurou sozinha, clicando na barra de escrever e então passou seus dedos sobre o teclado com agilidade de quem já o fazia sempre. — Olá, meu amigo — zombou. — Tudo certo para a minha chegada?

🌡️

— Cara — Kismet soltou um assovio quando Forest passou pela porta. — Você tá muito gato!

— Realmente — Noble concordou. — Você fica bem de terno.

Forest olhou de um para o outro e abriu um sorriso nervoso.

— É sério?

— Claro! — Salvation, vestido como Forest, deu uns tapas nas costas do amigo. — Você vai ser o padrinho mais gato de todos.

— Eu nem acredito que você vai casar hoje — Kismet fingiu fungar. — Um soldado abatido.

Noble passou o braço pelo ombro de Kismet.

— E todos nós esperando alguém colocar juízo nessa sua cabeça.

— Puff, ninguém vai me amarrar não! Tô tranquilo!

Forest balançou a cabeça e comentou:

— Para por ai, conheço uma porção de caras que disseram o mesmo e acabaram gamados em alguma mulher. 

— É verdade — Sal concordou e quando estava para continuar a falar, eles ouviram o barulho de passos agudos se aproximando. — E lá vem a madrinha.

Noble endireitou os ombros e empurrou Kismet para o lado, passando na frente dos amigos. Kaira surgiu no corredor e depois passou pela porta com um olhar sério. Ela usava um vestido bonito e dourado, marcando suas curvas, o cabelo estava preso em um coque elegante que deixava mechas castanhas caindo ao redor do rosto até o queixo.

Ela parou, colocou as mãos na cintura e olhou para cada um deles.

— Estão me olhando como um bando de idiotas — brincou. — Espero que não estejam planejando nenhuma brincadeira, não quero desfazer esse penteado ridículo. 

Kismet assoviou de novo.

— Tenho que admitir que eu deixaria ela me amarrar.

Kaira ergueu as sobrancelhas.

— Amarrar?

— Esquece — Noble ficou na frente dela e segurou a mão delicada, plantando um beijo sobre a mesma. — Você está muito linda.

— Obrigada — ela o olhou de cima a baixo. — Você também não está nada ruim.

— Com licença...

Forest passou pelo dois e parou ao lado de Kaira, oferecendo o braço para ela.

— Desculpa, amigo, mas hoje ela é minha.

— Haha — Noble forçou uma risada. — Vai sonhando.

— Hã...

Kaira negou o gesto de Forest e olhou para cada um deles demoradamente. O silêncio naquela sala, com seus melhores amigos, não era constrangedor ou estranho, mas um breve instante para cada um se dar conta do que estava acontecendo.

Kismet deu um empurrão em Salvation e eles começaram a rir.

— Que coisa, em... você vai casar.

— Não é maluco? — Salvation gargalhou ainda mais. — Estou tão feliz.

— E é bom você cuidar da minha Irmãzinha — Kaira abraçou Sal e depois agarrou o braço de Forest. — Okay, estou pronta.

— Não me deixa cair, Kaira — Forest murmurou.

— Nunca.

🌡️

Noble nunca vira as árvores na Zona Selvagem enfeitadas de forma tão delicada e brilhante, nem mesmo a grama tão aparada no caminho que fizeram para a noiva passar. A folhagem nos bancos de madeira para os convidados passava a sensação de que ambos surgiram juntos, com flores brancas e pequenas.

O padre estava no fundo, em pé sob os galhos longos e entrelaçados que formavam o arco do altar, conversando com Fury e Leo.

— Uau, Stella e Aurora fizeram um trabalho muito bonito aqui.

— Aurora até disse que gostou de lidar com decoração — Sal comentou. — Ela disse que quer fazer um curso de decoração de ambientes.

— Muito legal — Noble apertou o ombro do amigo. — Agora você tem que ir lá na frente, as pessoas estão quase enchendo o espaço.

Salvation respirou fundo e sorriu.

— Meu coração está a mil.

— Vai dar tudo certo, irmão.

O amigo deu um soco em seu ombro.

— Talvez Kaira pegue o buquê.

Noble teve que rir alto.

— Eu aposto que ela vai estar do lado contrário.

Salvation pareceu momentaneamente envergonhado.

— Ei, o que foi?

— Eu não queria passar a sensação de querer ser muito apressado e fazer você pensar que deveria seguir o mesmo caminho, na verdade queria fazer tudo isto depois de vocês e—

— Espera — Noble ergueu as mãos. — Sal, não se trata de tempo, mas sim do desejo de começar algo. Vocês se amam e vão formar uma família. Estou muito feliz por vocês, sério, nada me deixa mais orgulhoso... Quanto a Kaira e eu, bem, não se pode dar início a algo enquanto não se termina outro assunto, não é?

— Como assim?

Noble deu de ombros.

— A cabeça de Kaira está em outro lugar, em sonhos e desejos diferentes.

Sal deu um passo a frente, ignorando o chamado de Fury.

— E quanto a sua?

— Estou esperando a vida me dar uma oportunidade.

O amigo revirou os olhos e quando estava para dar as costas a ele, disse:

— Talvez seja a vida que espere algo de você.

🌡️

Ele podia jurar que tinha visto lágrimas nos olhos de Leon, mas este negou até o fim, rosnando para Noble. Os votos de casamento foram emocionantes e Aurora fora a noiva mais linda de todas.

Durante a festa alguns fizeram discursos.

Noble não queria nunca mais ouvir Kismet falar tantas besteiras em um microfone. Forest dançava com quase todas as mulheres da festa, até mesmo com sua mãe. Salvation e Aurora simplesmente não se desgrudaram mais.

Noble estava sentado com os pais e mais os pais da noiva, até mesmo Aaron estava ali. Era sempre "adorável" observar a comunicação entre ele e Leo.

A hora da noiva jogar o buquê chegou e era claro que Kaira não estava lá. Não sabia se aquilo o deixava triste ou aliviado. Com certeza os dois. A procurou com os olhos e não demorou para a encontrar na mesa de docinhos com três pequenos Espécies a rodeando.

Ela pareceu sentir que Noble a observar e o olhou de volta, acenando e cobrindo a boca cheia de doce.

Quase ao anoitecer, depois de comer e beber, mas antes dos noivos sairem, ele sentiu braços contornarem sua barriga. O cheiro de Kaira fez com que fechasse os olhos e ronronasse quando ela beijou sua bochecha.

— Eu amo você — Kaira murmurou. — Nunca se esqueça.

— Você fez algo de errado e precisa da minha ajuda? — ela soltou uma risadinha e o beijou novamente. — Hmm... também amo você.

Houve um breve silêncio da parte dela.

— Eu sei.

Mais tarde, quando os noivos estavam saindo da festa algumas pessoas pararam para os parabenizar e até mesmo conversar. Noble podia ver de onde estava sentado que Leo, Leon e Stella estavam ao lado de Aurora, mas não Kaira.

Ele olhou para os lados e para as mesas de bebida e doces, mas não a encontrou, nem mesmo próxima de Aaron que estava sentado com Tim Oberto e Trey, em uma típica aposta de cartas.

Levantou-se e deu uma volta ao redor da festa e, ainda sem a encontrar, aproximou-se de Kismet.

— Ei, você viu a Kaira?

— A última vez que eu a vi ela disse que ia ao banheiro.

Noble ficou ao lado do amigo, esperando a companheira para poderem falar com os recém casados, no entanto... ela não apareceu nem naquela hora e nem na hora seguinte.

E nem pelo resto da noite.

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