12
Com uma semana inteira de experiência, já me sinto muito mais confiante. Chego ao trabalho mais preparada: os cabelos bem presos, o uniforme passado. Dou um "boa noite" baixo ao entrar no restaurante, mas, antes mesmo de me situar, Adrien Bertrand surge na porta de seu escritório e me faz um sinal para entrar. Engulo em seco. Justo quando eu pensei que estava indo bem.
— Júlia, acho que precisamos dar uma palavrinha.
Contenho o revirar de olhos e apenas assinto o mais educadamente possível. Adentro na sala revestida em madeira escura e Adrien fecha a porta.
— Sente-se, por gentileza.
Algo na atmosfera da sala dele me deixa desconfortável, mas eu obedeço. Com cautela, me ajeito na cadeira de couro preto e apoio as mãos nos joelhos. Bertrand se apoia na mesa de carvalho, ficando de frente para mim. Tenho certeza de que estou encrencada.
— Algum problema? — Pergunto, a minha voz sai mais aguda do que o normal. Comprimo os dedos para que as mãos não fiquem tremendo.
— Problema? — Adrien ri. — Problema!? Bom, eu não sei. Eu recebi uma ligação muito interessante essa manhã. Imagina o que Pedro Loth poderia querer conversar comigo?
Meu coração dá um salto inesperado.
— Pe-pe-pedro Loth? — Tento forçar a indiferença.
— Pode imaginar que eu também fiquei surpreso, mas ele esteve aqui na semana passada. Você atendeu a mesa dele, não atendeu? — Tudo que consigo fazer é assentir. — Parece que ele gostou muito do atendimento.
A última parte vem com um tom sugestivo. Eu pigarreio, me mexendo discretamente na cadeira numa tentativa de disfarçar o incomodo.
— Eu só segui o roteiro.
— Bom, bom... — Ele tamborila os dedos na madeira com um sorriso malicioso. — Sendo assim... devo imaginar que a qualidade do vinho seja o motivo pelo qual ele fez tanta questão de conseguir uma mesa para essa noite, não?
— O Pedro... — Posso sentir os batimentos se acelerando.
— Vamos colocar isso em pratos limpos: o senhor Loth pareceu especialmente interessado em você e não nos vinhos, Juliana.
— Eu não faço ideia do motivo — minto. Estou em defensiva.
— É fácil adivinhar. — Adrien coça a barba, os olhos correm pelo meu corpo de um jeito indiscreto. — O ponto dessa conversa é: o senhor Loth é um cliente importante. — Ele quer dizer famoso. — Com contatos também importantes. — Ele quer dizer uma namorada famosa. — Não vamos querer deixá-lo desapontado.
— Você está insinuando que eu deva...
— Dar a atenção que o meu cliente espera — Bertrand interrompe.
Salto da cadeira, passando a mão pela saia.
— Acho melhor eu ir organizar as mesas, antes que os clientes comecem a chegar. — Acelero para fora da sala. O coração bate muito rápido, pulsando todo o sangue para as bochechas. Minhas mãos estão tremendo também.
Meu chefe acabou de insinuar que eu deveria ser um brinquedinho e entreter o Pedro Loth essa noite. Acho que é assim que as coisas são para ele agora que é rico e famoso. O mundo inteiro caindo aos seus pés, seu desejo é uma ordem, senhor. Mas não eu.
— O que esse desgraçado quer comigo, afinal? — penso em voz alta enquanto dobro os guardanapos de tecido na mesa.
— Não, não, não! Isso parece uma camisa amarrotada. — Estou tão imersa em pensamentos que mal percebo a aproximação de Bertrand. — Refaça todos, Juliete. Eu quero essas mesas impecáveis.
Então dá as costas, indo perturbar o pessoal da cozinha. Eu reviro os olhos, mas meio que entendo a paranoia dele, porque fico o tempo todo checando a minha imagem no reflexo do vidro, só para garantir que a minha aparência também esteja impecável.
Não que eu queira impressionar o Pedro. Eu não quero. Mas se ele decidiu se lembrar de nós, eu quero que ele dê uma boa olhada no que perdeu.
Acendo as velas, organizo os pratos, separo as cartas de vinho. Os clientes vão lotando as mesas aos poucos. O tempo passa. Troco os pés, ansiosa. Quanto mais a hora se aproxima, mais nervosa eu fico. Torço para ele desistir, embora essa ideia seja um pouco frustrante. Acho que meu estômago começa a embrulhar. Discretamente, envio uma mensagem no celular para Sarah.
Eu: SOS Pedro Loth vai chegar aqui a qualquer momento.
Ela: OQ???? Me informa todos os detalhes! Vou soltar tudinho no blog.
Eu: Foco!!! O que eu faço?
Ela: Fica calma, vai dar tudo certo. Só respira fundo.
Quando eu subo os olhos, Pedro está entrando acompanhado do Chefe Bertrand em pessoa que o guia até a mesma mesa em que se sentou da última vez. No instante em que os nossos olhares se cruzam, o meu coração dá um pulo no peito. Respirar fundo? Eu nem me lembro mais como respirar. Ao menos dessa vez não tenho nenhuma sobremesa em mãos para derrubar.
Para alguém que sumiu por anos, Pedro está se saindo um tremendo perito na arte de ressurgir dos mortos.
— Quero lembrá-la que eu não sou um homem de segundas chances — Bertrand fala baixo ao passar por mim. — Não me desaponte, Juliane.
Então ele sai, me deixando a sós no pátio com Pedro Loth. Ok, não a sós. Tem pessoas nas outras mesas, mas estão tão imersas em seus jantares e conversas clichês, que não parecem perceber a tensão que se assenta por todo o ambiente. Devo estar vermelha, mas respiro fundo como Sarah disse e me obrigo a parecer indiferente.
— Boa noite! — Encaro minhas próprias mãos — Seja bem-vindo ao restaurante Paris, meu nome é Julie e vou servi-lo hoje, espero que tenha uma refeição agradável.
—Tiete? — Ele tem a audácia.
Sinto a jugular pulsando de raiva e todo o sangue subiu para o rosto. Eu não sou a tiete dele. Pedro não tem o direito de me chamar desse jeito. Eu não sou mais a garotinha que ele quebrou.
— Meu nome é Julie, e eu vou atendê-lo hoje — repito.
— Eu sei o seu nome. — Pedro dá um riso curto.
Me permito encará-lo. O terno social meio desalinhado, os cabelos negros exatamente como eu me lembro, pequenas ruguinhas contornam a risada de dentes brancos.
— Demorou uma semana inteira para lembrar? — Mordo a língua. Maldita língua que não consegue se controlar. Maldito coração que insiste em bater tão rápido. Maldito Pedro!
— Na verdade, demorei tudo isso para criar coragem e para conseguir uma mesa aqui. Faz ideia de quanto esse lugar é disputado? — Ele sustenta o olhar no meu. — E a comida nem é tão boa assim.
— Você já provou nosso salmão com molho Béarnaise? — Tento parecer indiferente, mas só consigo soar sarcástica. — É a indicação do Chef Bertrand essa noite.
— Eu pensei que estivesse alucinando... — Pedro prossegue como se não houvesse sequer me escutado. Tudo gira em torno dele. — Tinha que ser outra Julie muito parecida contigo. Mas porra... é mesmo você. O que você tá fazendo aqui?
Eu aperto os lábios, olho ao redor. Estamos num restaurante, eu visto um uniforme tosco, estou parada como uma idiota ao lado da mesa dele e tem uma maldita comanda eletrônica na minha mão.
— Acho que é um pouco óbvio, Pedro.
Ele ri. Eu não estou tentando contar uma piada.
— Quero dizer... em Los Angeles. O que você está fazendo em Los Angeles?
Eu mastigo meu lábio em descrença. Vamos fazer isso mesmo? Penso. Brincar de falar sobre as nossas vidas como se fossemos velhos amigos? Nós nunca fomos amigos. Tudo que tivemos foi uma paixão esquisita, rápida, intensa e dolorida da qual ele saiu com dois prêmios Grammy, e eu saí quebrada.
— Faculdade — resumo e trato de desviar logo do assunto. — Então o que vai pedir?
— Um pouco da sua atenção. Se não for pedir demais, é claro.
O mesmo tipo de "atenção" que o meu chefe insinuou, imagino. Claro que é pedir demais.
— Uma taça de vinho branco para acompanhar? — Lanço um sorriso irônico.
— Acho que vou precisar de uma bebida mais forte. — Ele reclina na cadeira, pegando o cardápio para analisar. Tem um quê de prepotência no modo como seu queixo fica levantado. — Pode ser o uísque Jack Daniels. Se importa se eu fumar um cigarro?
Ele saca o maço do bolso e já está enfiando entre os dentes.
— Na verdade, eu... é... são as leis da Califórnia, então...
— Relaxa. Eu não tenho medo de levar uma multa. — Ele sorri, acendendo o isqueiro prateado perto da boca. — Vai um trago?
— Obrigada.
"Obrigada?" eu me repreendo mentalmente. Jura que você tá agradecendo o babaca?
— Eu vou buscar sua bebida. — Aproveito a deixa para fugir da cena do crime bem rápido.
***
Só vim postar capítulo pq vcs tavam ansiosasss e pedindo, então comentem bastante 🗣🗣🗣
Cês n pensaram que o Pedro tinha mesmo esquecido dela né? 👀
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