dois
Los Angeles | três anos atrás.
Os meus dedos percorriam calmamente e preguiçosamente pela pele de Yoongi. Ele ainda tinha a respiração descompassada, o peito subia e descia pelo esforço que havia feito há alguns segundos.
Não pude evitar deixar o sorriso bobo escapar, ao mesmo tempo que a dor percorria todo meu peito. Algo dentro de mim, me dizia que seria a última vez que isso aconteceria.
Dado aos acontecidos, que nos fizeram parar aqui, na nossa cama, entrelaçados e nus. Apenas apreciando a companhia um do outro, enquanto os meus dedos pequenos percorriam pela sua cintura fina, e desenhava todas as pequenas marcas vermelhas que ocupavam sua pele alva.
Levantei minha cabeça para encarar-lhe, ele tinha os olhos ainda fechados. Apesar de cansados, exibiam uma expressão dolorosa mesmo que ele não olhasse diretamente em meus olhos.
Seu coração ainda batia acelerado. Meus lábios abriram várias vezes para dizer algo que fizesse seu coração se acalmar, mas, eu sabia que não seria capaz.
Entrelacei as nossas pernas, juntando por fim, os nossos corpos suados ainda mais. Sua cabeça rapidamente se aconchegou em meu peito, e seus braços envolveram a minha cintura. Num aperto desesperado e sufocado, ele estava sentindo tanto quanto eu.
Mas, eu apenas fiquei em silêncio. Até ouvir seus soluços engasgados e seus ombros trêmulos. Afaguei seus cabelos, enquanto o envolvia contra mim, protegendo-o de qualquer que fosse o sentimento ruim que seu peito sentia.
Por mais que o meu peito estivesse explodindo em desespero.
— Você precisa respirar fundo, Yoongi. — disse, arrastado. Ouvindo seu ronronar e seus soluços ainda mais engasgados. Afastei os nossos corpos, e segurei seu queixo, fazendo-o olhar para mim.
Dando-me a visão de seus olhos pequenos apertados, cheios de lágrimas e inchados. Os lábios machucados pela força que ele fazia para segurar as lágrimas, então, por via das dúvidas, apenas mordia os próprios lábios.
— Não se machuque assim, meu bem. Vai ficar tudo bem, sim? — ele negou.
— Você vai ser preso, Jimin. Eles vão levar você. E poxa, isso é tão injusto e..— ofegou, caindo no choro novamente. Eu apenas o ouvi. Talvez, a sensação de sufocamento não estivesse somente nele, mas, em mim também. Porém, eu sabia perfeitamente esconder a dor que me acometia, para não desesperá-lo ainda mais. — nos sabemos o que eles vão fazer, nos sabemos como isso vai acabar.
Meu peito apertou ainda mais. A minha cara quase se contorceu pela vontade de chorar. Mas, felizmente, eu segurei. Ele já estava destruído demais para que eu apenas caísse aos prantos em sua frente.
— Se este for meu fim, saiba que vou aceitá-lo. — Ele me olhou, incrédulo de minhas palavras. — Eu te amo, Yoongi. E eu sei que isso dói em você, saiba, que dói ainda mais em mi-
— Você está aceitando isso tão fácil..— gemeu, pela dor e calmamente se sentou na cama. Encarando-me com indignação e fúria. — Não foi você não é? Me diz que você não tem nada a ver com aquilo, Jiminie.
— Santo Deus, Yoongi. — Me sentei na cama, de frente para si e segurei suas mãos — Você deveria saber tão bem quanto eu, que eu não fiz aquilo. E pior, com Songmi. Eu não sou capaz nem de matar uma barata, que dirá uma pessoa.
Ele riu, fraco e choroso.
— Vai ficar tudo bem, amor. Acredite em mim. — Beijei o topo de sua cabeça, e ele apenas confirmou. Abraçando-me com toda força que ainda restava de seu corpo cansado.
00:30AM | Los Angeles
— Sim? – soltei, assim que meu ouvido se encontrou com o telefone. Eu podia ouvir alguns barulhos estranhos ao fundo, mas, não me atentei diretamente ao que era.
Yoongi havia saído faz alguns minutos, para comprar comida em um restaurante 24h. Ambos os dois estávamos exaustos demais para que pudéssemos simplesmente cozinhar algo decente, então, comida pronta nunca pareceu uma boa opção naquele momento.
E quando ele saiu, eu chorei. Chorei tanto, que eu sentia os meus olhos ainda inchados e a minha garganta dolorida pelos gritos desesperados que eu deixei escapar somente hoje.
Eu não tinha chance alguma se fosse preso. Apesar da minha boa forma, eu tinha absoluta certeza que não duraria menos de três dias. E se as minhas certezas já não pareciam nulas, quando a televisão foi ligada e mais informações sobre o que estava acontecendo passaram, eu me desesperei ainda mais.
O meu nome foi sim confirmado. Encontraram uma de minhas digitais nos copos que tinham na mesa de centro, da casa de Songmi. Eu realmente havia ido a sua casa, para bebermos e conversarmos sobre a vida.
Principalmente sobre sua situação, que a cada dia se tornava difícil. Com um namorado que não a deixava em paz boa parte dos dias, uma mãe que estava internada com suspeita de câncer, e um pai a quatro palmos debaixo do chão. Não me parece uma boa carga.
Mas, incrivelmente, ela sabia levar aquilo tudo com um sorriso e sempre me reforçava que tudo ficaria bem. Talvez tudo ficasse bem, mas, eu estava ali, sendo acusado por sua morte.
As outras digitais eram incompatíveis e não estavam registradas no sistema. Eu era a única que era registrada. Coisa que jamais vou me recordar, afinal, o que esperar de um adolescente de dezesseis anos que só queria problemas?
Infelizmente fui fichado aos dezesseis anos e bom, aqui estava eu.
Sendo suspeito principal, por um crime que eu não havia cometido.
E bom, você acha mesmo que eles teriam pena de mim, visto que o corpo de Songmi foi encontrado quatro dias depois do crime, em estado levemente avançado de decomposição. Eu estive com Songmi na Segunda, ela foi encontrada na sexta-feira.
As chances de eu sobreviver a isso tudo são nulas, visto que a incompetência dos policiais e investigadores são admiráveis.
— Jimin?
Era Yoongi. E surpreendentemente sua voz parecia afobada, cansada e sua respiração acelerada.
— Sim. Aconteceu alguma coisa? — Ele soltou um leve barulho e eu arregalei os olhos. — Yoongi?
— Venha até o restaurante da esquina me encontrar, preciso de sua ajuda. — Ele disse, depois de um tempo em silêncio o suficiente para me fazer desconfiar.
— Está tudo bem? — insisti. E ele riu, calmo.
— Claro que está seu bobo, venha logo.
E desligou.
Los Angeles | 01:25PM
Dias atuais.
E quando ele desligou, eu corri como um louco até o restaurante para ajudá-lo. Apesar da distância ser quase duas quadras, eu me coloquei a andar até lá, até ele.
Para ajudá-lo. Porque eu faria tudo por ele. Incluindo andar duas quadras até onde ele estava. Mas, o que eu vi foi Yoongi, ao lado de dois caras e três carros de polícia. Sim, polícia.
Quando tentei voltar, eles já haviam visto e eu fui forçado a parar. Um dos tiras, segurava Yoongi pelo braço. Eu não pude observar seu rosto naquele momento, porque ele estava longe demais de mim.
Eu não conseguia saber suas expressões, nem o que ele estava sentindo. Por que se ele estivesse olhando em meus olhos, ele teria tido ciência do quão destruído eu fiquei.
Ele tinha me entregado. Eu esperaria isso de qualquer pessoa, incluindo da megera da Cassandra. Mas, não dele, não do cara que eu jurava que me amava com todas as forças. Que em horas atrás, daquele dia, havia chorado com a possibilidade de me perder.
Mas, ao mesmo tempo que tudo acontecia, eu só me deixei ser preso. E eu fui. Levado diretamente para a delegacia principal de Samália*, onde fui fichado novamente e colocado em uma jaula, até a chegada dos policiais da capital.
E aquela teria sido a minha primeira noite na cadeia. Se não tivesse tão tarde, a segurança tivesse sido nula. Dando oportunidade para que eu conseguisse me livrar das algemas e fugisse dali sem olhar para trás.
Era tudo tão fácil. Foi tudo tão fácil, incluído o fato daquele policial ter dormido tão próximo da cela onde eu estava e eu pude sim, pegar as chaves da cela e fugir.
E por dias eu fiquei sumido. Não me foi surpresa quando eu fui declarado fugitivo. Passei por poucas e boas durante três anos. Mudei de todas as maneiras minha aparência, para que não pudesse ser reconhecido, incluindo algumas marcas de tinta em meu corpo.
Cabelos longos e tingidos de preto, fora as cicatrizes em meu rosto, do tempo e das várias confusões que me envolvi enquanto fugia.
Não foi fácil, mas, não foi impossível. E tudo melhorou, quando Taehyung me encontrou.
Ele era apenas um cara da Zona Sul de Samália. Me convenceu de que me ajudaria e não pediria absolutamente nada em troca, porque sabia que em Samália as pessoas eram tudo, e que fariam de tudo para sujar minha ficha.
Nunca acreditei em seus reais motivos para me ajudar, apenas senti que ele era uma boa pessoa, que tinha ligado os pontos e resultado na conclusão de que eu não era o culpado pela primeira morte.
E diante de tudo, ele me ajudou. Digamos, que o garoto, apesar dos sorrisos bonitos e gentis, tinha uma longa ficha suja. Me disponibilizou tudo que eu poderia precisar, incluindo uma arma.
Não sabia bem porque eu precisaria de uma arma, mas, ele quis garantir de eu ficaria bem.
Em torno de menos de três meses, eu já tinha tudo. Um nome falso, identidade falsa, arma, dinheiro, treinamento básico e uma coragem que só Deus sabia da onde eu tinha tirado.
Devido ao meu ponto grande de determinação, a minha coragem resolveu brotar disto. Quantas vezes havia pensado em desistir de tudo, e de utilizar aquela arma que Taehyung me deu e finalizar tudo com um tiro limpo.
Mas, no fim das contas, nunca fui corajoso o suficiente para ceifar minha própria vida. Não seria capaz de chegar até o fim, sabendo que tudo ficaria impune e que as pessoas que mataram a minha melhor amiga, sairiam desta como um sorriso no rosto. Enquanto a minha vida foi destruída a troco de nada.
Eu poderia ter recusado tudo, toda a ajuda de Taehyung, incluindo sua arma. Mas, não recusei, porque sabia que a minha hora de acertar as contas chegaria. Principalmente com alguém que eu não revia a tanto tempo.
E diante daquela televisão, na pequena sala arejada da casa, que era parte afastada de Samália, eu assistia ao noticiário. A minha mente viajava para qualquer canto menos doloroso das memórias que ainda me restavam.
Não me restou muitas coisas para vivenciar em minha vida. As únicas coisas que eu podia fazer era sair na calada da noite, andar pelas ruas escuras e vazias de Samália, observando algumas pessoas perdidas em seu próprio mundo. Outras, consumindo drogas e viajando em meio ao efeito temporário.
Claro, eu ainda conseguia consumir boa parte da literatura. Graças às boas almas da capital, era possível visitar a biblioteca pela parte da madrugada sem que seu sossego fosse tirado.
Mas, em outras partes, nesses três anos, eu continuava atrás de informações. Mais precisamente, respostas. Respostas sobre a morte de Songmi. Obtive êxito em boa parte de minhas investigações pessoais.
E bom, o tempo é suficiente para te tornar alguém experiente, e eu tinha três anos nas costas de bons aprendizados.
Encontrei pessoas, intimações quebradas, pistas falsas, pistas verdadeiras e até mesmo, corruptos. Os corruptos, é aquela coisa.
Se você molha sua mão com uma boa quantidade de dinheiro, eles abrem o bico. E bom, foi exatamente isto que fiz. Não foi tão difícil quanto eu achei que seria, mas, as informações que me foram dadas foram como pérolas.
Eu estava a passos de descobrir quem seria, mas, ainda faltava o básico.
O que eu faria diante do assassino.
Eu o entregaria para a polícia, ou, o mataria?
A minha consciência me dizia para ceifar sua vida, de acordo com o que ele fez com a minha amiga. Mas, a razão, me dizia que entregá-lo era a melhor opção. A minha ficha seria liberada, e viveria em paz.
Mas, isso era mesmo verdade?
Eu viveria mesmo em paz, como minha mente idiota e boba pensava? Depois de três anos experimentando a miséria e a falta de paz, será mesmo que minha mente teria paz?
Não, ela não teria.
A minha vida foi destruída a partir do momento em que minha imagem foi mostrada em televisão aberta. Eu já não tinha mais nada depois daquilo.
Não tinha dignidade, paz, mente estabilizada e vontade de viver. O amor que residia em mim, foi embora depois que a única pessoa que eu amava me traiu. A confiança, já não me era mais uma boa opção.
O ódio e a morte viviam juntos, dentro de mim, caminhando lado a lado. Eu já não me sentia cem por cento confiando em minhas ações, apenas sabia que o que tivesse que ser feito, eu faria.
Só, não sabia o quê.
Um suspiro cansado saiu por meus lábios rachados. Fazia tanto frio, que eu já não tinha ideia de quantas roupas vestir para me aquecer. Por mais que a lareira estivesse acesa e todos os cantos da casa protegidos com cobertores.
Estava quente, mas, ao mesmo tempo arejada. Por isso, eu sentia o frio bater certeiramente nas minhas costelas. Talvez, se eu tivesse pelado, não teria tanto frio.
Ri, com meu próprio pensamento. Um riso fraco e sem humor o suficiente para me colocar na mesma posição, e trocar de canal, vendo os noticiários.
Agora sim, eles informam sobre a nevasca. Iria cair, e estava tão próxima dos arredores de Samália. Mas, não precisava ser um adivinho para saber que ela estava próxima, já que sofríamos com os avisos antes da chegada dela.
"Eu te amo, Jiminie."
Pisquei os meus olhos, confuso pela voz em minha cabeça. Até olhei ao redor, mas, eu sabia que não passava da minha mente fraca, me trazendo à tona as lembranças mais felizes de minha vida.
Eu respirei fundo, me levantando com cautela do sofá, jogando o controle sobre o mesmo; enquanto passava as mãos nos fios de meus cabelos já longos, jogando-os para trás. Eu precisava de qualquer coisa, menos lembranças indesejadas.
Entrei a passos preguiçosos na cozinha, encarando o copo sobre a pia. Não exitei antes de pegá-lo e enchê-lo com água. Tomei três até que estivesse completamente satisfeito, e me apoiei sobre a bancada, encarando a janela e o horizonte depois dela.
Estava tudo escuro, exceto pelo céu, que ainda tinha tons pretos e azuis. Não tinha estrelas e muito menos nuvens, era somente o puro breu, enquanto a neve caía.
Tornei a ligar a torneira, molhando minhas mãos na água quente, da torneira aquecida e a passei sobre meu rosto. Sentindo meu corpo se aliviar e se aquecer brandamente. Os meus olhos ainda estavam presos na janela, e na vista.
Samália era bonita na parte dos dias, e naquela determinada parte onde eu residia afastado, a vista era ainda melhor.
Sorri, suspirando e sentindo-me mais calmo.
Puxando a pequena cortina e me virando novamente, encarando o armário pequeno à minha frente. Nada parecia interessante, então, somente encarei as minhas mãos, que já estavam tão cheias de calos e cortes, que eu me cogitei se tivesse envelhecido a tanto tempo assim.
Eu tinha apenas 25 anos, não era possível que a idade tivesse me atingido até nas mãos. Porém, eu sabia que não era de idade aqueles cortes e calos, e sim das altas roubadas que eu me envolvi em torno de três malditos anos.
Não só sabia daqueles calos, com meus cabelos estavam grandes, meu corpo estava mais forte – dando um ar até de altura que eu sabia que não tinha –, às diversas tatuagens que ocupavam meu corpo, fora os brincos e piercings que perfuravam minha pele.
Então, talvez, eu tenha contribuído um pouco para tal mudança drástica. Só não imaginava que seria assim.
Sai de minhas divagações quando as batidas na porta me despertaram. Os meus cenhos ficaram franzidos, não seria absolutamente ninguém. Já que eu não chamei ninguém, e o único que sabia de minha existência ainda em Samália era Taehyung.
E ele muito menos viria aqui, já que no Mississipi, as coisas estão muito piores.
O alerta vibrou em minha cabeça e rapidamente me desencostei da bancada, puxando debaixo da mesa a arma que eu sempre deixava preparada, para avanços indesejados.
Devagar puxei sua trava e a deixei pronta. Caminhando a passos lentos em direção a porta que estava perfeitamente trancada, enquanto a pessoa do lado de fora, tornava a bater incansavelmente nela.
Não disse absolutamente nada, mas, parei em seu lado oposto, não ficando em frente à porta. Seja lá quem fosse, e se possivelmente estivesse armado, atiraria diretamente na porta.
Com calma, destravei a mesma e a abri, apontando sem mais nem menos, a arma para o indivíduo que me tirava a paz.
Analisei-o de cima a baixo. Utilizava uma máscara preta e uma touca de mesma cor, diante de seu conjunto maçante de morte. Ergui uma sobrancelha, olhando-o bem atentamente, este que já estava de mãos erguidas.
— Acho que você precisa ter um bom motivo para estar aqui, e um bom motivo para que eu não mate você. — Comecei, tranquilo e traiçoeiro como uma cobra. — Vamos, comece. — fiz um movimento com uma a arma, para que prosseguisse.
— Jimin..
Então, eu travei. E os olhos o encararam com mais atenção. Aqueles olhos.
Os malditos olhos felinos que eu tanto conhecia. Eu ri, negando.
E sem pensar duas vezes, arranquei a máscara de seu rosto. Praguejei contra todas as divindades que resolveram não só me punir com a desgraça, como trouxeram o diabo junto.
Eu ri, mas não sabia se era nervoso, ou de dor.
Ironia, não?
Ele tinha um corte no lábio inferior, pelo vermelho, ainda era recente. A maçã esquerda de seu rosto estava marcada pelo hematoma. E ele estava diferente.
Não exalava o mesmo sorriso de anos atrás, e nem a mesma coragem no olhar toda vez que olhava para mim. Estava diferente, parecia amargo e pela postura rude.
Acho que o tempo não mudou somente para mim, é o karma.
Mas, diante de sua revelação, não exitei, continuei apontando a arma em sua direção. Se o tempo o mudou, ele também havia me mudado, e uma coisa que ele me ensinou com gosto foi não acreditar em traidores.
— Seja o que diabos você veio fazer aqui, suma. — Ele negou, e eu ri. Amargo. — Não vai dizer que sentiu saudades, Yoongi?
— Jimin, me deixe falar. — Pediu baixo, e eu neguei, apontando a arma para seu peito — Pare de apontar essa porra pra mim!
— Ou o quê? Você vai fazer o quê? Me diga. — Ele exitou e eu respirei fundo. — Foi o que eu pensei. Agora, saia.
— Já disse que não vou. — Insistiu e eu franzi as sobrancelhas. A porra da minha vida tava um caos, a ficha dele tava suja comigo, e ele se pagando de marrento.
Vai pra puta que pariu.
— Você não está em condições de exigir nada, seu grande bosta. Vaza! — Apontei para ele sair e dei dois passos para trás, mas ele deu três para frente. Me fazendo apontar novamente a magnum em seu peito. — Você tá achando que isso aqui é o que, Yoongi?
— Jimin.. — ergui meu dedo em seu rosto, pedindo para que se calasse.
— Não, você não chega aqui depois de três anos e me olha com essa cara e age comigo como se não tivesse feito nada. Poupe a sua dignidade e a sua vida. Eu não sou mais o Jimin bobo de anos atrás, que te amava e você traiu. As circunstâncias são outras meu caro, e essas não me impedem de enfiar uma bala na sua cara bonita. — Bradei, e ele recuou um passo. Os olhos marejados como da última vez. — Vá embora, siga sua vida e esqueça que você veio até aqui.
— Eu vim até aqui me explicar! Me deixa explicar, Jimin! — Os ombros estavam caídos, e eu ri. Porque depois de anos, ele ainda conseguia se encolher diante de mim, mesmo com toda sua pose foda e cheia de marra, como ele estava naquele momento.
— Explicar? Você tá achando que eu tenho cara de bobo da corte? —Rri, abaixando a arma e guardando atrás, em minhas costas — Explicar o que? Que há três anos, você me chamou para te encontrar naquele restaurante e por via das dúvidas, ainda chamou os policiais para te fazer companhia? Conta outra.
— Eu não chamei, Jimin. Eles estavam lá, eles já estavam lá e sabiam que eu era seu namorado. — Contou, mas, diante de suas explicações, eu não consegui me abalar.
Se era tudo isto mesmo, porque ele não foi na delegacia me contar a verdade e sanar a dor que eu senti por anos.
— Você é um grande filho da puta mentiroso, isso que você é. — Ele negou, se aproximando, segurando os meus braços. E descendo as suas mãos para as minhas, segurando com força o suficiente para me fazer encará-lo.
Enquanto eu tinha as mãos calejadas, ele tinha as mãos mais finas como seda.
— Eu nunca mentiria para você. Eu jamais faria isso, Jimin. Me deixa explicar, por favor, me deixa te dizer tudo. Eu não tenho muito tempo. — Implorou, me puxando mais em direção a si.
— Por que você não tem tempo, Yoongi?
— Os meus pais sabem das coisas que eu fiz para encontrar você e para te ajudar. E nesse meio tempo, três anos, eu me tornei policial, Jimin. — Os meus olhos se arregalaram e eu ri.
— Isso tá se saindo pior que a encomenda. Sério, você tá achando que eu sou palhaço? É isso? Yoongi, some daqui antes que eu te atire nos seus joelhos. — O empurrei para longe de mim e ele negou.
— Maldito seja, mas você vai me escutar. — Parou no batente da porta — Eu não arrisquei a minha pele por pura bosta, eu não arrisquei ser descoberto somente para morrer aqui. Você vai me escutar.
— Você tem três minutos. — Olhei o relógio de parede e dei espaço para que ele entrasse.
Mas, na verdade, eu queria chorar diante da confusão de sentimentos em minha cabeça.
Por Deus, eu queria matá-lo. Mas, naquele momento, não era a solução e ele possivelmente teria algumas informações.
— Eu não entreguei você. Eles me fizeram fazer aquilo, eu não tinha escolhas, Jimin. — Começou, e eu apenas cruzei os meus braços, parando de frente para si — Eu fui até o restaurante, eles estavam lá quando eu cheguei. Um dos policiais me parou, e nas palavras dele, ele tinha recebido informações sobre mim e sobre você. Tanto, que ele sabia que você era meu namorado.
Apenas acenei para que ele continuasse, prestando a atenção em si. Atento até mesmo quando ele puxou a touca da cabeça, respirando fundo aliviado. Enquanto abria o sobretudo preto pesado, e deixava exposto o peito coberto pela camiseta de frio de gola alta. Marcando não só os gominhos de sua barriga, como os braços.
Não era apenas eu que havia mudado.
— Ele me forçou a ligar, dizendo que sabia sobre tudo que envolvia a mim, e a minha família. E que se eu não fizesse o que ele pediria, ele daria um jeito de me matar. E Jimin. — Encarou os meus olhos, com os seus transbordando desespero — Eu não queria morrer. Então, eu fiz. E resultou em tudo que resultou. Mas, eles não me deixaram falar ou ver você, contataram a minha família e expuseram tudo para eles. Meus pais me tiraram de Samália logo depois.
Respirou fundo, apertando as mãos em punho, os olhos se enchendo. Então, me questionei.
Será mesmo que era só as minhas mãos que estavam calejadas?
— Eles te tiraram de Samália, e?
— Me mandaram para Detroit, de novo. Para viver lá, até que a poeira abaixasse e que eu seguisse o futuro que meus pais queriam que eu seguisse. De todos os futuros fodidos que me propuseram, eu escolhi um que poderia me ajudar. — Encarou os meus olhos, e ele tinha uma coisa que os meus não tinham — Meu pai movimentou uns pauzinhos e eu entrei para academia de polícia, lá, pude estudar lá e realizar todos os procedimentos para que eu pudesse me tornar parte deles. Eu os fiz Jimin, fiz todos. Todos os testes, todas as provas, todas as malditas questões, tudo. E passei em todas. Porque minha insegurança, se comparada ao meu desejo de justiça, era somente pó.
— Apenas me diga palavras que desejo ouvir, Yoongi. Não há discurso de perseverança e motivação. — Ele respirou fundo, e eu apenas o encarei. Sem emoção.
— Em menos de dois anos, eu me tornei bom o suficiente para ter um distintivo e uma arma. Passei para policial de campo, depois me colocaram apenas na área de investigação, em outro departamento. Eu fiz o que pude para ter minha própria investigação e aí eu voltei para cá, para Samália. — Pausou, antes de tirar dos bolsos um pendrive e me entregar — Eu tive passe livre diante dos tempos em que fiquei aqui. Voltei quase ao mesmo tempo que você..
— De onde você conseguiu informações sobre mim? — A pergunta de ouro, então ele apenas respirou fundo.
— Todos conhecem bem Kim Taehyung, para saber que ele se envolve com companhias da pesada. Então, ele me informou onde você estava.
Kim Taehyung, tenha certeza que você vai amanhecer mais furado de peneira.
— Ah, com certeza. Tinha que ser, como não imaginei. — Ri, em escárnio.
— Neste pendrive, tem todas as informações que eu consegui, de tudo que foi basicamente investigado entre as delegacias de Samália. Descobri também, que eles reuniram as delegacias mais próximas para se ajudarem, já que o número de mortes aumentou a partir da morte de Songmi. — Meu coração se apertou ao ouvir seu nome ser pronunciado, então, eu apenas respirei fundo. — Eles acreditam até hoje que foi você, mas, as pistas que estão neste pendrive, mostram ao contrário.
— E por que me entrega isto? Não pode resolver por você mesmo, afinal, não é um tira? — Ele respirou fundo, negando.
— Eu abdiquei da minha carreira na polícia, quando percebi que meu tempo e as investigações já estavam suficientes. — Pegou novamente o sobretudo, encarando os meus olhos — Não sou um tira, mas, a minha perna fodida me deu garantias.
— Invalidez. — Yoongi piscou e eu retirei os olhos. — Acho que esta é a hora que você vai embora.
— Sim, está é hora que eu vou embora. — Devagar, Yoon caminhou a passos calmos até a porta — Só me diga, que diante de todas as provas que ler, vai tomar as decisões certas. Não vá ser preso, Jimin.
— Vou pensar. Mas, não é como se eu tivesse alguma coisa a perder, não é Yoongi? — Ele se encolheu e apenas respirou fundo, se virando para me encarar novamente. Desta vez, me analisando dos pés a cabeça, franzindo as sobrancelhas para cada coisa que percebia em mim.
— Está diferente. — Eu ri, sem emoção — Eu queria ter palavras o suficiente para dizer o quanto eu sinto muito, mas, sei que nada vai ser suficiente. Mas, Jimin..
— Sim?
— Eu nunca deixei de te amar. — Meus olhos vacilaram por um momento, e eu respirei fundo, apertando com mais força o pendrive em minhas mãos — Depois disso, eu espero ao menos que possa me perdoar por saber que eu não te entreguei por livre e espontânea vontade. Espero que saiba, que eu ainda te espero voltar. E vou estar sempre te esperando, até depois de tudo isso. E se ainda me quiser, não vai ser tão difícil de me encontrar.
Eu não disse nada. Mas, eu sabia que os meus olhos estavam marejados o suficiente para que os dele também estivessem.
— E aquilo do início de não poder demorar, tem alguém te seguindo? — perguntei baixo.
— Não, era apenas uma cena para que você me deixasse entrar. — Sorriu, fraco e eu revirei os olhos. — Até, Jimin.
E antes que eu pudesse responder, ele saiu. Me deixando ali perdido, com o coração na mão, e uma repleta enxurrada de informações que eu sempre desejei, mas, sempre tive medo.
Eu simplesmente não soube como agir, apenas me sentei no sofá, encarando as paredes e desejando que a minha mente me desse alguma luz.
E no fim das contas, eu não sabia o que fazer. Mas, sabia que teria que ir até o fim, diante de tudo que eu sempre quis fazer.
Diante de tudo que eu sempre quis além da justiça.
A minha liberdade.
Samália | Los Angeles.
Tempos atuais | nove meses depois.
Os jornais não estavam mais exibindo as notícias sobre a nevasca. Agora eles falam apenas sobre o tempo, e o belo sol que surgiria nos céus.
Eu não pude deixar de sorrir, enquanto abraçava meu próprio corpo. Já não aguentava mais tanto frio, e principalmente notícias.
Mas, uma em específico me agradava naquele momento.
"Lee Hyun foi preso a três meses atrás, acusado pela morte de Kim Songmi, Park Boram, Min Soora, e outras trinta e duas vítimas. Vítimas estas, que suas famílias pediram descrição de seus nomes. Todas mulheres, e nesta manhã, as decisões dos juízes encarregados foram suficientes para estabelecer que a presença de Hyun em sociedade é perigosa; sendo condenado a 30 anos de prisão perpétua."
Eles não mencionaram o meu nome nos jornais, devido a descrição que pedi. Mas, não me seria total surpresa se tivessem dito que eu havia sido culpado em seu lugar.
Hyun passou anos fora da cadeia, cometendo seus crimes e ceifando vidas de pessoas inocentes. Fora as famílias que ainda choravam por seus entes queridos. Eu, mesmo que não tivesse matado absolutamente ninguém, tive minha vida destruída por suas ações e por ações de pessoas incompetentes que foram punidas.
Eu tive todas as opções do mundo para recusar a voz da verdade em minha cabeça, e agir da maneira correta. Claro, eu poderia muito bem ter ignorado tudo, e ido atrás do assassino de Songmi. Mas, eu sabia que não adiantaria nada matá-lo com as minhas próprias mãos. Isso apenas sujaria meu nome e provaria algo de mim que eu jamais seria.
Depois de um mês, em que Yoongi foi até a casa, eu tomei minhas decisões e fui atrás da devida coisa que me agradava: justiça.
Entrei em contato com pessoas competentes o suficiente para que pudessem resolver o meu caso. Diretamente com o chefe, com o manda chuva da delegacia de Somália.
Ele, como todos os outros, não sabia o que se passava na delegacia da cidade pequena. Mas, quando descobriu tudo o que aconteceu, ficou claramente muito chocado e tratou de me ajudar com absolutamente tudo que poderia. Claro, dentro da lei.
Mas, eu não dei as caras em sua frente, porque sabia que ele poderia me prender. Então, apenas fiz tudo o necessário e enviei as provas que eu ainda tinha em mãos, absolutamente tudo. Incluindo provas o suficiente para incriminar os policiais corruptos da delegacia. Que descobriram no final de tudo, que não se passavam de paus mandados de Lee Hyun.
Pude contar com a ajuda de Taehyung, que se resolveu no Mississipi e veio para Samália para me dar uma força. E só depois que tudo se ajeitou, eu dei as caras novamente. Claro, eu ainda fui fixado por algumas coisas que cometi, ao decorrer deste ano. Mas, nada que pudesse de fato sujar minha ficha.
O que seria isso, perto das coisas que eu livrei a minha pessoa. Mas claro, não sozinho. Tive ajuda de Taehyung e principalmente de Yoongi. Que mesmo com uma arma apontada para a própria cabeça, não exitou em me confrontar.
De certa forma, ele sabia que eu jamais atiraria nele.
Eles expuseram na mídia uns meses depois, pedindo-me desculpas sobre o ocorrido e ressarcindo-me com o que puderam fazer. Mas, eu sabia que eles não poderiam me dar de volta os três anos que eu perdi da minha vida, fora os anos atuais que eu ainda continuei lutando.
E depois disto, eu proibi que mencionassem meu nome, ou mostrassem minha foto novamente. Afinal, já utilizaram tanto de minha foto e de meu nome, que a última coisa que eu queria era ser visto na televisão novamente.
Os tempos passaram, eu mudei novamente, voltando para Samália.
Os meus cabelos já não estavam grandes mais, a cor era mais harmoniosa, e eu já não me escondia mais dentro de toucas e casacos gigantes para o meu tamanho médio. Eu era livre agora, é a minha liberdade.
Liberdade esta, que apenas faltava uma única coisa para ser completa.
Então, eu bati na porta, que era tão conhecida por mim, e que mesmo depois de anos, eu ainda a reconheceria até pintada de outra cor.
E quando ele atendeu, o sorriso que direcionou para mim, foi tudo que eu precisei para ter a certeza de que suas palavras eram reais.
Ele sempre estaria ali, esperando por mim.
F I M
*Samália: É uma cidade fictícia de Los Angeles, que eu criei para colocar na história.
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