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Contos de uma infância

Kaira não estava satisfeita com o castigo de sua mãe, poxa, por que ela deveria ficar sem videogame e doces? Não podia ser ficar sem banho ou sapatos?

Não.

Sua mãe estava concentrada em tiras somente as coisas boas e manter as chatas, como: decorar a tabuada, assistir aulas de matemática que ela deveria estar aprendendo em uma escola normal e ler livros de ortografia.

Estava sentada na cadeira da cozinha, com os dedos da mão direita doendo de tanto escrever palavras repetidas, até que um Leo todo descalço e com o cabelo molhado entrou no cômodo. O saquinho transparente nas mãos dele automaticamente chamou sua atenção. Eram jujubas deliciosas e, jugando pela cor das guloseimas, ela podia dizer que eram de uva.

Suas preferidas depois de maçã verde.

Soltou o lápis na mesa e sorriu para ele, como quem não queria nada.

— Oi!

— Oi, pequena — ele puxou uma cadeira e se sentou ao lado dela, olhando para os papéis preenchidos de ponta a ponta. Um brilho de diversão passou pelas orbes dele e Leo soltou um riso baixo. — Quantas folhas ainda faltam?

— Quatro — Kaira apertou os olhos e suspirou fundo. Seus olhinhos se voltaram para o saquinho de balinhas. — Me dá uma jujuba?

— Leo, vem aqui agora!

Os dois olharam para a sala ao mesmo tempo, sua mãe estava lá.

— Desculpa, gracinha, mas sem doces para você.

Leo se levantou e caminhou até a porta, indo em direção a fêmea.

— É tão injusto!

— Injusto é você sair escondida achando que não teria consequências, você é mais inteligente do que isso, Kaira — Stella rebateu na mesma hora, deixando-a sem palavras e também sem vontade de responder, o castigo poderia ficar ainda pior. — Agora termina as suas tarefas e depois vai tomar banho.

Atividades e banhos, era tudo o que ela estava fazendo durante a semana inteira.

Depois de terminar os exercícios, Kaira subiu e tomou banho, tudo para passar o resto da noite ouvindo uma conversa entediante entre seus pais. Leo não largava sua mãe nem um segundo, o tempo todo com as mãos alisando a barriga redonda e falando com o bebê.

Ela achava uma idiotice, ao menos até sentir um chute dele.

Aquela lembrança ficaria para sempre em sua cabeça. Estava deitada no chão, sobre o tapete, fazendo massagem nos pés de Stella quando a mesma deu um pulinho no sofá e riu, divertida. Kaira virou a cabeça para trás e encarou a mãe confusa, não vira nada de engraçado na televisão. Aurora reagiu de maneira diferente, pulando também, mas assustada. Leo, que estava ao lado da fêmea, se aproximou mais e foi quando Stella pegou a mão dele, levando a palma até o próprio ventre.

Kaira observou tudo com atenção e Aurora ao seu lado também ficou parada, com os olhos voltados para o momento entre o casal.

— Ele mexeu — Leo estava surpreso, olhando para o ventre com os olhos arregalados. Kaira sentia a emoção dele, não precisava de muito para notar que ele estava exultante. O macho se inclinou até a barriga e ronronou, acariciando o local onde o bebê chutara. — Oi, filho...

— Quero sentir — Kaira se levantou e colocou a mãozinha ao lado da de Leo. Nada aconteceu por um bom tempo, até que ela sentiu um impacto intenso sob sua palma. Ela deu um passo para trás, surpresa e olhou para os pais. — Ele é forte!

O coração dela retumbou dentro do peito com aquela sensação incrível de que algo especial estava acontecendo, era o seu irmãozinho se mexendo e logo ele estaria nos braços de sua mãe. De repente se sentiu mais propensa a fazer tudo que sua mãe pedisse ou mandasse, tudo para que seu irmãozinho ficasse bem. Sentia-se protetora. Kaira apoiou a bochecha na barriga de Stella e sorriu quando o bebê se mexeu novamente. Passou os lábios pela pele de sua mãe e murmuro:

— Eu mal posso esperar pela hora de te ver, Leon.

Aurora se moveu atrás dela, tímida e curiosa.

— Posso tocar?

— Claro, meu amorzinho — Stella sorriu e alisou o ventre de novo, sentando-se o mais confortável possível. — Acho que ele gosta muito quando tem a atenção de todos vocês, está se movimentando tanto!

Os dias se passaram lentamente na Zona Selvagem sem que ela pudesse se divertir do lado de fora da casa, mas tudo mudou quanto uma Tammy inquieta bateu na porta deles durante a manhã.

Kaira quem atendeu, sendo seguida por uma Aurora sorridente.

— Oi, Tammy — olhou pela varanda em busca de Noble, mas ele não estava com ela. — Quer entrar?

— Não vou entrar, na verdade estou indo pegar um helicóptero para ir até Homeland resolver alguns problemas.

Os olhos de Kaira brilharam em entusiasmo, lembrando-se do quanto era bom estar no céu.

— Noble vai com você?

— Não — Tammy negou com a cabeça, rindo. — Noble ainda é jovem demais para aparecer na frente dos outros humanos. Ele só ficou para trás porquê subiu em uma árvore e não quis sair, Valiant agora deve estar tentando o convencer a descer sem rugir, eu espero.

Ela estava para abrir e boca e falar quando sua mãe apareceu atrás dela, segurando-a pelo ombro e a tirando da frente da porta.

— Tammy! — Stella sorriu. — Que surpresa!

— Oi! — as duas se abraçaram e Tammy tocou a barriga de sua mãe. — Mais um pouco e ele estará entre nós.

— Penso nisso todos os dias!

— Eu imagino... Então, tudo bem se Noble passar esta tarde aqui? Preciso ir até Homeland e Valiant não me deixa ir sozinha, você sabe como ele é.

— Está tudo bem? — Kaira não entendeu o assombro repentino de sua mãe, então prestou ainda mais atenção na conversa.

Tammy olhou para as duas antes de falar, parecia hesitar.

— Só alguns problemas, nada muito grande.

— Entendo, Noble pode ficar conosco.

Toda a atenção de Kaira se voltou para Valiant e Noble que se aproximavam pela trilha, precisou sair de trás das costas de sua mãe para que ele pudesse vê-la. Ele parecia sério e irritado, com uma carranca que não contribuía muito levando em consideração que o rosto dele não era muito normal, no entanto o sorriso de ambos se abriram em sincronia quando seus olhares se encontraram.

Ela não sabia que sentia tanta falta dele até vê-lo. Aquelas semanas somente com a sua família a fizeram se dar conta de que realmente queria ser melhor amiga dele. Sentia falta das brincadeiras e conversas, até mesmo do sorriso afiado e do jeito dominante com que ele agia.

Gostava muito de Noble.

Noble fez menção de avançar até ela, mas Valiant o segurou e disse algo em voz baixa. Kaira também deu um passo à frente, saindo para a varanda e esperando que a conversa entre os dois logo chegasse ao fim. Seus olhos não se desgrudaram por nenhum segundo sequer; havia doçura nas orbes douradas, um brilho intenso de satisfação e ela esperava que fosse por finalmente vê-la, pois se sentia da mesma forma.

Algo incrível estava acontecendo e ela não sabia explicar e nem tentou entender, não quando Valiant soltou Noble e o mesmo caminhou rapidamente em sua direção. Kaira ficou parada, com o seu coração batendo levemente mais rápido e forte, era bom.

Os braços dele se abriram quando estavam próximos e Noble a capturou em um abraço de urso, levantando-a do chão e a apertando com força contra ele, ela passou os braços ao redor dos ombros dele, agarrando-se a ele de volta, retribuindo o carinho.

— Estou feliz por te ver de novo, Kaira. Senti sua falta.

Então Noble começou a se esfregar nela, roçando suas bochechas e cabelos, Kaira gargalhou alto.

— O que você está fazendo?

— Deixando meu cheiro novamente em você.

Ela o encarou de frente, estranhando.

— Por quê?

— É o que me parece certo — ele balançou os ombros, em descaso. — Nós estivemos separados e você perdeu meu cheiro.

— Isso é estranho, Noble.

— É coisa de Nova Espécie, você vai se acostumar.

Alguém forçou a garganta atrás deles e Noble a colocou no chão de volta, mas não se afastou muito.

— Seja educado e diga oi para Stella e Aurora, elas também moram aqui.

— Oi!

O amigo acenou para sua mãe e irmã, que retribuiram.

— Kaira, vem aqui um segundinho!

Ela estranhou o pedido de Tammy, mas fez como a mulher pediu e se aproximou dela. A mãe de Noble de agachou rapidinho e murmurou bem baixinho na orelha de Kaira.

— Diga a ele que matemática é divertida, ultimamente Noble vem se espelhando em seus gostos. Ele assistiu todos os filmes do Jurassic Park e está crente de que pode ser tão feroz quanto um dinossauro.

Kaira sorriu ao se afastar de Tammy ao descobrir tal coisa, sentia-se triunfante e recebeu um olhar sério de sua mãe, mas nem a seriedade nos olhos azuis a fizeram desanimar.

— Tudo bem — sorriu como um anjinho e puxou o amigo depois, arrastando-o consigo para dentro da casa quando o mesmo se despediu dos pais. — Vamos, Noble, tem muitas coisas que quero te mostrar.

Noble entrou na casa, usava bermuda e uma camiseta grande, não usava sapatos e entedia o motivo dele odiar usá-los, também não gostava. Ela o chamou com um gesto e, quando ele se aproximou, a primeira coisa que disse foi:

— Matemática é um saco, eu odeio.

🌡️

Kaira sempre desejou ter um cachorrinho ou um gatinho de estimação, mas os problemas de sua avó a impediram de conseguir realizar seu sonho. Agora que vivia na Zona Selvagem ela tinha um melhor amigo que ronronava como um gato e que às vezes rugia como um leão, mas não podia chamá-lo de animal de estimação já que quase nunca Noble fazia o que ela mandava, embora soubesse que secretamente ele tentava gostar das mesmas coisas que ela.

No entanto, um dia seu sonho se concretizou, não com um gato ou cachorro, mas um coelhinho branquinho e assustado, que nunca a deixava se aproximar muito. Bom, talvez parte da culpa do pobrezinho ser traumatizado fosse de Noble, já que ele caçava o coelho como se fosse seu jantar.

Eles tentavam de tudo, desde oferecer cenouras e outros vegetais, mas ele se recusava a sair debaixo dos móveis. A única que se aproximava vez ou outra do bichinho era Aurora, embora nem nela o coelhinho confiasse.

Kaira queria chamá-lo de Pernalonga e Noble, por insistência, chamava o coelho de Cucoco e ela simplesmente se acostumou ao apelido estranho e totalmente sem sentido.

Ela esperava ficar com Cucoco por um bom tempo, mas ele cometeu um erro terrível; comeu a pequena árvore que sua mãe esperava crescer. Sua mãe usou esse argumento e também o fato dele feder muito — culpa de Kaira e Noble por terem jogado água no coelho — para o devolver para Torrent depois de três semanas.

Pois é, ele não passou nem um mês na casa.

Entretanto, Kaira e Noble nunca se esqueceram do pobre coelho de nome esquisito.

Um tempo depois do incrível caso com o bichano, ela ganhou uma bicicleta rosa da Barbie com sininho e com uma cestinha adorável na frente, toda enfeitada com purpurina. Ela era boa em andar sem rodinhas, não se lembrava de quando abandonara o apoio, mas foi rápido e fácil.

Enganaram-se aqueles que pensaram que a bicicleta toda feminina fosse só dela, óbvio que não, Noble fazia questão de passar mais tempo brincando com o presente do que Kaira. Ele parecia um pequeno monstrinho pedalando com força e fazendo poeira, embora às vezes, quando Kaira estava pedalando, ele só corresse atrás.

Ainda assim era questionável de quem era a bicicleta, em todo o caso Kaira simplesmente respondia da seguinte forma:

— É nossa bicicleta.

Visto que de repente parecia que tudo que era dela também era dele, e tudo que era dele era dela.

Entendia que Noble podia ser um poço de energia sem fim, na verdade o melhor amigo dificilmente se cansava. Algumas vezes, quando seus pais jantavam juntos, ela coçava os olhos com sono e ele ainda parecia ótimo, completamente pronto para fazer qualquer coisa.

Gostava de correr com Noble pela floresta e escalar pedras e árvores, mas ultimamente ela não se sentia tão bem disposta. Ainda comia os espinafres e beringelas que sua avó sempre dizia para comer, gostava até das beterrabas. Eles não deveriam fazer bem para a sua saúde? Pensava que ficaria forte os comendo sempre.

Ainda assim, quando corria com Noble, sentia-se fraca e cansada muito mais rápido do que o normal.

Um dia, estavam caminhando próximos do rio quando ela precisou parar e se sentar em uma das rochas. Sentia uma sensação estranha nas pontas dos dedos, como se eles estivessem tremendo e palpitando, enquanto seu estômago se retorcia de fome.

O engraçado é que ela não fazia muito tempo desde que almoçara na casa de Tammy e Valiant.

— Você está bem? — Noble perguntou e Kaira o olhou com o canto dos olhos, ele fungava, cheirando o ar ao redor. — Seu cheiro parece diferente.

Kaira esticou a mão, agarrando a camiseta dele e apertando o pano, mas até nesse gesto ela se sentia cansada e sonolenta. Ela se moveu para frente e para trás, quase caindo na água se Noble não estivesse lá para a segurar.

— Kaira?

— Não me sinto bem...

— Vou chamar meu pai!

— Não — o impediu de sair correndo. — Não me deixa sozinha, Noble.

Ele concordou, mesmo que a contragosto e se sentou ao lado dela, alisando sua coluna com uma mão. Ficou parada, lentamente puxando o ar pelo nariz e soltando pela boca, até que o ritmo de seu coração e corpo voltasse ao normal.

Demorou alguns instantes, mas as sensações ruins passaram e não se sentia mais tonta ou confusa.

Abriu um pequeno sorriso para ele, que a olhava com preocupação.

— Me diga algo legal — murmurou, levemente nostálgica, pedira o mesmo em outro momento de medo.

— De novo? — Noble perguntou inocentemente e se aproximou mais, segurando a mão dela. — Hm, eu não sei... O que você quer saber?

— Eu só quero falar e falar.

Ele estreitou os olhos, rindo.

— Você sempre quer falar e falar!

Kaira concordou com um aceno, bom, não tinha como o contrariar.

— Eu não gosto do silêncio — disse baixinho, como se fosse o seu grande segredo. — Não gosto do frio e não gosto de estar sozinha.

— Por quê?

— Faz com que eu me lembre de... bem, faz com que me lembre das tardes ensolaradas, sozinha no balanço de casa, esperando minha mãe voltar para casa depois do trabalho um tempo após meu avô morrer — ela suspirou e apertou a mão dele, satisfeita por ser quente, como o sol. — Quando o meu avô morreu tudo foi tão triste e silencioso, sabe, ele era um homem legal. Sinto falta dele, principalmente das coisas que me contava.

— Sinto muito.

— Hm — ela piscou os olhos com força, olhando para a água. — Ele foi tudo o que tive como pai até Leo chegar, você não faz ideia como fiquei feliz quando o conheci!

— Eu imagino — Noble comentou, divertido. — Kaira?

— Sim?

— O que aconteceu com o seu pai verdadeiro?

A expressão dela automaticamente se fechou, contrariada pelo pergunta. Não fazia ideia do que dizer a ele, será que a reação dele seria a mesma das outras crianças que sabiam da verdade? Elas costumavam a olhar com estranheza, como se fosse uma alienígena e tivesse uma segunda cabeça em seu pescoço.

— Leo é o meu verdadeiro pai — declarou em voz alta, soando mais grosseira do que queria ou deveria. Noble encolheu os ombros e Kaira sentiu o coração se apertar, não, ela não podia tratar seu único amigo daquela forma. Então, com um sorriso desanimado, resolveu contar tudo o que sabia sobre o homem que nunca conheceu. — O meu pai de verdade nunca apareceu, ninguém fala dele... nunca. Minha mãe sempre me distraiu quando este era o assunto e minha avó ignorou completamente minhas perguntas. Eu não sei nada sobre ele, como se chama ou onde vive, ele é apenas como um fantasma que sempre assombra o meu dia dos pais.

— Eu sinto mui—

— Não, não quero que diga isso ou que sinta pena, eu o detestaria se fosse assim.

— Tudo bem — Noble apertou os dedos dela e se inclinou em sua direção, fazendo-a estranhar aquilo. Ele beijou sua bochecha e Kaira sorriu, feliz. — Quem se importa com os pais? — ele zombou. — Estamos bem sem eles.

Ela gargalhou alto, achando graça.

— Engraçado — o cutucou somente para irritar. — Você agora a pouco disse que ia correr e chamar seu pai!

— Você é má, Kaira, sabia disso?

Levantou-se, puxando-o consigo logo após.

— Dizem que sou muitas coisas, mas nunca má — brincou. — Vamos, eu me sinto melhor!

Os dias se passaram e ela não voltou a sentir aquelas sensação, não de maneira tão intensa e sentia medo de contar a sua mãe, sabia que mulheres grávidas não podiam se assustar ou se desesperar.

Então deixou para lá.

Kaira estava feliz em arrumar o jardim da casa, principalmente no início da manhã quando as formas dos raios solares ultrapassavam pequenas brechas entre as árvores altas e faziam belas sombras sobre o solo cheio de plantas que ela e Aurora plantaram. As cores que se somavam, quando o sol iluminava todas as flores coloridas, era de tirar o fôlego.

Ela sempre ficava feliz e encantada ao saber que fazia parte daquilo, que estava construindo um pedaço do paraíso no quintal da casa.

Sua mãe algumas vezes no dia se sentava na mesa do lado de fora e ficava alisando o ventre inchado com o bebê, olhando-as arrumar as flores e depois brincar.

As flores preferidas de Kaira eram as Escadas de Jacó, com seus tons fortes de azul e roxo. Aurora também parecia atraída pelas plantinhas, as cheirava com afinco e reproduzia sons baixos e fofinhos. Quando perguntou o motivo dela fazer aquilo, a irmã disse a flor era como um ímã delicioso e cheiroso.

As duas passaram a manhã toda trabalhando com terra e água, ouvindo músicas agitadas do pequeno rádio que Kaira sempre carregava consigo.

— Mamãe está nos chamando — Aurora avisou com um fio de voz, erguendo-se num pulo impressionante. — A comida tá pronta.

— Pode ir na frente — fez um gesto para ela, a mão cheia de barro. — Quero terminar meu castelo.

— Não me parece um castelo.

Kaira observou melhor o monte de barro e, infelizmente, chegou a conclusão de que realmente sua sobra não se espalhava a um castelo, era só muito barro disforme e meio que derretido.

Deu de ombros, rindo.

— Poderia ser um castelo de lava derretendo se fosse laranja e quente!

Aurora não entendeu e Kaira não esperava que entendesse, ainda precisava ensinar muitas coisas a sua nova irmãzinha.

— Vamos!

Tentou se erguer de uma única vez também, querendo imitar a irmã felina, mas uma tontura repentina e agonizante a atingiu. Kaira caiu de joelhos e ofegou ao sentir o seu coração apertar dentro do peito, batendo num ritmo rápido e doloroso.

— Mãe! Pai!

A última coisa que ouviu antes de se deitar cansada no chão foram os passos rápidos e pesados de Leo, que a chamou pelo nome antes de desmaiar.

🌡️

Kaira acordou com uma luz branca incomodando seus olhos, ela suspirou ao virar o rosto e o cheiro de remédios invadiu seus pulmões. Sua casa não tinha aquela cheiro e aquela cama alta e larga com certeza não era a dela.

Olhou para os lados, verificando o quarto branco vazio, depois para o próprio corpo; usava um pijama confortável e havia uma agulha conectada na veia de seu braço direito, acompanhou o fino tubinho transparente até o saquinho de plástico cheio de um líquido parecido com água.

Não sentiu medo, estava acostumada a tomar soro desde que tivera sua primeira virose e sabia que aquilo fazia bem para o corpo.

Ela estava para fechar os olhos e voltar a dormir quando a porta do quarto abriu e sua mãe entrou, não sozinha, uma mulher bonita e loira a acompanhava. Era uma médica.

— Querida! — sua mãe sorriu e acariciou o rosto de Kaira, que sorriu também. Sentia-se bem com o toque quente e materno. — Meu amorzinho, você se sente melhor?

Concordou com um aceno.

— Que bom... Ficamos todos preocupados com você!

Kaira olhou para a mãe e depois para a médica, o que será que ela tinha? Será que era ruim? Iria morrer? De repente se alarmou, ela não podia morrer, não antes de terminar o Lego do Batman e ver o seu irmão nascer.

Eram suas prioridades!

— Eu vou morrer? — indagou, sentindo-se um pouco apavorada.

— Não! — a médica riu e chegou ao lado de Kaira, verificando algo em seu soro. — O que você tem é chamado de hipoglicemia, Kaira. Uma vez que os níveis de glicose no sangue caem, nosso corpo recorre a estoques de glicogênio, que são as reservas energéticas das nossas células. A maior parte do nosso glicogênio está armazenado nos nossos músculos e fígado. Por isso, eventualmente, você se sentiu fraca e caiu.

— O que é hipoglicemia? — perguntou, embora tivesse medo da resposta.

— Acontece quando os níveis de açúcar no sangue estão abaixo do adequado, por isso você precisa se alimentar melhor e mais.

Kaira não entendia. Sua alimentação era ótima, incrível na verdade, ela gostava de coisas relacionadas a saúde.

— No entanto — a médica voltou a falar, capturando toda atenção de Kaira. — Pelo que sua e eu conversamos, você é uma garotinha que tem comido muito e bem, então logo descartei uma opção, que seria uma alimentação desbalanceada. Você também não tem nenhuma tendência a ser diabética e não toma nenhum remédio que poderia causar a hipoglicemia. Não usa drogas ou álcool.

Ela apertou as sobrancelhas, não, era óbvio que ela não se encaixava em nenhuma daquelas opções.

— Então vamos deixá-la aqui enquanto fazemos mais testes, de preferência com você acordada.

Kaira concordou.

Ela passou dois dias inteiros no Centro Médico, algumas horas em jejum e outras experimentando as comidas que a médica levava para ela. Trisha era gentil e legal, além de que ela tinha um filho chamado Forest. Kaira nunca o vira, mas Noble havia falado dele algumas vezes.

Forest foi o primeiro filhote a nascer naturalmente entre os Novas Espécies.

Recolheram seu sangue várias vezes e, mesmo aplicando o soro glicosado, Kaira continuava se sentindo muito ruim às vezes, mas depois a médica mandou que aplicassem outra coisa em sua veia e isso fez com ela se sentisse bem, não era muito como o soro de antes, era um dose menor e diferente. Noble e os outros vieram vê-la, tinha sido bem legal receber mimos das fêmeas Novas Espécies que viviam por ali.

Elas eram em sua maior parte altas e lindas, Kaira queria ser como elas um dia.

Na noite do seu segunda dia na cama, a médica entrou feliz em seu quarto.

— Olá, Kaira!

— Oi, Trisha.

A loira de jaleco se aproximou da cama e se sentou, verificando o soro novo e sorrindo de forma orgulhosa.

— Como se sente?

— Agora me sinto ótima, é como se não tivesse nada de errado.

— Isso aqui que você está tomando se chama insulina, ela serve para ajudar com que a glicose entre em suas células e vai fazer com que você se sinta melhor — a médica tocou o rosto de Kaira, fazendo um breve carinho em sua bochecha. — O seu pâncreas produz insulina e ele está ótimo, mas o seu corpo, por algum motivo estranho, também produz anticorpos contra a insulina e é exatamente isso que faz com que você se sinta ruim. A glicose não consegue entrar nas células necessárias e você acaba tendo os sintomas de hipoglicemia. A conclusão que cheguei é que isso é hereditário, um problema com suas enzimas que sua mãe ou pai provavelmente também tem e que apenas agora começou a dar as caras em seu organismo. Ele já estava lá, agindo mais lentamente e por causa da sua mudança para cá, tomou outras proporções. Ansiedade e estresse provavelmente ajudaram no aumento total.

— Minha mãe não tem isso e nem Leo, Novas Espécies não ficam doentes.

A doutora arregalou os olhos e depois pigarreou, pensando no que dizer.

— Kaira — a médica olhava cuidadosamente para ela. — É do seu pai biológico que estamos falando, não de Leo, ele não tem qualquer participação nas questões que envolvem o seu erro metabólico hereditário.

Kaira negou, irritada.

— Você está mentindo!

— Querida... Ah, eu vou falar com a sua mãe e ela vai conversar com você.

— Eu não quero saber!

— Calma, querida...

Kaira se virou, dando as costas a médica e pressionou o rosto contra o travesseiro, sentindo algumas lágrimas tomarem conta de seus olhos.

Seu pai era Leo, e somente ele!

Estava parada, sentada sobre a carteira nova da sala de aula improvisada. Um milhão de sentimentos estranhos e confusos enchiam sua cabeça, nenhum deles voltados a aula de matemática que acabaram de ter, mas sim em relação a estranha afeição que seu melhor amigo começara a ter com outro filhote. Kismet era o nome do Nova Espécie, ele tinha um cabelo escuro e olhos de gato azuis e inteligentes, além de ser o único que competia nas aulas com Kaira.

Ela o odiava, por ser um esnobe chato e também por ter roubado seu melhor amigo.

Noble e Kismet estavam sempre juntos agora, fazendo assim como que ela se sentisse sozinha e trocada.

Os dois estavam plantando bananeira na sala quando a professora entrou. O nome dela era Anna e ela era linda e maravilhosa, Kaira queria ser como ela também quando crescesse, na verdade havia uma lista infinita de coisas que ela queria ser. Jericho era o oficial que sempre acompanhava a mulher e ficava do lado de fora da sala, os esperando e garantindo suas seguranças enquanto ela ensinava.

— Ei, Kaira? — ela virou o rosto para Noble, a sua direita. Sua vontade era de não dar atenção a ele, mas era impossível. — Quanto que dá essa conta?

— Por que não pergunta ao seu amigo? — retrucou, sorrindo meio azeda. Os olhos dourados dele se arregalaram e Kaira se sentiu péssima, orgulhosa, mas péssima.

— O resultado é quatorze, Noble — Kismet respondeu e o olhar que eles trocaram foi o pior possível.

Ótimo, se era guerra que ele queria, era isso que teria.

— Traidor — resmungou quando Noble acompanhou o garoto para fora da sala num breve momento de intervalo que eles tinham para brincar do lado de fora. — Mentiroso...

Ficou dentro da sala mesmo quando Salvation e Forest a chamaram para brincar, não estava nenhum pouco a vontade. Ela estava irritada e queria urgentemente pensar em algo para fazer, estava até se concentrando quando a porta se abriu com um baque baixo e dois corpos entraram. Era uma cena estranha, Jericho e Anna estavam meio que abraçados e com os cabelos bagunçados, seus lábios se tocando e Kaira achou aquilo extremamente nojento e desnecessário.

Por que estavam daquele modo?

— Eca, por que adultos fazem isso? — perguntou em voz alta, atrapalhando o momento deles. Jericho, na pressa para se afastar da professora, esbarrou na mesa dela e derrubou todos os livros, fazendo um barulho alto e que atraiu os filhotes Novas Espécies para a sala também. Kaira sorriu para os meninos. — Anna e Jericho são namorados!

— Deus, não!

Anna estava toda corada e as crianças riram dela, pois fazia gestos escandalosos e tentava arrumar a própria roupa, mesmo que estivesse toda bagunçada e sem rumo.

— Nós não namoramos, você não deveria ter falado algo assim, Kaira, é feio!

— É a verdade — ela riu, ainda curiosa, por isso fez uma pergunta. — Professora?

Todas as atenções se voltaram para Kaira ao chamar Anna.

— Sim?

— Por que os adultos se beijam?

— Porquê eles querem — Kismet quem respondeu de imediato, fazendo-a revirar os olhos.

— A conversa ainda não chegou no chiqueiro. 

O Nova Espécie olhou para ela confuso e Kaira sorriu, satisfeita por ele não entender coisas de humanos.

— Não é coisa que se diga ao seu amigo, Kaira — Anna suspirou. — E os adultos se beijam, hã...

— Porquê eles se gostam — Jericho respondeu, olhando no fundo dos olhos da professora e caminhando em direção a ela, até encostar os lábios contra os dela levemente. — Viram? Quando gostamos muito, muito mesmo de alguém fazemos isto.

— Meus pais fazem isso às vezes — Salvation disse depois de alguns minutos de silêncio entre os filhotes. — Eles se amam. Você ama a nossa professora, Jericho?

— Chega! — Anna cortou o macho adulto antes que ele pudesse falar. — Vamos voltar a aula, crianças não precisam saber de beijo.

🌡️

Kaira passou a manhã toda de sábado fazendo os deveres de casa e ajudando sua irmã com coisas simples, pois havia muitas coisas da qual ela não entendia. Era legal ajudar Aurora e mostrar a pequena tudo que ela sabia.

No almoço, Kaira comeu de tudo e um pouco mais, além de ter tomado insulina mais cedo. Ela tomava todos os dias uma com ação intermediária e só usava mais caso sentisse os sintomas de hipoglicemia. Sua mãe monitorava os seus doces mais do que antes, ela podia comer, mas não deveria exagerar só porquê faltava açúcar em seu sangue em algumas situações.

Depois de comer e escovar os dentes, uma visita chegou. Noble. Ela nem queria olhar na cara dele, aquela semana eles andaram meio afastados e ela colocava toda a culpa nele. Na verdade a culpa era de Kismet, ele que arrumasse um melhor amigo e deixasse o dela.

— Oie, Kaira.

— Oi.

O seu tom frio fez com que o amigo parasse no meio do caminho para a abraçar. Os olhos de ouro a encararam com estranheza e Kaira se irritou, ele não fazia ideia do que ela sentia. Não cogitava que sentia ciúmes dele com Kismet, na verdade ela não deveria sentir, mas era o seu melhor amigo, seu Noble.

Não queria que ele a deixasse quando percebesse que o outro Nova Espécie era capaz das mesmas coisas que ele, enquanto ela nem mesmo conseguia comer um peixe cru sem querer vomitar.

— O que aconteceu com você? — a voz dele soou baixa. — Por que está assim?

— Nada.

Noble inclinou a cabeça, observando-a atentamente.

— Não me esperou para vir embora ontem.

— Kismet estava com você, não precisava de mim.

A expressão dele ficou séria.

— Lógico que precisava, você é minha melhor amiga.

— Não pensou nisso quando me deixou de lado a semana toda — Kaira cruzou os braços, irritada consigo mesma ao ver tristeza nos olhos do amigo. — Eu me senti muito sozinha quando você saiu pela porta da sala sem me chamar, esta é a verdade. Senti ciúmes de Kismet, porquê você o segue como se ele fosse incrível e eu não posso fazer as mesmas coisas que vocês dois. Sinto muito.

Despejou tudo de uma vez, incapaz de controlar a própria língua. Noble encolheu os ombros, aproximando-se mais.

— Não queria que você sentisse assim.

— Quer saber de uma coisa? — indagou cansada. — Esquece, vamos brincar.

Kaira se virou para ir em direção a gangorra, adorava se divertir nela com Noble. Ele era forte o suficiente para mantê-la no ar por bastante tempo, era muito legal.

— Espera! — a mão dele era quentinha e segurou o braço dela, puxando-a de volta em sua direção. — Estive pensando no que Jericho nos disse na aula.

— O quê? — apertou as sobrancelhas, pensando nas milhares de coisas que o amigo primata falava para ela. Eram muitas.

— Sobre beijo.

— O que tem o beijo?

— Eu gosto muito, muito de você.

Kaira sentiu um frio na barriga ao ouvir aquilo, era sincero e Noble sorria gentilmente, ele parecia mais bonitinho assim. Suas mãos de repente pareciam suar e vacilar, mas não era culpa da sua hipoglicemia. Não, com certeza não. Não era por causa do açúcar que seu coração batia mais rápido ou que suas mãos se moveram até os ombros dele, aproximando-se como se fosse um instinto.

Não, nada daquilo era culpa do seu defeito.

Era efeito Noble.

— Eu... — o rosto dela estava quente, queimando na verdade. — Também gosto muito, muito de você.

Ele assentiu e aproximou o rosto do dela. Kaira simplesmente tampou a respiração, sem saber o que fazer ou como reagir. Apenas olhava no fundo dos olhos diferentes e esperava pelo toque. As testas se tocaram e, quando ela pensou que finalmente aconteceria, os dois ouviram passos altos e se afastaram, Noble praticamente pulou um dois metros para longe dela.

Era o seu pai, com uma careta assustadora e com um terrível olhar. Kaira se surpreendeu quando o macho arreganhou os lábios e mostrou as presas para Noble, rugindo na direção do filhote.

— Pai, não!

Ela chamou atenção do mais velho, estava realmente surpresa e com medo dele. O estrondoso barulho que escapara dele fora alto e doloroso para os ouvidos dela.

— Vá para casa, Noble — Leo rosnou. — Vá antes que eu queira te caçar!

O amigo foi embora depois de lançar um olhar em sua direção, Kaira assentiu e o observou sair correndo para dentro da floresta. Suspirou, ainda impactada, também frustrada porque o seu pai chegara no momento decisivo.

Outro rosnar a fez olhar para Leo.

— Nenhum macho pode te tocar — ele disse. — Vá para dentro agora, Kaira, nós vamos conversar sobre isso mais tarde, quando eu me acalmar.

Naquela noite, depois de ter uma conversa longa sobre chutar os machos entre as pernas e afastá-los se a quisessem beijar, Kaira se deitou e ficou muito tempo acordada depois das luzes se apagarem.

Só conseguia pensar em como seria beijar Noble, seria doce?

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