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O conjunto de camisa branca e saia lápis não é o tipo de roupa que eu usaria por vontade própria, mas é o meu novo uniforme de trabalho, e até que não fica tão mal assim. Eu checo o traseiro no espelho, me certificando de que não está transparente nem nada do tipo.
— Você parece a secretária gostosa do CEO de uma empresa multimilionária que ninguém sabe ao certo o que faz. — É a resposta de Sarah para o meu simples "como estou?".
— Eu pareço a Anastacia Steele? — Dou risada e pego a bolsa pendurada perto da entrada. — Obrigada, eu acho.
— Ei! Me promete uma coisa!? — Ela pede, saltando do sofá. Eu já estou meio passo para fora da porta.
— O quê?
— Se o Johnny Depp aparecer, você pega um autógrafo dele pra mim? Ele é muito meu bebê desde, sei lá, Edward Mãos de Tesoura.
— Desculpa. — Engulo o riso, apertando os lábios. — Li as letras pequenas do contrato, e eles tem uma regra bem explícita sobre importunação de clientes. Isso inclui o capitão Jack Sparrow.
Sarah faz uma careta insatisfeita, franzindo o nariz.
— Ao menos me manda uma mensagem se alguém imperdível aparecer? Meu primeiro furo exclusivo no blog, pode imaginar?! — Ela balança o corpo, toda animada.
— Prometo que vou tentar — cedo, e então fecho a porta porque já estou para lá de atrasada e eu nem sei a que horas meu ônibus passa.
Enquanto espero, aproveito o tempo livre e mando uma mensagem para Thomas. Os dias na faculdade são muito corridos, normalmente conversamos com mais calma a noite, mas, com o turno do restaurante começando hoje, até esse tempo nos foi retirado.
Eu: Como está meu garoto Nova Iorquino?
Ele: Com saudade.
Eu: Tb.
Ele: Estudando?
Eu: A caminho do trabalho agr. E vc?
Ele: Vou sair com uma galerinha para ver o jogo de Hockey hoje.
Eu: Hockey!? kkkk Vc tá mesmo virando um nova iorquino. E o basquete?
Ele: É uma imersão cultural kkkk A gente se fala mais tarde?
Eu: bjs
Então eu enfio o celular na bolsa e presto atenção ao caminho. No trecho que faço a pé, eu atravesso um pedaço da famigerada Walk of Fame (a calçada da fama). Embora a maioria dos nativos — ao contrário dos turistas — passem batido pelas homenagens, eu me distraio lendo os nomes dourados cravados no centro das estrelas. Meio que espero ver aquele nome conhecido que tanto me assombra, mas esse parece ser o único lugar do mundo onde Pedro Lucas não está. É um pouco frustrante, confesso. Hollywood tem o tipo de energia que te absorve, faz você querer ser parte desse universo.
— Está atrasada, Juliana — reclama Bertrand assim que eu piso o primeiro pé para dentro do restaurante. Preciso conter a minha indignação. Foram apenas 5 minutos, e o meu nome nem é Juliana. — Vamos, tem muito o que aprender antes de o restaurante abrir.
Sem muita cerimônia, o chefe me apresenta cada espaço do restaurante. O salão principal tem capacidade para cento e vinte pessoas, com um piano de cauda no centro. A sala de espera conta com um amplo bar e uma boutique de doces, também temos um salão reservado para reuniões de negócio.
Por fim, Adrien me guia para o pátio exterior: um espaço a céu aberto cercado por natureza, onde casais reservam mesas com semanas de antecedência para garantir uma noite romântica que precisa ser impecável. São somente cinco delas, espalhadas pelo chão de bloquete, cada qual decorada com uma rosa vermelha solitária e luzes de vela.
— Vai começar atendendo só aqui fora — ele avisa. — Considere um agrado. É o lugar mais tranquilo da casa, e normalmente os casais se importam mais com a privacidade do que qualquer outra coisa. — Assinto. — A regra sagrada é não importunar. Acha que eu estou sendo bastante claro?
— Translúcido — respondo e mordo a língua, torcendo para que o sarcasmo não tenha ficado evidente.
— Excelente. — Ele abre um sorriso amarelo no meio da barba. — Só faltou a cozinha. Vamos lá.
Eu o sigo restaurante adentro. A cozinha é a gigantesca, azulejada e com balcões de inox para todo lado. Os cozinheiros e auxiliares trabalham em um ritmo frenético, preparando-se para a chegada dos primeiros fregueses.
— Nós temos cinco estrelas na avaliação dos críticos — se gaba como se essa fosse uma conquista pessoal. — Nossos clientes não esperam mais do que dez minutos por uma bebida, ou mais que trinta por um prato quente. Em hipótese nenhuma pode atrasar. Entendido?
Assinto. Eu vou ser babá de casais milionários e mortos de fome, que não aguentam esperar meia hora por uma refeição que não vai encher suas barrigas e ainda assim custa os olhos da cara, penso.
— Então vai! — Ele me enxota da cozinha com palmas apressadas. "Chefe mala" essa informação devia constar no descritivo da vaga. — Está esperando um convite formal para começar? Ah! E prenda essa cabeleira. Você até que é gostosinha, mas vai ter que se comportar como todo mundo, meu bem.
Eu fico estática por um segundo ou dez, depois meus olhos correm pela cozinha, mas os outros funcionários não parecem ter escutado (ou se importado), então eu me convenço de que foi só um choque cultural. Talvez na França a palavra "gostosinha" possa ser usada desse jeito. Volto a mim mesma e faço um nó desajeitado nos cabelos, depois fujo rápido para o pátio.
De pé com a coluna ereta, estudo a extensa carta de vinhos enquanto os primeiros clientes não chegam. Até penso em enviar uma mensagem para Thomas, quero muito falar com ele, mas a última coisa que eu quero é que Adrien apareça para chamar minha atenção por usar o celular ou algo do tipo.
Eu só sei que não quero chamar a atenção do meu chefe, então pretendo ser a funcionária mais irritantemente certinha e comportada que esse restaurante já viu. Se Adiren Bertrand não tiver um motivo para falar comigo, eu não vou precisar olhar para a cara dele e assimilar o termo "gostosinha" a esse homem que tem idade para ser o meu pai, tampouco lembrar que o meu pai traiu a minha mãe com uma mulher que tinha pouco mais que a minha idade atual naquela época.
Nota importante: Como a maior parte das minhas leitoras são do público feminino, eu acho importante ressaltar que 53% das mulheres brasileiras sofrem ou já sofreram assédio sexual no trabalho. Acho importante discutir esse tema.
E eu já seiiii que vocês estão ansiosas pra rever o Pedro. Calma que tá vindo aí!!!
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