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Surpresas

Kaira e Noble cumpriram suas promessas e nos dias que se seguiram eram praticamente inseparáveis, estavam sempre juntos na Zona Selvagem, fosse em uma de suas casas ou na floresta, próximos do rio. Às vezes era Valiant quem os observava de longe, geralmente ele ficava sobre uma pedra alta e sentado, apenas os ouvindo e com os olhos atentos. Ela ainda o achava um pouco assustador, talvez fosse porquê ele era muito mais sério do que Leo.

Seu pai, ao contrário do outro macho, corria com os dois e depois pegava Kaira pelos braços e a jogava no rio. Ela sabia nadar bem e Leo confiava em suas habilidades, gostava especialmente disso. Às vezes o mais velho também fazia algumas brincadeiras agressivas com eles, mas Noble não se importava e Kaira se divertia quando os três rolavam pela grama.

Gostava de quando eles faziam pegadinhas com os oficiais também, era engraçado.

Torrent sempre estava por perto e levava alguns filhotinhos para eles verem; eram todos fofos e brincalhões, ela amava especialmente os pequenos leões que Leo os deixava pegar. Kaira e Noble observaram a interação do macho com a grande leoa do bando de longe uma vez, era impressionante o modo como se comunicavam pelo olhar.

Kaira amava brincar com Noble, até mesmo quando ele colocava as garras de fora e ficava de quatro como um verdadeiro gato. Ele a cheirava e seus olhos dourados a fitavam como se subitamente fosse uma frágil presa para que pudesse caçar. Quando fazia isso soltava alguns barulhos parecidos com rosnados, embora fossem mesmo ronronados ríspidos, então ele corria atrás dela e Kaira fugia rindo.

Na primeira vez ela não tinha achado muito engraçado quando caiu no chão e ficou embaixo de Noble, os dentes dele tão perigosamente próximos que ela pensou que viraria uma vampira se ele a mordesse, no entanto ele não a mordeu, apenas cheirou e se esfregou em seu corpo. Agora ela ria e passava os braços ao redor dele, acostumada a brincadeira.

Comiam juntos muitas vezes e rapidamente notaram que não tinham o mesmo gosto quando se tratava de comida. Uma vez, quando estavam no rio, Noble pegara um peixe com as mãos e entregara a ela, dizendo para morder e engolir, simplesmente porquê era delicioso. Kaira apenas o encarou chocada, com certeza não esperava por aquilo.

Ela olhou o peixe em suas mãos e engoliu a saliva, tudo bem, ela podia tentar, não havia nada de errado naquilo. Seria como comer comida japonesa, só que sem o tempero.

— Olha — Noble chamou sua atenção, estava com outro peixe e mostrou a ela como colocava os dentes pontiagudos na carne branca. Estava hipnotizada enquanto o observava rasgar e mastigar com facilidade. — Viu, fácil e é muito bom! Meu pai e eu sempre fazemos isto.

Kaira respirou fundo e tentou, no entanto a pele era muito forte e seus dentes não eram fortes e afiados.  Ela lutou contra a vontade de vomitar por causa do cheiro do peixe e insistiu, falhando miseravelmente.

— Eu não consigo, Noble — cuspiu na terra e limpou os lábios, enjoada. — Alguns dos meus dentes ainda são de leite e não são tão fortes, não como os seus.

— Deixa eu ver os seus dentes.

Ela abriu a boca e deixou que Noble observasse bem, ele até mesmo colocou o dedo indicador sobre as presas dela e pareceu surpreso ao perceber que elas não eram cortantes.

— Eles são lisos demais, como os da minha mãe. Sua raça é estranha.

— Obrigada por dizer que meus dentes são inúteis.

Ele riu, balançando os ombros.

— Acho que você também deve preferir os peixes grelhados como ela, não é?

— Com certeza! — afirmou, balançando a cabeça, mas estava curiosa para saber o sabor do peixe puro também. — Eu também gosto de comida japonesa, mas os peixes são muito bem preparados. Pode cortar um pedaço para que eu possa provar?

— Sério? — estava novamente surpreso. — Pensei que você teria nojo.

— É um pouco nojento, mas estou curiosa. Vai, corta!

Ele pegou o peixe das mãos dela e rasgou com facilidade um naco de carne pálida, Kaira pegou com as pontas dos dedos e colocou na boca. Não era bom, era horrível e nojento, difícil de mastigar e engolir.

— Eca!

— Quer saber de uma coisa legal?

— O quê?

— O que você está sentindo agora é o que sempre sinto quando coloco chocolate na minha boca.

— Impossível!

Kaira o empurrou com um ombro em direção ao rio e os dois riram, voltando a brincar com a água e sem pegarem mais os pobres peixinhos.

As semanas se passaram e a barriga de sua mãe começava a ficar maior e o seu pai mais protetor a cada dia. Algumas vezes ele não saia o dia todo de casa e só ficava atrás da fêmea, cercando-a o tempo todo e a protegendo, isso entediava Kaira, já que também não saia sem ele. Ela queria ter um celular para que pudesse trocar mensagens com os novos amigos, mas sua mãe ainda dizia que era muito jovenzinha para ter um aparelho.

Ela nunca mais vira Jericho, mas o peso do colar sobre seu coração sempre a fazia se lembrar dele. O seu Batman, ele só precisava aceitar!

E assim foram todos os seus dias, mas a mudança estava prestes a acontecer.

🌡️

Acordara no meio da noite com os sons altos de vozes e passos que vinham do andar de baixo. Kaira hesitou um pouco na cama, atenta aos sons, mas depois colocou as pernas para fora da coberta e calçou seus chinelos, descendo lentamente a escada a procura de quem fazia aquele barulho. Sabia que nada de ruim poderia estar lá embaixo, Leo não deixaria nada acontecer com Stella e ela.

Seus pais estavam na sala, sentados no sofá juntos e ela não podia ver o que faziam quando estavam de costas.

Havia algo grande nos braços de sua mãe e quando Kaira estreitou os olhos, aguçando sua vista e se acostumando a luz da lâmpada, teve uma surpresa. Era uma criança um pouco menor que ela, encolhida como se estivesse com frio ou até mesmo machucada.

Terminou de descer as escadas correndo e chegou até eles ofegante.

— Quem é ela? — perguntou, confusa.

Sua mãe segurava a pequena nos braços com carinho, olhando-a como costumava olhar para Kaira e aquilo a deixou com um sentimento estranho no peito. Um barulho na porta da frente chamou atenção de Kaira, que desviou o olhar e encarou o casal estranho na entrada. A mulher tinha um cabelo realmente longo e de um tom vermelho intenso, como se estivesse em chamas sob a luz, sua barriga de grávida estava grande e parecia que logo ela ganharia o bebê.

O macho era alto e tinha um olhar intenso, mas então ele sorriu para Kaira e ela sorriu de volta. Ele era muito lindo e tinha um cabelo escuro com mechas claras.

— Olá, pequena.

— Oi, sou Kaira — disse e se aproximou deles, não tinha medo, principalmente com Leo tão próximo, para Kaira ele era como uma espécie de super herói que sempre a protegeria dos perigos. — E vocês?

A ruiva abriu um sorriso enorme e se aproximou dela, alisando o seu cabelo.

— Como você é fofinha! — apertou as bochechas de Kaira e as beijou. — Sou Jessie e este é meu companheiro, Justice.

— Por que estão aqui?

— Você me parece ser uma filhote bem inteligente — foi Justice quem comentou, atraindo o olhar desconfiado dela. — Quantos anos você tem?

— Sete.

— Idade o suficiente para ser a irmã mais velha dela.

Ele apontou o queixo em direção a criança nos braços de sua mãe e Kaira arregalou os olhos.

— Ela vai ficar conosco?

— Isso te incomoda? — Jessie quem perguntou e Kaira negou. Não a incomodava, mas ela queria saber o porquê da menina estar ali. — Então qual o motivo desse olhar sério?

Kaira olhou para a menina e perguntou baixinho:

— Por que ela está aqui? O que aconteceu? Qual o nome dela?

— Não posso ficar com ela agora, vou ganhar um bebê e quero ter tempo para ele e isso a deixaria sozinha. Justice trabalha muito também. Leo é um bom macho e ainda falta muito para o seu irmãozinho nascer e você também está aqui, será legal para ela crescer com outra criança, principalmente uma garota. Os outros casais com filhotes tem que ficar de olhos neles e são todos machos, ela tem medo deles.

Kaira olhou para a menina novamente e os olhos de gato, grandes, bonitos e expressivos a encantaram com facilidade. Não sentia mais ciúmes de sua mãe. 

— Ela é diferente...

— Nos disseram que foi misturada com uma espécie de leopardo que foi extinto há algum tempo. Por isso o formato do rosto e os olhos grandes, mas é bonita, você não acha?

— Sim, muito linda. Perfeita.

Justice se aproximou mais e tocou o ombro de Kaira.

— Ela vai precisar de um nome e de alguém de confiança, tenho certeza de que você vai ser uma irmã mais velha muito boa.

A menina olhava para ela com a mesma intensidade com que a encarava de volta. Kaira se aproximou e se sentou no sofá ao lado, de onde Leo acabara de sair para falar com Justice. Não prestou atenção no que eles falavam, parecia muito sério e ela só queria poder prestar atenção em sua nova irmã.

Esticou a mão e tocou, lentamente, na pele dela. Quente e macia, as bochechas dela eram altas e os lábios bonitos, Kaira sempre dizia que sua mãe era a mulher mais linda que já havia visto, mas essa menina era muito bela. O nariz dela lembrava o de Leo e Noble, porém muito mais suave e pequeno.

A Nova Espécie pequena soltou um breve barulho e deitou a bochecha contra a mão de Kaira, vibrando como um felino.

— Ela gostou de você — sua mãe murmurou. Kaira não entendeu o porquê dos olhos dela estarem cheios de lágrimas. — Não se preocupe, amorzinho, só estou feliz.

Assentiu e voltou sua atenção para a nova irmãzinha.

— Ela precisa de um nome, mãe.

— Com certeza, eu pensei em um bom, quer saber?

— Qual?

— O que acha de Aurora?

Kaira olhou bem para a fêmea loira e sorriu, era mesmo um bom nome e ela amava as cores azul e verde da Aurora, eram como os olhos da pequena gatinha.

— Aurora — murmurou e se aproximou mais dela, olhando-a no fundo dos olhos. — Você gosta de Aurora?

Ela apenas acenou timidamente e se encolheu ainda mais nos braços de sua mãe.

— Ótimo! — sua voz alta fez a pequena se encolher ainda mais e Kaira se controlou. Pegou na mão dela com carinho e sorriu. — Sou sua irmã mais velha, meu nome é Kaira e vou cuidar de você, prometo!

Ela ouviu um riso baixo, mas não se importou, na verdade nada importava além daquela gracinha dos braços de sua mãe.

— Sobre ela, Leo... — Justice suspirou. — É uma longa história, vamos conversar lá fora.

🌡️

Bom, se há algum tempo atrás alguém dissesse a Kaira que estaria morando num lugar chamado Zona Selvagem e que teria um pai muito gentil e protetor ela nunca acreditaria, sério, parecia impossível até mesmo para uma cabecinha tão criativa quanto a dela.

Parecia uma história de contos de fadas e ela gostava justamente das que não eram tão fantasiosas, afinal, o Batman só era um homem rico e inteligente, sem super poderes como o Superman.

No entanto, se ela pensasse por certa perspectiva, os Novas Espécies tinham super poderes e viviam o tempo todo lutando contra vilões malvados e terríveis.

Então, de vez em quando, realmente parecia que estava em uma fantasia.

Ouvira um pouco sobre os anti-espécies e agora os via como monstros, era difícil para ela entender como outros seres humanos podiam odiar Novas Espécies como Leo, Jericho e Torrent, ela já os amava de todo coração. Contaram-lhe também as histórias de Ellie, Trisha, Tammy e das outras humanas que passaram por situações ruins por causa daqueles que odiavam sua nova família.

Ficara muito irritada e isso fez com que o sentimento de proteção em seu coração crescesse, mais do que nunca queria ficar forte para ajudá-los contra seus inimigos.

Era a sua parte heróica gritando para sair.

— Quem é esse? — Noble perguntou, tirando-a de seus pensamentos. Ele apontava para um personagem desenhado na folha do quadrinho.

— É o Coringa.

— Ele parece maluco.

— É porquê ele é! — ela gargalhou e assoprou novamente a poeira da entrada do controle. Tentou fazê-lo funcionar, mas foi em vão. — Droga, acho que só um de nós vai conseguir jogar.

Noble rodeou o videogame e fitou a tela do menu do jogo, era uma relíquia para ela.

— Medal Of Honor — ele murmurou o nome do game. — É sobre o quê?

— É um jogo de tiro, agora senta ai ou sai da frente, não consigo ver nada!

Ele soltou um rosnado do fundo da garganta e se jogou sobre Kaira, fazendo-a se deitar no tapete felpudo e rosa de seu quarto. Ela riu alto e segurou os ombros dele.

— Vamos sair daqui — Noble murmurou, olhando no fundo de seus olhos. — Vamos pular pela janela e correr para a floresta, só nós dois, sem nenhum adulto chato.

— Não posso.

— Por quê?

— Minha mãe vai ficar preocupada e meu pai bravo comigo, por estressá-la. Meu irmão vai nascer, você sabe e Aurora vai querer vir atrás de qualquer modo.

Noble resmungou e fechou os olhos dourados, inalando com força algum cheiro que ela não era capaz de sentir. Ela observou, pacientemente, ele inalar profundamente e suspirar, Noble virou lentamente a cabeça para o lado, como se ouvisse algo a distância e abriu os olhos.

— Sua mãe e Aurora estão na varanda. Seu pai saiu com Torrent mais cedo para resolver algo sobre os leões.

— Como você sabe?

— Eu os ouvi conversar faz tempo — Noble se sentou e levou Kaira consigo, sentando ela ao lado dele. Às vezes era como se fosse só uma boneca nas mãos dele. — Vamos, Kaira — ronronou e esfregou a bochecha na dela. — É uma chance única.

— Uma chance única de eu ficar de castigo pelo resto da minha vida.

Ele ficou em silêncio e Kaira estranhou, encarou-o com o canto dos olhos e ele fazia o mesmo com suas pupilas brilhando em desafio.

— Covarde!

Foi a vez dela o empurrar, irritada. De alguma forma, querendo ou não, Noble conhecia alguns pontos fracos e fortes dela e o orgulho em seu espírito era grandioso.

— Levanta a bunda do chão e vamos!

Isso o deixou animado e os dois sairam pela janela juntos, caminharam pelo telhado o mais silenciosos possível. Era fácil para Noble, ele desceu com facilidade e caiu de pé na grama, agachando um pouco para reduzir o impacto em seu corpo. Ela olhou para o chão e quis recuar, desistir, mas o garoto arrastou a mesa que sua mãe colocara no quintal e subiu sobre a mesma, estendendo os braços para Kaira.

— Vem, vou te pegar.

— Eu não sei, Noble — murmurou. — É tão alto.

— Nem tanto se você olhar de onde estou, se agacha e passa as pernas para cá, depois só soltar o corpo e vou pegar você.

Estava mais para teste de coragem e confiança do que uma simples escapada, pensou.

— Você promete?

— Quer que eu suba aí para fazer outra promessa de dedinho? — ele rosnou. — Eu nunca deixaria nada acontecer com você, é outra promessa também.

Ela balançou a cabeça, negando.

— Tudo bem — riu nervosa. — Confio em você, apenas não me deixe quebrar um braço, soube que dói demais!

Kaira fez exatamente como ele disse; sentou-se sobre a calha e colocou as pernas para fora do telhado, depois tudo que sentiu foi o vazio e logo após o corpo quente de Noble colado ao dela, segurando-a com firmeza. Os olhos dele brilhavam em confiança e orgulho.

— Eu vou ser um bom macho — ele murmurou. — Vai ver, vou cuidar de você!

— Não preciso de um guardião, mas obrigada — Kaira o empurrou um pouco para longe e desceu da mesa, suas pernas tremiam um pouquinho. Olhou para o garoto depois de verificar que ninguém os ouviu, aparentemente o olfato de sua irmã não era muito bom, ela fora criada para ser uma Presente, só não entendeu o que isso queria dizer. — Então, fujão, para aonde irá me levar?

— Até o Poço Azul, onde uma das cachoeiras cai, é muito bonito e do alto das pedras da para ver o pôr do sol.

— Ótimo — ela segurou a mão dele, que automaticamente cobriu a dela com força e calor. — Me guie até lá!

Noble começou a correr e Kaira estava logo atrás, sem se deixar abater pela velocidade extrema das pernas do garoto. Graças a ele foi fácil driblar outros machos que moravam por ali, o que ela não gostou mesmo foi da trilha apertada que eles tiveram que tomar depois de algum tempo andando, já que não era nenhuma Nova Espécie que conseguia correr sem parar por muito tempo.

Muitos galhos de árvores seguravam suas roupas e as raízes no chão a deixavam atenta, mas então tinha que manter os olhos nos pequenos galhos que podiam furar seus olhos e naqueles que poderiam fazê-la rolar morro abaixo.

Os seus pés descalços estavam cheios de terra e com a sola escura, embora estivesse melhor do que Noble, parecia que ele tinha acabado de sair de uma luta com pássaros, pois o cabelo estava com alguns penas e galinhos de ninhos.

Ficaram em silêncio na maior parte do caminho, com ela apenas seguindo as pegadas dele.

— Estamos muito longe, Noble?

Ele se virou para a encarar e gargalhou alto, fazendo-a cruzar os braços.

— O que foi, em? — perguntou. — Quer começar outra briga?

— Primeiro que eu ganharia! — sorriu divertido e se aproximou dela, arrancando algo do meio de suas madeixas. — Segundo, olha aqui que bonitinha a nossa nova amiga.

— Coloca ela em alguma árvore — murmurou meio apavorada ao colocar os olhos na aranha, não era grande, mas ainda assim nojenta e ela não queria pensar naquilo dentro de suas roupas. — Anda!

— Tem certeza de que não quer ela?

— Noble!

Seu gritinho saiu meio esganiçado, muito fino, arrancando uma careta dele. Noble colocou a aranha em um galho alto e andou mais um pouco, ela foi atrás e pode ouvir o barulho da água batendo contra rochas logo à frente. O garoto puxou um arbusto da frente deles com um braço e Kaira pode ter a visão do paraíso.

Ficou boquiaberta.

A água do poço era extremamente limpa e azul, ela podia ver as pedras no fundo e como não era tão fundo. Rochas altas fechavam a cachoeira e o poço como num lugar precioso e escondido, mas com a água que descia por vários quilômetros pela Zona Selvagem e Reserva.

Caminhou para fora da trilha e seguiu pelas rochas molhadas com Noble, usando o ombro esquerdo dele para apoiar sua mão e não escorregar.

— Vamos? — ele perguntou, voltando os olhos para a água.

— Com certeza!

Noble se afastou e tirou a camiseta, depois mergulhou na água, espalhando gotas altas por todos os lados. Kaira riu e tirou a bermuda, empurrando-a para longe com os pés e ficado com a sua regata e calcinha.

— Lá vou eu!

Pulou também, submergindo de uma única vez.

Quando voltou a superfície, gelada e tremendo um pouco, um ataque de água a impediu de abrir os olhos e a risada de Noble preencheu o silêncio, às cegas ela também tentou atingir ele. Mãos maiores a seguraram e Kaira riu quando o corpo dela foi jogado para o lado, realmente como uma boneca.

— Vem me pegar — Noble disse quando ela finalmente conseguiu se recuperar do ataque. O cabelo dourado estava todo colado no rosto dele e os olhos pareciam bem selvagens. Ele queria brincar e ela estava disposta, mesmo que fosse difícil. — Se você conseguir, claro.

— Eu nunca nego um desafio, Noble — começou a caminhar na direção dele. — É bom que você corra!

🌡️

Nadaram por muito tempo, praticamente o dia todo. Ela comeu algumas frutas na hora do almoço, Noble as encontrara em árvores altas e trouxera para ela, enquanto ele mesmo comeu três peixinhos. Aquilo foi tão natural que Kaira nem fez careta ao vê-lo se lambuzar nos pobres bichinhos. Escalaram algumas pedras juntos, sempre lado a lado, porquê Noble poderia segurá-la se escorregasse, às vezes ele ia atrás, para se certificar que os pés dela estavam nos lugares certos.

O lado de cima da cachoeira também era bonito, principalmente porquê a vista do vale era magnífica e o garoto tinha razão, o por do sol era de tirar o fôlego. Ela nem podia acreditar em algo tão belo.

Kaira abriu a boca para falar e olhou Noble, surpreendendo-se com o quão diferente ele parecia quando o sol refletia em seus olhos e pele dourada. Parecia de outro mundo e muito bonito. Ela voltou a olhar para frente, sem ter coragem de interromper aquele momento dele com a natureza.

Estava tudo tão pacífico que ela deu um pulo quando a mão dele tocou seus dedos. Encarou-o de olhos arregalados e Noble começou a falar, no entanto um som alto e horrível o silenciou. Era algo que ela nunca ouvira antes.

Pássaros voaram para longe e a floresta toda pareceu ter morrido, tudo o que ouviam era o som da água.

O coração dela bateu forte, muito forte mesmo, podia senti-lo abaixo das costelas; pulsante e vivo, talvez Noble pudesse o ouvir também. Moveu-se em direção a ele, agarrando o braço dele com força, praticamente se escondendo atrás do corpo maior.

— O que foi isso?

Noble farejou o ar e franziu a testa.

— Não gosto desse cheiro, queima meu nariz.

Eles ouviram outro barulho, mais alto e que parecia vir lá debaixo, do meio da floresta. Noble levantou e ela também. Não sabia exatamente o que fazer e o pressentimento que ela tinha era ruim, talvez sua mãe realmente a deixasse de castigo pelo resto da vida.

— Vamos subir o rio — ele pegou a mão dela com força, puxando-a consigo. — Eu sei que barulho é esse e nós temos que correr para longe.

— O que é? — perguntou baixinho, com medo de qualquer outra pessoa os ouvir.

— São tiros — respondeu e rosnou, a mão dele a apertou mais, mas não reclamou. Ele parecia irritado e preocupado. — Vem, vamos seguir pela esquerda.

— Não, meu pai disse para eu sempre ficar do lado direito do rio.

— Isso porquê você é humana, mas nenhum dos residentes vai te machucar enquanto estiver comigo. Confia. Ninguém vai desafiar meu pai assim, me atacar quer dizer arrumar uma briga com ele.

Kaira conseguia confiar, ela nunca gostaria de arrumar problemas com Valiant.

Andaram juntos conforme o barulho atrás deles ficava mais alto e assustador, quase excruciante, ela podia sentir seu coração se apertar a cada disparo. Era um ataque e ela sabia que deveria estar com sua mãe e irmã, Aurora com certeza estaria escondida embaixo da cama e Stella preocupada.

Noble parou do nada e ela bateu contra as costas dele e o segurou.

— Você tem que se acalmar, Kaira — ele olhou para ela de um modo diferente, como se estivesse o incomodando. — Posso sentir o cheiro forte do seu medo como nunca senti antes, isso vai atrair outros até nós.

— O q-que eu faço?

Ele respirou fundo e a segurou pelos ombros.

— Me abraça.

Kaira o abraçou com força, afundando o rosto na camiseta molhada. Estava com frio e assustada, queria ir correndo para os braços de Leo e chorar um pouquinho. Noble fungou e a abraçou de volta, ronronando suavemente e vibrando; era bom e reconfortante, principalmente porquê a pele dele era muito quente, como se estivesse com febre.

Esfregou-se nela por inteira por alguns instantes, fazendo-a rir com as cócegas.

— O cheiro está muito mais fraco agora — fitou os olhos dele que pareciam mais intensos no começo da noite. — Só confia em mim, Kaira, não tenha medo.

Ela assentiu, confiava nele, era o seu melhor amigo.

— Vem, vamos subir em uma árvore e ficar nela até meu pai nos encontrar.

Andaram até achar uma boa árvore, claro que ele subiu com facilidade, era um felino com garras especiais para aquilo e as mãos e solas dos pés dele eram rígidas, enquanto as dela eram macias e sensíveis. Kaira se machucou com o tronco e acabou que abriu um pequeno ferimento, que começou a sangrar e novamente a atrair atenção do olfato de Noble.

Ele a ajudou subir em um galho algo e que suportava o peso dos dois. Kaira estava dolorida e cansada, ter nadado o dia todo tirou suas forças e ela queria dormir. Apoiou-se no corpo dele e amoleceu. Noble pegou sua mão e levou até o rosto, lambendo o sangue e o machucado. A língua dele era diferente, áspera e bem quentinha.

— O que está fazendo? — perguntou, assustada com aquilo.

— Te ajudando.

— Me lambendo?

Ele apenas lançou um olhar zangado em sua direção e rosnou, mostrando as presas.

— Deixa eu fazer isto e depois você pode me agradecer.

Mais algumas lambidas e a pele dela estava limpa do sangue e também não doia tanto, parecia ter feito bem. Ficaram em silêncio juntos, mas conforme o tempo passava parecia que os ecos dos tiros estavam mais próximos, quase como se estivessem atirando ao lado deles.

Noble indicou um galho acima e os dois subiram juntos e em silêncio, ele a ajudando o tempo todo. Precisou passar os braços ao redor do pescoço dele e ele a puxou até que estivesse sentada sobre suas coxas. Estava tão frio e ela tremia, precisava do calor que Noble emanava.

Quero voltar para casa, pensou, tomar um banho quente e passar o resto da noite em minha cama.

Os raios de sol que coloriram o céu em tons quentes e bonitos sumiram, dando lugar a escuridão onde diversas estrelas brilhantes reinavam. Os sons se afastaram e pararam, mas o medo dela não desapareceu tão facilmente.

Fechou os olhinhos com força, pensando se deveria ou não dormir com a cabeça encostada no ombro de Noble. Não era tão ruim. Kaira era sempre falante e disposta a fazer milhões de perguntas, mas agora não sabia o que dizer ou fazer.

Era tão assustador estar longe de seus pais e sem saber o caminho de volta, além de que pessoas más poderiam estar na trilha.

— Diga alguma coisa — ela murmurou, incomodada com o silêncio.

— Hm? — os olhos amarelados se voltaram para ela, enquanto ele parecia pensar em algo para dizer. Passaram-se minutos até que ele, enfim, perguntasse. — Como é o mundo lá fora?

— Chato — não hesitou em falar a verdade, ao menos para ela tudo lá fora parecia cinza e sem graça; não fora muito bem recebida na escola e as crianças a olhavam de modo diferente por não ter um pai. Não era legal, era triste e solitário. — A única coisa que eu amava era a floresta próxima da casa da minha avó, mas aqui é tão lindo quanto lá, então sinto que é apenas uma extensão do que sempre conheci.

— Você tinha um melhor amigo?

Kaira negou com a cabeça.

— Eu, bem... a casa da minha avó sempre foi longe das outras e as horas na escola são rápidas, não haviam vizinhos ou amigos, era apenas minha avó, avô e mãe.

— Então parece que nós somos iguais — ela o olhou, esperando que continuasse. — Você sabe, não é? Os outros estão sempre na Reserva ou em Homeland, eu estava sozinho até você chegar.

— Então que bom que estou aqui — brincou, abraçando-o com mais força. — Nós nunca mais vamos estar sozinhos.

Nunca mais.

Algum tempo passou até que a lua estivesse no alto do céu e a visão dela se acostumou com a penumbra. Noble, de repente, apertou os braços ao seu redor com mais força e arqueou as costas. Kaira olhou para o rosto dele e os lábios estavam abertos e ele mostrava a presas, então ele silvou ameaçadoramente para algo embaixo da árvore.

— Kaira — murmurou a voz conhecida na escuridão. — Noble não faça isso novamente, não sou uma ameaça para vocês.

Ela conhecia aquela voz, mas fazia algumas semanas que não a ouvia. Era Jericho, ela tinha quase certeza, mas não conseguia enxergar nada além de um vulto grande e escuro.

— Jericho! — o chamou com a voz chorosa. — É você?

— Sim, pequena — a voz estava mais próxima e os galhos da árvore se moveram com um peso a mais. Noble desta vez rosnou mais alto e o corpo dele estava tão tenso que as garras poderiam machuca-lá. — Chega, Noble. Solte ela e eu vou aí.

Outro rosnado partiu de Noble e um som estranho, forte e grave a assustou. Aquilo não era o garoto, era Jericho.

— Acalme-se e saia de perto da pequena — disse, tentando convencer Noble, mas agora Kaira não tinha certeza se queria mesmo sair dos braços dele. Era protetor. — Ela está com medo e vou levá-la de volta para os pais.

— Tudo bem — murmurou para Noble, segurando o rosto dele com as mãos. — Me ajude a descer até Jericho, não consigo ver nada.

Ele fungou o ar, novamente fazendo uma careta.

— Eu não conheço ele.

— É meu amigo, confio nele!

— Eu sou seu melhor amigo — rosnou. — Não ele.

— E você vai deixar de ser se continuar rosnando assim pra mim! — rebateu irritada e se forçou o máximo para fora dos braços de Noble. — Jericho, me ajuda a descer.

Não demorou para que a árvore voltasse a balançar e braços realmente fortes a pegassem com cuidado. Segurou-se de volta nele e foi carregada até o chão, Jericho não a soltou e esperou por Noble.

— Vocês dois estão em uma enrascada, ouviram?

Ela concordou com uma aceno contra o peito dele, cansada e com frio. Kaira se encolheu, começando a adormecer.

— Eu só queria mostrar algo legal à ela...

🌡️

O ataque ao muro da Reserva tinha deixado dois Novas Espécies realmente feridos e alguns outros somente com arranhões de balas. Leo e alguns outros residentes chegaram para ajudar, mas ele não poderia dizer com o que estava mais irritado, se era com a sua pequena filhote fujona ou com aqueles humanos idiotas.

Sentiu medo pela primeira vez ao pensar que algum deles poderiam ter colocado as mãos nela ou talvez pior, que tivesse visto Noble.

Valiant estava atrás dos dois quando o ataque aconteceu, o que os deixou ainda mais assustados, afinal, será que era um ataque para pegarem seus filhotes? 

Stella ligara para Leo na hora do almoço, avisando que não encontrava a filha e Noble em lugar algum e que também encontrara a mesa dos fundos próxima do telhado, como se tivessem a usado para pular. Ele ficou muito irritado, rosnando para colocar as mãos no pescoço daquele pequeno macho que ajudou Kaira a sair de casa.

Estava segurando um dos humanos idiotas pelas algemas quando o celular de Valiant tocou ao seu lado.

— O que é? — resmungou o macho ao lado de Leo, mostrando os dentes em descontentamento. — Eles estão com as fêmeas? Estão bem? — passou alguns segundos e Valiant rosnou. — Ótimo, diga a minha Tammy para mantê-lo acordado, preciso dizer algumas coisas a ele. Obrigado, Jericho.

Leo se aproximou, deixando o humano com um oficial que o levaria para ser julgado.

— Kaira e Noble estão bem? — Valiant assentiu. — Jericho os encontrou?

— Parece que o macho se importa com ela o suficiente para deixar o seu posto e correr para salvá-la.

Leo estava surpreso, claro que sabia sobre a interação de Kaira e Jericho. Ela o encantou desde o início com seus sorrisos e frases longas, ele a atraiu de volta e Kaira sempre queria saber mais dele. Um grande sinal da amizade era o colar que ela carregava consigo para todos os lugares e nunca tirava.

— Preciso agradecer ele depois.

— Vou ir para casa e conversar com Noble — Valiant parecia mesmo nervoso e Leo ficou com um pouco de dó do filhote. O macho de repente se virou e encarou Leo. — Isso não vai acontecer de novo, então não o afaste de Kaira.

Leo balançou a cabeça, erguendo as mãos divertido e em sua defesa.

— Eu nem pensei nisso.

🌡️

Valiant se movia rapidamente em direção a sua casa. Muitos pensamentos invadiam sua cabeça, principalmente aqueles em que pensava em matar qualquer um que ousasse machucar seu filhote, era dele e lutaria até a morte para mantê-lo seguro, exatamente como faria por sua Tammy. Minha.

O cheiro dela e de Noble invadiram suas narinas e fez seu corpo relaxar, abriu a porta da casa e subiu pelas escadas como um furacão, só queria colocar os olhos sobre os dois.

Abraçou aquela mulher maravilhosa assim que a teve em seus braços, apertando com força e cuidando para que não a quebrasse. Noble os olhava da cama, vestido com um pijama infantil e com a juba de cabelos molhados. Soltou sua Tammy e lançou um olhar sério na direção dela.

— Seja gentil com ele — Tammy disse e foi em direção a saída. — Você sabe que não fez por mal.

Valiant se sentou na beirada da cama e olhou severamente para Noble que, encolhido, mantinha suas orbes douradas no macho.

— Estou magoado com você, Noble. Desobedeceu todas as regras e poderia ter morrido se estivesse no lugar errado hoje — sua voz de trovão inundou todo o quarto. — E o pior, colocou Kaira em perigo, você imaginou nas consequências de sua escolha ao menos uma vez?

— Pai, e—

— Não pode fazer isso, você sabe. Deixou todos assustados, principalmente eu.

Noble o fitou curioso e surpreso.

— Teve medo?

— Sempre sinto quando penso que posso perder você ou sua mãe, vocês são tudo o que eu tenho, amo vocês.

Valiant puxou o filhote para os seus braços e suavemente o segurou, mantendo-o seguro. Não deixaria ninguém o levasse embora, não conseguia pensar nisso sem sentir seu coração doer. Ele inalou o cheiro de Noble e conseguia sentir Kaira nele também.

— Desculpa, pai... Eu só quis fazer algo legal — Noble se esfregou nele, o peito vibrando enquanto ronronava. — O senhor ainda gosta de mim, não é?

— Com certeza, para sempre. 

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