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The Flame That Does Not Extinguish

EM TERMOS DE CONHECIMENTOS excepcionais sobre veículos, me categorizavam como insipiente e o básico que sabia abarcava uma parcela bem insignificante do que se espera de um adulto que já se arriscou na direção — dessa forma me tornando um perigo em potencial. Dante, em oposição, tinha estilo até pra girar na estrada no seu conversível vermelho lustroso de teto retrátil e orgulhosos assentos surrados nomeado “beldade rubra”. Se você quisesse um piloto de fuga contra seres não-humanos eficiente e uma reputação de respeito com uma experiência invejável em lidar com tais criaturas, vocês teriam Dante como a melhor opção. Além de manejar demônios, ainda fazia manobras para driblá-los com a expertise de um profissional.

O homem é incrível.

Claro que a pretensão fosse que viagem ocorresse sem grandes complicações visto que o objetivo é cuidarmos de uma criança. O garoto em questão não tinha falado muito desde que começamos o percurso, o que não condenaria nem nada pela situação estranha que estava inserido e teria que passar um tempo razoável com dois desconhecidos — um deles sendo um meio-demônio.

Depois de umas horas, estava começando a acreditar que a ideia de excursão empolgante foi jogada pelo ralo. Percorrendo uma estrada sem nenhum estabelecimento, como um hotel, para darmos uma pausa para esticar o corpo já pensava em desistir. Ninguém fala de como permanecer parado num carro, em uma posição, por longos períodos pode causar desconforto. Meu traseiro já estava protestando por ficar sentada e ainda sem ter como aliviar era difícil, mas nada se comparava ao clima e o silêncio absoluto dentro do veículo.

Por mais que não fosse um exemplar de comunicação, variando entre introversão e extroversão, a falta de contato me condenava a perpétua condição de tédio. Se comparasse meu eu anterior com a atual, podia afirmar com veemência que tinha melhorado bastante o departamento de socialização. Talvez só precisasse dar o primeiro passo, tomar a iniciativa, para as engrenagens girarem de acordo com o que deveria ser.

Enquanto amadurecia a ideia, elenquei o que Howard compartilhou sobre Ayden: nos encarregaram de levá-lo em segurança a um orfanato em outra cidade e falar com a Madre do local que dará a recompensa pelo serviço concluído. Não somente esses detalhes cruciais no desempenho da nossa função, havia também uma sensação que rastejava em meu sistema nervoso, uma espécie de pendência que a visão despertou — o que definiria como pontapé inicial da jornada. Trish e Lyana ficaram responsáveis pela manutenção do escritório e os cuidados com o Kane. E torço esperançosamente que elas não terminem de destruir o lugar, afinal quero voltar pra uma casa intacta ou parcialmente pra ter, ao menos, um teto pra dormir.

Ocasionalmente o observava pelo retrovisor interno para verificá-lo em caso de ter algum problema ou ele queira algo — com uma sensação esquisita de familiaridade. O pobrezinho tinha uma profunda apatia em sua compleição e traços de receio, o que me deixava mais preocupada com o que ele poderia estar sentindo.

Uma ideia bem boba passou pela minha cabeça e sem muitas opções disponíveis, resolvi tentar.

— Ei, Ayden! — chamei, ele virou o rosto e me encarou pelo espelho do retrovisor interno sem entender o objetivo de tê-lo chamando tão repentinamente. Então, fiz uma careta deveras engraçada, em resposta Ayden piscou, confuso. Dante deu uma risadinha. Tentei outra careta, nessa consegui tirar uma reação dele. Fiz mais uma, dessa vez Ayden começou a rir.

Fiquei contente por ter feito com que essa pobre criança feliz, mesmo que seja momentâneo. A gargalhada de Ayden era tão contagiante que eu acabei rindo junto, chegando a doer a barriga. Continuei brincando com ele, que parecia cada vez mais a vontade conosco. Aproveitei para lhe ensinar jogos que normalmente as pessoas fazem quando estão viajando de carro como “Vejo com meu olhinho" e canções que quase levaram Dante a loucura.

A temperatura estava agradável — minimamente quente — e o céu sem nenhuma nuvem. Peguei uma barra de chocolate, comi um pedaço pequeno e servi o resto para Ayden.

— O que é isso? — questionou inocentemente, fitando o doce.

— Pequenino, nunca comeu chocolate? — perguntei espantada.

— Não. — fiquei quase sem fala.

— Experimente, tenho certeza que irá gostar — ele hesitou, mas logo deu uma mordida. Ayden sorriu ao sentir o sabor delicioso e a consistência macia que possuía o chocolate.

Ninguém resiste a doçura do chocolate.

— É muito bom, obrigado.

— Não precisa agradecer, pequenino.

Alcancei a garrafa de suco e quando estava preste a beber Dante faz um movimento brusco, derramando o um pouco do conteúdo em meu rosto e na minha camiseta.

— Droga! Dante devia ter mais cuidado! — olhei desolada o estrago, devido ao suco a camiseta ficou colada ao meu torso e ainda toda grudenta. — Olha, estou toda molhada.

Não foi minha real intenção lhe chamar para ver, era apenas uma frase retórica.

— Estou olhando — notei que Dante estava bem atento ao meu busto, aliás, muito interessado. Essa era uma das graças da nossa dinâmica; ele flertava comigo de modo que poderia retribuir de igual maneira. Ele acabou sendo o único no qual tive esse nível de intimidade.

— Olhe para estrada, querido. Somente para estrada. — rindo, segurei o queixo dele e o virei em direção à rodovia que continuava se estendendo a nossa frente, fazendo-o voltar a atenção no que deveria.

Desisti de tomar suco e o guardei. Com um pano que encontrei no porta luvas usei para me limpar.

Nunca imaginei que algo tão simplório acabaria trazendo uma atmosfera de cumplicidade e graça.

×××

EM SUA INVESTIGAÇÃO INDIVIDUAL, Trish obteve um acervo generoso de uma história que se remontava a um determinado ponto no tempo, uma tela delicada tecida a tramas com leves desfiados que servia para preencher, ainda que de maneira provisória e muito imprecisa, as lacunas deixadas por quem quer que tenha apagado tais pormenores. Dentre a coleção de livros, pinturas e artefatos antigos, tinha algumas fotografias desbotadas e outras ainda conservada em porta-retratos desenhados a ouro. Através dela conseguiu dar uma face para o escritor e também para aqueles que conviviam sob sua meticulosa supervisão. A princípio, pela inimizade inicial, não reparou no rosto da mulher de longos e volumosos cabelos vermelhos e se tivesse captado antes certamente a reconheceria sem dúvidas.

Alexander não poupou adjetivos e tampouco empregou nenhuma tração de humildade para descrevê-la; ressaltando a beleza e sua importância para o pequeno núcleo familiar. Depois de si, a mulher seria a figura de suporte e objetivamente a que servia como irmã mais velha para os membros menores.

Dos sobreviventes, ela era o ponto clave.

— Lyana, certo? — indagou para testar as águas. A mulher a encarou com os grandes olhos igualmente carmim, assentindo. — Você conheceu Alexander, suponho

Lyana se surpreendeu com a pergunta, emitindo um suspiro longo e cansativo.

— Pelo visto ninguém aqui perde tempo, mas acho que não deveria estar surpresa pelo que a Diva já sabe. — comentou com um sorriso forçado. — É, eu o conheci. Na verdade... — mordeu o lábio inferior por um instante. — Ele foi alguém que me importava, mais que qualquer coisa.

— Se era tão próxima dele, por que não contou a Diva sobre?

Houve um segundo incômodo de silêncio.

— Eu fiz uma promessa. — Lyana se levantou do sofá, andando sem rumo pelo escritório. — Além disso, a intenção era que ela não tivesse contato com esse tipo de coisa.

— Não tinha como esconder isso pra sempre, você sabe.

No mundo original da Diva, não precisava se preocupar com demônios tentando capturá-la.

— Achava que tudo estava sob controle... — passou a mão nervosamente pelo cabelo, encarando Trish com olhos afiados. — O que você sabe sobre Alexander?

— Que ele e a Diva são a mesma coisa em essência. Ambos são Sophians, Unchant ou como prefere defini-los. — Trish ainda tinha os dados frescos na memória. — Antes da Diva nascer, ele se encarregou de contar uma parte do que era e o que conhecia de contos antigos.

A ruiva balançou discretamente a cabeça.

— Você conseguiu descobrir uma boa parcela das coisas, mas não tudo. De fato, ele catalogou eventos históricos, mas só foi capaz disso por conta de alguns livros que aparentemente Sparda escreveu e outros que Arya escreveu. Esses que deram um norte a ele, pois foi nessas escrituras que ele soube o que eram os Peregrinos.

Trish franziu o cenho.

— Sparda?

— Sim. Ele retratou bastante sobre Arya pelo grau de proximidade. — suspirou. — Havia muitas coisas sobre ela que ele não descreveu com muitos detalhes e outras ele queria realmente contar. — o som dos saltos ecoou pelo vazio. — O principal ele manteve muito vago. Ao menos com isso Alexander soube quem foi a última Unchant a pisar sobre a Terra antes de seu nascimento.

Lyana se apoiou no encosto da poltrona.

— Sabe, Diva costumava ver Alexander, mas pensava nele como um amigo imaginário... — fechou os olhos reproduzindo a lembrança como um rolo de filme antigo que se desenrolava com as cores desbotadas devido ao tempo. No começo, quando optou por seguir a promessa que fez a Alexander, observava Diva crescer em uma distância segura até que, para permanecer perto o suficiente, se transfigurava em uma criança da sua idade para que tivessem uma ligação desde cedo.

Naturalmente aos cinco anos, Diva desenvolveu uma sensibilidade cognitiva que lhe permitia ver o que, na época, ela chamava de “borrões” nas pessoas. Uma das primeiras manifestações de seus poderes lhe garantindo a visão de auras.

Remexendo no velho baú de memórias, explorou mais a fundo.

O olhar fixo e temerário da infante Diva propiciou uma vaga noção de que, seja lá o que sua mente fértil infantil engendrou, não se tratava de algo leviano — as orbes castanhas tremeluziam com excitação e a boca ligeiramente aberta para transmitir a informação que tanto guardou. Ela deixou de lado os desenhos onde rabiscou duas crianças — uma de cabelo loiro e outra de cabelo preto — e se voltou quase completamente pra meio-demônio que a fitava com a mesma proporção de curiosidade.

— Eu tenho um amigo — disse sem rodeios. — E ele te conhece, sabia?

O risinho travesso dela, quase que enfatizando seu segredo, lhe arrepiou.

— É mesmo? — escutou dos pais dela, enquanto a vigiava, que Diva tinha começado a fase de “amigos imaginários”. Para Lyana, que conhecia a natureza dos dons dela, não via como uma simples “tulpa” no qual formulou para se distrair, pelo contrário, poderia significar que as habilidades sensitivas estivessem evoluindo. — E qual é o nome desse amigo?

Ela virou a cabeça para os desenhos para procurar entre a pilha que tinha a disposição. Suas mãos pequenas e ágeis recolheram dois mais antigos e entregou para Lyana.

— O nome dele é Alexander — o sorriso que sustentou durante toda a curta conversa mitigou com a realização. — Alexander Lockhard.

Lyana lutou contra o impulso avassalador de chorar quando percebeu que, de fato, era a visão que se desenvolveu. Se preparou por anos para cada rito, cada novo descobrimento e sobre como lidar com cada prisma dos poderes dela, mas nunca, no período que se tornou guardiã de Diva, imaginou que seria capaz de auxiliá-la nessa parte.

Nem a morte iria pará-lo, já era de se esperar.

Nos dois desenhos que ela lhe deu retratavam a imagem de Alexander: o cabelo longo loiro, os olhos púrpura e o semblante gentil. Tudo reproduzido em traços um pouco descoordenados típicos de crianças dessa idade, porém ainda sendo ele.

— E... Ele está aqui?

— Sim, está bem ali — indicou um ponto do quarto. — Ele fala muito de você. Conhece ele?

Na época não soube o que responder.

— Diva parecia saber nada quando conheci ela.

Mordeu o lábio inferior.

— Isso durou pouco tempo. — divagou com melancolia. — Ela teve um acidente, nada grave. Depois disso ela parou de vê-lo sequer recordava da existência de Alexander ou dos poderes que possuía. Foi tudo apagado. — explicou com prudência. — Ao menos a frequência de pesadelos diminuiu significativamente.

— Pesadelos?

— Talvez vocês não saibam tanto quanto eu esperava... — com a face séria mirou Trish e afirmou com a voz tétrica: — Há alguma força poderosa que acompanha Diva desde sempre. Algo que está além da compreensão.

×××

— Aaaah, tem a cor amarela e espirra água — emulei a voz do capitão da música.

— Bob Esponja calça quadrada! — Ayden seguiu no ritmo do jeitinho que eu ensinei.

— Se nenhuma bobagem é o que você quer! — continuei a canção com Ayden igual duas crianças em um passeio escolar.

— Bob Esponja calça quadrada!

— Podemos trocar de música? — Dante indagou. — Algo mais do meu estilo?

— Essa foi divertida. — afirmei pensando em alguma música. — Que tal Backstreet Boys?

— Hm.

Observei Dante ajustar o retrovisor com um olhar divertido e cauteloso.

— Ei, doçura, o quanto você consegue em um alcance de teleporte? — Dante perguntou com aquele semblante de que arquitetou o plano mais mirabolante e possivelmente perigoso.

— Depende. Por que a pergunta?

Ele direcionou os olhos para o espelho e vi, de longe, alguns demônios alados sobrevoando a estrada.

— O que pretende fazer?

Ele sorriu.

— Vamos improvisar. Consegue me lançar direto pra eles?

— Acho que sim...

— Assuma a direção, o resto do caminho deixarei em suas mãos. — Dante proferiu com convicção sem nem me deixar uma alternativa viável.

— O quê? Dante, não acho que seja uma boa ideia...

— Eu confio em você, doçura — afirmou, dando uma piscadela. — Agora!

No pico de adrenalina toquei no braço dele que imediatamente desapareceu, surgindo estrategicamente sobre uma das criaturas em nosso encalço.

Ele confiava em mim... E esse era o problema, eu não confiava em mim nessa questão.

Sem escolha, mudei de lado e assumi o volante.

— Eu nem sei dirigir. E ele ainda diz: assuma o controle, mas não pergunta se eu sei! Eu não sei! — grunhi indignada. — Nem tenho um manual para lidar com isso. Só espero que não reclame pelo que acontecer.

Usando meu conhecimento vago sobre carros e suas funcionalidades, pisei no acelerador.

— Pequenino, aperte os cintos!

O motor rugiu mostrando no painel que estava quase no vermelho na velocidade máxima pra desviar de tudo quanto é demônio que vinha de diferentes direções. E isso não sabendo o que é dar marcha.

Cantei pneu freneticamente, ignorando minha ansiedade e me preocupando com o mais importante: a segurança de Ayden. Um rosnado metálico desafinado me distraiu. Houve uma perfuração no teto acertando o lugar em que estava antes, a lança atravessou o banco e prendeu-se ali.

O carro rodopiou enquanto tentava a custo me livrar do demônio. Criei um escudo ao redor do carro, garantindo que nenhum ataque surpresa pudesse me parar. O carro flutuou pela repentina inclinação da estrada, fazendo com que fôssemos jogados direto para o final da ponte. No processo atingi alguns demônios. Outro impacto no capo, mas por sorte era Dante.

— Eu consegui! — gritei alegre feito uma criança com um novo brinquedo. — Isso foi melhor que velozes e furiosos!

— Encosta, doçura. — Dante impetrou monótono, encarando desdenhosamente o pobre carro.

— Só se me ensinar como. Porque eu não sei!

No início não consegui seguir adequadamente seus comandos para parar, só depois de muita — muitíssima — paciência pude fazê-lo.

— Não foi tão ruim, Dante — ri meio sem graça enquanto Dante analisava os estragos. — Tudo em perfeito estado.

Dei leves batidinhas no retrovisor, mal chegando realmente a toca-lo. Porém, para minha falta de sorte, a peça caiu quicando no chão.

— Só esta um pouquinho danificado.

— É muito pior do que pensei.

— Posso dirigir? — brinquei, bancando a inocente.

— Não — Dante reivindicou seu assento e tentou, sem sucesso, por o carro pra andar.

A Beldade Rubra já era!

— Teremos que continuar a pé daqui.

— Veja o lado bom, Dante. Vamos aproveitar melhor o dia, não é, Aydenzinho?

Ayden não replicou, ele estava focado no oceano e na minúscula imagem da praia a alguns quilômetros a diante. Seus olhos brilhavam na expectativa de contemplar, apesar da tristeza e do constante perigo Ayden ainda é somente uma criança e sendo assim tinha o jeito animado e explorador como qualquer outra.

— Oh, Dante, nós podemos dar uma pausa?

Sem elaborar muito, Dante concordou. Nossa linha de comunicação não carecia de palavras elaboradas para que a intenção fosse clara. Afaguei a cabeleira escura do garotinho, despertando-o de seus devaneios.

O trajeto se prosseguiu sem nenhum incidente com demônios ou nada semelhante. À medida que avançávamos na pista, mais perto do nosso objetivo estávamos. Me senti bem absorvendo os suaves raios de sol como uma plantinha no processo de fotossíntese, cantando baixinho um canção pra mim mesma. Nem mesmo toda loucura de horas antes ofuscou a felicidade de Ayden ao perceber que estava prestes a afundar os pés na areia macia da praia.

Do ângulo que estava podia ver encostas de pedra, de um cinza claro encoberta por recife de corais. As águas eram um azul claro e límpido, puro e cristalino. A brisa trazida pelas ondas era fresca e revigorante, meramente aliviando o calor. Não tinha ninguém na praia, pelo menos não naquela hora. Fui trazida a realidade quando senti algo quente tocar minha mão, e para minha surpresa, quem a segurava era justamente Ayden. Suas feições eram difíceis de descrever; um misto de alegria, súbita comoção, temor e por fim a agitação para saborear coisas novas. Segurei delicadamente sua mão, impulsionando-o a se juntar a mim para vermos o oceano de perto. Ele me acompanhou de bom grado, seguindo cada passo decidido meu, depositando sua confiança em mim. Não dava para aproveitar corretamente a praia sem poder senti-la, então tirei minha sapatilha e sem hesitar permiti que a areia molhada afundasse meus pés e a água se chocar contra ela.

— É tão bonito! — Ayden sussurrou extasiado.

— Sim, muito.

Abri os braços sentindo o refrescante vento formigar em minha pele, o cheiro de maresia embriagando-me.

Ayden e eu caminhamos pela parte onde o mar batia. Ele corria na minha frente, uma hora pulando na encosta ou brincando com a água. Numa dessas, ele tropeçou em algum gume de areia. Corri para socorrê-lo, mas não parecia ter machucado como imaginei. Ou era apenas um menino com dois pés esquerdos. Ele me encarou e tranquilamente depositou uma concha perto dos meus cabelos como se tentasse ver algo que somente ele sabia.

— Combina, você parece uma princesa.

Estou começando a ver que vou me dar muito bem com esse garoto.

×××

No pináculo da exaustão e da dúvida, observei como Dante, com sua lábia bem articulada, conseguiu o último quarto de uma hospedaria pequena e simples — dada as circunstâncias não achava que seria necessário algo grande e caro pra passar uma noite. O arranjo ficou: eu dormindo em uma cama, Ayden na outra e Dante se espremendo no sofá. Não que fosse contra dividirmos a cama, mas seria meio complicado os dois caberem sem que, em algum momento, um de nós caísse durante o sono (muito provavelmente eu seria a desafortunada).

Imagina que divertido acordar de cara no chão. Não soa como a programação dos sonhos.

Era um pouco estranho o déjà vu; a impressão que conhecia Ayden mesmo nunca tendo um contato anterior. Minha curiosidade começou a consumir o meu bom senso e me senti quase compelida a questioná-lo, saber mais sobre sua vida e o que o trouxe direto para Devil May Cry.

— Quer alguma coisa, Ayden? — indaguei, desafivelando a bota. — Algo pra beber ou comer?

— Não, obrigado. Estou bem.

— Então... — busquei segurança em Dante que se ajeitou no sofá meio puído. Ele deitou preguiçosamente e nos fitou sem se envolver na conversa.

— Quer saber por que desse trabalho? — os olhos azuis dele competiam com a intensidade dos de Dante, mas mais escuros e melancólicos. — Eu não sei muito também, estava vivendo em outro orfanato antes de me dizerem que precisaria mudar.

— Sinto muito. — murmurei, me sentando perto dele. — Olha, enquanto estivermos juntos, vou fazer o melhor possível para cuidar de você. Como uma irmã mais velha.

Ayden sorriu.

— Eu agradeço.

— Eu tenho uma história. Dizem que ajuda para dormir — me voluntariei toda eufórica.

Dante riu baixinho.

— Eu sou boa contando histórias. Inclusive já escrevi fanfics. Dito isso: nunca duvide de uma fanfiqueira. — argumentei com ar de confiança. Nunca escrevi nenhum besta seller, porém ainda tinha um ou outro talento literário depois de ler aficionadamente.  Um dia ainda mostrarei pra ele que não sei só me meter em confusões, situações de vida ou morte e enfrentar malucos por aí. Claro que o único material que manterei longe é meu acervo sobre as fanfics de Devil May Cry, das minhas coleções e tudo que pudesse me comprometer a longo prazo.

— Fanfics? — Dante repetiu como se fosse um termo estrangeiro esquisito que exigisse tradução e significado.

— Histórias de fãs. — disse com sabedoria.

Ayden ficou fascinado em ouvir minha eloquente narrativa — sobre a história de Final Fantasy VII — com riqueza de detalhes e a paixão de uma fã. Para minha surpresa, ele pegou a mochila e vasculhou o conteúdo até pegar algo, se revelando ser uma caixinha de música. Pequena e em formato oval, ela tocou uma melodia doce e harmônica... Como uma canção de ninar.

Supus que era algo de extrema importância para ele. Uma ligação com algum parente? Realmente queria saber, contudo, mantive a curiosidade trancada a sete chaves. Admito que Ayden seja um garoto agradável e de bons modos, mas havia algo nele que me intrigava. Obviamente, talvez seja o fato que nenhuma criança normal — e órfã — precise de escolta para ir para um orfanato. E não existia, na minha concepção, um motivo coerente para demônios estarem estarrecidos por um garoto. Eu não podia perguntar diretamente para Ayden para saber, e não creio que se sentira a vontade em falar. Se vier a ter uma real necessidade, tenho certeza que ele esclarecera. Tudo há seu tempo. De qualquer maneira, pretendo agir com delicadeza e não tentar extrair nada a força. Quero que nossa convivência seja a melhor possível.

Dei um breve beijo em sua testa e o cobri, ajeitando-o devidamente em sua cama. A melodia continuou serena e imperturbável embalando seu sono.

Antes que me desse conta, reproduzi a canção como se a conhecesse há muito tempo.

Notei que havia um panfleto na mesa de cabeceira, e como minha curiosidade é maior que qualquer outra emoção, incluindo o senso critico e a preguiça, bisbilhotei um pouco. As informações contidas ali não eram tão relevantes; pequenos anúncios de um museu na cidade vizinha que traria uma exposição nova e que, segundo o próprio responsável pelo projeto, seria a descoberta mais encantadora e instigante de toda sua carreira. O que me fez crer que deve ser algo muito grande — das mais altas proporções, o que atiçou mais o ímpeto de ir lá.

—Parece legal. A gente podia ir, não? — perguntei a Dante.

Meus olhos se focaram na imagem de um anel; uma pedra de lápis-lazúli enfeitando-o com um desenho feito em prata do símbolo que eu carregava nas costas, o mesmo que estava gravado nas esculturas na Isla de Lunier. O sentimento de reconhecimento encheu-me e tragou meus sentidos, deixando-me tonta.

Houve um pulsar doloroso na minha cabeça e a única forma de aplacar, embora soubesse que seria inútil, seria massageando minha têmpora. Já não segurava o folheto que voou para longe de minhas mãos, enquanto contive as dores crescentes. Recortes aleatórios de memórias flutuavam por minha mente. A escuridão puxou-me para as profundezas e novas imagens começaram a surgir.

A princípio eram vislumbres confusos de um passado ainda mais confuso, que não chegaram a formar uma sequencia compreensível.  Via-os apenas como cenas minimamente iluminadas por flashes de luzes. Aquilo ecoava de forma nítida, ao mesmo tempo, sem definição.

— Ei, doçura. Você está bem?

Tropecei de volta pra minha cama com cuidado pra não despertar Ayden, tentando visualizar ao meu redor. Apoiei-me debilmente na parede em tons de carmim e puxei o ar estabilizando minha respiração. Talvez esse fosse um dos presentes — que fazem parte do pacote — memórias perdidas de Arya que por algum motivo só estão manifestando-se agora. Mas por que justo agora?

Estou mantendo a calma com todo esse assunto, e pelo que vai indo as coisas não ficarei tranquila por muito tempo.

A dor persistiu, iniciando uma cadeia de memórias subsequente; O homem que não podia identificar quem era, sorria ternamente para mim — orgulhoso e fraterno — e usava o anel do folheto. Tocando o topo da minha cabeça, ele pronunciou algo que em deixou pasma; “Logo você herdara o poder e o controle do clã, minha filha”. Não ouvi errado, esse homem desconhecido realmente me chamou de filha. E logicamente, a visão seria um trecho da minha vida passada. Entre outras palavras, o homem era o pai de Arya e o anel pertencia a ele. Forcei minha mente a recordar qual seria o nome dele, no inferno, a projeção do meu subconsciente — a outra Arya — me contou sobre ele.

Gael, esse era seu nome.

A dor fora desaparecendo.

O mundo tremeluziu e se clareou. Fiquei tão aliviada em voltar à plena consciência que por pouco não chorei. Com tudo isso a necessidade de conhecer a tal inauguração ficou maior. Eu queria conhecer o que um dia fez parte da minha vida — mesmo que passada.

O impacto quase me derrubou, por sorte Dante me segurou antes da queda inevitável.

— O que houve?

Era óbvio que ele sentiu a confusão beirando em minha mente.

— Acho que foi algumas memórias que queriam voltar. — o abracei quase instintivamente. — Sempre é estranho como essas coisas podem acontecer do nada. Acho que é questão de costume ou algo assim.

— Podermos ver isso depois — ele murmurou, se preparando pra luta. Demorou um pouco para notar a aura malévola se espreitando por ali.

— Só precisamos nos assegurar de não acordar o Ayden.

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