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Prisão Subterrânea

Como ela tinha sido capaz de tomar uma decisão daquelas?

Não poderia dizer que fora algo de última hora, porque seria mentira, foram meses planejando a própria fuga. Mas com certeza fora uma daquelas decisões que parecia extremamente inteligente e incrível na hora, para somente depois se sentir a mais burra e idiota de todas.

Arrependeu-se no mesmo instante que saiu para fora da Reserva, dando as costas a sua amada família, companheiro e floresta, para dar entrada na horrível e catástrofica cidade, onde as pessoas eram sem educação no trânsito e nas calçadas.

Todos andavam sempre com tanta pressa.

Chorara um pouco em um banheiro público no dia seguinte a sua fuga, para só depois se encher de uma coragem maluca. Afinal, era necessária certa bravura para lidar com o que estava por vir.

Pelo menos era assim que pensava. 

Agora estava colhendo o que plantara.

Kaira apertou os dedos das duas mãos na beirada da mesa, suas articulações brancas por causa da pressão. O barulho constante da máquina com a agulha a atormentava tanto quanto a dor das picadas em sua pele sensível.

Sentiu outra vez uma fisgada no pescoço e soltou um arquejo, dividida entre a dor e o ódio.

— A dor vai valer a pena no final.

A voz de Jonathan, o seu contato, era um combustível para ela; alimentava até o fundo sua alma e queimava em seu coração. Saber que estava ao lado de um provável assassino, ladrão e contrabandista era o que a manteria de pé apenas para o ver no chão mais tarde.

— Aposto que vai — murmurou contra o estofado pressionando seu rosto. — Vai sim...

A tatuagem era uma das formas de modificação do corpo mais conhecidas e cultuadas do mundo, uma obra de arte viva e temporal tanto quanto a vida. Existem muitas provas arqueológicas antes mesmo de Cristo de que homens marcavam suas peles.

Os antigos gregos e romanos usavam tatuagens para penalizar escravos, criminosos e prisioneiros de guerra. As tribos germânicas, celtas e outras tribos da Europa central e setentrional pré-cristã possuíam o costume de utilizar tatuagens, de acordo com registros de sobreviventes, era um troféu.

Em outros cantos foi considerada elemento remanescente do paganismo e proibida legalmente pela Igreja como uma prática demoníaca, comumente a  caracterizando como prática de vandalismo ao próprio corpo.

Bom, não importava onde as tatuagens começaram e onde iriam terminar, Kaira só queria que aquela maldita dor passasse logo.

Marcar a própria pele como gado não era nenhum sonho, mas essa foi apenas mais uma das coisas que teria que aceitar se quisesse mesmo fazer parte daquele grupo de Anti-Espécies.

— Pronta para se livrar de todo esse cabelo?

Kaira se levantou da mesa lentamente, evitando tocar a própria nuca que ardia. Ergueu os olhos e encarou o homem careca em sua frente; Jonathan, ou seja lá qual fosse o seu verdadeiro nome, era alto e forte, com o semblante de alguém que nunca sorria.

— Sim.

Ele se virou para sair do cômodo e Kaira tocou, discretamente, as pontas dos fios de cabelo. Sempre mantera o penteado longo, como costume dos Espécies, cortar era estranho para ela.

Pegou a mochila do chão e acenou para o tatuador, não por estar feliz com o serviço dele, mas para não atrair o desagrado de alguém.

Ironicamente não desejava que nenhum deles sentisse o desdém dela para com toda aquela sujeira.

Seguiu o caminho que Jonathan fez, indo atrás dele como um robô. Passaram por muitos cômodos, alguns cheios de homens se tatuando, jogando ou bebendo, vez ou outra vira as expressões neutras de mulheres que pareciam prostitutas.

Jonathan virou à esquerda e finalmente entrou em outra sala, mas não se sentou em nenhuma das cadeiras disponíveis.

— Ellen?

Uma mulher mais velha e toda tatuada girou na cadeira e olhou do homem para Kaira. 

— Sim?

— É ela.

Ellen levantou e se aproximou dos dois, passando por Jonathan até ela. Uma mão com unhas grandes e pintadas de vermelho agarrou seu queixo, tudo para ser avaliada pela mulher.

— Tá, pode deixar ela comigo.

— Espera! — Kaira segurou o braço de Jonathan quando ele começou a se afastar. — Onde eu o encontro depois?

— Ellen vai levá-la até o trabalho quando terminar tudo por aqui.

— Ah, okay... — soltou ele e deixou a mochila de lado novamente. As coisas lá dentro era tudo o que tinha, objetos importantes e que mudaria seu futuro seja lá qual fosse, por isso agia como se a bolsa não valesse nada. Ficar apegada a bagagem chamaria atenção, ao menos era o que pensava. — Estou pronta, Ellen.

Jonathan saiu e fechou a porta, enquanto Ellen continuava no mesmo lugar, perscrutando Kaira com atenção.

— Você tem um olhar diferente, garota.

— Diferente como?

Ellen estreitou os olhos.

— Um olhar que as pessoas aqui não costumam ter.

Kaira sentou na cadeira que a mulher puxou, olhando-se no espelho na parede, que refletia o seu rosto e o de Ellen.

— E você poderia me dizer que tipo de olhar as pessoas daqui costumam ter?

Ellen inclinou a cabeça.

— O de desdém, raiva, desejo, tristeza... mas nunca o olhar de quem quer entrar aqui.

— Como assim?

A mulher pegou uma tesoura e se aproximou pelas costas dela e, nesse exato momento, Kaira se deu conta de que deixaria muito de si mesma para trás para conseguir o que queria, então era bom começar a pensar em tudo o que estava disposta a perder.

— Você tem curiosidade, o que muitas vezes já está morto dentro daqueles que aqui estão.

— Curiosidade é um princípio básico para a evolução — balançou os ombros. — Provavelmente você vê isso porque sou jovem e ainda tenho muito para aprender.

— Ou talvez porque você queira alguma coisa.

O que havia de errado com essa mulher?

Por um instinto ela prendeu a respiração quando a tesoura cortou uma porção de fios. A sensação foi estranha, como se estivesse tirando uma parte importante dela, algo que até então não fazia diferença, mas que só então compreendia que estava lá por um motivo.

Por que nunca cortei o cabelo tão curto antes? Perguntou-se, quando Ellen cortou mais um tanto e agora estavam na altura de seus ombros.

Ela gostava de mudanças, mas não como aquela.

Desejou chorar novamente quando os fios estavam tão curtos que não seria capaz de puxá-los e quase o fez quando ouviu o barulho da máquina de cortar.

— Pronto.

O sentimento de encarar a si mesma, careca, foi... assustadoramente revigorante. Poderia odiar Ellen e dizer que ela era uma vadia por cortar seu cabelo.

Era como se ver pela primeira vez.

Pela primeira vez não era o castanho o que chamava atenção, mas o azul escuro de seus olhos e o vermelho pálido de seus lábios. Talvez fosse o seu queixo que realçasse a face ou as sobrancelhas escuras.

Estava tremendo quando tocou a própria cabeça e deixou que alguma lágrimas rolassem.

Não estava necessáriamente triste, mas também não estava feliz.

— Uma pena — Ellen pegou um tufo de fios. — Era tão lindo em você.

Kaira limpou as lágrimas, respirou fundo e se levantou com um olhar firme.

— É apenas cabelo — disse séria. — Cresce novamente.

🌡️

O carro parou em frente a uma velha casa de ração, ou o que era o resto de um depósito.

A cidade de Dunsmuir, situado à sombra do Monte Shasta, na fronteira norte da Califórnia, era um lugar tão pequeno quanto a cidade local próxima da Reserva. Com quase dois mil habitantes, aquele era um lugar para se passar uns dias, visitar as cachoeiras e ir embora.

Não era atoa que eles tinham um grande número de turistas.

Um lugar por onde as pessoas passam, mas nunca ficam, era de fato bom para começar um negócio sombrio?

Estava disposta a descobrir.

Kaira desceu do carro com sua mochila e se virou para a motorista.

— Obrigada pelo corte e por me trazer até aqui.

Ellen olhou para a sua nova careca, o que fez Kaira se perguntar se ela estava refletindo como em desenhos animados.

Bem, humor era sua forma de lidar com os fatos.

— Sabe aquele olhar de curiosidade? — Kaira acenou, concordando. — Ele não morreu quando cortei seu cabelo, apenas ficou mais intenso. Não sei o que está fazendo aqui, com esses caras, mas... boa sorte, você parece uma garota, não — Ellen balançou a cabeça. — Uma mulher legal.

— O que você sabe sobre esses caras?

Ellen riu, ligando o carro.

— Eu sei que onde trabalho é o lixão, mas isso — ela olhou para o depósito. — É o próprio esgoto.

Ficou observando o carro se afastar e depois procurou por uma entradas que não fosse as portas de aço velhas e cheias de pó. Kaira deu uma volta no estabelecimento, até uma portinha pequena nos fundos e com uma câmera.

Abria apenas do lado de dentro pelo que podia ver.

Encarou a câmera e levantou uma mão, acenando.

De repente, a porta abriu e Kaira entrou, mas não antes de dar uma boa olhada na rua. Vazia. Não havia uma alma viva por aquele bairro escuro. Caminhou por alguns metros até se aproximar de um homem que estava sentado olhando uma única tela que dava para o lado de fora.

Tinha por voltado dos cinquenta anos, usava óculos e também era careca. Será que o chefe tinha algum tipo de fetiche por pessoas sem cabelo? O homem a olhou com indiferença e indicou o corredor.

— Vá até o final, pegue a escadaria da esquerda e continue até encontrar Jonathan. 

Ela fez exatamente o que o senhor disse, desceu pela escadaria de iluminação precária tentando não se sentir em um filme de terror e, quando chegou ao fim, encontrou Jonathan sentado ao redor de uma mesa com outros homens.

— E aqui está a nossa nova aliada! — ele se levantou e estendeu uma mão para ela. — Como se sente com o novo visual?

— Ótima — respondeu com a voz mais confiante que conseguia ter. — Onde... — ela olhou ao redor da sala com nada além de uma TV antiga e a mesa. — Onde eu vou trabalhar?

— Não aqui, eu te garanto — um homenzinho zombou, com os olhos vidrados nas cartas. — Ao não ser que esses idiotas precisem de uma medicazinha para curar seus dodóis depois de tanto perderem para mim.

— Eu não sou médica, sou enfermeira.

Ele riu.

— E qual a diferença?

— A diferença é que, se abrirem um buraco na sua barriga, eu vou apenas olhar e sorrir.

Os homens riram, caçoando, menos o baixinho, este resolveu encarar Kaira.

— Humpf — ele cuspiu no chão. — Leve a vadiazinha para o lugar dela, Jonathan.

— Vem, Kaira, vou te levar onde a festa começa.

Dizer que sentia nojo de cada um deles era pouco, até mesmo o mais cálido dos gestos a faziam querer vomitar.

Kaira acompanhou Jonathan por mais alguns pares de escada até que o corredor de paredes cinzentas e largadas desse lugar a estruturas limpas, brancas e bem iluminadas. No final do novo corredor haviam dois elevadores.

— Vamos descer mais — ele informou ao entrarem. — Estamos quase lá.

A ideia de que estava em um esgoto foi substituída pela de que estava próxima do inferno conforme desciam mais.

Quando sairam do elevador, Kaira começou a andar, mas Jonathan a segurou.

— Você provavelmente não está acostumada a lidar com feras, mas vai ter que aprender. Você vale uma grana pra mim, já que trazer carne nova para trabalhar é o que faço — os dedos masculinos se apertaram ao redor do braço dela. — Faça o seu trabalho bem e escute o seu chefe, assim eu vou receber melhor ainda e pagá-la... mas, faça alguma merda e os caras que ficam com os Espécies não vão ser bonzinhos contigo. Ninguém está aqui porque tem um bom coração.

— Você não trabalha com os Espécies?

Ele bufou.

— Eu não chego perto daqueles animais.

— Ma—

— Você vai entrar ali — Jonathan apontou para a porta branca e grande, que mais parecia a porta de um cofre. — É onde Espécies, homens e mulheres ficam. Nate vai estar esperando por você, ele é o seu chefe agora, então faça tudo o que ele mandar.

— Certo.

Ele a empurrou e Kaira segurou a mochila com mais força. Espero que você queime no inferno, pensou sem olhar para trás. A porta abriu e girou antes mesmo de parar, então continuou.

Esperava qualquer coisa daquele outro lado, mas não estava preparada para o que encontrou.

Assim que colocou um pé para dentro um rugido soou alto a sua direita, como se estivesse contra seu o ouvido. Kaira pulou para longe, com seu coração batendo a mil. O Espécie rosnou novamente, agressivo e letal, mostrando as presas afiadas e cheias de sangue para ela. 

O vermelho manchava o rosto dele e a macabra feição malvada a fez recuar mais alguns passos, até sentir algo em suas costas, o que imediatamente a fez pular para o lado contrário.

Havia outro Espécie na jaula da frente, quieto, mas igualmente mortal.

Kaira sentiu os olhos arderem ao olhar ao redor do salão.

O número de Espécies presos ultrapassava o que ela tinha em mente. Eram muitos, dúzias, presos em celas apertadas.

Ela sentiu um calafrio na espinha.

Era horrível.

Continuou caminhando, olhando para cada um deles; alguns olhavam de volta com curiosidade, outros com ódio e outros com indiferença. Kaira vagarosamente foi chegando ao final do corredor até que, para seu assombro, encontrou algo pior.

Uma mulher humana acorrentada, com seus pulsos juntos as grades da jaula. Estava sentada, com a cabeça baixa e... uma barriga de grávida. Havia um Espécie macho junto dela, sentado logo atrás.

Ele olhou para ela e seus olhos negros se estreitaram, então rosnou ameaçadoramente.

— Você está pálida — ouviu uma risada masculina, carregada de um sotaque estranho. — É demais pra você?

Kaira perscrutou o homem em sua frente. Alto, forte e com olhos azuis claros e inteligentes. Ele sorriu.

— Nate?

— Eu mesmo.

— Eu sou Kaira, a enfermeira.

Ele abriu os braços.

— Seja bem-vinda ao meu lar — Kaira tentou sorrir, mas imaginou que foi uma péssima farsa. — Espero que não tenha ficado muito horrorizada com esses monstros, porque ainda tem muito para ver e gostaria que conhecesse Helena hoje.

— Helena?

Aquele nome lembrava alguém, mas ela não tinha muito para pensar quando estava rodeada por Espécies presos e um filho da puta na frente dela.

— É a nossa recém aquisição. Boa médica. Agora vem, tem muito o que ver para terminar o dia.

🌡️

Kaira não esperava que embaixo do depósito existisse um prédio subterrâneo. Era muito, muito mais grande do que qualquer coisa que já tinha visto antes, o que a fazia pensar em todo o dinheiro investido para que tudo funcionasse e de onde exatamente ele vinha.

Ela ainda viu dois andares de Espécies e um outro com apenas mulheres e homens humanos, o que a fez pensar que o que existia ali era em partes muito pior.

O buraco ficava bem mais embaixo.

Pararam em um galpão claro e cheio de macas e produtos hospitalares. Haviam mais mulheres deitadas do que Espécies, além de que não vira fêmeas, apenas machos.

— Helena, minha querida!

Uma mulher baixa se virou e Kaira teve outra surpresa. Ela sabia quem era Helena. Tinha visto aquele rosto nos jornais por dias, semanas e meses. Até então a família não deixara de a procurar.

Helena Price, mãe da pequeninha Cassie, que eles encontraram no galpão durante o tornado.

Foi então que tudo fez sentido.

Todas aquelas mulheres desaparecidas depois do tornado, até mesmo mulheres do mesmo galpão onde estavam durante o ataque. Um ataque que até então ela pensava ter como objetivo a captura de Espécies, no entanto, ao ver todas aquelas mulheres, deu-se conta de que os Espécies não eram o alvo naquele dia.

Mas sim aquelas pobres almas.

Helena se aproximou e Kaira não deixou de reparar nas correntes que prendiam seus tornozelos. Ela tinha olhos bonitos mas, com olheiras e tristeza, a faziam parecer esquelética.

— Esta é Kaira, sua nova ajudante, já que você foi tão... — ele pareceu pensar na palavra. — Delicada com a última.

— O que houve com a última? — Kaira perguntou.

— Eu a matei — Helena respondeu com a voz fria e olhou para a careca dela. — E eu disse que mataria outra dessas.

— E eu disse que faremos uma visita a sua doce bebezinha se fizer algo a esta — Nate ameaçou e depois riu. — Vocês precisam ser boas amigas, assim todo mundo fica bem!

— Você é um filho da puta cínico! — Helena rosnou. — Tem sorte de eu estar presa, seu cretino.

— Tá, tá — ele balançou a mão como quem não ligava. — Estou contanto com você para lidar com a nossa ótima médica, Kaira, ela precisa de alguém que frequentemente a lembre do que precisa fazer e o que vai perder se não o fizer. Entendeu?

Kaira aprumou os ombros.

— Sim.

— Ótimo.

Mais tarde, quando ele a levou para o dormitório e Kaira se olhou no espelho outra vez, precisou fechar os olhos e lutar contra as lágrimas.

Naquela noite se agarrou ao travesseiro como se fosse Noble em sua frente, pensando que assim teria algum conforto.

Ledo engano.

🌡️

Nos próximos três dias que se seguiram, Kaira passava a maior parte do tempo com Helena na enfermaria, realmente cuidando de humanas. As mulheres tinham marcas que seguiam um padrão ainda estranho para Kaira.

Eram marcas de cirurgias, alguma muito recentes e outras mais antigas, cicatrizadas.

Tinha uma espessura não muito grande e pontos bem feito, o trabalho de um médico experiente. Ela só não tinha certeza de que esse médico era Helena. A mulher apenas a olhava com ódio e a ignorava no resto do tempo, o que fazia Kaira procurar pelos próprios doentes por si mesma.

— O que houve com você? — perguntou enquanto apalpava lentamente o abdômen de uma jovem mulher. — Qual o motivo dessa cicatriz?

A mulher a olhou como se fosse uma idiota.

— É a marca da cirurgia para a retirada das cápsulas de cocaína.

— Cocaína? — murmurou. — Para quem?

— Kaira! — Helena a chamou. — Vem aqui, preciso de ajuda.

Kaira cruzou o espaço entre as macas depois de deixar a mulher. Helena estava com outra jovem, pálida e, quando Kaira se aproximou mais, a garota vomitou em um balde ao lado da cama.

Kaira correu ao ver que era sangue.

— Segure os ombros dela e a force contra a cama, preciso que ela se acalme para que eu posso sentir a rigidez da barriga.

— Ok.

Fez como o pedido, segurando a moça. Ela choramingou e gemeu, implorando para que a médica a ajudasse.

— Preciso da sala de cirurgia limpa para agora, ou ela morre.

Kaira continuou a acalmar a mulher enquanto Helena apoiava as mãos na cintura e respirava fundo.

— O que ela tem?

— Alguma cápsula a machucou pelo lado de dentro durante a viagem — Helena segurou o queixo da menina. — Você disse que caiu quando estavam vindo para cá na van?

— S-Sim — naquela ponto ela chorava. — Eu cai e uma dessas idiotas caiu por cima de mim, com o cotovelo na minha barriga. Algum tempo depois comecei a vomitar sangue.

Helena a soltou.

— Vou ter que abrir.

— Sem nenhuma ultrassom ou tomografia? Como pode ter certeza de que foi o ferimento de um cápsula sem ver antes?

A médica olhou para Kaira com os olhos cheios de lágrimas e ela se calou imediatamente.

— Você acha que tem uma máquina desse tipo aqui? Acha que vou levar ela em uma sala, colocá-la em um tubo e ver tudo pelo computador? Acha que vou tirar uma ultrassom da onde?  — Helena gritou. — É tudo uma merda aqui.

— Ela vai morrer...

Helena olhou com pena para a garota.

— Vai morrer de qualquer jeito.

🌡️

Noble não queria nem olhar para a própria cama.

Ele não tinha entrado no quarto desde que Kaira desapareceu, sabendo que sentiria o cheiro dela lá dentro ou que veria aquelas minúsculas lingeries sobre o colchão, ao lado da câmera que passara horas a fotografando um dia antes do casamento.

Maldito presente.

Uma tola distração, na qual ele caira como um patinho.

Dizer que estava com raiva era pouco, mas estava ainda mais triste.

Como ela podia desaparecer sem dizer nada? Como ele não tinha sequer suspeitado?

Noble segurou a maçaneta do quarto e rosnou antes de a virar. Ele precisava entrar lá querendo ou não, seu uniforme de serviço estava no guarda-roupa e deixar de trabalhar não era uma opção.

Na verdade era o que o manteria em pé.

Ele entrou como um furacão, não olhou para a cama e nem para a janela, onde tinha pendurado aquele maldito sutiã. Pegou as roupas no armário, ignorando o cheiro dela misturado ao dele.

— Porra...

Talvez ele não fosse tão forte.

O coração dele começou a bater mais rápido quando se aproximou da cama e pegou uma daquelas peças vermelhas, rendada e pequena. Lembrava-se de Kaira a ter usado e desfilado por todo o quarto, enquanto o provocava.

— Ah, que ódio!

Deitou na cama e ficou daquele modo por bastante tempo, até o pai bater na porta e entrar. Noble não se importou em esconder aquelas coisas, ficou do mesmo modo quando Valiant entrou e cruzou os braços.

— Levanta.

Ele não se moveu e o pai rosnou.

— Levanta, toma um banho e desce — Valiant deu as costas. — É uma ordem. Aaron quer falar com você, ele descobriu algo.

Noble levantou a cabeça no mesmo segundo.

— Descobriu o quê?

Mas Valiant não disse nada.

🌡️

Noble empurrou a porta do laboratório e automaticamente apertou os punhos.

Ele odiava aquele lugar gelado e cheio de lembranças; Kaira se fora há uma semana, mas parecia que faziam meses. 

Aaron estava sentado em frente ao computador e Trey apoiado na mesinha, enquanto Leo e Jericho estavam em pé e próximos. Noble parou em frente a mesa e enfiou as mãos nos bolsos.

— Descobriu algo, Aaron?

Trey se moveu e colocou uma embalagem de plástico transparente sobre a superfície da mesa; era um daqueles saquinhos de coletas de evidências em crimes, com uma pistola dentro.

Observou, sombriamente, aquela arma e perguntou:

— Foi isso que Kaira usou para apagar os guardas no dia? 

Trey concordou com um acenou.

— Nós encontramos a arma a alguns quilômetros da Reserva, escondida dentro do buraco de uma árvore. Jericho confirmou que foi Kaira quem usou ao sentir o cheiro dela no objeto. Leo disse que condiz, você gostaria de sen—

— Não.

— Okay.

Noble desviou os olhos da arma.

— E quanto as câmeras, Aaron?

O homem balançou os ombros em descaso.

— Quer minha opinião sincera? Foi até fácil para ela. Kaira fez login com a senha padrão, pegou as informações dos processadores que usamos e deixou um vírus compatível. Depois que a câmera infectada baixa o vírus, ela começa a enviar pacotes desesperadamente para encontrar outras câmeras que podem ser infectadas, espalhando as imagens que Kaira queria nos passar de maneira bem rápida. Pior: o vírus foi tão excelente que matou o servidor apenas temporiamente, dificultando o acesso. Ótimo trabalho.

Noble só não entendia porque Aaron parecia tão... empolgado.

Leo deu um soco potente na mesa, fazendo tudo sobre ela tremer e a tela do computador quase caiu para trás, mas Aaron a segurou.

— Ei, olha o que tá fazendo, cara!

O Espécie segurou Aaron pela camisa com força o suficiente para o erguer do chão.

— Você fica aqui elogiando o erro que ela cometeu, como pode ser tão imbecil? — Leo rugiu. — O meu próximo soco vai ser na sua cara.

A resposta de Aaron deixou Noble ciente de que havia certa loucura em sua cabeça.

— Me soca, grandão — disse calmo e com um olhar de precisão mortal. — Na próxima manhã sua esposa vai ser uma viúva.

— Está me ameaçando?

— Não sou eu que estou com as mãos ao redor do seu pescoço, filho da puta.

O que aconteceu a seguir foi rápido, mas se não fosse por Jericho, que segurou o braço de Léo, Aaron com certeza estaria desmaiado no chão do laboratório.

— Chega — Jericho não tinha a melhor das expressões ao separar os dois. — Não estamos aqui para brigar.

— Humpf — Aaron riu. — Não fale por esse daí.

Leo rosnou e apontou para Aaron.

— Justice saberá do que aconteceu aqui.

Então ele saiu dali furioso e pisando duro, como se aquilo fosse o livrar de sua frustração. Noble respirou fundo e se voltou para Trey.

— Imagino que não seja apenas para mostrar a arma que tenha nos chamado.

— Não foi — Aaron tomou a frente. — Na verdade, eu consegui uma localização exata de onde Kaira esteve está semana.

Noble se permitiu sentir certa esperança.

— Mas você disse que não havia encontrado nenhum vestígio dela nem nas câmeras públicas das outras cidades...

Aaron sorriu de maneira arrogante.

— Acontece que eu tenho meus contatos, rapaz.

Ele se aproximou da mesa e apoiou as mãos ali.

— Então fala logo!

Aaron se virou e começou a digitar algo em seu computador. Várias páginas se fecharam e apenas uma ficou em destaque.

Era o mapa da Califórnia com um ponto em destaque: Dunsmuir.

— Um contato me falou algo sobre uma moça bonita, vestida como alguém que queria passar despercebida e andando com um cara bem suspeito.

— Podia ser qualquer mulher...

— Nananinanão — ele balançou o dedo e Noble sentiu vontade de o socar também. — O que entrega esse homem é a tatuagem. O símbolo dos Novas Espécies cortado e localizado na parte de trás do pescoço.

— Espera... — Noble estava confuso. — O que essa tatuagem significa e por que Kaira estaria com alguém assim?

— Gegen Arten.

Aaron o encarou como se aquilo fizesse todo o sentido.

— Hã?

— Oras, Gegen Arten, o grupo Anti-Espécies que já organizou muitos ataques a Homeland e vez ou outra a Reserva — ele continuava sem entender. — Até mesmo fizeram algumas manifestações malucas.

Trey segurou o ombro de Aaron.

— Ah, Aaron... alguns Espécies não sabem disso, principalmente os mais jovens.

— Como assim?

O soldado hesitou antes de começar a falar.

— Há alguns anos ficou decidido que a nova geração não precisava se preocupar com Gegen Arten, eles eram apenas crianças e nós não imaginavamos que tomaria proporções tão problemáticas.

Aaron se levantou imediatamente, com o rosto vermelho pelo que parecia ódio.

— E agora eles são adultos no escuro! Que grande ideia! — ele bateu as mãos. — Eu vou bater palmas para o idiota que faz tal sugestão.

— As nossas crianças precisavam de um pouco de paz — Jericho argumentou. — De liberdade.

Noble deu um passo para trás.

— Não estou entendendo nada.

Todos olharam para Noble. Jericho com certa dúvida, Trey com pena e Aaron apenas com raiva.

— Gegen Arten, como diz o nome em Alemão, que dizer Anti-Espécies — Aaron começou, sua voz soando fria. — Um grupo de babacas carecas e tatuados sob a influência de algum líder psicopata que, tem como objetivo, nós supomos, a reprodução de Espécies para o tráfico de pessoas.

Ele preferia ter levado um soco do que ter ouvido aquilo.

Não fazia sentido algum.

— Reprodução... de Espécies? — sussurrou. — Existem outros de nós lá fora?

— Sim, Noble, mas é muito difícil encontrar suas localizações — Jericho disse, aproximando-se dele. — Anos atrás, a equipe da Força Tarefa encontrou Aurora em um esconderijo desse grupo e logo depois eles tentaram a recuperar — o primata tocou seu ombro. — Lembra-se daquela vez que eu fui atrás de você e da Kaira na floresta, durante o ataque? — Noble acenou, concordando. — Eram eles atrás de Aurora. Na época foi decidido que ela ficaria em um local mais isolado e protegida, quase que ela foi levada para os seus pais, mas... Leo tinha Stella e a pequena Kaira, então achamos melhor que ela tivesse a companhia de outra garotinha.

— E os outros filhotes?

— Nós não temos cem por cento de certeza que eles existam, Noble. É apenas uma suposição, já que muitos grupos tentaram a reprodução e fracassaram.

Algo em seu estômago o fazia querer vomitar.

— Mas e se existir?

— Nós vamos achar — Trey falou. — É o objetivo da Força Tarefa.

Ele se desvencilhou de Jericho e fechou os punhos.

— Vocês esconderem isso de nós por anos... sempre foi nosso direito saber disso!

Explodiu cheio de raiva e rancor; em seu coração não sabia se sentia mais ódio pelos humanos ou agora, por sua própria espécie.

Jericho estendeu as mãos.

— Tente nos entender, Noble, era para o bem de vocês.

— Para o bem? — rugiu. — Colocamos as nossas vidas em perigo no passado pensando que o sumisso dos Espécies fosse uma coisa passageira, mas na verdade eram esses caras! Eu poderia ter morrido, Forest poderia ter morrido! Para o bem? — controlou-se para não socar a mesa. — Vocês esconderam um fato que seria de extrema importância quando fôssemos tomar uma decisão!

— Noble...

— Não! — balançou a cabeça. — Não diga mais nada, nenhuma explicação vai fazer com que eu sinta empatia por essa estúpida decisão — apontou para si mesmo. — Nós, os jovens Espécies, somos o futuro, como espera que sejamos capaz de lidar com os problemas se nem sequer sabemos de todos os pontos da história?

Jericho não virou a cabeça ou baixou o olhar, permaneceu firme e o encarando.

— Você está certo, Noble... eu sinto muito.

Soltou um riso sem graça.

— Um pouco tarde para sentir, não é mesmo?

Ele não sabia como lidar com aquela nova informação.

Filhotes Espécies presos e eles ali? Sem fazer nada ou tomar alguma atitude? O que raios estava se passando pelas cabeças de Justice e dos outros líderes?

A sensação de paz e segurança que Noble sentira desde sempre se esvaiu com aquela nova realidade.

Como ele poderia viver em paz sabendo que crianças como ele sofriam fora daqueles muros?

Estava tudo uma bagunça e sua companheira se fora... se ao menos Kaira estivesse ao seu lado.

— Espera — parou de andar de um lado para o outro. — Como Kaira soube disso?

Trey ergueu a mão.

— Eu disse à ela, mas já faz muito tempo...

Noble sabia que algo vinha atormentando Kaira, não lhe escapava agora que tudo estava muito explícito.

Ela agia diferente quando estavam apenas os dois juntos, como quando andavam pela floresta a noite e ela dizia coisas estranhas, com aquele olhar distante enquanto pedia para que ele nunca a odiasse, mesmo que fizesse uma idiotice.

E ainda havia a obsessão por aprender mais e mais; passar os dias estudando e lutando, ainda que trabalhasse no Centro Médico.

Noble precisou se sentar um pouco.

Ele sentia que estava prestes a explodir e não seria agressivamente. Seus olhos ardiam.

— Por que ela... por que ela estaria com esse cara?

— Não é óbvio? — Aaron retrucou antipático. — Ela acha que pode ser uma heroína.

E, infelizmente, ele sabia que aquele era exatamente o tipo de coisa que sua companheira faria.

🌡️

Kaira odiava a sensação de que estava nos bastidores do filme "O Poço", da Netflix, tantos eram os níveis subterrâneos daquela prisão. Ela andara pesquisando ou melhor, conversando, com algumas das mulheres presas — ao menos com aquelas que falavam inglês — já que não entendia muito de espanhol e francês, para logo compreender que não conhecera nem metade daquele lugar.

Era triste saber que aquelas pobres pessoas estavam presas porque acreditaram em mentiras de alguém que claramente se aproveitou num momento ruim de suas vidas, fazendo promessas de um bom futuro quando, na verdade, o que as aguardava era o tráfico e a prostituição.

Uma vez, enquanto lia reportagens, Kaira encontrara um homem chamado Marc Dutroux, um ladrão, traficante, pedófilo, estuprador e assassino em série da Bélgica.

O que ele tinha em comum com o grupo Anti-Espécies?

Uma contrução que com certeza continha inúmeros túneis para transportar pessoas sem ninguém notar e, além de uma tendência a serem psicopatas em potencial, prendiam seres vivos em jaulas.

Kaira também descobrira outras coisas sobre aquele grupo. O local onde cortara cabelo era uma espécie de "clube do malvados", onde as mulheres capturadas tinham o trabalho de se prostituir e vender drogas, além de que havia o caso de ilegalidade onde financiavam jogos de azar e não apenas isso.

Aparentemente existia uma "rinha" de animais contra Espécies, o que não fora a coisa mais chocante que descobrira.

Aquela prisão, pelo que ouvira de outro carrasco, não era única. Sabe-se lá quem, o verdeiro patrão, ou como ela gostava de chamar, "O Grande Chefão", havia investido em outros laboratórios onde eram feitas as antigas e novas drogas testadas em Espécies, com o caso de contrabando de itens medicinais, o rapto de profissionais da saúde, como Helena Price, e a venda de cadáveres e humanos vivos para fins de comércio de órgãos.

A lista era longa e Kaira anotava cada um desses crimes em um diário que agora mantinha bem escondido. Não apenas isso, mas também anotava nomes e locais, já que ainda não conseguira ter acesso a nenhum computador deles.

A segurança era boa.

Embora a superfície passasse a imagem de abandonada e fácil invasão, logo notou que eles tinham um sistema de segurança impressionante, como câmeras de última geração, aparelhos de escuta e travas eletrônicas, com direito ao uso de digitais, o que a desanimou para entrar na sala de controle.

Precisaria de um bom plano para invadir os arquivos, os copiar e mandar para o seu drive online.

Kaira fez uma cara de durona e espetou o frango com mais força. A hora que ela mais odiava e adorava era a da refeição; ela podia se alimentar e descobrir novas coisas, mas também tinha de suportar o olhar de vários idiotas, como os dois que estavam a olhando e cochichando.

Ela só precisava mostrar que era forte e não uma medrosa, ou alimentaria qualquer tipo de fetiche na cabeça deles.

Não confiava em ninguém, nem na própria sombra.

Helena também era um problema, a médica a odiava e Kaira temia que a mulher lhe fizesse algo que precisasse revidar. A ideia de a manipular com ameaças sobre a filha eram boas, mas Kaira tinha pena, no entanto precisava se cuidar para parecer durona para todos, até mesmo para os inocentes.

🌡️

Kaira aplicou a insulina em si mesma e descartou a embalagem no lixo, depois saiu do banheiro e caminhou lentamente pelo corredor branco.

O coração dela pulsava com força.

Ela havia decorado o horário dos dois homens que monitoravam as câmeras, computadores e servidores. Um deles se chamava Edgar e o outro Paul; o primeiro era mais velho do que o pai dela, enquanto o último não deveria ter mais do que trinta anos.

E, foi quando ela viu Paul próximo a porta da segurança e a fechando, que apressou os passos e acenou.

— Olá, Paul.

Ele a olhou com estranheza.

— Oi.

Kaira colocou as mãos na frente do corpo e sorriu.

— Eu vi você ai e pensei que poderia me ajudar!

— Ajudar?

— Sim! — exclamou como uma boba. — Cara, este lugar é muito grande e eu não faço ideia de onde estou. Sabe, faz apenas duas semanas que eu cheguei e ainda estou em processo de adaptação, então... pensei que um cara como você, que lida com a segurança, com certeza conhece o prédio de cabo a rabo, deve ser um expert. Talvez consiga até andar de olhos fechados por aqui.

Exagerou um tanto ao falar sobre as habilidades dele, mas esperava que um homem como ele fosse um tanto orgulhoso sobre o que fazia, mas Paul não sorriu ou se gabou.

— Quer ir até onde?

— Voltar a enfermeira...

Deu uma breve olhada para dentro da salinha.

Não era diferente do que estava acostumada no laboratório, embora menor e com menos dispositivos eletrônicos.

Paul fechou a porta e Kaira desviou o olhar para a fechadura onde apoiava a mão e depois para o sistema de segurança digital. Se não houvessem tantas câmeras no corredor, ela poderia usar o pó colorido na maçaneta e conseguir um traço perfeito da digital, para depois colar com uma pequena lâmina de plástico transparente, como as usadas para retroprojetar.

Mas essa opção estava fora de cogitação, então a única forma de conseguir as digitais dele seria a de um copo, mas Kaira nunca o via no refeitório.

Precisava descobrir que hora Paul comia.

Ele a acompanhou por um curto período até o elevador e entrou junto, dando a ela certa esperança ao clicar no botão, mas que logo se foi. Ela não teria tempo de ir até o dormitório e voltar, antes disso alguém já teria usado o elevador.

— Cara, que fome — colocou uma mão na barriga. — E olha que eu já comi!

— Hm.

Odeio pessoas introvertidas, pensou.

— Você já comeu?

— Ainda não.

Precisava fazer uma pergunta sem parecer muito evassiva.

— Sabe, eu sempre como cedo porque se o fizer muito tarde passo terrivelmente mal! Acho que é de família, minha mãe também é assim, mas o meu irmão deu sorte, ele não é nada parecido com nós duas!

Falar sobre família passa a sensação de conforto para algumas pessoas e a de extremo tédio a outras, que desesperadamente vão querer mudar de assunto.

O cara aparentemente era do segundo tipo, já que mudou a posição das pernas e cruzou os braços, então disse sério:

— Eu não passo mal em horário algum após comer.

— Nossa, você é sortudo! — agora outra frase para garantir segurança sobre o assunto. — Sempre que eu falo sobre isso com os outros, alguns concordam que comer muito tarde gera desconforto. Aliás, que horas você costuma frequentar o refeitório?

— Apenas à noite, quando termino meu turno.

Às dez horas.

— Nossa... é nesse horário que eu gosto de tomar um chá.

O elevador parou e ele suspirou.

— Aqui é o andar da enfermaria.

— Você foi tão gentil me trazendo até aqui, muita obrigada! — acenou para ele ao sair do elevador. — E cuidado com a indigestão, comer tão tarde não é bom! Talvez nós possamos tomar um chá juntos qualquer hora e...

As portas de aço se fecharam e ela soltou uma risada.

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