Capítulo 7 parte 1
Capítulo 7
***
Brasil, São Paulo.
Quando Laura, filha de Reinis e Daina, ficou grávida da primeira filha, ela e o marido decidiram mudar para um novo país, a fim de que a menina pudesse ter uma infância tranquila, sem muitas mudanças. Volker Schneider, marido de Laura, escolheu um local bastante sossegado próximo a São Paulo, no Brasil.
Como sempre se deslocavam todos juntos para onde quer que fossem, Reinis, Daina e o resto da família vieram com eles. O local escolhido foi um bairro residencial afastado do centro da cidade de São Paulo, mas perto o suficiente para permitir que todos mantivessem seus ramos de trabalho no grande centro urbano. Michel, que agora era um adolescente, estudaria em uma escola local até ir para uma universidade, na metrópole. Após três anos do nascimento da primeira filha, Carolina, o casal ganhou mais um bebê, o que deixou Laura e Volker muito ocupados.
Nos últimos meses, Andrey andava mais angustiado e já chamava a atenção das outras pessoas da casa. Volker, que convivia com ele diariamente, no trabalho, reparava que ele estava cada vez mais calado e introspectivo. Preocupava-se com ele e comentava com Daina que isso não era uma coisa boa: estava lembrando a época em que Andrey havia retornado de seu trabalho em hospitais na guerra, trazendo Rainer resgatado das prisões soviéticas.
Daina ainda não havia dito nada a ninguém, nem a Reinis, sobre a previsão dela, de que uma moça que estava sozinha seria encontrada por eles e de como Andrey estava angustiado em localizá-la. Daina era mais intuitiva que todos eles, ela podia pressentir os acontecimentos importantes para eles com mais clareza e antecedência, mas esperava ter algo mais sólido para se apoiar, alguma informação mais concreta. Esperava, também, Andrey concordar em deixá-la expor seus problemas a Reinis, mas estava tudo muito vago, ainda, eles já haviam passado por muita coisa ao longo dos anos e das mudanças que foram obrigados a fazer. Daina acreditava que tudo isso agravava os sentimentos conflitantes de Andrey. Volker, Laura e Michel nunca passaram por guerras; nem Lars e Slauka, seus sobrinhos, tiveram que ver muito sofrimento, portanto, era mais difícil para todos eles entenderem.
Os sonhos, que há décadas incomodavam Andrey, tornaram-se mais frequentes, fazendo seu estado de espírito ruir e deixando-o angustiado durante os dias da semana.
Nesta noite ele tornou a sonhar com o período difícil em que viveram na Hungria, do século XVIII. Andrey estava, então, com dezesseis anos de idade, e Reinis o segurava com força pelos braços e o arrastava para dentro de casa, afastando-o de Mathias, que tinha, na ocasião, dezenove anos.
- Você não fez nada! - bradava Mathias, que, preso pelos braços do pai, tentava socar Andrey de alguma maneira. - Você não podia ter deixado!
- Ele não podia ter feito nada! - protestou Gabor segurando seu filho raivoso, impedindo que ele se aproximasse de Andrey.
Andrey não se pronunciava, resistia à tentativa de Reinis em colocá-lo para dentro de casa. Mesmo já sendo mais alto que Reinis, Andrey ainda não tinha forças para se desvencilhar dele; tombava seu corpo para frente no sentido da rua e encarava Mathias, que já tinha lhe dado um soco. Andrey se sentia culpado por tudo: por tudo o que Mathias o acusava. Estava com raiva de si próprio e queria voltar para Viena e lutar, não iria ficar em casa com Daina, como Reinis determinou.
- Eu disse para levar uma arma! - vociferou Mathias para Andrey, enquanto se debatia com Gabor. - Se você tivesse treinado direito! Se tivesse levado a espada de seu pai!
- Se ele estivesse armado, teria sido morto! - completou Gabor contendo Mathias - Entenda, Mathias, ele não teria chances! Nem com todo o treinamento! É jovem demais. Não mataram Andrey porque pensaram que ele era humano!
- Eu vou lá. - continuou Mathias, que, de súbito, mudou a direção em que arremessava seu corpo, soltando-se de seu pai e se dirigindo para o estábulo, com o intuito de conseguir um cavalo e seguir em direção à Viena. Gabor o alcançou e o jogou no chão.
Mathias passou a vida querendo ser como seu pai, esforçou-se tentando desenvolver a agilidade e a rapidez que o Guerreiro Selvagem possuía, mas sendo Nemtsi era mais limitado. Sempre se dedicou com afinco a tudo o que fazia, treinou e deu o máximo de si; queria, de fato, ter nascido Selvagem para ser igual ao pai, que sempre admirou. Mathias não possuía as habilidades de Gabor, mas, nesse momento de crise, isso já não era mais tão importante, acreditava ser bem preparado e sentia-se capaz de lutar contra os agressores, debatia-se com seu pai para seguir até Viena. Gabor sempre elogiou o empenho de Mathias em se superar, mas, agora, diante do conflito que enfrentavam, não deixaria seu filho, que ainda não era adulto, se atirar em um confronto para o qual não estava preparado.
- Você vai ficar aqui, não pode fazer nada contra eles! - insistiu, aprisionando o filho no chão. - Vladímir já está atrás deles..., vai encontrá-la! Eu vou com Reinis, está bem? Você vai me obedecer e ficar aqui.
- Andrey, não force - pedia Reinis, que ainda segurava Andrey, prevendo sua teimosia em também querer partir com eles, - quero você longe do perigo. Fique aqui, com Daina. Ajude-me, por favor, eu preciso ir.
Andrey não queria ouvir Reinis, o soco que Mathias lhe dera doía em sua alma e, de alguma maneira, o tirou do estado de torpor em que, até então, se encontrava. Tudo em que Andrey pensava, agora, era em se juntar a Vladímir e caçá-los.
- Andrey, ouça-me - insistia Reinis, que continuava a segurar Andrey pelos braços impedindo que ele fosse até o estábulo, - você não me ajuda se comportando assim.
Krista, mãe de Mathias, saiu de dentro de casa e segurou Andrey pela cintura, dizendo:
- Andrey, Daina está chamando você. Pense nela. Não vai ajudar em nada se você se ferir, ou morrer! Ela está ouvindo esta discussão e está perguntando aonde Reinis vai.
Andrey parou de tentar escapar de Reinis, era inútil, não o deixariam ir e Daina sofreria mais se ele não colaborasse. Relaxou seus músculos, olhou para Mathias, ainda lutando com o pai, e viu Ferd se aproximar para ajudar. Não restando nada a fazer, entrou na casa, indo para perto de Daina.
Depois, os sonhos se tornaram confusos: ele se via adulto e discutia com Vladímir que, em seguida, se transformava em Dimitri Lebedeff. Andrey tentava segurar sua esposa e mantê-la ao seu lado, mas ela, claramente, escolhia seguir por outro caminho, deixando-o aborrecido, também. Acabava acordando e tinha dificuldade em voltar a dormir. Seu passado o perseguia e seu futuro confuso e mal avaliado o tornava inseguro de suas possibilidades.
**
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro