Capítulo I - Distrito Uchiha
Assim como na ética o mal é uma consequência do bem,
Assim, com efeito, da nossa alegria tem nascido a dor.
Edgar Allan Poe
AQUELA CIDADE NUNCA MUDAVA.
Sempre seria o mesmo lugar caótico. Lembrara que Madara uma vez havia falado que Konoha já havia sido um lugar pacato, mas Itachi nunca conheceu esse tempo: Desde criança havia vivido em um dos bairros mais perigosos, o distrito Uchiha, onde imperava a lei do mais forte.
Todo o lixo que os altos bairros não queriam era jogado lá, se tornando um lar de traficantes, ladrões e prostitutas. A única lei que havia era Madara Uchiha, seu tio. Ele era chefe do crime no local e respeitado, ou temido, dependendo de para quem se perguntasse.
Itachi e Sasuke haviam crescido em meio ao caos após a morte dos pais, quando o mais velho tinha dez anos e o outro cinco anos apenas e se mudaram para a casa do tio. Itachi, no fundo, não tinha o que reclamar de Madara. Ele havia os criado bem e ignorando seus negócios exclusos, tentou criar os sobrinhos longe de tudo aquilo, mas claro que foi em vão: era difícil ignorar sujeitos armados na porta de casa todo o tempo.
Com o tempo, Itachi aprendeu que independentemente de ser um bom tio, isso não o tornava uma boa pessoa no geral. Madara guardava seu lado cruel para seu "trabalho".
No mais, era complicado ignorar a violência quando se morava no bairro com maior índice de assassinatos. Embora quando o tio assumiu o lugar do pai dele os crimes houvessem diminuído, havia só tanto que ele pudesse fazer para manter a ordem no lugar sem mover sua mão. Itachi bem sabia o quanto Madara era impiedoso com os inimigos. Ele nunca esqueceria quando presenciou adolescentes que estavam vendendo drogas atrás da escola, coisa que Madara havia proibido, sendo espancados até a morte em um beco pelo segurança da sua casa.
Se não tivesse uma mente formada ele teria sido engolido. Por tudo isso e seu maior medo foi Sasuke, que sempre foi influenciável demais, acabar caindo naquele mundo. Itachi sabia que se não houvesse o vigiado de perto, ele teria afundado. Porém, no fim, as pessoas têm duas escolhas quando vivenciam algo tão ruim: se tornarem iguais para serem aceitas ao redor ou diferentes e tentarem mudar o que os cerca.
Itachi se formou em medicina e se tornou um psiquiatra, entrando para a polícia. Sasuke se tornou jornalista e escritor. Ele ficou famoso, justamente por escrever sobre o bairro e jogando luz no que acontecia debaixo do nariz da sociedade de Konoha, ganhando prêmios no processo.
E foi justamente nessa época que o sonho acabou e ele foi assassinado.
Fechou os olhos com força e suspirou ao lembrar disso, passando pelo conhecido bairro da infância.
A casa onde iria morar nos próximos meses ficava em meio a esse caos. Estivera fechada desde que os pais haviam morrido. Sabia que ela só não estava aos pedaços em razão de seu primo, Shisui, que vinha olhá-la de vez em quando, impedindo que tomassem posse do local.
Shisui, assim como Kurenai, era um dos poucos laços que restara a Itachi. Mesmo que o primo tenha sucumbido ao submundo, não podia duvidar do carinho que este lhe devotava. Talvez, os laços criados em meio ao caos que cresceram fossem ainda mais fortes do que se tivessem tido outra vida.
E sabia que Shisui igualmente amara Sasuke.
E Itachi usaria isso a seu favor no momento.
— Nunca pensei que voltaria aqui. — Shisui falou enquanto abria a porta e mostrava a casa. Itachi foi atingido pelas memórias de infância, já tão perdidas. Passou ao menos um minuto olhando para o papel de parece conhecido, os olhos vagando nos móveis ainda cobertos por lençóis empoeirados. Foi naquele lugar que viveu seus melhores momentos. E tinha cheiro de lar, por trás de toda a poeira e cheiro de naftalina no momento.
E isso era extremamente doloroso.
— Falei com você, Sinatra. — O primo resmungou.
Itachi virou chateado com o apelido e o outro riu fechando a porta.
— Não sou surdo. — Itachi respondeu. — Não sei a razão de você e Kurenai me chamarem assim ainda.
— Kurenai. — Shisui falou o nome com ar sonhador. — Como ela está?
— Ainda sem querer te ver nem pintado.
Os três haviam sido inseparáveis durante a adolescência, vivendo no bairro, estudando juntos, arrumando briga juntos, se ajudando.
É claro que Shisui se apaixonou por Kurenai.
É claro que Kurenai se apaixonou por Itachi.
A primeira briga dos primos foi por ela. Hoje Itachi e a prima se tornaram apenas os bons amigos que deviam ser. Mas com Shisui era bem diferente. Eles haviam se casado. Casamento que durou exatos sete meses. E deixou muita dor de cabeça, principalmente para Itachi que tinha que aturar os dois.
— Um dia- — Shisui falou desejoso. — Mas você não me respondeu.
— Você não fez uma pergunta. — Itachi rebateu.
—Pois agora pergunto. Por que diabos voltou? — A voz do outro ficou triste. — Esse lugar não é para você, Itachi. Não vai encontrar nada para você aqui.
Itachi se sentou no sofá empoeirado e o outro o seguiu. Ficaram olhando as partículas de luz entrando pela janela enquanto a poeira brilhava nela.
— Eu sei como você se sente-
— Não sabe. — O interrompeu seco.
— Eu sei. Eu também amava Sasuke, era tão seu irmão quanto meu. Sabe disso!
Ele sabia. Não queria se cruel, mas Shisui realmente não sabia. Ele não tinha todos os detalhes do que havia acontecido.
Fechou os punhos e respirou fundo.
— Ele não morreu por sua culpa.
— Nem por a sua.
Itachi encarou o primo, o rosto vazio escondendo o tumulto que sentia. Ele raramente perdia o controle, mas quando o perdia era difícil recuperar. Shisui era um dos poucos que conhecia esse seu lado; em praticamente todas as vezes que isso acontecia era quando mexiam com Sasuke, com Kurenai ou com Shisui. E nesse momento, Itachi se mostrava tão violento quanto Madara podia ser, ou mais.
Shisui ficou em silêncio esperando o outro se acalmar. Lembrava da primeira vez em que viu o primo verdadeiramente irritado. Itachi nunca revidava provocações, que não eram poucas. Os Uchihas eram tão temidos quanto odiados no distrito. Eram quase amaldiçoados aos olhos dos demais. Por viverem em meio ao crime, poucos desfrutavam uma vida longa. Acontecera com os pais de Shisui, com os pais de Sasuke. E mesmo Kurenai, ainda que não fosse completamente Uchiha.
Shisui era sempre o mais violento e temido. Itachi, o mais meticuloso. Até o dia em que tinham onze anos e um garoto no distrito tentara sodomizar Sasuke. Itachi chegou na hora. Não avisou a Madara, ou nada do tipo. Ele espancara o garoto e teria o matado se Shisui e Kurenai não intervissem.
— Eu estava atrás daquele maldito. — Itachi se recuperou, tocando o polegar e o indicador na ponte do nariz. — Meu primeiro grande caso. Me chamaram para traçar seu perfil. Eu estava quase o pegando, então ele mata Sasuke. Isso parece bem culposo a meu ver.
— Você sabe que Sasuke estava fuçando aqui dentro, era jornalista, pode ser que-
Itachi balançou a cabeça negando.
— Ele me chamou para lá. Me ligou naquela noite. Ele queria que eu soubesse o que ele iria fazer. Ele colocou Sasuke ao meu alcance para tirá-lo.
Shisui arregalou os olhos: — Você nunca me contou isso.
Itachi ficou em silêncio. Ouviram um barulho súbito de freadas em frente à casa e ambos pegaram suas armas e trocaram um olhar.
Shisui andou devagar até a janela e então riu.
— Madara não sabia que você vinha, sabia?
Itachi abaixou a arma e bufou.
.................................................................................................................................
Enquanto o carro preto deslizava pelas ruas, algumas pessoas olhavam com receio o símbolo Uchiha. Seu tio havia mandado buscá-lo tão logo soubera de sua chegada.
Como policial, Itachi detestava ter que fechar os olhos sobre os negócios de seu tio. Porém, em todos esses anos que trabalhava para a polícia não poderia dizer que ele agia sempre dentro da lei também. Na verdade, para horror de Kurenai, o jovem Uchiha tinha um maldito senso de justiça com as próprias mãos. Todo o tempo naquele bairro cobrara seu preço, Itachi não havia saído sem suas cicatrizes. A violência parecia estar em seu sangue.
O oposto de Sasuke, que sempre foi totalmente correto. Quando os dois eram adolescentes, Itachi aprendera cedo que para se defender dentro daquele lugar às vezes você tinha que largar a piedade ou seria esmagado. Mas nunca permitiu que Sasuke precisasse disso. Seu irmão era totalmente limpo e tentou fazer com que sempre fosse assim.
Mas no fim, Itachi acabou o arruinando também.
— Chegamos.
O motorista anunciou enquanto entravam dentro dos portões do lugar de destaque do bairro. Era uma mansão clara, em uma área arborizada e cheia de seguranças. Ninguém ousava penetrar nos domínios de Madara.. Os últimos que haviam tentado, haviam sido dizimados.
Quando desceu do carro foi recebido por um homem sorridente de quimono. Seu tio não envelhecera nenhum dia, a seu ver, desde que o vira pela última vez.
— Ita!! — O homem o apertava e o balançava sem pudor. Eles tinham uma mistura estranha de descendentes do Japão e da Itália. O tio sempre fora mais para o lado italiano, com aqueles beijos estalados que o horrorizavam os sobrinhos.
Itachi olhou de lado com a cara feia para os seguranças que seguravam o riso com seu constrangimento e o seu olhar mortal os calou.
O tio o afastou segurando seus ombros e então o sorriso caiu mais.
— Você envelheceu dez anos em cinco. O que anda fazendo? Está horrível!
— Trabalhando, tio. — Resmungou, entrando atrás dele na enorme casa. Era como se nunca houvesse saído dali, sabia exatamente cada recanto daquele espaço. A grande escada espiral, a biblioteca com livros de todo o mundo, as dezenas de quartos vazios, a sala de segurança e as alas do subterrâneo, onde se encontravam as armas, e claro, onde se fabricavam as drogas químicas e aconteciam outras coisas em que Itachi preferia não pensar.
— Eu sabia que entrar para os fardados ia fazer isso com você. Meus negócios sempre estão abertos para sua mente inteligente, sabe disso.
— Pensei que não nos quisesse nesse mundo.
— Sarcástico como sempre. Nesse tipo de negócio só confio em poucos, Ita. — O tio rebateu. — Claro que por mim você nunca pegaria em uma arma, mas acho que já é meio tarde para isso. — O homem falou com simplicidade. — Se tem que atirar em alguém, que seja em um inimigo meu.
— Obrigado, mas não. — Bufou, de novo sempre a mesma história. — E sou psiquiatra, traço perfis, não saio por aí dando tiro a torto e a direito.
O tio que andava à sua frente o olhou cético. Itachi suspirou. Claro que Madara sabia dos pulos do sobrinho, às vezes esquecia que aquele lobo velho sabia de tudo o que acontecia no submundo.
Ele saberia como o sobrinho pegava suas informações quando o lado da "lei " não funcionava. Mesmo em outra cidade, Madara não o perderia de vista e Itachi havia pego certa fama nas ruas desde a morte de Sasuke.
Para Itachi a ótica era bem simples: se você tem que caçar alguém, tem que entrar no território deles, naquele mundo. O problema, a seu ver, da polícia, é que eles queriam fazer seu serviço sentado com o rabo em suas poltronas confortáveis.
Itachi não havia nascido para isso. Ele bem tentou, no começo, mas depois que perdeu o irmão, ele aprendeu da pior maneira que para se pegar um assassino, às vezes você tem que sujar as mãos, entender como a mente deles funciona. Se houvesse feito isso antes, e não seguindo a linha reta, podia ter evitado muita dor.
Talvez ele ainda tivesse Sasuke.
Alheio aos pensamentos do sobrinho, Madara deu de ombros e o serviu conhaque enquanto entravam na sala enorme. Lá estavam as estantes dos livros, o bar e todas as obras de arte. O tio era um apreciador conhecido. Conhecia tudo sobre arte, literatura e vinhos. Tudo que entrava em contraste com seu trabalho. Na verdade, em rodas da alta sociedade, não havia ninguém que se comparava a ele em elegância e conhecimento, e ainda o charme irrevogável dos Uchiha. Pena que eles o baniam, mas isso não o impedia de mostrar o que eles estavam perdendo. Afinal, dentro da alta sociedade, havia coisas piores do que chefes do tráfico escondidos entre lençóis de seda.
Depois de perguntas soltas e constrangedoras sobre amor e trabalho e da irritação do tio quando se negou a se hospedar em sua casa, Madara finalmente ficou sério e foi ao ponto.
— O que veio fazer em Konoha?
Itachi o fitou com falsa serenidade.
— Visitar?
Madara ergueu uma sobrancelha descrente e o sobrinho sorriu de canto.
— Vim terminar o que comecei.
Madara ficou em silêncio, pensativo. Itachi esperou, até ele o encarar novamente. Não era mais o seu tio ali, mas o grande chefe Uchiha.
— Da última vez, eu escavei cada pedra desse hospício e não encontrei o desgraçado que fez aquilo com Sasuke. Por que pensa que vai conseguir?
Itachi não respondeu. Estava ciente do massacre que Madara organizara em busca do culpado pela morte do sobrinho mais novo. Na época, Itachi havia entrado em estado de choque e sido afastado do caso. Ele nem mesmo lembrava de tudo que acontecera nos dois meses seguintes a tudo aquilo.
Desta vez, era sua vez de agir. Ele voltou para aquela terra maldita com o único propósito de pegar o desgraçado que matou seu irmão. Ele iria ao inferno se preciso.
O tio suspirou e ergueu-se quando o seu telefone tocou. Antes de sair, se virou para Itachi.
— Se vai sair fuçando por aí, tenha mais cuidado. Seu irmão só encontrou a morte da última vez que você se meteu aqui. Se o mesmo acontecer com você, vão ter motivos para chamar esse lugar de inferno.
Itachi tremeu levemente. Podiam falar tudo de Madara, que ele era um filho da puta cruel e sádico, que ele não tinha piedade dos inimigos, mas ninguém podia dizer que ele não amava os sobrinhos.
Se mexiam com sua família, o diabo era apelido fraco para ele.
Itachi, afinal, havia aprendido com o melhor.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro