Night I Stand
CERTAS OCASIÕES, quando menina - como qualquer criança em desenvolvimento - era acometida por constantes e tenebrosos pesadelos que incluíam perseguições de um inimigo invisível e implacável, pronto para me atacar à menor ação. E eles se esvaiam a medida que regressava a realidade, aliviada por tudo ser apenas um fruto da minha mente fantasiosa.
Lembro-me da sensação de acordar: poder respirar sem medo, mover-me mais livremente e acima de tudo a maravilhosa emoção que estilhaçava as premonições desagradáveis e lúgubres, dando lugar unicamente a alegria sublime e o bem-estar. Despertar de um tortuoso sonho terrivelmente longo, é descarregar o peso que lhe impede de fugir em segurança e romper as amarras que nos mantêm ao medo do inevitável, do desconhecido. E naquele momento, era isso que sentia entrando no meu organismo como um choque de adrenalina direto na veia, ao mesmo tempo jogando-me em águas geladas. Enquanto estive tentando nadar contra a correnteza nas águas escuras que me condenei, lutando para não ser levada ou me afogar como tanto acontecia nessas semanas de isolamento, contentando-me com ínfimas possibilidades de sucesso e esperança, presumi estar comodamente presa. Desde que escolhi sucumbir miseravelmente nas garras de Ace, minha vida tornava-se um jogo de tabuleiro e a peça equivalente a mim, esperando pela queda depois de movimentos impensados, que não tardou a ocorrer. A imagem vivida de Dante, de fato, me tirou do pesadelo. A sensação é a mesma, duplicada pelo misto de emoções enevoando meus pensamentos. Nunca havia estado tão viva, reconhecendo a verdadeira definição de viver. Poderia simplesmente dizer com todas as palavras o quão abismada e incrédula estava, assim também a felicidade sem limites. Ainda que tudo fosse infinitamente melhor do que esperava, não compreendia absolutamente nada. Se por um lado, continha-me de inerente contentamento, o outro reagiu confuso.
Conclui basicamente: não conseguiria discernir nada, meu corpo exaurido e tenso sem como locomover-me, minha mente atolada de questões sem resposta. Nenhum desses fatores poderiam me ajudar. Estava sobrecarregada de emoções que, apesar de, existir uma generosa sensação que prazerosamente preenchia-me por dentro iluminando a escuridão sufocante da última semana. Também há uma fonte quase inesgotável e turbulenta de percepções alteradas: a confusão amarga, incredulidade inquietante e outras que não pude descrever mais claramente. Elas jorraram descontroladas tentando ocupar minha mente e confundir-me, tanto para assimilar de uma única vez que parecia que entraria em colapso igual a uma bomba relógio.
No começo, acreditava que aquilo que meus olhos contemplavam com admiração seria um fruto da minha imaginação - somente me pregando uma peça. No entanto, conforme a situação naquele ambiente tornou-se suportável a ficha foi, enfim, caindo. Diante de mim, ninguém menos que Dante. Não é possível que ele estivesse ali, prostrado feito uma estátua sem esboçar uma única reação que fosse além do sorriso quente e mordaz. Exibindo sua segurança irreparável. Crente que tinha matado com o tal poderoso sangue que adquiri da minha reencarnação passada, nem cogitei a possibilidade dele, de alguma forma, pudesse se salvar.
- Não importa como, ele sempre se salva. - cantarolei com a voz embargada.
Com as atuais experiências que tive até agora em relação ao poder existente no meu sangue foram esclarecedoras o bastante para ter total certeza que nunca falharia, e ao invés de tudo que afirmei convictamente, Dante encontrava-se inabalável e exalando todo seu ar arrogante e despreocupado que eram sua marca registrada. Ele é o tipo de homem orgulhoso de si mesmo, nunca se abate ante coisas complicadas, por que pode facilmente romper a barreira da improbabilidade e criar momentos favoráveis. Sendo a pessoa que, sem dúvida, depositaria minha fé. Devia saber muito bem disso, o conheço bem para ser consciente do que ele consegue fazer - grande parte, consideráveis milagres. Não era diferente naquele momento, e embora tenha o traído escolhendo - não tinha muitas alternativas - o lado inimigo, ainda assim Dante chegou até aqui. Por mim. Depois desse longo período de instabilidade e consternação, conseguira a cura e a serenidade para reacender as chamas da esperança que, por pouco, não se extinguiram completamente no meu coração.
- Ele veio...
A nossa conexão que perdera a força com o passar dos dias, repentinamente, ganhou mais poder a ponto de deixar-me desnorteada. Como dois ímãs que se atraem instantaneamente. Dois polos que se cruzam e encaixam harmonicamente. Pelos minutos que se seguiram, esqueci a lamentável e patética posição que estava. Concentrada na corrente de sensações que correram fervendo pelas minhas veias, ativando suaves descargas elétricas. O que mais desejava era me libertar e abraçá-lo com toda vontade que guardei, inocentemente lamentando sua morte. A significativa troca de olhares entre nós, seria como palavras sinceras de consolo não propriamente ditas. Através dos olhos hipnotizantes que ele possuía pude ver o quão determinado estava, disposto a lutar com unhas e dentes.
Meus olhos arderam pelas insistentes lágrimas que segurava à custo, não permiti que elas escorressem livres. Ainda assim, alguns soluços irromperam pela minha garganta emitindo o inicio de choro. Havia experimentado truculentos sentimentos, constantemente em conflito e vendo Dante pronto para começar uma verdadeira guerra, sentia-me plena por ainda ocupar espaço no coração dele. Acima de tudo realmente amada. A batalha que travei para conter as lágrimas fora perdida quando as senti deslizar suavemente pelas minhas bochechas coradas. Dante comentou comigo certa vez que odiava me ver chorar e justamente o que tanto afirmou, eu como sempre fazia o oposto do aconselhado. Embora essa fosse à prova da felicidade que me acalentava o coração, deu para notar que não o agradou. Não por chorar, mas pela razão. Ficava frustrada por ser tão chorona, por que é só isso que tenho feito e o que realmente me impressiona é que parece que minhas reservas de lágrimas nunca terminam, ainda que ultimamente tenha chorado até não poder mais.
Nem sequer pude lhe dizer algo coerente, tudo que meus lábios trêmulos emitiam eram sons cortados e incompreensíveis. Ecoando mais como burburinho que frases. Certamente, considerei que meu cérebro não captou muito bem a atual situação e seus comandos não estavam sendo adequadamente obedecidos. As palavras não saíam, travadas por uma língua lenta.
Meu coração batia na sintonia de um único nome.
- Ainda está vivo?
- Desculpe, amigo, eu te conheço? - Dante indagou, examinando Amon. - Não fomos apresentados. - o sorriso ladino enfeitou a face do caçador.
Ace se levantou com um semblante diferente de antes, quase vil.
- Ele é todo seu, garoto. - Amon abriu caminho
- Vejo que nem o Inferno te aceitou, filho de Sparda. - Ace proferiu jocosamente, transparecendo seu desagrado com a presença de Dante.
- Acho que mesmo todos os demônios do Inferno não poderiam me segurar, parceiro - retorquiu cuspindo sarcasmo, quase como uma direta sem rodeios. - Geralmente faço uma entrada triunfal, nada melhor que deixar os ânimos esfriarem para aparecer e ter os holofotes principais em mim.
- Era pra você ter se livrado dele.
Ace olhou de soslaio para mim, passou uma série de identificáveis sentimentos: fúria bestial e inquietação. Obviamente desconfiou que estivesse mancomunada, e em hipótese alguma, ousei matar Dante.
- Estavam certos quando concluíram que quando se quer algo bem feito, faça você mesmo. Eu terei o prazer de terminar o trabalho que essa garota tola não pôde fazer.
- Não me diga? - Dante declarou em escárnio, cruzando os braços despreocupadamente. - Diva.
Ao ouvir sua voz me chamando imediatamente, meu olhar recaiu sob Dante. Aquela voz que reconheceria de longe em meio ao caos, que me deixava enrubescida e fazia meu interior tremer. Tudo que vinha dele me afetava, o modo como seus olhos viam além, fixo e capaz de decifrar o mais profundo segredo em minha alma, o calor que sua aura transmitia diretamente para mim, aquecendo-me e embriagando. Ele seria uma droga no qual estava irredutivelmente viciada.
- Não tenho muito oferecer e mesmo assim você sempre acreditou em mim, - a amabilidades e a ternura impregnaram sua voz, como se não existisse ninguém no mundo. Só nós dois. Dante não demonstrava tão abertamente sua afeição, não por vergonha, ele era cauteloso demais e temia o pior. E esses raros eventos sempre me faziam extasiada. - e também me salvou quando precisei então dessa vez quero fazer direito. Permita-me que eu te salve.
Num gesto impulsivo, permiti que minha cabeça tombasse miseravelmente para baixo, incapaz de lhe dar uma resposta. Meus soluços emergiam sôfregos, porém não audíveis. Queria expressar e nomear os sentimentos que estavam trancados, dizer a ele que me importava e não precisa que tenha esse esforço, pois o amava do jeito despreocupado e alheio. Da minha boca mal consegui balbuciar uma palavra, apenas acenei.
- É essa sua melhor opção, irmãzinha? - mesmo soando como tantas vezes antes, havia algo distinto na maneira que Ace articulava as palavras. - Se orgulha disso? Você sempre tão idealista, prezar o amor sobre todas as coisas? Acha que isso vai te salvar? Ou salvar o mundo? - Ace inquiriu severo, ainda impassível. - Só há uma forma de consertar as coisas e é com o poder.
Dante esfregou a nuca meio exasperado.
- Cara, você está começando a me dar nos nervos com essa conversa. Não tem nada melhor pra falar? Tem que ser esse mesmo papo de "amor não salva o mundo"? Você me lembra alguém e isso me irrita bastante. - Dante retorquiu minimamente interessado, o fino sorriso estampado em suas feições calmas. Dante novamente direcionou seu olhar ao meu. - Sabe, Diva, quando você caiu nos meus braços e disse que eu era um personagem de um jogo, achei que tudo se tratava de uma grande piada. O objetivo era te levar de volta pra casa inteira exatamente como chegou aqui. - Não pude deixar de soltar um riso meio abafado, ele relembrando aquele não muito convencional primeiro encontro e foi bastante nostálgico tal qual constrangedor. - Quem diria que essa loucura poderia ser real? Imagina, eu, um personagem de jogos? Ah, claro ainda tem minha recompensa, não é? - Reprimi uma risada mais forte, contudo sabia que estragaria o momento e me deixaria em mais evidência. Em compensação, o rubor cobriu as maçãs do meu rosto, tingindo-as com o mais escuro vermelho. - Eu observei você superar suas limitações e lutar pelo que acredita e entendi que não é a garota indefesa que encontrei nesse lugar meses atrás. Admiro você, Diva. Eu não vou desistir de você.
Dante suspirou como se tirasse um peso de seus ombros. Esse tipo de confissão não esperava dele, e quando ouço suas palavras sinto-me pasma.
- Eu ouvi sua música, ouvi você me chamando.
- Dante - sussurrei timidamente.
- Seria pretensioso demais se me sentisse honrado por você ter tanta fé em mim? - Dante sorriu, meio incerto sobre o que deveria dizer. Eu o via relutante em revelar algo que, particularmente, é incomum para ele. - Acho que sou um bastardo egoísta que gosta da simples possibilidade de existir uma pessoa que se importe. - Dante sacou Ebony e Ivory, mirando em Ace. Este não demonstrou reação, seu corpo parecia estranhamente relaxado. Ouvi os ruídos provenientes das balas, uma atrás da outra, rapidamente.
O sangue em minhas mãos voltou a circular adequadamente, o primeiro jato de impulso gerado pela corrente sanguínea retornando as partes mais debilitadas fora doloroso. Entretanto, a dor e o incomodo inicial foram esquecidos. Cápsulas afundaram na água, embora o perigo de ser atingido - principalmente por ser um alvo em destaque e fácil - Ace continuou imóvel, seu semblante maquiavélico. Nenhuma bala o tocou, sem marcas ou furos frutos dessa ousada empreitada. Nilin se adiantou e foi direto para a plataforma onde estava o altar.
- Parece que errou, filho de Sparda.
Dante sorriu, erguendo uma sobrancelha em descaso.
- Você é um completo idiota se pensa que atirei a esmo. - Ace virou no segundo e o que quebrei as correntes que me deixaram tão incapacitada, corri meio desajeitada para alcançar o Santo Graal.
- Não! - Ace rosnou, desviando sua atenção para mim e vindo até onde estava em passadas pesadas e violentas. Sua raiva pulsou, envenenando o ar. Dante se interpôs no caminho de Ace, impedindo seu progresso.
- Diva! - ouvi outras vozes juntarem-se a reunião. Sorri ao ver Lyana, Eryna, Maya e Nero. Vê-los foi gratificante e animador, por que soube que estava cercada por pessoas que se importavam comigo e que são ligadas profundamente a mim.
Tudo aquilo serviu como incentivo e sem hesitação, me lancei para reclamar o Santo Graal. Arfei com o golpe que me arremessou direto para água antes que tivesse chance de tocar a espada.
- Sinto muito, Diva. Mas não posso deixar que desfaça o que foi feito. - Amon negou com a cabeça encenando como um homem sem alternativas.
- Vai se ferrar!
Para minha surpresa, em meio a cruzada, determinada e usando de demasiado esforço, Nilin arrancou a espada e os símbolos que brilhavam feito o sol se extinguiram, o efeito imposto perdeu a eficácia e, num impulso ainda mais feroz, jogou com toda força pra mim. A onda repentina de poder me atordoou assim que a empunhei, é como se tivesse recebido uma grande carga elétrica. No entanto, conforme persisti, meu corpo se adaptou a ele. Vendo minha dificuldade inicial, Lyana e Nero fizeram menção em ajudar. Sinalizei para n se aproximarem, era perigoso não pelos adversários e sim pelo efeito do Santo Graal. Brandi a espada como se fosse uma velha parceira, reconhecendo sua textura e peso, movendo-a para testar se lidaria bem com o poder oculto no interior da lâmina.
Pequenas lembranças, que não fazia parte do meu acervo original, começaram a vir a tona, peças pequenas que aos poucos se montava em instantes, momentos, vivências que eram de Arya. Tocar o Santo Graal deveria ser um gatilho para que elas viesse e me direcionasse para realizar o que fosse necessário.
- Eu sei muito bem o que pretende - disse, olhando para a abertura anômala. Concentrando minhas forças reservas, infundi minha aura na lâmina e o pouco de sangue para potencializar ainda mais e cortei a fenda, interrompendo a ressonância e, consequentemente, o que sairia dela. No entanto, mesmo destruindo a "porta" o rasgo no tecido ficou ali como uma ferida aberta.
Amon sorriu, sem deixar a máscara de convencimento vacilar.
- Você adiou o inevitável, mas o espetáculo ainda não acabou - ele acenou abrindo um fenda. - Até mesmo alguém como eu sabe a hora de ir. Nos veremos, Diva Lockhard. Ou melhor, Arya Lunier.
Tentei correr para atacá-lo, mas minha fraqueza, a adrenalina diluindo do sistema, me derrubou antes que chegasse nele.
Girei a espada e a finquei no chão para me apoiar.
O extraordinário de tudo que eu sabia, uma rede de informações que outrora eram vagas, agora pareciam mais completas e definidas. Meu nome, meus poderes, minha essência e quem realmente fui e sou. Tudo isso na palma das mão, um fonte infinita de conhecimento que fora armazenado no Santo Graal esperando para ser revisitado.
Estendi-a o mais alto que meus braços fracos suportavam, a arma sagrada emitiu um suave fulgor refletido pelas chamas bruxuleantes e as faíscas. De súbito, minhas pernas cederam ao choque impregnando meus sentidos. Minha mente processou as novas levas de dados cuidadosamente. A certa altura, brandindo o Santo Graal tive uma concepção muito anormal de algo relevante, inspirava profundamente tentando conciliar a turbulência que atribula meus pensamentos. Vi distraidamente a batalha acirrada entre Dante e Ace, dava para perceber que havia diferenças entre os confrontos anteriores. A velocidade de Ace aumentou consideravelmente, seus movimentos fluidos e certeiros. Observei as lâminas se riscarem, analisei perfeitamente bem as habilidades de cada um. À medida que visualizava atentamente os golpes travados, desferindo de vários ângulos pelos dois rivais, notava a voracidade deles.
Uma disputa sem misericórdia, violenta e intensa.
A brisa gentil acariciou minha pele, o calor inexplicável inundou meu coração. Não era desagradável, ainda que impertinente. Mas não pude entender o motivo dessa sensação que me invade completamente. Sentia meus pensamentos mais leves e enevoados, nervosa por não ter devido controle. Estranhei meu comportamento. Tinha meus momentos de pane, porém esse estava muito longe, aliás, um abismo de diferença especificamente.
- Diva! - ouvi vozes femininas gritarem meu nome, nem consegui identificar para qual direção.
- Ei, Diva! - o timbre agressivo da voz fez com que virasse o rosto para saber quem me chamava. Uma aura tomada de frieza aproximou-se de mim, percebi a variação do vento ao meu redor. A ameaça iminente que crescia perto, quase pude saborear a calma e a escuridão desgastante.
A situação não é simples quanto aparentava, posso esquivar do ataque, mas meu corpo não me obedecia. Outra mudança no ambiente me torna ciente que Nero se pôs em minha defesa vendo a vulnerabilidade que me encontrava.
- Atacar uma mulher indefesa, um pouco baixo, não? - Nero questionou impaciente e pouco amigável a quem reconheci ser Degel. - Você está bem, Diva?
A voz dele ficava distante, mais incompreensível conforme que mergulhava num transe com uma voz profunda que acalenta meu coração. O solo desaparece sob meus pés enquanto uma nova e frágil corrente de vento sussurrava.
- O círculo! - murmurei, deliberadamente soando como uma ordem. Nero encarou-me por cima do ombro, intrigado com a imprevisível atitude autoritária. Confesso que eu mesma não entendi a razão: continuava sendo Diva, mas sentia que alguém falava por mim. Não era totalmente dona de meus pensamentos e ações. Meus dedos ainda segurava a espada sem jamais soltá-la, a aparência dela dava a entender que era pesada demais para uma garota sem treino manter. Eu facilmente podia não somente erguê-la como também exercer golpes rápidos, para mim o peso não era um empecilho. Certamente estava voltando à espécie de renascimento, no qual receptivamente considerava que meu conhecimento e a desempenho seriam reflexo ao meu eu passado se revelando. Essa pessoa que tinha tomado conta de mim, a misteriosa sensação de flutuar ainda que estivesse com os pés bem presos ao chão pela gravidade. Na verdade, agia de maneira aristocrata, sem transparecer medo ou insegurança, distribuindo ordens firme e severa, havia altivez nas palavras e olhava de frente para o inimigo. Estava entorpecida por um incomum senso de poder superior. Nero juntou força e equilíbrio, seu impulso jogou o homem para trás quase o fazendo tocar o circulo.
- Saia do meu caminho, garoto - exigiu frígido e incisivo. - E embora meu trabalho seja eliminá-lo, tenho que cumprir com o ritual.
- Sinto muito, mas a senhorita não deseja seus serviços - enunciou em tom zombeteiro, sua postura irradiando menos tensão. - Ela me parece não apreciar muito, eu posso ser seu "parceiro".
As mulheres preocupadas vieram até mim, levando-me para um lugar afastado. Deixei que elas guiassem meu corpo inerte para longe. Lyana estalou os dedos em meu rosto para me acordar desse estado de zumbi, aquele som irritante repetidas vezes me sacolejou de volta a realidade.
- Diva?
- Lyana - sussurrei meio grogue.
- Ótimo, ela voltou a si! - arquejou exultante.
Maya me abraçou forte e Eryna sorriu solenemente. Embora sua aparência estivesse diferente da última vez que a vira, sua aura é tão calorosa que o reconhecimento é imediato.
- O que fazem aqui?
- Que pergunta mais idiota! Viemos te salvar! - Lyana argumentou estalando a língua impassiva, cruzou os braços com uma expressão nada feliz. - Você é uma garota estúpida, flerta com o perigo, impulsiva, inconsequente e desprovida de bom senso, esqueci algo? - ela fingiu estar refletindo profundamente e completou: - Já disse idiota?
Neguei rindo.
- Você é uma idiota de marca maior.
Peguei Lyana de surpresa quando a abracei, o corpo dela ficou imóvel e não soube se retribuía o gesto ou ficava parada feito um monumento de gesso. Os braços acolhedores dela me envolveram, quentes e com a certeza de estar com pessoa que amo.
- Me desculpe - pedi, envergonhada. Ela me apertou mais forte num gesto mudo que aceitava minhas sinceras desculpas.
- Contanto que não faça mais isso, posso reconsiderar e virar a página.
- Eu ainda preciso parar esse pesadelo, se o rasgo aumentar será o fim. - alertei aflita.
- Calma, Diva. Vamos ajudar a pôr um fim nesse caos. - Eryna anunciou gentilmente. - Algo saiu daquele portal?
Assenti.
- É um mau sinal, certo? - Maya indagou, mordendo o lábio inferior.
- Algum plano? - Lyana jogou repentinamente a pergunta no ar. Pensativa, observei a batalha de Nero e a de Dante com Ace.
- Aquele homem não é exatamente o Ace - desvelei o que minha intuição disse, saindo do círculo de mulheres que me cercavam. - Talvez o que ele achou que pudesse deter, foi o que acabou consumindo-o.
Dante surpreendentemente lutava com seu Devil Trigger ativado, Ace também mudou; as asas de plumas negras e lustrosas, cintilantes como arco-íris, suas rubras pupilas dilatadas semelhantes à de um gato e cabelo escuro antes curto, deslizava pelas suas costas. Para alguém que possuía genes angelicais, ver asas tão sombrias é... Desconfortável. Geralmente as cores de asas variam de acordo com a personalidade do anjo, assim como as auras para os seres.
Ace bateu as asas fazendo algumas penas voarem, enquanto seus sentidos e corpo encontram-se fixos em Dante, a mesmas penas avançaram rasgando a rajada impetuosa de vento. Elas assemelharam-se a navalhas indo direto e sendo eu o principal alvo. Meu corpo resetou, incapaz de escapar pela coragem e ainda angustiada por querer esquivar. Tentei projetar um escudo ao redor de mim e expandir para as outras pessoas presentes, o poder acumulado fora tão fraco e pequeno que as penas quebraram-no em milhares de fragmentos. Tropecei devido ao golpe abrupto, cambaleante coloquei os braços frente ao rosto para protegê-lo.
Em uma duração curta, quase rápida demais para assimilar algo evitou o ataque.
O tempo parou e tudo que vi fora somente um corpo, paralisado diante de mim. Peguei-a em meus braços, puxando-a para envolvê-la ternamente. Nilin tinha sido atingida no peito, o local sangrava e a pluma evaporou numa nuvem escura de fumaça. Transtornada, encarei o ferimento e mesmo sem energia suficiente - quase estourando a cota de energia existente - iniciei o processo de cura. A luz dourada oscilava constantemente na palma de minhas mãos, escorregando pelos meus dedos feito água. Ela tinha feito à loucura de me proteger o mínimo que posso lhe fazer é ajudá-la, por sorte a pena não atingira um ponto vital.
- Fique calma, eu vou te salvar, Nilin. - tranquilizei-a sorrindo. Meu corpo chegara ao limite, e ainda que meus músculos protestassem devido à taxa descomedido de energia que aquilo me drenava, não permitiria que ela morresse. A crise de tosse irrompeu o silêncio, meus pulmões queimavam como se tivesse atravessado o oceano a nado suportando o frio penetrando meu organismo. Senti o gosto amargo de sangue em minha boca e em resposta meu estômago rugiu, nauseada. Concentrei-me num único objetivo, esquecendo minhas limitações. A luminosidade radiante cresceu em minhas mãos, suave e calorosa.
- Sinto muito, Diva. Tentei honrar meu dever, achei que estava fazendo o certo. - Nilin suspirou lentamente, a dor sumira de sua feição. - Eu estava cegada demais... Era pra ser...
- Não fique se culpando por algo que não é sua culpa, independente do que me trouxe pra cá, isso iria acontecer de qualquer jeito. Por eu ser assim e ter esses poderes já era um presságio disso tudo - apaguei ternamente a cabeça dela. - Agora trate de descansar, a Nina precisa de você.
- Nina... - Nilin chorou desconsoladamente.
- Vai ficar tudo bem. - sussurrei para confortá-la.
- Seus olhos... Mudaram, parece um rio banhado pela luz do sol - observou, arqueei as sobrancelhas, aturdida e sem ter o que lhe dizer. Toquei suave sua mão, roçando a ponta dos dedos.
- Eu entendo que você amava Ace e sei que o amor nos faz cometer alguns erros.
Nilin suspirou.
Automaticamente olhei para Dante que se mantinha ocupado disputando mano-a-mano com Ace, meu coração disparou frenético.
- Cuidem dela, por favor. - pedi para Lyana e Eryna, ambas apreensivas.
- O que pretende fazer, Diva?
- Acabar com isso pelas minhas mãos... Estou fugindo há tempo demais.
- Conhecendo como eu te conheço, sei que nada do que eu falar será o bastante para te fazer mudar de ideia. - Lyana exclamou emocionada. - Mas não posso deixar de me importar, afinal está sem forças e sua aura diminui gradativamente... Como pretende...
- Farei o necessário com minha vida se possível - eram meus lábios que se moviam para falar, entretanto não conseguia entender essa alternância de "personalidade". Fiquei em dúvida se, nada mais era que, um avatar entre duas pessoas distintas tentando tomar posse.
No fundo, soube o que significa. Está ali, dentro de mim, dormindo por longos anos.
Meus lábios se curvaram num ligeiro sorriso, para mim pareceu natural essa excitação que emerge igual ao eclipse bloqueando o brilho do sol. Novamente sentia-me renovada e capaz de tecer minhas próprias escolhas.
- Por tanto tempo tive medo... - comecei alto e claro para que os presentes pudessem escutar, minha voz compenetrada e séria. Sem cortes, ou gestos atrapalhados.- Temi o novo por instinto, o incerto e desconhecido por ser frágil em meu mundo seguro... - meus passos ecoaram firmes e pesados, riscando a lâmina do Santo Graal no terreno de mármore desenhada. - Sim, eu era insegura e fraca. Atitudes erradas e ações inconsequentes já faziam parte de quem eu era... Todo esse tempo, eu pude crescer... Nunca me achei capacitada para tais responsabilidades, mas não desisti... - engoli em seco, refletiva. - Dante, eu não tenho palavras para lhe agradecer por tudo que fez por mim... - tanto Dante quanto Ace me observavam, ambos de jeitos diferentes. - Como havia lhe dito sempre te deixei cuidar de mim e dos meus fardos... - eu dirigi minha atenção a Nero. - Vocês são importantes para mim e... - eu estava em prantos, mas contive as lágrimas. - Agora, eu quero terminar isso. Vocês já fizeram demais e graças as palavras de Dante , sei que posso superar meus temores.
Aproximei corajosamente dos dois homens em conflito, pondo-me frente a Dante impedindo-o de continuar o confronto.
- Aqui e agora, por mim começou o por mim terminará. - minha aura diluída, emitiu uma inigualável vivacidade dourado gerado pela recém-despertada fonte de poder. Já totalmente consciente do ocorrido, agindo de maneira mais confiante pude experimentar a liberdade manar.
- Então, enfim despertou... - a voz de Ace soou dura, rouca e entusiástica. Sua postura elegante e rígida. - Presumo que devo me sentir honrado por lutar com a famosa Arya em pessoa.
- Você escolheu a pessoa errada para compartilhar a última dança.
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