Calling To The Night
I'm finished with you taking me through
Eu cansei de você me levar para
A line of questioning that feeds you
Uma linha de questionamento que te alimenta
I'm must confess I'm here to kill the pain
Eu devo confesso que estou aqui para acabar com a dor
[...]
I'm finished with you draging me through
Estou cansado de você me arrastar para
More lies and deceipt that feeds you
Mais mentiras e falsidade que te alimenta
[...]
How hard I fight?
O quão duro eu luto?
To kill the pain
Para acabar com a dor
~
I'll never waste another day
Nunca desperdiçarei um outro dia
Searching to find the reason
Procurando achar a razão
Why did I choose to play this game
Porque escolhi participar deste jogo
This goes too far, I'll take no more
Isto vai muito além, não vou aguentar
I played the part and took the blame
Eu joguei a parte e peguei a culpa
While you pretend nothing is real
Enquanto você finge que nada é real
Life turned to night as you're asleep
A vida se tornou noites enquanto você dorme
Blood flowing down, is this a dream?
Sangue escorrendo, isto é um sonho?
[...]
Forever lost no reason
Pra sempre perdido sem razão
He never choose to play this game
Ele nunca escolheu participar deste jogo
Taken too far out of control
Levado muito além, fora de controle
The Pain, Self Deception — Lacuna Coil
A FAGULHA DE ESPERANÇA, o feixe tímido e modesto, ocluída pelas sombras que se espreitavam sencientes, devorando o mais diminuto foco de luz. O mundo, em uma tela, só possuía três tons sob sua lente exaurida e pessimista: branco, preto e cinza. Não existiam as diferentes paletas com cores vivas nem mesmo em suas recordações que se desbotaram com o tempo. Ela tentava resgatar um pouco de normalidade e reassumir seu papel ao invés de se acovardar pelo que passou, mas estava cômoda demais para prosseguir.
Antes, quando seu mundo era vibrante e multicolorido, Eryna se ocupava de auxiliar alguns humanos com magia. Em um período longínquo a humanidade esteve muito mais próxima do arcano e usou o conhecimento da alquimia para se manterem seguros da ameaça dos demônios, agora, no entanto, muitos desconhecem essa ligação e são incapazes de se reconectar com esse poder inato. Na verdade, julgando como as pessoas funcionavam, se tivesse em mãos, eles guerreariam pelo domínio e em prol de objetivos hedonistas. Ela conheceu Lady nesse tempo, embora fossem extremos em propósito, elas se completavam de uma maneira bastante extravagante. Lady, apesar do poder latente, era muito mais adepta das armas que qualquer outras formas não convencionais de combate e Eryna atuava nessa área para orientá-la se necessário.
Ela diria que elas desenvolveram uma relação de simbiose.
Parte dessa dinâmica mudou após uns anos desoladores. Eryna tinha uma filha, pequena e cheia de vitalidade, que acabou morrendo e isso, somado a outros traumas acumulados, a fez se fechar em si. O acidente que matou sua filha, a deixou desfigurada: qualquer ser humanos em seu estado sucumbiria aos ferimentos e a gravidade das queimaduras, contudo, sobreviveu e continuou sobrevivendo para cuidar de sua irmã mais nova.
A experiência de Eryna afetou Maya, que enxergava as relações, sobretudo, os demônios, como algo negativo.
Ela se habitou com sua miséria e se centrou em administrar o negócio da família, a curadoria do museu dedicado aos avanços da humanidade, incluindo a influência perspicaz de Sparda. Exceto que... Ela vislumbrou alguém idêntica a Diva, ou ela mesma, não soube definir pela maneira que a figura se movia. A jovem se ajoelhou e pediu amparo com olhos febris.
— Precisa detê-lo.
Eryna se endireitou sob a supervisão afiada de cada membro do grupo que pareciam compartilhar um assombro coletivo ao vê-la em sua “forma original”.
Os passos calculados se encaminhavam para dentro do escritório, incutindo pelo espaço silencioso: os saltos riscavam o assoalho que rangeu conforme se deslocava em direção a Dante. Ele fitou meticulosamente a figura tentando buscar alguma evidência de quem seria, estudando detalhadamente o rosto e tudo que pudesse considerar reconhecível, algo dentro dele afirmava que já conhecia tal pessoa, mas não lembrava — mesmo puxando no mais profundo na memória. E quando os olhares de ambos se cruzaram, ainda havia uma grande dúvida. A mulher continuou andando inabalavelmente sendo seguida por inúmeros olhares de curiosidade e também desconfiança, porém nada disso importava.
A mulher apresentava uma boa aparência: longos e sedosos cabelos loiros claros que de tão leves flutuavam a medida que caminhava, a pele cremosa e delicada como estátua de porcelana, uma peculiaridade eram os olhos heterocrômicos azul e verde que possuíam o mesmo brilho imponente, suas roupas consistiam em uma túnica verde claro de mangas longas e bufantes e os sapatos brancos. A figura feminina parou frente a Dante com uma expressão que para ele pareceu consternação e empatia, aqueles olhos o estudaram atentamente e diferente do que ele próprio fizera neles carregavam o inconfundível reconhecimento. Uma nova presença adentrou o local, mas esta foi facilmente identificada. Maya correu para perto da mulher e Dante a encarou sutilmente impressionado quando a ficha cauu, foi algo tão estranho que nem podia se comparar a nada do que já testemunhara. Ele poderia ter caído da cadeira se não tivesse um bom equilíbrio — vantagens de ser meio-demônio. Os olhos de Maya transbordavam em meio a lágrimas e pelo que pode notar as notícias da caótica situação já chegaram a ela, como Maya apegou-se a Diva era compreensível que sofresse por ela estar em perigo.
— Eryna? — a voz de Dante teria falhado se ele não a conteve a tempo, ele ainda não estava muito certo se aquilo era uma pergunta ou uma afirmação. — Como isso aconteceu? A última vez que te vi você... — ele pensou em medir as palavras, calmamente arquitetando uma forma gentil de dizer pelo muito tempo de convívio com mulheres o mestiço aprendeu a lidar com certas termos sem parecer rude demais.
— Fraca e em uma cadeira de rodas, isso que quis dizer? — Eryna emendou serena, quase adivinhando os pensamentos do mestiço. Para Dante poupou o trabalho de falar. — É uma longa história e tempo é um luxo que não possuímos.
— Eryna? — Lyana se pronunciou categoricamente, olhando minuciosamente tanto para Dante quanto para as irmãs. Cuidadosamente marchou em direção a eles, então sorriu. — Diva me falou um pouco sobre vocês e no diário dela há bastante informações. Agradeço pelo apoio que deram a ela e também por querer nos ajudar a achá-la.
— Não precisa agradecer, assim os demais, também devo algo a ela.
Eryna pausadamente varreu o espaço com olhos analíticos, avistando a compreensão e empenho nas feições de cada pessoa presente no local.
— Prestem atenção; Essa pode ser a batalha pelo futuro da humanidade de todas as dimensões. Não digo isso somente pelos poderes dela, não... Há algo pior vindo e se não impedimos, tudo que um dia conhecemos incluindo a própria Diva serão apagados. — Eryna fechou os olhos, como se visse ou lembrasse algo de grande importância.
— Não estamos aqui para somente salvar o mundo ou algo do tipo, nosso objetivo principal é ajudar uma amiga — Nero admitiu, sério e confiante.
— Concordo, Diva apesar de alguns parafusos soltos é nossa amiga — Ana concordou. — Salvá-la é o mínimo que se espera.
— Ficar de braços cruzados nunca foi opção. — Lady acrescentou.
— Fazer o que? Não podemos negar uma boa luta. — Trish concluiu, sorrindo.
— E você Dante? Nada a declarar? — Lyana provocou — Sabemos que você é o maior interessado.
— O que posso dizer? — o sorriso de Dante se ampliou, sarcástico e intenso. — Diva é uma parte de mim que não posso abandonar. Ela sabe que não há absolutamente nada que irá me afastar dela nem mesmo a sua cabeça dura.
— É uma declaração, Dante? — Trish alegou, semicerrando os olhos demonstrando dúvida fingida.
— Não, é um fato.
— Dante, existe algo que você precisa estar ciente — Dante voltou a atenção para Eryna, ele suspeitava que por trás dessas palavras pudesse haver algo obscuro. Uma verdade escondida nas sombras que só cabia a ele saber. — Preciso falar a sós com você.
×××
Diva
OS PENSAMENTOS SE MATERIALIZAVAM como argila que insculpisse de acordo com meu desejo e as palavras avulsas teriam uma trama elaborada com uma delicadeza única da medida da sinceridade que abarcava meus sentimentos mais profundos — navegando em águas tranquilas e conhecidas. Ao fechar os olhos, vislumbrava o resplendor cerúleo cuja luz se originava e estendi a mão para capturá-la egoistamente para mim, o feixe escapava por entre os dedos com a realização de dois axiomas: se quisesse resgatar os resquícios de sanidade precisava cultivar a ínfima esperança e que havia algo muito maior que a mera e ignóbil vontade de Ace.
Com os braceletes, ainda que não tivesse a liberdade para utilizar meus poderes, permanecia susceptível a rastrear e absorver as energias recendentes que permeava no ar. Todo ser vivo emanava uma frequência única que ninguém, nem mesmo demônios capazes da proeza de disfarce, reproduziram com igual perfeição. Essa energia condensada pura também possuía fragrância, um sutil aroma que passava quase despercebido por quem não destacava nenhuma competência no quesito sentir essências. No entanto, eu sentia uma que contaminava a casa em uma névoa escura e uma diminuta que vinha de mim. Cogitei a teoria de estar aflorando alguma coisa nova resultada do estresse que nem a música em sua glória miraculosa ofuscava.
— Consegue... Sentir isso? — indaguei, parando de tocar. — Essas auras?
— Sim — Nilin proferiu com indiferença ressentida. — Eu posso sentir também, está em toda parte como o próprio oxigênio.
— Você disse que aqui perto tem o santuário — encorajei Nilin para que se aprofundasse no tópico. — Deve ter algo lá que convoque alguma força externa.
— É uma possibilidade.
— Quero explorar um pouco — meus dedos encontraram consolo nas teclas do piano a conforme executava a música sob a supervisão de Nilin. — Conhecer melhor esse lugar antes do final.
Os frutos do meu esforço dobrado em solver cada grama de conhecimento se concretizou com o formidável avanço no piano. Acho que depositei todo comprometimento e determinação para tornar a atividade mais harmoniosa enquanto tentava ao máximo manter minha mente ocupada, assim não pensaria em Dante.
É um engano adorável encenar uma pisca de conformismo e fingir que estava em um longo e restaurador processo de autossuficiência. Ninguém ficará constantemente no meu pé se agir baseado do que pretendem que eu atue. Embora a verdade seja tão clara quanto um rio fluente e cristalino no qual não poderia, nunca, em nenhuma instância plausível, esquecer Dante, considerava meu desempenho em mostrar o contrário um grande truque. Ajudava bastante o fato de ocupar minha mente aprendendo a mexer em um instrumento clássico que exigia um carga de trabalho maior e atenção em todos por pormenores, apagando os pensamentos desnecessários e esvaziando a mente abarrotada — ou ao menos entorpecê-la. Até mesmo acalmava o borbulhante nervosismo gerado pela distância, a dor de estar longe fisicamente de Dante. Algumas vezes tinha a gentil e confortável sensação de que ele estava próximo de mim, podia sentir seus braços me envolvendo e sua voz rouca e sexy chamando-me de "doçura".
— Quer mesmo explorar?
Assenti.
Nilin se levantou e pegou minha mão, fazendo com que a acompanhasse. Havia alguma coisa diferente nela, como se estivesse em outro espírito, convicta de que precisava fazer aquilo.
— Sabe, você não me deve nada — disse com sinceridade. — A Canção não me trouxe pra cá, fui atacada. Isso foi o gatilho para vir a esse mundo.
— Eu te devo isso ao menos — ela respondeu.
— Que grande surpresa — uma voz desdenhosa cantarolou. Automaticamente virei-me para seu dono e encontrei o cara ruivo que me atacou meses atrás e que junto de outro contratou Cordélia para me sequestrar. — Quanto tempo, não é?
Recuei com Nilin.
— Não vai saudar um velho amigo, senhorita?
Fechei a cara.
— Eu que deveria estar muito irritado, afinal, você me deixou sem um olho — indicou o olho que não parecia nada danificado. Para ser justa, não lembrava dessa contenda tanto quanto do demônio que ele trouxe na época. Não é como se, em um surto de adrenalina, fosse recordar cada mínimo curso de ações que tomei para me defender.
— Você mereceu. Me seguiu, invadiu meu quarto e me atacou. — repliquei nem um pouco amigável.
— Strider. Se afaste. — Nilin pediu com autoridade.
— Doce e mandona como sempre, não é, Nilin?
O tal Strider saiu com um sorriso malévolo que me arrepiou.
— Quem mais falta aparecer?
— Além do Strider, só tem o Degel. Eles são a guarda pessoal de Ace. Não há com que se preocupar, eles não irão te machucar.
Crispei os lábios em discordância.
Vagamos pelo casarão e as memórias começaram a brotar; a familiaridade me consumiu silenciosa. Assimilei cada cômodo com a última vez que o vi com Alexander, reconhecendo algumas áreas. Nilin me conduziu a uma passagem subterrânea usada como um percurso secreto para o campo ritualístico.
— Sabe, os Lockhard fundaram essa cidade com o objetivo de neutralizar as anomalias. — Nilin contou e apurei a audição para ouvi-la enquanto examinava o longo corredor subterrâneo com alguns emblemas entalhados nas paredes sólidas.
— As Fendas?
Ela assentiu.
— Eles ficaram responsáveis por cuidar da harmonia dessa dimensão, sobretudo, evitar que o mal selado seja liberto.
— Mal selado?
— Há muitos séculos a grande deusa selou um mal em uma dimensão a parte — me encarou sombria. — No centro do planeta, chamada Dimensão Prisão. O senhor Ace queria o poder da grande deusa pra diluir a influência dessa entidade.
— Ele acha que tenho esse poder ou algo assim?
— Todo Sophian que manifestou poder tem o sangue da grande deusa. — informou.
— Se o propósito deles é tão nobre, por que ele fez o que fez?
— Eu não sei... — Nilin murmurou derrotada.
Chegamos em uma das aberturas e arfei com a vista que nos recebeu. Foi o lugar onde fui parar ao viajar pra essa dimensão.
— Melhor voltarmos — apertei o passo de voltar com Nilin em meu encalço sem entender. — Ainda preciso terminar as aulas, não é?
Estremeci pensando no que, me trazer ali, significava.
Pegar o ritmo foi difícil, mais do que gostaria de admitir. Vez ou outra minha cabeça martelava de volta para os escombros do santuário e a recordação de Dante que instintivamente me trazia.
Não percebi que chorava até sentir o sutil calor das lágrimas tocarem minhas mãos enquanto fazia o possível para manter-me focada, tocando piano. Estava indo muito bem em não demonstrar o que verdadeiramente sentia por trás da máscara de frieza que fiz questão de colocar — seria uma falha não ter pleno domínio das minhas emoções, levando em conta que estou prisioneira do pior inimigo e ele poderia facilmente usar contra mim exatamente como tem feito até agora —, mas da mesma forma que prendi a algumas com força, agora elas transbordam sem controle e mal conseguia, simplesmente, parar. Era como se em toda minha vida tivesse guardado meus sentimentos mais profundos e somente ali, naquele breve e entorpecente momento colocasse tudo para fora. Havia tantos motivos para chorar, porém nem sabia ao certo o porquê. Acima de qualquer coisa seria um pouco de culpa...
O pequeno e sufocante bolo enredado em minha garganta surtia como uma válvula propulsora para aumentar a corrente de lágrimas, intensas e gélidas. Elas seriam como uma espécie de consolo de tudo que estava preso, acumulado: a dor, raiva, a crescente angústia e o medo se enrolavam numa teia perigosa. Não importa quantas vezes tenha que ser forte tampouco quanto se pode suportar de determinada situação, potencialmente dolorosa e a tensão, tudo vem à baixo quando se perde uma das principais razões para persistir — algo extremamente importante, aquilo que é a base de tudo. Talvez isso me torne fraca e seja meu decadente destino, mas pelo menos posso garantir que tive algo bom em meio ao caos. De qualquer maneira, de ao menos uma coisa estava absolutamente certa: perdi a esperança e grande parte dos sonhos que tive, partidos em mil pedaços.
Os papéis se inverteram tão drasticamente que ainda absorvo cada circunstância, estou confusa. O pior é relembrar o dia da despedida com Dante, era tão doloroso que me quebrava assim como as barreiras que criará para minha proteção — vejo que não adiantou muita coisa. De todas as adversidades e provações que sofri nada podia se comparar a essa, nem o tempo poderia curar a ferida que ficou aberta e dormente. A tristeza foi o que restou daquele amor avassalador de outrora, existirá sempre o vazio em minha existência.
Nilin tocou em meu ombro condescendente, transmitindo o máximo possível de tranquilidade. O gesto foi tão acolhedor que, magicamente, deu-me serenidade e autocontrole suficiente para limpar as insistentes lágrimas que escorregavam pelas minhas bochechas. Depois de ter chorado o que precisava sentia-me mais confiante em relação ao que fazer e como me portar assim também a agir perante a situação, precisava ter minha dignidade intacta e ser a pessoa que nunca cogitei ser: fria, independente e despreocupada. Se tiver que esquecer as minhas emoções e o que engloba quem realmente sou, teria o sacrifício e o sangue frio para isso. Nesse jogo de altas proporções tenho que agir conforme a necessidade.
Embora ainda houvesse a incomoda sensação de desolação me dominando, severamente destruindo a fortaleza de racionalidade, não a ponto de romper a minha força de vontade — minimamente estável. Respirei fundo, engolindo minhas mágoas e a eterna reprovação para um lado obscuro e desimportante da minha mente que se concentrava em administrar a corrente confusa de sentimentos. Sabia que o esforço drenava os resquícios de energia que possuía. Num gesto um tanto abrupto, bati nas teclas com demasiada força gerando um som alto e cortante. Eu deveria entender de uma vez o rumo dos acontecimentos, sabendo claramente que algo assim não poderia ser evitado. Fiz uma escolha e, embora machuque, nada disso ira alterar-se. Paguei o preço pela decisão e terei que aguentá-la, arcando com as consequências. Tenho que me conformar e tentar o máximo para não enlouquecer diante de tantas pressões.
Em meio à bagunça mental que estava, uma presença despertou-me tão repentinamente que encarei o intruso chocada. Ace caminhou para perto, fazendo sinal para que Nilin se retirasse. Meu olhar assustado encontrou os reconfortantes e gentis de Nilin, mesmo que ela estivesse claramente tentando me dar sossego, não me sentia confortável em estar na companhia de Ace. Dividir o mesmo espaço com ele dava-me uma pontada incomoda no estômago. Acompanhei com devida atenção Nilin enquanto esta partia, deixando-me desprotegida com o cruel monstro. A ânsia de querer fugir era forte até para comparar com a fervorosa onda de aversão. Resolvi não ter contato direto com ele, permanecendo imóvel e indiferente. Os passos tornaram-se próximos e o pânico cresceu, rapidamente levantei e dei alguns passos para ficar a uma distância segura. Abracei meu corpo numa tentativa de criar uma barreira física entre nós.
Poucos entendem o conceito de “indesejável”.
Minha cabeça girava e doía com o esforço mental exigido por querer bloquear os fatos — assim como a presença do meu algoz. Não estava em condições para testar minha paciência em discussões desnecessárias, meu esgotamento físico e psicológico sequer me davam uma linha de pensamentos ordenada. Parecia que meu cérebro tinha entrado em curto. Minha capacidade responsável pela calma encontrava-se alterada, então teria o dobro de cuidado em minhas palavras — apesar de estarem irritantemente atravessadas na garganta. Ace notou a óbvia atitude repelente, ficando no lugar sem mover um centímetro mais perto de mim. Vi um brilho incomum nos olhos claros dele, não soube identificar a razão exata. Ele, talvez, mostrava a evidente alegria de ter o que queria ao alcance, o meio sorriso sem dúvida evidenciava. Meu estômago revirou violentamente e as dores na cabeça se duplicaram consideravelmente, tive que massagear as têmporas buscando uma maneira de aliviar. Adquiri uma postura séria e de falsa tranquilidade.
— Não me olhe como se tivesse cometido um crime bárbaro — murmurou solene, sua voz criou um leve eco pelo ambiente aberto. — Você pode gostar ou não, mas tudo é necessário. Então se sinta honrada e abrace seu destino.
Finquei as unhas fortemente na pele delicada do meu braço, ignorando a dor. O destino que ele orgulha-se tanto possivelmente será a queda da humanidade, e ouvindo dizer tão friamente algo assim me encheu com a raiva que tive que conter a todo custo.
— Destino? Que besteira. — rosnei feroz, desviando a atenção para a janela. Queria encontrar um encorajamento para ser o mais frígida aceitável, porém era difícil camuflar a frustração e a ira. — Não quero e nem pretendo fazer parte desse seu plano de dominação.
— Você está no centro disso. — respondeu. — É uma oportunidade pra se encontrar e, sobretudo, realizar qualquer desejo. Almejar poder é uma parte de se estar vivo, não sou um pecador por isso.
— Não sei aonde quer chegar, também nem me interessa. — retruquei soando mais calma do que realmente estava. — Esse sonho seu não irá, jamais, se realizar.
— Como pode ter tanta certeza? Quem vai me deter? Você? Alexander? — o sorriso diabólico se desenhou na face presunçosa. — O Dante?
Cerrei os punhos.
— Posso fazer do jeito fácil se você se unir a mim.
— Me unir a você? — repeti suas palavras como se elas fossem algo incompreensível demais e que precisava analisá-las detalhadamente para fazer sentido. Ace aproveitou meu estado inerte para se aproximar vagarosamente, ficando poucos centímetros de mim. Sua expressão cheia de convicção e imponência, ao mesmo tempo uma suavidade quase encantadora. Num misto de confusão e medo, recuei alguns passos ainda perdida. Esse tempo todo fugindo e fazendo o impossível para nunca deixar que Ace consiga o que deseja e finalmente ele declara que quer, supostamente, que me alie a ele. Eu sabia que deveria dizer algo, mas não conseguia que minha mente processasse corretamente uma frase coerente.
— Não precisa ser assim. Podemos refazer a história como uma família.
— Você não faz parte da minha família, seja a do outro mundo ou nesse.
Ace balançou a cabeça.
—Se você ficar do meu lado, posso colocá-la em um pedestal tão alto que todos te venerariam como uma deusa. — prometeu, querendo abrir uma brecha em minha reforçada e inquebrável confiança.
— O quê?— fora a única coisa que pude dizer. Havia muito que assimilar e mal podia conciliar os acontecimentos. Aquele caos estava afetando meu ponto de vista, agora não entendia que questão nesse jogo absurdo de poder. Eu nunca quis nada disso, apenas quis viver minha vida em paz.
— Alexander foi ingênuo em acreditar que as coisas seriam melhores estando apenas como observadores, guiando os acontecimentos sem nos envolver. Foi justamente por esse pensamento que ele morreu.
— Ele era o seu pai, como pode ser tão frio?
— Ele não é meu pai, não de verdade. — o ressentimento se mesclava ao seu tom de escárnio.
— Ele te criou, te treinou e te amou. Como ele não é seu pai? — vociferei, mordendo o lábio inferior em visível tensão.
— E você, é minha irmã? — os olhos de Ace brilhavam em excitação. Não queria ouvir mais tamanha ganância e frieza, mas consegui disfarçar. Permaneci sem poder mover um único músculo, estava abismada com suas visões egoístas e sua vontade insana de modificar o mundo. Meu corpo tremia em desespero e repulsa, enquanto meus pensamentos — mais controlados — advertiam sobre a situação. Mecanicamente coloquei-me em posição de ataque, mesmo que soubesse a desvantagem presente: sem armas e meus poderes supridos não faria muita coisa. No entanto, não me impediu de atacá-lo se necessário ainda possuía habilidades físicas.
— Alexander te contou, suponho, sobre o objetivo dele, seu nome e sua identidade nesse mundo.
Virei-me aturdida, a revolta chegou violentamente envolvendo meus sentidos. Ele me tirou muita coisa, tem feito minha vida ser o mais terrível que poderia e ainda quer que aceite de bom grado sua proposta incabível como se fosse a maior glória do mundo. Sem contar que ele pretende matar pessoas inocentes por um desejo, isso só me mostrou o quão vil e inescrupuloso Ace pode ser.
— Qual é o sentido dessa loucura? — indaguei rígida — Não há nada que você faça poderá mudar meus ideais. Se for uma escolha, então serei direta entre o mundo que você quer criar e esse, prefiro esse mundo de caos.
Ace semicerrou os olhos, frio e impecável.
— Te darei tempo para pensar.
— Tempo não é necessário, minha resposta definitiva é não! — Ace sorriu, esperava que ele ficasse irritado pela minha negativa, mas... Sua expressão neutra e enigmática me deixou nervosa, por trás naquele sorriso via uma sombra tão negra quanto à noite mais escura.
— Eu quero que confie em mim, Diva.
— É tarde para arrependimentos e também para mudar impressões. — anunciei cautelosa.
— Vou lhe mostrar que estou sendo sincero em minhas palavras — Ace andou para fora do salão, não fiz questão de olhá-lo ir, porém assim que tive certeza que ele se fora liberei o ar preso. Essa conversa deixou-me exausta tanto fisicamente quanto psicologicamente, estava ainda sem entender a discussão. Eu podia afirmar que minha mente não pôde administrar muito bem o ocorrido, por que sinceramente tudo parecia irreal demais para ser verdade.
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