Bônus
" Cinco anos atrás"....
- Liza, anda logo! Vai se atrasar para o primeiro dia de aula. - minha mãe gritava da cozinha.
- Já estou indo, mamãe. - respondi.
Pra dizer bem a verdade, eu não estava nem um pouco afim de ir a escola. Era tudo novo. Professores novos, pessoas novas, eu odiava o novo. Quando se acostuma com as pessoas, até o jeito como elas te rejeitam passam a não te incomodar tanto, porém, quando as pessoas são completamente desconhecidas, o medo é algo incrivelmente absurdo. Olho no espelho inúmeras vezes e por mais que eu estivesse dez quilos mais magra, a minha visão era de um completa obesa. "Qual era o problema em ser assim"? Perguntei-me por longos anos até descobrir que a sociedade não é tão boazinha quanto você acredita ser.
Eu já tinha dezessete anos e estava no último ano do colégio. Época em que os hormônios estão à flor da pele e eu sabia mais do que ninguém que se eu não tomasse uma atitude, eu passaria pela mesma situação quantas vezes fossem necessárias. A questão é que eu estava cansada. Cansada de toda aquela humilhação, de toda aquela decepção. Descobrir que as garotas as quais você acreditava serem suas melhores amigas, na verdade andava com você apenas para sobressair a beleza delas. Saber que nenhum menino se interessava por você e todos lhe faziam brincadeiras de mau gosto, era de perder as esperanças.
Minha primeira decepção foi aos nove. Apaixonei-me perdidamente pelo novo aluno do colégio. Diferente de mim, ele era mais espontâneo e fazia amizades facilmente. Lembro - me de na festa junina eu não ter nenhum par sequer para dançar quadrilha, pois era professora quem escolhia, e numa turma de alunos em que havia mais meninas do que meninos, alguém iria sobrar, no caso eu e mais uma menina. No dia do evento eu estava frustrada por não ter um par e consequentemente não iria dançar e nem tirar foto. Mas ainda tinha uma esperança. Aquele menino que eu fiquei boa parte do tempo contemplando sua beleza, chegara, era a professora decidir me colocar com ele e tudo seria resolvido. Ela me chamou juntamente com a outra garota e Felipe, meu primeiro amor.
- Felipe, pra você dançar quadrilha você precisa escolher um par. - informou a professora.
Sem pensar duas vezes e nem sequer observar com mais atenção, ele escolheu a outra menina, segurou sua mão e foram em direção a quadra se prepararem para dançar. Fiz uma cara emburrada quando na verdade a minha vontade era de chorar.
- Liza, minha querida. Eu sinto muito, prometo tentar achar outro par pra você, está bem? - a professora tentava me consolar.
Apenas consenti com a cabeça, mesmo sabendo que procurar seria em vão e não seria tão especial se tivesse sido com Felipe. Corri para o corredor lateral da escola, sentei-me no chão erguendo os joelhos, e afogando minha cabeça neles, pus-me a chorar.
Com dez anos eu era gorda demais para namorar o meu vizinho.
Aos doze, na minha festa de aniversário o menino que eu gostava empurrou minha cabeça contra o bolo rindo debochadamente de mim, assim como todos os meus amigos que estavam presentes.
- Calma aí Liza, deixa um pouco de bolo pra mim. Não vai comer tudo, é capaz de explodir. - zombou.
Com quatorze, o meu melhor amigo disse ser apaixonado pela minha melhor amiga.
Aos quinze, o meu primeiro beijo aconteceu porque Nick estava bêbado e não podia ser visto com uma garota assim como eu, e tive que ouvir ainda de sua irmã dizer que se eu emagrecesse talvez teria alguma chance.
Com dezesseis eu fui humilhada pela sala inteira depois que minha sexta paixão pegou uma folha do meu caderno escrita o seu nome com um monte de corações e mostrou para todo mundo. Como se não bastasse, ainda cogitou a possibilidade de eu não ter um espelho em casa. Minhas amigas não andavam mais comigo nem sequer conversavam, motivo suficiente para eu implorar para que papai me mudasse de escola no final do ano.
As férias chegaram e eu decidi que deveria mudar. Resolvi fazer uma dieta drástica para emagrecer, mas descontava a minha ansiedade em besteiras e acabei por utilizar métodos nem um pouco recomendáveis. Passava a maior parte do tempo no banheiro e chorava descontroladamente sempre tentando esconder as coisas. Não queria ter que passar por isso, mas era a minha única solução.
Respiro fundo e tento esquecer todos aqueles momentos. Eu era uma nova Liza, dez quilos mais magra e um novo guarda - roupa, exceto pela insegurança, que continuava a mesma.
- Bom dia papai! - digo logo assim que me sento à mesa.
- Bom dia meu amor. Dormiu bem? - ele pergunta.
- Quase nada. Um pouco nervosa para o primeiro dia.
- Deixa de bobagem, é um dia com outro qualquer, - mamãe colocava as coisas sobre a mesa bruscamente.
- A menina esta nervosa, Lilian. É normal para o primeiro dia.
- Você sempre mimando essa garota, Walter, por isso que ela é assim, não faz nada nessa casa.
- Lilian, por favor, uma trégua no café da manhã. - papai tentava acalmá-la. Mamãe revirou os olhos e bufou.
Papai estacionou o carro em frente ao colégio, e pude sentir um arrepio em minha barriga. Minhas mãos estavam suando e meu coração completamente acelerado.
- Filha, você tem que ir, meu amor. Vai dar tudo certo.
- Tudo bem, eu vou. - dou lhe um beijo de despedia e abro a porta do carro.
Entrei em minha sala um pouco atrasada. A professora me olha e eu fico parada na porta sendo encarada por vários olhos de tudo quanto é cores, tamanhos e formatos.
- Você deve ser a aluna nova, certo? - A professora quis confirmar e eu apenas consenti com a cabeça. - Sou a professora Íris e dou aula de literatura. Como é seu nome?
- Elizabeth.
- Ótimo, pode se sentar que eu já vou começar a aula. Sinta-se a vontade querida. - Íris era um doce de pessoa e aparentava ser muito nova.
O único lugar vago era atrás de um garoto extremamente lindo. Ele tinha os olhos azuis e os cabelos lisos jogados para o lado. Um metro e oitenta de altura e um sorriso radiante. "Por favor Liza, concentre-se, de novo não".
Abaixei minha cabeça com a intenção de não encará-lo muito e sentei-me no meu lugar. Ainda com a cabeça baixa peguei meu material e concentradamente comecei a copiar a matéria.
- Oi! - uma voz surge o que me faz pular de susto e acabo derrubando a caneta no chão. – Desculpa! eu não queria te assustar. - ele ri baixo. Não respondo de imediato, pego a minha caneta, primeiro.
- Tudo bem, eu... estava concentrada.
- Então você se chama Elizabeth? - confirmo com a cabeça. - É um nome muito extenso, tem um apelido?
- Todos me chamam de Liza.
- Não, eu prefiro um apelido diferente. Que ninguém te chame. Que tal Beth? - sugere.
- Oh não, Beth não, por favor – suplico.
- O que tem de errado? - ele estranha.
- Vou lembrar daquela série da Beth a feia. - ele ri.
- Que tal Eliza?
- Melhorou.
- Já sei. Vou te chamar de Ellie.
- Ellie?
- O que? Não gostou? Alguém mais te chama assim?
- Não. Só é diferente. Ellie. - pronuncio novamente tentando me acostumar. - É, eu gostei, pode ser.
- Ótimo, eu me chamo...
- Bill. - a professora o interrompe. - Já está de papinho com a aluna nova? - ele sorri. - Poderia prestar atenção na aula agora, por favor?
- Sim senhora. - responde fazendo uma continência. Sua atitude provoca algumas risadas e acabei por entender que ele era o popular da escola.
- Depois a gente conversa. - sussurrou para mim.
A aula passou rapidamente e o intervalo veio depressa. Não iria de jeito nenhum sair do meu lugar enquanto não desse o horário de ir embora.
- Você não vai sair para o intervalo? - Bill pergunta.
- Acho melhor não.
- E por quê?
- Não conheço ninguém, vou me sentir deslocada. - confesso.
- Você me conhece. Garanto que já é alguma coisa.
- Sim, mas não muito. - dou um sorriso forçado.
- Ei! Vamos. Vou te apresentar alguns amigos. - ele estende a sua mão e meio relutante eu acabo aceitando.
Conforme íamos andando pelo colégio Bill cumprimentava a todos que passavam, pude ouvir até o suspiro de algumas meninas pelo corredor. Porém pra mim, eram mais olhares fixos que eu tinha certeza, acompanhavam meus movimentos. Ainda estava de mãos dadas com Bill e por mais que eu estivesse completamente assustada ele parecia não se importar.
Entramos no refeitório e paramos em frente a uma mesa onde havia cinco pessoas: três meninos e duas meninas e eu não sabia de qual deles eu tinha mais medo. O cheiro deles exalavam popularidade e beleza, coisa que por mais que eu me esforçasse levaria um bom tempo para eu me tornar uma daquelas pessoas.
- Pessoal! Essa é a Elizabeth, ela é aluna nova. Sejam legais com ela - Bill me apresentou.
- Elizabeth, não se acanhe. Não mordemos. - disse um menino que aparentava ser o mais velho da turma. Era moreno e tinha uma barba bem preenchida. - Me chamo Erick, muito prazer. - ele me estende a mão e eu a aperto.
- Venha Ellie, vamos nos sentar. - Bill segura minhas mãos e me acompanha até a mesa puxando a cadeira pra mim. Senti-me desconfortável, pois uma das meninas ria daquela situação. Minha vontade era fugir dali, sair correndo e nunca mais voltar. A todo momento eu achava que ia ser vítima de alguma gracinha ou brincadeira de mal gosto e cada vez mais eu me sentia desconfortável.
- Bill, o cavalheiro de sempre. - a mesma menina que ria, agora decidiu se manifestar.
Ele apenas revirou os olhos e sorriu.
- Por que Ellie? - perguntou um outro amigo. Ele não era tão bonito quanto os outros, mas ainda assim fazia muito sucesso pelas suas covinhas.
- Queria chamá-la de um jeito que ninguém a chama. - explicou Bill.
- E pra que toda essa exclusividade?
- Sei lá, gostei dela. - meu coração gelou. Será que finalmente alguém teria se interessado por mim?
- Então a chamarei de Liza. Prazer sou o Augusto. - assenti com a cabeça.
- Sou Bia. - a garota que ria sem parar decidiu se manifestar.
Depois que todos se apresentaram, eles ficaram fazendo perguntas, as quais eu contava sem nenhum detalhe e ânimo já que eram totalmente estranhos para mim. Mesmo com toda a minha insegurança, eles me trataram bem e conseguiram arrancar alguns risos contidos.
Os dias se passaram e eu comecei a andar com Bill e seus amigos. Eu me soltava aos poucos e me sentia bem tendo a companhia deles. Bill passou a frequentar minha casa e eu a dele o que nos fez muito amigos e muitos próximos. Eu o ajudava nos estudos e ele me incentivava no balé, vez ou outra, jogávamos video-game e ele sempre me deixava ganhar, até o momento em que eu realmente fiquei muito boa. Bill me convidava para os almoços com sua família e para algumas festinhas nos finais de semana. Ríamos o tempo todo quando estávamos juntos, um provocando o outro. Havia brilho em meus olhos, ânimo na minha rotina e cor na minha vida. Não existia mais provocação, e ninguém zombava de mim. Pelo contrário, todos diziam que eu era uma boa amiga e que gostavam da minha companhia.
Era uma segunda-feira como outra qualquer eu estava com uma cólica horrível e nada me animava. Ora era vontade de chorar, ora de matar alguém. Nada estava bom, tudo me incomodava, e como se não bastasse, eu teria prova de biologia no dia seguinte. Bill viria me ajudar, pois depois de exatas, genética era o meu terror. Entretanto, eu não queria vê-lo, pois provavelmente eu seria uma péssima companhia, portanto, decidi ligar pra ele cancelando.
- Sinto muito, mas hoje não poderei recebê-lo. - falo pelo telefone sem ao menos dizer alô.
- O que aconteceu Ellie? Parece irritada.
- Nada, só não estou com cabeça hoje.
- Me diz o que é, talvez eu possa te ajudar. - ele dizia calmamente e até a sua tranquilidade me incomodava.
- Não é nada. Não acordei num bom dia hoje. - não queria dizer que estava na TPM.
- Certeza que está na TPM. Você sempre fica desse jeito nesses dias - ótimo, ele me conhecida muito bem.
- Tanto faz. Só não serei uma boa companhia hoje, então.
- Nada disso, você sempre é uma boa companhia. Estou indo aí.
- O que? Bill, eu não quer...
Bill desligou na minha cara e naquele momento eu apenas queria gritar com ele e dizer que ele não tinha esse direito. Cerca dez minutos a campainha tocou. Papai estava lá embaixo e atenderia a porta de forma que eu não tivesse esse trabalho. Estava deitada em minha cama contemplando o teto quando alguém bate na porta.
- Entra. - digo indiferente.
- Como vai minha garotinha?
- Não sou sua garotinha.
- Essa doeu. - Bill fez cara de magoado.
- Vem, sente-se aqui. - reviro os olhos e o convido.
Ele estava com as mãos atrás das costas e antes de se sentar revelou o que escondia. Era uma caixa de bombons dos mais diversos tipos e sabores e como uma amante de chocolate, meus olhos brilharam e meu estômago gritou animado. Sentando ao meu lado e rindo da minha atitude nem um pouco madura, Bill tinha um olhar doce e atraente.
- Não precisava. - falo de boca cheia com um bombom na boca. – Desculpa. - peço envergonhada.
- Imagina se precisasse. - ele ri.
- Esses chocolates são deliciosos.
- Está melhor? - pergunta.
- Tirando a cólica está tudo ótimo.
- OK, relaxa que eu vou fazer uma mensagem em seus pés. - ele se levanta indo em direção as extremidades da minha perna segurando delicadamente meu tornozelo.
- Tem um pé muito delicado. - conclui apertando levemente meu pé esquerdo. - Combina com você. São pés de princesa. - lanço um olhar extremamente acalorado a ele. Aquela sensação era extremamente relaxante tornando minha dor menos intensa.
- Ellie, agora precisamos estudar. Não quero que tire uma nota ruim. Vou te ajudar e você vai ver que é super simples.
- Por favor, só mais um pouquinho. - supliquei.
- Nada disso. Se não depois escurece e minha mãe liga preocupada.
- Tudo bem. - concordo frustrada.
Na minha escrivaninha ele me explicou detalhadamente como fazia cada combinação, ajudou-me em um monte de exercícios, sua paciência era incrível e sua dedicação pela matéria era algo a se admirar.
- Essa última está impossível.
- Ellie, não tem segredo, é a mesma coisa, só muda que temos mais combinações a se fazer.
- Não sei como consegue fazer isso. É muito complicado.
- Não tem nada de complicado. - ele sorri. - Só precisa praticar.
Reviro os olhos e tento fazer novamente o exercício. Seus olhos estavam compenetrados em mim e um desconforto me invade. Levanto minha cabeça um tanto assustada e seus olhos se encontram com os meus. Ficamos longos três segundos assim e eu não me contive.
- O que foi?
- Você é linda, sabia? - seus olhos ainda estavam compenetrados aos meus.
- Para de bobagem Bill, está me deixando sem graça.
- Estou dizendo a verdade. E você fica ainda mais linda quando está sem graça.
Tento ignorar seu comentário voltando às combinações genéticas, mas sua concentração em mim prejudicava a minha.
- Não precisa ter vergonha. - ele segura meu queixo. - Só estou dizendo a verdade. - Dou um sorriso tímido.
- Você está tirando a minha concentração isso, sim.
- Então está funcionando. - seu sorriso vem com uma pitada de malícia.
- Está fazendo de propósito? - tento dar um tapa em seu ombro, mas ele pega a minha mão e me puxa de modo que fiquemos mais próximos. Ele encarava meus lábios e no mesmo instante senti um frio percorrer minha espinha, bem como minha respiração ofegante que tomou conta de todo o meu quarto. Bill segura o meu rosto e com toda a delicadeza deposita um beijo em meus lábios. Eram calmos, doces, sem desespero. Meu coração estava sambando dentro do meu peito e eu simplesmente me esqueci do mundo lá fora.
Separamo-nos e Bill sorriu. Fique sem saber o que fazer ou dizer e apenas sorri constrangida.
- Por que fez isso? - estava com medo da resposta.
- Gosto de você. - ele confessa.
Logo em seguida, quando Bill foi embora, era como se ele ainda estivesse presente. Seu cheiro se exalou pelo quarto e dormir foi impossível. As borboletas brincavam de tobogã na minha barriga, era um sentimento novo acompanhado de um arrepio gostoso.
A terça feira chegou com um lindo sol me dando bom dia, e meu ânimo de ir para escola era estonteante. Nem o mau-humor matinal de mamãe era capaz de me abalar.
- Seu amigo foi embora muito tarde ontem. Não quero esse menino aqui o dia inteiro.
- Ele veio me ajudar em biologia, mamãe. Tenho prova hoje, mas acabamos perdendo a noção do tempo.
- Te ajudar. - a voz de mamãe era debochada. - Sei bem que tipo de ajuda é essa. Me ajudar aqui em casa ninguém quer. Anda, toma logo seu café se não vai se atrasar. E toma cuidado com esse garoto, não quero você de namorico aos arredores do colégio.
- Sim, mãe.
Quando cheguei, Bill me esperava logo na entrada com o sorriso mais maravilhoso do mundo. Sem pensar, corri para abraçá-lo e ele corresponde naturalmente e assim que papai sumiu das nossas vistas ele me dá um selinho rápido.
- Quero te levar a lugar hoje. - segurando as minhas mãos, ele fala.
- Aonde você quer me levar?
- É surpresa.
- Bill, você vai me deixar curiosa.
- E nem assim você consegue ficar feia. - ele sorri fingindo estar admirado, enquanto eu finjo estar brava.
Andamos de mãos de dadas pela escola em todos os momentos. As pessoas cochichavam entre elas e eu as olhava, constrangida. Seus amigos não demonstraram nenhuma reação surpresa, só fizeram algumas piadinhas sobre a nossa aproximação, mas nada que fosse pra humilhar ou coisa do tipo. Pela primeira vez e me sentia aceita. Como se eu não precisasse ser outra pessoas para que as pessoas gostassem de mim, só a Liza de sempre.
A noite chegou rápido e não era mais possível controlar minha ansiedade. Analisava cada peça do meu guarda-roupa tentando achar algo que caísse perfeitamente com a noite de hoje. Como era até então desconhecido o lugar aonde iríamos, era ainda mais difícil saber qual roupa usar. Poderia pedir ajuda a mamãe, mas Dona Lilian nunca foi uma amiga, a qual eu pudesse desabafar ou pedir algum conselho. Optei por um vestido preto básico que combinaria com várias ocasiões e ambientes, e tentei fazer uma maquiagem, por mais que eu adorasse coisas que envolvessem moda e beleza, eu era uma total ignorante, mas depois que decidi mudar, tinha que aprender de todo jeito. Estava na hora de pôr em prática, e acabou dando certo. Comecei a domar com mais facilidade meu cabelos, já que mamãe não me deixava comprar secadores ou chapinhas, pois achava desnecessário. Ela não usava nada daquilo, então pra mim também seria um utensílio fútil.
Do meu quarto, pude escutar a buzina do carro de Bill e os gritos de Lilian, dizendo que o mesmo havia chegado. Respirei fundo e desci. "Finalmente eu teria o meu primeiro encontro". Era indescritível a felicidade que eu sentia, um sonho realizado, o sorriso mais sincero, a empolgação por cada momento, a expectativa pelos detalhes, o frio na barriga, as pernas bambas. Era possível flutuar. Estaria eu dando início ao meu conto de fadas, e de fato, eu me sentia uma princesa.
Bill estava em frente ao carro e me olhava de cima e embaixo.
- Você está maravilhosa. - concluiu.
- Obrigada. - sorri.
- Vamos? - consenti com a cabeça e Bill abriu a porta do carro para mim. O mesmo se repetiu quando chegamos.
A surpresa era o meu restaurante preferido. Serviam o melhor macarrão do mundo, mas pelo preço eu não ia lá com frequência, só em datas especiais. E o dia de hoje, certamente, era especial.
- Como sabe que eu amo esse lugar? - estava maravilhada.
- O fato de você adorar macarrão, achei que seria um lugar perfeito.
- E é mesmo. Obrigada. - senti meus olhos molhados, mas evitei que ele percebesse.
Bill pegou o cardápio e se prontificou a escolher os pratos.
- Sei que você ama um molho vermelho, mas posso lhe mostrar outra opção? - Bill mordeu o lábio inferior receoso.
- Claro, pode sim.
- Ótimo. Dois pene ao molho pesto e dois Manhattan. - pede ao garçom.
- Manhattan?
- É uma bebida muito boa, Ellie, Whisky, vermute doce e essência de ervas aromáticas, é uma bebida muito requintada, ótima para uma ocasião como essa.
- Não estou acostumada a beber. Pra falar a verdade, nunca coloquei uma gota de álcool na boca. - confesso timidamente e ele ri.
- Não se preocupe Ellie, se você passar mal, eu estou de carro. – zombou.
- Estou falando sério. Não é muito forte?
- Não muito. Mas em todo caso, é apenas uma taça, não fará diferença.
- Tudo bem, eu confio em você.
- Que bom saber disso. - ele segura minhas mãos - Sabe, eu realmente estou gostando muito de você. Achei que era só amizade, mas você não sai da minha cabeça.
- Também estou gostando muito de você. Está sendo muito bom pra mim a sua companhia, nunca me senti tão bem. - e de fato era verdade. Ele trazia uma Liza mais confiante e mais disposta.
- Fico feliz em saber que eu desperto isso em você. Mas me conta, o que pretende fazer de faculdade?
- Literatura. – respondo.
- Combina com você. Seu jeito doce e delicado, e romântica do jeito que é. - concluiu.
- A sua paixão pelos cavalos de seu pai influenciam de algum jeito na sua decisão? - O pai de Bill, tinha uma fazenda. Ele me levou até lá algumas vezes e era incrivelmente linda. Os animais eram a sua paixão a ponto de conversar com eles, mas os cavalos eram o seu xodó. Bill insistiu inúmeras vezes para que eu montasse em um, mas eu preferi apenas assistir.
- Sou um amante de animais, de tudo quanto espécie, gênero, raça. Sinto como se eles fossem capazes de nos entender mais do que os humanos. Mas eu estou meio perdido.
Nossos pratos chegaram e o molho era realmente muito bom, mas eu ainda preferia o vermelho. A bebida era doce, mas levemente amarga o que me fez, a princípio, fazer algumas caretas. Bill me contou sobre seus planos para o futuro, alguns tão certos outros ainda eram uma incógnita. Adorava ouvi-lo falar e economizava nas palavras com medo de estragar tudo. Alias, ele era muito rico, popular aonde ia, e eu, bem, tinha uma condição de vida boa, mas nada comparada com os luxos de Bill.
Após o jantar, demos uma volta na cidade. A lua estava maravilhosa e o céu totalmente iluminado.
- Posso te fazer um convite? - perguntei durante o passeio.
-Claro.
- Sábado é a minha última apresentação no balé. Não sou muito boa, você sabe, mas prometo me esforçar se você for.
- Será uma honra. - deu-me um selinho.
- Topa um sorvete?
- Você quer me engordar? São bombons, macarrão, sorvete. Vou ficar feia e você vai parar de gostar de mim.
- Ellie, jamais deixarei de gostar de você. Você é diferente, é gentil, carinhosa e divertida, mesmo sendo tão introvertida. E mesmo se você engordar continuará linda.
"Nem queira ver como eu era antes"
- Então, aceita? - insistiu.
- Como resistir a esses olhos? - ele sorri.
- Qual sabor? - quis saber.
- Creme, com cobertura de chocolate.
- E um de chocolate, por favor. - pede pagando o moço da sorveteria.
- Huum... Eu adoro esse sorvete. - falo quando continuamos a caminhar.
- E eu adoro você. - confessa.
- Sabe, parece que eu estou sonhando. Nunca me senti assim.
- Prometo que todos os dias farei como se você estivesse sonhando. - ele passa mão em meu rosto. - A propósito, está sujo aqui. - com o polegar ele limpa o canto dos meus lábios, e quase meio que sem resistir ele deposita um beijo, mais intenso e ainda mais apaixonado. - Acho que estou apaixonado.
Um arrepio invade o meu corpo, não poderia acreditar no que eu estava ouvindo. Novamente meus olhos estavam molhados, eu o abracei. Meio sem jeito ele correspondeu.
- Vamos. Vou te levar para casa, senão sua mãe matará nós dois. - segura minha mão e me leva até o carro.
- É uma pena. Queria que esse momento não acabasse. - falo decepcionada.
- Calma princesa, temos a vida toda. - conforta-me abrindo a porta do carro.
Contava as horas para vê-lo e esquecia tudo a minha volta. Os momentos eram eternos, eu me sentia protegida em seus braços com a autoestima elevada. Era um sentimento novo, até então desconhecido, mas era adoravelmente bom senti-lo. Todos os dias era uma aventura, totalmente gostosa, nada conseguia me abalar, e sem que eu percebesse eu poderia até cantar.
A semana se passou e minha apresentação estava para começar. Minha desenvoltura havia melhorado, mas ainda assim, minha coordenação não estava a das melhores. Estava nervosa, com as mãos suando e o coração saindo pela boca. Eu não era atração principal, nem pudera, mas o fato de Bill estar me assistindo era como se eu fosse a protagonista de um best seller, ou a bailarina mais famosa do mundo. Todas as garotas estavam sendo acalentadas por suas mães, mas a minha infelizmente estava em casa e a única pessoa presente até agora era papai. Por trás da cortina eu olhava aquela cadeira vazia com um aperto no peito e pedindo encarecidamente para quem pudesse me ouvir para que ele viesse.
Faltavam poucos minutos e nem sinal dele. Senti meus olhos encherem, mas eu não podia desistir. Eu tinha esperança. As cortinas se abriram e eu já estava posicionada. Precisava de concentração. Suspirei tentando liberar o nervosismo que me consumia. Fiz meus primeiros movimentos e decidi seguir a música sem me preocupar com a plateia. Tinha que dar o melhor de mim, por mais que ele não fosse. Cada passo era uma sensação diferente, a apresentação demonstrava a dor e um sofrimento de uma jovem apaixonada que depois de tanto tempo, encontro o amor, mas ele estava mergulhado em mentiras e a mesma permaneceu ao chão até que as cortinas se fechassem.
Ao abrir novamente para os cumprimentos e a recepção dos aplausos, eu o vi. Com mais um belo sorriso de sua coleção. Bill ovacionava com vontade e podia sentir meu coração agitado e eu sorri, pois a minha emoção estava trasbordando. Ele pega alguma coisa de seu banco e tenta com certa dificuldade passar por todas aquelas pessoas e por um instante achei que ele iria embora, mas não. Vem em direção subindo as escadas sem tirar os olhos de mim, e quando estávamos tão próximos, ele me entregou uma rosa vermelha. Não me contive e deixei algumas lágrimas caírem, e ele delicadamente as secou. Segurou minhas mãos e saímos correndo deixando todos para trás sem dar nenhuma satisfação.
- Você estava radiante. - elogiou-me
- Até parece. Dei sorte hoje.
- Digo, porque é verdade. Estava linda. - insistiu.
- Fiz por você. - digo tomando a iniciativa de beijá-lo.
- Fico lisonjeado. Poderíamos dar uma escapada, o que acha? - sugere.
- Tenho que avisar meu pai e trocar de roupa.
- Por mim, você pode ir assim.
- Com um tutu e uma sapatilha? - franzo o cenho.
- Está linda.
- Muito obrigada, mas não posso sair assim. - dou uma risada leve. - prometo ficar pronta em um minuto. - falo saindo.
- Ellie, espera! - ele me chama. - Como ousa sair sem me dar um beijo?
Dou-lhe um beijo rapidamente e saio em seguida para me trocar.
Bill me levou a um parque de diversões que estava lá alguns dias na cidade. Voltei a ser criança por algumas horas e fiquei encantada com a quantidade de brinquedos. Desde que papai e mamãe começaram a brigar eles nunca mais me trouxeram.
Paramos em frente a uma barraca de tiro ao alvo. Bill pegou a espingarda e tentou acertar algumas latas dispostas de forma aleatória. Posicionou-se concentradamente enquanto eu apenas o observava. Relaxou os ombros e deu o primeiro disparo, seguido de mais alguns, os quais eu não consegui contar. Bill era realmente muito bom e acabou por acertar todas as latinhas ganhando de brinde um Stitch de pelúcia, o qual ele me deu.
- Quer tentar? - perguntou.
- Oh não. Melhor não, é capaz de eu acertar todo mundo, menos as latas. - começo a rir e ele me acompanha.
- Que tal, montanha - russa? - ele sugere e na mesma hora sinto o medo me percorrer.
- Podemos ir ao carrinho bate-bate, ou naquelas barraquinhas que acertamos as argolas. Isso é mais seguro. - Puxo sua mão, mas ele continua parado.
- Alguém aqui está com medo, ou é impressão minha? - Bill semicerra os olhos, desconfiado.
- Medo? Eu com medo? Imagina, eu só... - olho para o nada em busca de alguma desculpa, mas não tenho sucesso. - Tá legal, eu tenho medo.
- O que se passa?
- Altura. Enquanto ela esta no baixo está tudo certo, mas quando está no topo andando lentamente pronta para descer e você observa lá de cima as pessoas quase do tamanho de uma formiga, é como se eu estivesse abraçando a morte, só de imaginar. Dispenso. - falo com dificuldade devido ao ar acumulado em meus pulmões só por cogitar em estar lá em cima.
- Ellie, você já tem dezessete anos. Coragem. É o meu brinquedo preferido e eu adoraria dividir essa emoção com você, por favor. - aquela carinha era algo irresistível.
A fila estava imensa, mas não foi motivo para ele desistir. Olhava ao meu redor tentando achar alguma desculpa e implorava para o brinquedo parar de funcionar quando chegasse a nossa hora. Ver aquelas pessoas num verdadeiro sobe e desce e toda aquela gritaria acumulada, aumentava ainda mais o meu desespero. Porém eu deveria fazer isso por Bill, era o mínimo que eu poderia fazer por ele ser tão gentil.
Infelizmente o brinquedo não parou de funcionar. Pelo contrário, trabalhava perfeitamente. Segurei com toda força na trava de segurança e fechei os olhos firmemente. Com toda certeza eu estava patética.
- Ei, eu estou aqui, só relaxa. - Bill tentava de todo jeito me acalmar, mas o fato dele rir da minha atitude, só piorava ainda mais.
Fez-se um solavanco, e eu dei um grito. Vi algumas pessoas me encarando e um Bill se divertindo com o meu estado, mas antes que eu pudesse ficar brava, o carrinho começou a andar. O começo era até gostoso, ele ia tranquilamente e o vento que tocava minha pele era fresco e totalmente agradável, o que me fez amolecer as mãos. Porém, o topo foi se aproximando e o carrinho foi parando lentamente.
Bill segurou as minhas mãos com firmeza.
- Confia em mim. Vai dar tudo certo. Só fecha os olhos e sinta.
Eu apenas assenti com a cabeça.
Espremi meus olhos novamente e então o carrinho desceu provocando um vendaval em minha barriga e eu não contive um grito. A sensação era quase como a de estar voando. Agradeci internamente a Bill por me proporcionar toda aquela emoção.
- Foi divertido, não foi? - ele pergunta logo assim que o carrinho para.
- Foi incrível. Obrigada. - o abraço e o mesmo beija a minha testa.
Fomos em todos os brinquedos possíveis. O meu preferido era o carrinho bate-bate e eu acertava todos os carrinhos enquanto Bill ficava parado horas, tentando sair do mesmo lugar. No final comemos um cachorro quente e ele me deu um algodão doce para que eu fosse comendo no caminho de volta para casa. Era somente, ele, eu o Stitch.
- Eu sei que está cedo. - Bill começa a falar assim que entramos no carro. - Mas eu quero que vá ao baile comigo, você aceita.
- Mas é claro, por que ainda pergunta?
- Sei lá, até lá você pode encontrar alguém melhor do que eu. Quero me garantir.
- Bobo. - dou-lhe um beijo doce e um pouco melado.
A nossa interação e afinidade aumentava todos os dias e eu me apaixonava cada vez mais por ele. Ele era fofo, romântico, gentil e totalmente cavalheiro. Estávamos a sete meses juntos, e por mais que ele não tivesse feito o pedido oficial, era como se já estivéssemos namorando. Bill me apresentou a sua família, convidou-me a muitos jantares em sua casa e até no casamento de uma de suas primas fazendo questão de me apresentar a eles. A cada dia eu via mais verdade e certeza de que tudo aquilo era real. Poderia virar um filme ou um livro o qual eu teria a honra de assinar em baixo. Depois de várias estações juntos, o verão chegou ainda mais quente e cheio de surpresas.
Dezembro estava agitado assim como a escola com todos os preparativos para o baile. Tinha pedido ajuda de Bia para escolher um vestido, pois mais uma vez, mamãe se recusou. Optei por um rosa bebe longo e com algumas rendas no decote em coração que vinha até a minha cintura. Era absurdamente lindo e caiu perfeitamente em mim. Olhei-me no espelho e me senti uma verdadeira princesa.
- Está maravilhosa. - concluiu Bia que engoliu seco e eu não sabia o porquê.
- Está tudo bem?
- Está. - ela olha pra baixo e em seguida pra mim. - Você está linda. - desconversou.
Achei estranha sua atitude, mas preferi não dar muito atenção, afinal, ela iria desabafar quando quisesse.
A grande noite havia chegado. O céu contribuía para que tudo saísse perfeito e de fato estava. Dei uma ultima olhada no espelho, meus cabelos ondulados jogados para o lado, uma maquiagem agradável que realçava meus olhos e um coração empolgado.
Desci as escadas com papai me esperando e pude ver o mesmo emocionado. Molhou minha testa com os lábios, segurou minhas mãos e me olhou.
- Está maravilhosa, minha filha.
Mamãe chegou sem dizer uma só palavra, apenas para que eu fosse logo.
Papai me levaria até a casa de Bill, pois ele estava sem carro. Sua mãe o havia usado e só chegaria perto da hora do baile, e como a casa dele era mais próxima, pediu que eu fosse até a sua casa. Walter me desejou uma boa noite logo que chegamos. Saí e fui entrando sendo recebida pela empregada.
- Espere aqui. Vou chamá-lo. - Ela sobe as escadas enquanto eu fico lá embaixo encarando cada canto daquele sobrado que já conhecia muito bem. - Ele pediu para que a senhorita subisse, por favor. - informou.
Assim eu fiz. Subi até seu quarto e a porta estava aberta. Bill se olhava no espelho finalizando a sua gravata. Pigarreei a fim de chamar a sua atenção, ele se virou. O mesmo estava boquiaberto e como de costume, sorriu em me ver.
- Você está linda. Com certeza será a menina mais bonita da festa.
- Bill, não exagera.
- Estou dizendo a verdade. Serei o garoto mais sortudo por ter você ao meu lado. Entre. Estou terminado de me arrumar e minha mãe deve estar para chegar.
Sentei-me em sua cama e o observei dar o ultimo nó em sua gravata. Deu uma última arrumada em seu cabelo e passou o seu perfume. Suspirei quando a fragrância encostou em minhas narinas, era o melhor cheiro.
- Ellie, venha cá! - me chamou. Ele abriu a janela mostrando uma vista maravilhosa. A lua estava cheia e parecia sorrir. Fiquei sem palavras e completamente encantada com todo aquele brilho capaz de iluminar o ambiente inteiro. Ellie, quer namorar comigo?
- Está falando sério? - pergunto óbvio.
- Estou. Sem que tenho enrolado já faz algum tempo, mas não tive coragem ainda.
- É claro que eu aceito. - como de costume, estava eu chorando. Ele então me dá um beijo seguido um abraço caloroso.
Chegamos ao baile, o qual já se encontrava cheio e, portanto, senti-me o centro das atenções por ter todos os olhares direcionados a mim. Mas desta vez, eu não estava nem um pouco me importando, pelo contrário, estava era com orgulho e queria mesmo que todos me olhassem. Eu esbanjava felicidade e era nítido a qualquer um. Encontramos os amigos de Bill no bar e fomos nos juntar a eles. Bia não tirava os olhos de mim e parecia incomodada em me ver, e novamente decidi ignorar. Todos me cumprimentaram amigavelmente me elogiando.
Estávamos conversando e tomando alguns drinks que com o passar do tempo eu já estava me acostumando. Depois de um tempo eu comecei a contemplar a pista de dança com todos aqueles casais, alguns apaixonados, outros descobrindo o amor e alguns, apenas se conhecendo melhor. Então o DJ resolve dar espaço a Celine Dion. Bill nota a minha admiração vendo as pessoas dançarem e estende sua mão.
- Me concede essa honra? - seguro suas mãos um pouco insegura, mas tentei não demonstrar. Ele me guia até a pista.
- Bill, eu não sei dançar. - minha voz soou mais desesperada do que eu gostaria e isso o fez rir.
- Me dê seus sapatos.
- Oi? - pergunto sem entender.
- Para que você possa pisar em meus pés.
- Não precisa eu...
-Ellie, por favor.
Tirei meus sapatos e entreguei a ele. Apoio-me em seus ombros e coloco meus pés em cima dos deles, e o mesmo me abraça. Lentamente ele dá os primeiro passos e ao som de "A new day has come", estávamos dançado.
- Viu, você está dançando. - disse Bill.
- Não seja bobo. Se não fosse por você meus saltos já teriam perfurado o seu pé. - ele ri.
- Só relaxe Ellie, e deixa que eu te conduza.
Seria fácil sentir as luzes se apagando, e o salão ficando vazio quando a única coisa que te interessa é o momento. Seria fácil dizer sim aos felizes para sempre, quando você sente certeza. Seria fácil não ter problemas quando você abraça a solução. Seria fácil repetir a mesma música porque ela lhe traz os melhores sentimentos. Seria fácil pausar o filme ou dobrar a página de um livro, porque aquela ocasião é a mais importante. Seria fácil, se o final fosse feliz.
No dia do meu aniversário, papai decidiu chamar alguns parentes para comemorar. Iria ajudar mamãe com os preparativos para que ela concordasse com a ideia e reclamasse de menos. Seria algo simples, somente para não passar em branco. Meus tios foram chegando, bem com Dona Branca. Do colégio, havia chamado apenas Bill, aliás, meu namorado era uma presença importante e o mesmo chegou super cedo. Em pouco tempo ele havia se enturmado com todos da minha família. Conversamos de tudo um pouco, sobre os planos para o futuro, vestibular, sonhos, segredos de família, vergonhas alheias e tudo mais. O assunto até que estava bom, mas Bill me chamou em particular.
- O que foi?
- Quero te dar o seu presente.
- E onde ele está? - pergunto curiosa.
- No seu quarto.
Subi as escadas pulando degraus. Estava ansiosa e animada. Ao abrir a porta, o chão estava coberto de rosas e havia algumas velas espalhadas por todo canto. Sabia o que estava prestes a acontecer. Fiquei nervosa na mesma hora, ao mesmo tempo em que admirada.
- Bill... - ele me interrompe colocando o indicador sobre os meus lábios.
- Queria que fosse especial, mas vou entender se você não estiver pronta.
Somente encarei aqueles olhinhos e pude sentir meu rosto molhado. O que estava faltando? Eu tinha uma pessoa maravilhosa ao meu lado.
- Tudo bem. Eu confio em você.
Ele sorri e começa a me beijar. Segura-me em seu colo e me leva até a minha cama onde me deita e por alguns segundos ele analisa meu rosto. Sua expressão era de preocupação e o mesmo me dá um beijo desesperado, mas não com malícia e sim como se estivesse esperado a vida toda por aquilo. Lentamente ele tira a minha roupa e antes de nos tornarmos um só ele segura minhas mãos entrelaçando nossos dedos.
Eu estava mais que certa para a minha decisão. Eu o amava e me sentia amada. Ele esperou meu tempo, se dedicou a mim por tantos meses, aceitou minhas inseguranças e despertou uma Liza até então adormecida. Senti que devia isso a ele e a mim. Dormimos abraçados e completamente apaixonados, pelo menos até o amanhecer.
O sol veio em cheio em meu rosto me fazendo acordar. Espreguicei-me e demorei alguns segundos até voltar à realidade, quando me lembrei da noite passada. Dei um sorriso e virei-me para o lado estranhando a sua ausência. Pensei que ele estaria lá fora, ou estivesse ido embora para que meus pais não fizessem perguntas. Resolvi descer e ver se ele estava em algum canto de casa, mas nem sinal dele. Resolvi mandar uma mensagem agradecendo a ele pela noite maravilhosa e por ser tão especial. Ele não retornou. Tentei ligar algumas vezes até cair. Estava preocupada pensando se tinha acontecido alguma coisa. Se ele não tivesse gostado, eu poderia tentar de novo, aliás, como ele mesmo disse, tínhamos a vida toda.
No final da tarde, papai me levou até o colégio para pegar o histórico escolar. Estava perdida em meus pensamentos tentando imaginar o que pudesse ter acontecido, mas não encontrava nexo em nada. Fazia a mim mesma inúmeras perguntas sem respostas, cogitava milhões de possibilidades e descartava todas elas. Mas a verdade estava diante dos meus olhos, tão claro quanto a água. Bill estava há duas quadras da escola aos beijos com outra garota.
- Para o carro! - gritei em desespero. Meu coração estava se partindo em inúmeros pedaços e quando estava inteiro em minúsculas partículas, era como se tivessem arrancado ele de mim e o jogado como se fosse descartável. As lágrimas corriam numa velocidade que eu não conseguia acompanhar. Encarava naquele momento a pior cena da minha vida. Sinto a mão de papai sobre meu ombro.
- Sinto muito minha filha. - eu olhei pra ele soluçando e suplicando para ir embora dali o mais rápido possível e papai obedeceu. O trajeto todo eu fui chorando descontroladamente. Quando chegamos segui direito para o meu quarto gritando. Tranquei-me no quarto e abraçando o travesseiro, eu o encharquei com todas as minhas lágrimas.
Quando eu estava seca por dentro e não havia mais o que esvaziar, senti meu peito cheio e dolorido. Estava sufocada e sem ânimo nenhum. Encarava as paredes com pensamentos vazios. Sentia-me um lixo, uma pessoa que tinha acabado de ser usada e jogada como se eu fosse um nada. Fiquei um tempo sem comer e sem falar com ninguém. Meus pais brigavam diariamente e seus gritos eram incomodativos e torturantes. Tirei minha mala do guarda roupa e coloquei algumas peças de roupas. Desci as escadas com a cara mais horrível possível, fazendo com que eles se silenciassem por alguns segundos.
- Minha filha, como você está? - ele pergunta de forma acalorada, mas qualquer sentimentalismo era indiferente pra mim.
- O que pensa que está fazendo com essa mala? Aonde pensa que vai? - mamãe gritava e sua voz era como marteladas em minha cabeça.
- Eu não penso. Eu vou. Já liguei para minha avó, ela está me esperando e vocês não vão me impedir. - minha voz soava fraca, eu estava fraca.
- Você ficou um mês trancada nesse quarto e eu tive que cuidar de tudo sozinha, agora que resolve sair você vai morar na casa da sua vó? De jeito nenhum.
- Lilian, já está decidido. Já sou maior de idade e posso ir para onde bem entender. E antes que você comece com o papo de "enquanto você estiver morando sob o meu teto", estou indo pra bem longe de você, goste, ou não. E pai, se você não me levar eu chamarei um táxi.
Papai consentiu com a cabeça e me levou.
Contei toda a história para vovó. Depois do meu pai ela era a pessoa que eu mais amava, a que mais me entendia e tinha os melhores conselhos, mas eu estava fechada por completo. Permaneci todos os dias dentro do quarto saindo somente para comer ou fazer minhas higienes. Num belo dia eu recebo uma mensagem "Sinto muito, Ellie". Ri ironicamente e chorei com raiva. Jurei a mim mesma que não me apaixonaria novamente, que ninguém, nunca mais me machucaria daquele jeito. O amor não era pra mim, se é que o mesmo existe.
Depois de um tempo, comecei a frequentar festas, bebia sem limites, ficava com alguns caras sem pudor nenhum e chegava a hora que eu quisesse. Eu me sentia alguém sem valor e não fazia questão disso. Por Deus eu não virei uma drogada, nem engravidei, muito menos contraí algum tipo de doença. Minha avó passava as noites em claro cuidando das minhas ressacas e dos pesadelos que eu tinha todas as noites. Depois de três meses, Dona Branca foi se queixar a meu pai, o qual me comprou um apartamento. Mas essa vida durou mais três meses até o dia que Walter me deu um tapa na cara com os olhos cheios de lágrimas. Senti a decepção em seu coração e naquele momento eu soube que era hora de parar. Papai me pediu desculpa várias vezes, mas eu não o culpava. Então decide focar em alguma coisa. Decidi tirar a habilitação com o que sobrou da minha mesada e o que eu não gastava em festa, estava melhorando com o tempo e a dor não existia mais, apenas as lembranças que hora ou outras decidiam invadir os meus sonhos. Resolvi fazer uma faculdade descartando qualquer uma que lembrasse a Liza de antigamente. O direito demonstrava um lado que eu não tinha e passaria a ter. Trouxe-me um senso crítico fazendo com que eu me perguntasse o porquê disso ou aquilo, o que de certo modo me fez questionar e separar a ficção da vida real. O amor era algo construído pelo homem a fim de manipular as pessoas para comprar romances. O amor é puramente ficção, ele simplesmente não existe. Bill me arrancou tudo aquilo em que eu acreditava, tirou de mim toda a minha essência.
Era hora de seguir em frente como uma mulher madura. O pior de tudo é olhar para trás e perceber que depois de ser magoada tantas vezes, eu estava magoando as pessoas mais importantes para mim e esquecendo do sentimento mais puro.
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