04. As pequenas burocracias
#BruxinhoFofinho
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Algo em deixar Jimin em casa soava diferente dessa vez. O ômega parecia muito mais à vontade em sua companhia e Jeongguk podia ouvir isso no tom de voz dele, ou nas músicas que ele fazia questão de colocar para tocar durante a curta viagem até o casarão na Cidade Alta. Seus beijos por todo o rosto de Jimin faziam seus lábios formigarem, querendo sentir o gosto da boca dele, do cheiro e da voz gemendo o seu nome. Não havia nada que pesasse mais em seus pensamentos do que aquilo e até achou que aconteceria depois de darem um beijo de focinho um tanto demorado, mas Jimin acabou se afastando, todo tímido.
Apenas dois dias tinham se passado, mas ambos sentiam que o que apertava o peito não correspondia à quantidade de horas que se conheciam. Não havia como negar que era algo de outras vidas e acostumar-se àquela enxurrada de sensações era um processo lento e gradual.
Despediram-se com promessas feitas por Jeongguk de que dirigiria com cuidado e tentaria dormir cedo, pois a estranha angústia revelada após o alfa contar qual era a sua teoria do que acontecera no passado, ainda surtia efeito em seu peito e Jimin comprometera-se a esquecer e seguir em frente, pois não havia nada que pudessem fazer para extinguir a cicatriz de Jeongguk. Ela sempre estaria lá e pensar demais sobre aquilo não adiantaria nada.
Jeongguk passou por toda a orla da Praia da Costa e, sem demora, entrou na via que o levava à ponte para chegar à Ilha do Boi. Seguiu pelas ruas bem asfaltadas e, naquele horário da noite, a ilha tinha uma certa magia com todas as lâmpadas arredondadas que seguiam os fios dos postes. O lugar parecia uma maquete de cidade americana no natal, mas sem a neve e a decoração vermelha e dourada.
Sua casa ficava na ponta mais afastada da ilha e o seu quintal era a praia. Em um universo paralelo, Jeongguk gostaria de morar ali, mas não havia uma memória com a sua mãe na praia, sentindo as ondas frias baterem em suas canelas finas. Ele nem tinha cachorro, mas já se imaginara com um labrador correndo na areia junto de seu pai, parando e sentando-se para assistir ao pôr-do-sol, pois estavam cansados demais.
Todas as suas memórias mais recentes naquela praia quase particular eram das suas preces em noites de lua cheia, das lágrimas derramadas por um pedido feito de todo o coração. As mais antigas eram das manhãs em que acordava após um cio, há cerca de quatro anos. Ele achava que um mergulho restauraria as suas energias e, de fato, por alguns minutos, Jeongguk se sentia curado e menos exausto. A pele bronzeada era advinda dali, de todas as tardes em que a praia ficava cheia durante o fim de semana e Jeongguk ficava sentado de sunga na areia, com uma cerveja gelada em mãos e Yoongi branco de protetor solar logo ao lado.
— Não entendo como você consegue gostar desse lugar lotado — reclamou o amigo, andando entre as pessoas com cuidado para não chutar areia na canga delas.
E Jeongguk nunca respondia nada, pois não sabia como explicar que a praia lotada lhe trazia uma certa normalidade em dias tão vazios.
Entrou em casa e as janelas fechadas o impediam de ouvir o som das ondas batendo na areia, o resto era só o silêncio de uma casa grande demais para pessoas que nem se conheciam. Perguntava-se qual era a finalidade de morar tão perto da praia se cada canto daquela casa parecia pertencer a um apartamento duplo no topo de algum prédio de qualquer megalópole. O sofá branco na sala principal permanecia intocável, parecia que ninguém se atrevera algum dia a sentar-se ali, e o resto da casa acompanhava o mesmo ritmo de tapete sem areia ou canga estendida no varal.
O único lugar que tinha vida, além do seu quarto, era a cozinha. Sempre havia algo assando ou cozinhando, as mãos de Mary eram mágicas e Jeongguk não podia recusar uma boa refeição feita por ela, mesmo não estando com fome.
— Hey, sweetheart — ela chamava, toda vez que Jeongguk aparecia para lhe dar um abraço.
Ela tinha cheiro de colônia de lavanda e a sua pele branca era avermelhada devido a todos os anos que havia passado trabalhando na lavoura de café da família. Cuidar da casa dos Jeon e do filho deles era o que ela chamava de "descanso". As palmas dela ainda eram grossas, cheia de calos e os olhos verdes sumiam em um sorriso de tão pequenos que eram. Mary era uma beta, neta de estrangeiros que se mudaram para as terras encantadas do oriente em busca de uma vida melhor após a Grande Guerra que castigou o seu continente. Havia muitas como ela, principalmente naquele pedaço de terra que eles chamavam de ilha.
— Está com fome? Eu fiz aquele negócio que você gosta, é tteokbokki que fala?
— Sim, é tteokbokki. — Jeongguk sorriu e pegou um prato para se servir, fazendo Mary arregalar os olhos e tomar a louça de suas mãos.
— Se a Sra. Jeon te vê fazendo isso, ela me demite na hora — avisou e Jeongguk revirou os olhos, sentando-se à mesa da cozinha. — E pode se sentar na sala de jantar, se ela te vê sentando aí, el-
— Mas eu quero conversar! — Jeongguk a interrompeu falando em inglês, o idioma materno de Mary. Apoiou as bochechas na concha das mãos e seu biquinho a fez suspirar, colocar o prato cheio na frente do alfa e sentar-se na cadeira na mesma posição pidona de Jeongguk.
— Sobre o quê? — respondeu no seu idioma mais familiar e logo soube que conversariam sobre algo íntimo, um segredo.
— Lembra de quando você me perguntou o que eu fazia na praia à noite? — Ela assentiu. — E eu te contei que fazia uma prece à lua para trazer o meu amor de volta? — Mary murmurou, atenta ao que o jovem falava. — Pois então, ele apareceu pra mim.
— Você se apaixona muito fácil. — Mary bufou, pronta para se levantar e lavar o resto da louça.
— Mary, não é uma simples paixão, é um imprinting.
— Como pode ter tanta certeza?
— Ora, não tem como explicar uma coisa dessas, eu só sei que é, do mesmo jeito que ele também sabe. — Jeongguk poderia citar diversos exemplos, mas Mary jamais entenderia. Aquilo era algo exclusivo da espécie lupina e ele nunca ousou reclamar dos seus cios ou de como se sentia sozinho porque o seu lobo nunca aceitava nenhum ômega. — E por isso, vou precisar passar cinco dias fora de casa.
— Por quê?
— Porque ele vai ter um cio e eu preciso ficar com ele. — Colocou uma porção na boca, mastigando a massa e sentindo a suculência do molho. Mary nem era habitante original daquelas terras, mas sabia fazer um tteokbokki como ninguém.
— E qual vai ser a história que você vai contar para os seus pais? — Mary sabia o que era cio, mas não entendia muito bem como funcionava e Jeongguk nunca fez questão de explicar.
— Ainda não sei. — Jeongguk riu, porque a relação entre ele e a família era óbvia até mesmo para o novo jardineiro. — Tô pensando em inventar uma viagem da faculdade, vou procurar um seminário com a mesma data só para consolidar a mentira. Aproveitar a temporada de eventos acadêmicos.
— E quando vou conhecer esse menino?
— Eu não sei... — Jeongguk deu de ombros. — Só nos conhecemos há dois dias.
Mary engasgou com a própria saliva e Jeongguk correu para bater em suas costas, oferecendo um pouco da água disposta na mesa.
— Eu achei que vocês já se conhecessem há meses, daí agora o amor surgiu e tudo o mais — disse, mais vermelha do que normalmente era.
— Sinta-se privilegiada, essa é uma informação fresquinha da minha vida amorosa, a qual a minha mãe só vai ficar sabendo meses depois. Ou talvez nunca saiba.
— Acredite, não dá para esconder um grande amor por muito tempo. Logo, logo você vai querer gritar pro mundo inteiro ouvir. — Mary se levantou para dar fim a louça da pia enquanto ouvia Jeongguk comer a sua comida preferida depois de conversarem em sua língua materna, como se aquele fosse um acordo silencioso entre os dois: cada um tentando encontrar um pouco de casa dentro daquele amontoado de cimento e granito branco.
Jeongguk deu boa noite e foi tomar banho. Atirando a camisa verde limão no cesto de roupa suja, pensou que deveria começar a organizar o closet e separar peças para doação, já que aquela camisa não combinava em nada com o seu estilo. E parado em frente ao espelho, observou o seu tronco e a regata que o cobria, mal acreditando que passou o dia inteiro vestindo aquilo, mas entendeu o quão descarado Jimin foi em fazer aqueles comentários sobre a sua roupa, ou melhor, sobre o seu corpo. Então era nesse nível que as coisas estavam? Ergueu uma sobrancelha, convencido, e com um sorriso bobo nos lábios, retirou o resto da roupa e entrou debaixo do chuveiro.
E com a pele já cheirando a sabonete, Jeongguk penteou o cabelo para trás e sacudiu a cabeça, bagunçando todos os fios que insistiam em ficar repartidos de lado. Deitou-se na cama e apagou as lâmpadas, a tonalidade verde das paredes mal podia ser vista até que ele ligasse a televisão e digitasse na busca do YouTube "the wall live in berlin" e começasse a assistir o show.
— 1990 — comentou, consigo mesmo. — Nem eu, nem Jimin éramos nascidos. — E pensou que, muito provavelmente, o espetáculo fora apresentado ao ômega pelas mães, o que logo o fez se lembrar de que não fazia ideia do que os seus pais gostavam de ouvir.
E Jeongguk assistiu a cada minuto, todas as peças do muro sendo colocadas até o momento em que começaram a ser derrubadas. Todos os solos de guitarra, todos os instrumentos que ele não fazia ideia de como se chamavam, e até pensou que a banda Pink Floyd fosse formada por todos os artistas que apareciam, mas depois de uma pesquisa rápida entendeu que eram apenas convidados para celebrar algo histórico como a queda do muro de Berlim.
A cada música que começava e terminava, sentia que conhecia um pouco mais de Jimin, pois não dava para viver a vida toda escutando aquelas mensagens e não ser afetado por elas. E quando "Mother" começou a ser cantada por Sinéad O'Connor, foi a primeira vez que Jeongguk chorou ao ouvir uma música, pois sabia qual seria a resposta de sua mãe para cada pergunta feita.
Só voltou a sorrir, ainda em meio às lágrimas, quando o tal do Bryan Adams apareceu com Young Lust e a imagem de Jimin tocando guitarra não saía de sua cabeça. Foi ali que ele supôs quem era o Rick DiFonzo e não desgrudou os olhos do guitarrista, entendendo muito mais o que Jimin queria ser quando o solo de "Comfortably Numb" irrompeu, e DiFonzo era realmente o rockstar no topo do muro, tocando como se fosse fácil, com o vento bagunçando o seu cabelo e jogando o blazer branco que vestia para trás.
Quando "The Tide Is Turning" começou com todos os cantores no palco, Jeongguk percebeu que estava destruído depois de simplesmente ouvir algumas músicas e não entendia como Jimin não conseguia acreditar em magia, se o tempo inteiro ele estava com algo mágico em mãos.
Gatinho 😺
como você recomenda que eu assista esse show sem me preparar antes? eu tô destruído
Bruxinho 🖤
você tá chorando?
achei que já estivesse dormindo
Gatinho 😺
mas é claro que sim, bring the boys back home??? PELA GRANDE LUA CHEIA, ELES MORRERAM NA GUERRA
Bruxinho 🖤
obrigado lua por sempre me mostrar que eu vou dar certo com esse alfa 🙏
Gatinho 😺
o destino nos uniu
não tem como dar errado, meu bem ♥
te vejo amanhã no almoço?
Bruxinho 🖤
sim, mas venha até o bandejão das artes
tô cansado de correr atrás de você kkkk
já fiz todo o trabalho de te achar, você precisa começar a fazer alguma coisa
Gatinho 😺
e com "fazer alguma coisa" você quer dizer andar por 15 min até o outro lado do campus?
Bruxinho 🖤
também
Gatinho 😺
então, até amanhã 👀
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Se Jimin estivesse usando uma jaqueta jeans ou qualquer camisa de flanela por cima das roupas, pode ter certeza que ele estava dando aula no Núcleo de Música. E se a peça estivesse abotoada, na verdade, ele usava um cropped por baixo e precisava esconder a barriga e o piercing no umbigo.
Ele, Taehyung e Namjoon estavam parados na fila do restaurante, já guardando o lugar para quando ele abrisse, pois viram no cardápio que teria japchae e eles não queriam chegar depois que tivesse acabado.
— E aí, como anda o namoro? — Taehyung perguntou, sentindo Namjoon colocar o braço sobre o seu ombro em um ato de intimidade que eles não tinham. Eram companheiros de cio, mas assim que os calores passavam, voltavam a ser colegas de banda e de faculdade, nada mais.
— Não é um namoro. — Jimin franziu o cenho enquanto dobrava a blusa de flanela para guardar na bolsa.
— Ah é, esqueci. Vocês só são almas gêmeas. — Taehyung assentiu e Namjoon riu.
— Se conhecem desde outra vida e não é namoro, não — completou o alfa, buscando o olhar cúmplice de Taehyung, mas ele não o olhou de volta.
— Calem a boca, ele tá chegando. — Jimin enfiou a blusa de qualquer jeito dentro da bolsa, perguntando-se que coisa estranha era aquela que fazia o coração disparar e suspirar afetado ao ver Jeongguk aproximar-se vestindo um modelo moderno de hanbok cinza com os botões abertos e o peitoral forte em evidência mesmo coberto por uma camiseta preta. Ele calçava um tênis all star branco e, céus, o alfa era uma gracinha.
Quanto mais Jeongguk chegava perto, mais o sorriso dele se abria e Jimin não conseguia evitar contagiar-se. Seus pés já ficaram na ponta e sentir as mãos grandes em sua cintura nua quando ele o envolvia em um abraço sempre parecia coisa de outro mundo. Inebriou-se na fragrância de sândalo e ouviu os ronronos do alfa com o nariz afundado em sua glândula de cheiro, esquecendo-se que eram observados por dois fofoqueiros, que entreolharam-se com sorrisos sapecas nos lábios e resolveram dar as costas, pois aquilo estava ficando mais íntimo do que esperavam.
— Dormiu bem? — Jimin perguntou, afastando-se para jogar os fios lisos de Jeongguk para trás, que logo voltavam para o mesmo lugar.
— Uhum. — Apertou-o ainda mais em seu abraço e olhando-o frente a frente, roçou o nariz no dele em um beijo de focinho. — Gostou da minha roupa?
— Gostei. — Jimin mordeu os lábios ao sentir o hálito gostoso de Jeongguk ricochetear contra a sua boca e as suas mãos insistiam em descer em direção ao peitoral dele.
— Coloquei especialmente para impressionar as suas mães. — Sorriu, olhando para a boca de Jimin e notando que ele trocara o piercing. Agora, os lábios eram decorados por duas bolinhas de metal, uma no meio do inferior e outra abaixo, quase escondida pelos lábios que eram tão carnudos...
— Sério? — Jimin gargalhou e voltou a abraçá-lo, enroscando-se no pescoço dele, mal sentindo o esforço de estar na ponta dos pés de tão forte que Jeongguk o segurava. — Que gatinho esforçado... Mas você sabe que não precisava disso, né? Elas vão gostar de você independente do que vestir, só basta você me fazer bem.
— Menos mal. — Riu, resvalando o nariz no osso da mandíbula de Jimin. — Mas eu também precisava me redimir, as roupas que eu usei ontem eram horríveis, tomei um susto quando me olhei no espelho. — Beijando a bochecha dele, completou, em um tom mais baixo para que só ele escutasse. — Mas eu entendi o porquê de você ter gostado da regata. — E, assim, sentiu a pele de Jimin esquentar sob seus lábios, não precisando olhar para ele para comprovar a vermelhidão de sua face.
— Ah. — Foi a única coisa que evocou da garganta antes de rir sem vergonha. — Entendeu o que, seu convencido? — Jimin empinou o nariz, olhando-o, e os lábios retorcidos que tentavam segurar um sorriso era tentação demais para Jeongguk. Queria mordê-lo.
Mas qualquer ação impulsiva foi interrompida por Taehyung, avisando-lhes que a fila começara a andar, antes mesmo que quem estivesse atrás deles ousasse reclamar. Cumprimentaram-se meio sem graça porque Jeongguk não viu mais ninguém depois de encontrar Jimin, mas Taehyung e Namjoon realmente não ligavam para aquilo.
Andaram de mãos dadas até pegarem as bandejas com a sensação de que nada fora interrompido, como se Jeongguk já tivesse chegado mais perto da boca de Jimin do que só do cantinho e aquela fosse uma cena regular do dia-a-dia. E quando pararam para avaliar mentalmente a forma como estavam se comportando perto um do outro, entreolharam-se tímidos e pegaram-se pensando que não era daquele jeito que queriam beijar na boca pela primeira vez. Seus lobos ultrapassavam na medida dos toques e até era gostoso, mas havia toda uma magia naquele evento que pertencia a Jimin e a Jeongguk, a parte unicamente humana que também tinha seus desejos e influências do mundo romântico e que viviam pela primeira vez.
Saíram do restaurante e o grupo de músicos continuou a sua velha rotina, apesar do novo integrante. Pararam para comprar algum chocolate recheado na saída e sentaram-se a uma das mesas de cimento que cercavam o local, sentindo a brisa fresca típica da região bagunçando os seus cabelos. Jin surgiu do nada com um doce na mão, reclamando que eles nunca o esperavam e que estava de pé porque Jimin estava dando muita atenção para o alfa que era só o seu companheiro de cio. O pequeno grupo se entreolhou, sabendo do segredo que guardavam e rindo disfarçadamente.
E mesmo distraído pela presença inebriante de Jimin e pelos comentários irritantes de Jin, Jeongguk conseguiu olhar ao redor e reparar em como as coisas daquele lado pareciam diferentes. A começar pelas roupas que os estudantes usavam: tudo mais solto e mais leve, tecidos coloridos e acessórios de cabelo que os deixavam ainda mais bonitos. E sempre havia música, não houvera um minuto desde que atravessou o Arco da Justiça que Jeongguk não tivesse ouvido uma melodia namorando aos seus ouvidos.
Comparar com o lado que costumava frequentar do campus era inevitável. A grande maioria dos estudantes de exatas eram monocromáticos e usavam o tal tênis cheio de molas que Jimin havia comentado. Mesmo que existissem pequenas exceções, tudo parecia meio sem graça e sem cor, talvez porque Jeongguk estudava do lado errado. O Centro de Biologia não era muito longe do estúdio 13.
— O que você vai fazer agora, Jimin? — perguntou Jin, apoiando o joelho no banco que Namjoon se sentava e não se incomodando em depositar parte do seu peso nas costas dele. — Queria ajuda pra minha prova de guitarra III, vai ser amanhã.
— Ora, ora, mas não era você o rei dos solos da tão conhecida banda do Jin? — Jimin implicou, relembrando um passado de muitas brigas.
— Ai vai se foder, eu já admiti que estava errado. — Jin revirou os olhos, colocando o último pedaço do doce na boca.
— Kim Seokjin, essa é a primeira vez que você admite que estava errado em toda essa situação — Taehyung anunciou, tentando não perder o controle da voz porque aquilo ainda o dava nos nervos.
— Isso tudo porque quer um favor, francamente. — Jimin riu e deu de ombros. — Mas eu te ajudo, depois de voltar dos meus exames.
— Obrigado Jimin, eu sei que você é um ser humano muito mais evoluído do que eu — Jin agradeceu, com as palmas juntas em direção ao céu.
— Se fosse o contrário, você não faria o mesmo, não é?
— Só se eu não tivesse nada melhor pra fazer. — Deu de ombros, pegando a mochila e saindo correndo depois de ver Jimin pegar uma pedra no chão para atingi-lo, mesmo sabendo que tudo o que Jin dissera era mentira, pois ele nunca se cansava de ajudá-lo a melhorar as suas técnicas vocais.
— Exame de quê? — Taehyung esqueceu do assunto Jin e inclinou o queixo, curioso.
— DST, só pra prevenção. E também vou tomar a injeção de anticoncepcional. — E porque aquilo fazia parte de uma lista de recomendações do que fazer ao ter apenas um companheiro de cio e não um relacionamento monogâmico, o que não era o caso de Jimin e Jeongguk. Sabia que era difícil os dois terem alguma coisa já que os seus lobos nunca aceitaram outro alguém e, por isso, nem tiveram relações sexuais, mas era melhor prevenir do que remediar.
— Ah, mas é bom mesmo. Eu e Namjoon precisamos fazer um check-up também.
— Precisamos? — Namjoon perguntou, em um tom quase ofendido. — Mas eu só transo com você!
— O quê?! — Taehyung se assustou e, dramaticamente, se virou na direção de Namjoon, iniciando uma discussão sobre exclusividade que ele nunca achou que algum dia teria. As coisas não estavam claras?
— Acho que essa é a nossa deixa pra irmos embora — Jeongguk sussurrou e Jimin concordou, pegando a bolsa de cima da mesa e dando o fora dali, dizendo um "tchau" que foi ignorado.
E assim que começaram a andar, Jeongguk se arrependeu de ter estacionado o carro na mesma vaga de sempre, pois era muito longe de onde estavam. Mas era bom caminhar de mãos dadas com Jimin, escutar a voz dele contar alguma história engraçada sobre a banda, ou sobre a confusão que Namjoon talvez estivesse fazendo.
— Mas eu acho muito difícil não se envolver nessa situação — disse Jeongguk, depois de ouvir toda a fofoca. — Eles passam por um período sensível juntos desde sempre, confiam um no outro, passam o dia inteiro lado a lado e ainda tem a banda. Como que não se apaixonam?
— E o Taehyung é um gato, né? Entendo que Namjoon esteja envolvido de alguma forma, até desejo que ele seja correspondido, mas se não rolou um sentimento da parte do Tae até agora, duvido que ainda role. — Jimin balançava os braços enquanto andava, falando relaxadamente.
— Será? Talvez ele só esteja preso à ideia de "somos apenas companheiros de cio" — Jeongguk sugeriu.
— Não sei. Só tenho medo dele precisar passar o cio com Namjoon estando desconfortável, porque até achar outro alfa... — Jimin fez um muxoxo de insatisfação, sabendo que nenhum dos cenários seria bom para Taehyung.
— Bom, eu tenho um amigo alfa, quem sabe... — Jeongguk destravou a porta do carro apertando o botão da chave. Jimin só o respondeu quando entraram, o cheiro gostoso do interior fazendo-o suspirar.
— Ah é? Achei que não tivesse amigos. — E colocou o cinto de segurança.
— O que você quer dizer com isso, bruxinho? — Apesar do apelido carinhoso ser dito, o tom de voz trazia certo deboche e a expressão plantada no rosto era um pouco ofendida.
— Ué, você já conhece toda a minha turma e hoje faz só três dias que nos conhecemos. Você nem falou sobre ninguém — Jimin argumentou, com razão.
— Sua turma? Quantos anos você tem? 63? — Jeongguk riu, dando a partida.
— Esse é você fugindo do assunto e não querendo falar sobre a sua turma? — Jimin encarou o perfil de Jeongguk, mas ele não o olhou de volta. O semáforo da saída da universidade estava vermelho e a contagem ainda nos 49 segundos.
— Eu já tive uma turma bem grande — Jeongguk respondeu, depois de pensar por um momento. — Mas isso foi só até o meu primeiro cio. Não sei bem qual foi a ideia que esses antigos amigos começaram a ter sobre mim, provavelmente me acharam um esquisito. Depois que eu descobri que teria de ficar sozinho, só um deles ficou do meu lado e cuidou de mim, como Taehyung fazia com você. Ele está na América do Sul agora, estudando literatura latino-americana. De vez em quando ele me manda mensagens em espanhol só pra se exibir. — Sorriu com a lembrança, sentindo saudades de Hoseok.
— Poxa, gatinho. Sinto muito... — Jimin acariciou o ombro de Jeongguk, confirmando uma de suas muitas teorias: a solidão de alfas e ômegas não era bem vista pelos outros, mesmo que isso não fosse uma escolha. — Acho que fui um pouco insensível falando daquele jeito.
— Relaxa, meu bem. — Jeongguk sorriu de modo doce, pegando a mão de Jimin e beijando-a, os olhos ainda fixos nas ruas asfaltadas que passavam. — Amigos vêm e vão, acho que tudo isso serviu pra fazer uma boa limpa nas minhas relações.
— O alfa que você falou é esse que está estudando fora?
— Não, Hoseok está namorando com alguém de lá, duvido que volte pra cá. Me referi a Yoongi, que você ainda não conheceu porque ele está em outro estado, apresentando a pesquisa dele em um evento acadêmico que eu achei chato demais e não quis ir. E sabe o que isso significa? — Pararam em outro sinal e Jeongguk virou-se para Jimin, com um sorriso que fazia os seus olhos brilharem.
— O quê?
— Destino — respondeu, em tom óbvio. — E se eu tivesse ido? Quando você me encontraria?
— É um bom ponto. — Jimin sorriu de volta, tentando não imaginar o que teria acontecido consigo se não tivesse achado Jeongguk naquela manhã de segunda-feira.
Chegaram no laboratório e Jimin logo se dirigiu ao balcão de atendimento, dizendo seus nomes e para o que vieram. Jeongguk se sentou em um sofá na recepção vazia e não esperava que ele fosse tão macio, pois, de longe, o couro preto parecia bem firme. E dali, observou Jimin com os cotovelos sobre o balcão. O cropped preto subiu, deixando a pele clara da cintura ainda mais exposta. A peça era mais colada ao corpo, tornando a combinação com a calça jogger, cheia de tiras nos bolsos e correntes penduradas, uma terrível tentação para as mãos de Jeongguk manterem-se longe de Jimin.
Quando ele se virou e caminhou lentamente em sua direção, Jeongguk se achou um idiota, mais uma vez, por não ter imaginado que Jimin também teria piercings nos mamilos. Dava para ver as jóias se sobressaltando no tecido e uma curiosidade devassa foi plantada em seus pensamentos: como eles eram? Havia algum tipo de desenho nos metais, assim como a libélula do umbigo? Suspirou sem respostas, abrindo os braços para que Jimin se aconchegasse em seu abraço, rindo quando ele foi pego de surpresa pela maciez do sofá.
— A moça disse que pode demorar um pouco, tem muita gente lá dentro — avisou.
E não duvidaram, mesmo que a recepção estivesse vazia, pois a lua cheia se aproximava e, com ela, a temporada de cios. Nem se questionavam quando algum colega sumia por alguns dias durante a época, era implícito para todos o motivo das filas dos restaurantes universitários e da xerox estarem menores. E era comum que as atividades acadêmicas ficassem mais brandas durante a lua cheia, menos cobranças aconteciam, pois era certo que, a cada três meses, seus colegas ômegas fariam um revezamento para desaparecerem, levando consigo suas companhias alfas, que faziam o mesmo, mas a cada seis meses.
— Enquanto isso... — Jimin pegou o celular de dentro da bolsa e nem precisou entrar no site da universidade, a notificação inconveniente, mas cheia de emojis para soar simpática, já estava ali. — Vamos preencher esse bendito formulário.
— Como é? Eu nunca fiz isso. — Jeongguk olhava para a tela do celular de Jimin e os dedos dele preenchiam os campos no automático de tão rotineiro que aquilo era.
— Você não precisa preencher nada porque o cio é meu, eu coloco os seus dados aqui e pronto. Quando você tiver um cio, você faz o mesmo e é isso aí. — Jimin respirou fundo ao selecionar que era um alfa que o acompanharia, o coração batendo forte em apreensão porque era uma nova experiência e ele não sabia como seria. — Qual é o seu sobrenome, gatinho?
— Jeon.
— Jeon?
— Jeon Jeongguk? — Jimin perguntou, achando graça e o alfa não estava entendendo nada. — Jeon Jeon?
— Ai, cala a boca, os sons são diferentes, ok? — ele riu, empurrando-o de leve. — Meus pais não foram bons nem escolhendo um nome pra mim.
— Mas soa bonito. — Jimin quis mudar de assunto, porque o comentário de Jeongguk, mesmo dito em tom de brincadeira, parecia triste e ele achou uma lástima que aquilo fosse dito com tanta naturalidade. — Número de matrícula.
— 20152813.
— Esses são os professores que serão notificados da sua ausência, estão todos aí? — Jimin passou o celular para Jeongguk.
Ele olhou para os nomes familiares na tela e franziu o cenho, pensativo.
— Mas o que exatamente eles vão receber?
— Caro prof. dr. fulano de tal, a Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis vem por meio deste e-mail comunicar a ausência do aluno alfa JEON JEONGGUK em caráter de acompanhante de cio do ômega PARK JIMIN, do dia tal ao dia tal — Jimin respondeu, dando ênfase nos nomes porque achava engraçado que esse tipo de documento sempre tivesse os nomes gritados. — Daí tem o seu e o meu número de matrícula e um anexo com a lei que abona essas faltas.
— Explícito assim? Eu escreveria algo como "em caráter de lua cheia". Soa poético, né? — disse, com a mão pintando as palavras no ar. — E ainda tem o seu nome e os seus dados, pra quê?
— Como assim explícito? — Jimin riu, preenchendo os outros campos em branco. — Todo mundo tem cio, até os seus professores.
— Devo estar assim porque faz tempo que não tenho nenhum. — E apertou Jimin em seus braços em um impulso afetuoso.
O ômega ficou imóvel, fitando a tela sem piscar, não pelo abraço, mas, sim, pelo campo imprinting a ser selecionado.
— Vou pegar um pouco de água, você quer? — o alfa perguntou e Jimin assentiu.
— Você não tem uma garrafa d'água? — Viu Jeongguk responder que não e logo retirou a sua da bolsa, uma de alúminio, obviamente preta. — Mas você é o engenheiro ambiental aqui — brincou, vendo-o se afastar dando de ombros, enchendo-a no bebedouro a alguns passos de distância.
Jimin aproveitou os poucos minutos sozinho, marcou a opção do imprinting no formulário e, imediatamente, uma caixa de diálogo abriu com o aviso: Atenção! Ao marcar essa opção, os dados do companheiro se tornarão permanentes e só poderão ser alterados após a abertura de um chamado na sede da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis. Marcar mesmo assim?
Olhou Jeongguk ainda no bebedouro, apontando para a garrafa e perguntando se podia beber diretamente no bico, com aquele hanbok bem passado já um pouco amassado, os óculos de aro fino sendo puxados para cima pelo meio da armação e o cabelo bem cortado jogado para o lado. Jimin não conseguia colocar em palavras o que sentia quando o observava sendo apenas Jeongguk em um cenário tão comum da vida e era isso que matava todas as suas tentativas de achar que nada daquilo era real: porque era só o alfa de pé em frente ao bebedouro de um laboratório médico e mesmo assim, havia certa magia ali.
Respirou fundo e clicou em sim, logo, a seguinte opção surgiu abaixo: Ômega marcado? Jimin arregalou os olhos e clicou em não rapidamente, perguntando-se o motivo daquilo ser tão importante. Achava o imprinting suficiente, além de tornar todo o preenchimento repetitivo de dados muito mais prático.
Enfim, entraram na sala de exames e amostras de sangue foram coletadas. Jimin ficou um pouco mais para receber a sua injeção de anticoncepcional do mês, seu médico o receitou há alguns meses para, quem sabe, deixar os cios mais amenos, mas não resolveu muita coisa. E agora com Jeongguk em sua vida, elas eram mais do que necessárias, pois durante os cios, a grande maioria dos ômegas recusava-se a tomar as pílulas, a vontade de ter filhotes tornava-se incontrolável e as injeções eram o meio mais seguro de evitar gestações indesejadas.
Voltaram para a universidade com a promessa de que os resultados seriam enviados via SMS e despediram-se ainda dentro do carro, no estacionamento do Direito. E assim, o resto do dia se passou com aulas de Composição de um lado e Probabilidade e Estatística do outro.
Jimin tentou ajudar Jin com a prova, mas não sabia muito bem o que fazer porque ele já era ótimo. Não dava aulas de violão no Núcleo de Música, mas era o professor mais disputado de canto.
— Estou começando a achar que o que te atrapalha é o nervosismo, porque eu não sei o que dizer pra te ajudar a melhorar.
— Eu não sou bom o suficiente nem pra ser o guitarrista solo da banda, quem dirá tirar um 10 nessa prova. — Jogou-se no chão acarpetado do estúdio, fazendo Jimin revirar os olhos.
— É sério que você vai fazer drama de novo? Para com essa síndrome de estrelismo. Achei que já tivéssemos superado isso.
— Para de levar a sério tudo o que eu falo! — Jin sentou-se, falando sério dessa vez. — Ninguém entende o meu humor.
— Essa autodepreciação me cansa — disse, pronto para se levantar e sair dali.
Deixou Jin sozinho e nem o jardim que existia logo em frente ao estúdio melhorou o seu humor. Os quatro prédios formavam um muro ao redor da área verde, salas de aula subiam até o 7º andar, as janelas eram repletas de trepadeiras coloridas, como se o jardim acompanhasse a construção. E ali no meio, os estudantes se reuniam nos intervalos das aulas. Era comum ver rodas de conversa, ou de música, e pessoas de biquíni deitadas na grama pegando um pouquinho de sol.
Jimin andava em direção ao portão puto da vida. A banda não parecia ter futuro algum, não quando ninguém realmente gostava do Jin. Às vezes, achava que estava dificultando as coisas, em outras, que era Jin, quem sabe era a aversão subjacente desde as primeiras brigas, mas nada parecia ter mudado de lá para cá. E Jimin ficava chateado com tudo aquilo, como se todo o esforço de manterem-se juntos não valesse a pena, já que a banda se desmancharia de qualquer jeito.
Bruxinho 🖤
já estou livre, me avisa quando você também estiver
Mandou uma mensagem para Jeongguk e sentou-se em frente ao gramado da biblioteca, sentindo a brisa fria da tarde que se despedia bagunçar o seu cabelo. Observava as pessoas seguindo em direção ao restaurante para jantar, ainda com a guitarra nas costas, distraído demais para perceber a presença de um alfa acenando para si, com uma câmera na mão, andando pela grama em sua direção.
— Oi, desculpa incomodar, mas eu gosto de fotografar pessoas pelo campus e eu te achei bem bonito no meio de todo esse verde. Então... Aqui. — E abaixou-se na altura de Jimin para mostrar as fotos que havia tirado do olhar distante do ômega, a guitarra nas costas, a bolsa no meio das pernas e os fios negros de seu cabelo dançando com o vento.
— Ficaram lindas, olha esse céu rosado atrás da biblioteca! — comentou, animado e percebendo o cheiro de pinho do alfa de cabelos enrolados.
— Posso postar no meu instagram? O arroba é ohnoitsyonseiagain.
— Pode. — Jimin riu com o nome e depois de agradecer, o alfa sumiu, deixando o rastro de pinho no ar. Agradeceu mentalmente ao seu lobo por tê-lo permitido se aproximar de outras pessoas, sem repulsa ou medo, e só aquilo já foi capaz de melhorar o seu humor.
Quem sabe pudesse ter um vocalista alfa em sua banda. Quem sabe pudesse entrar em outra banda, ou acompanhar algum cantor solo. O mundo era grande demais e cheio de possibilidades, seu nariz sensível não o impedia de mais nada.
Gatinho 😺
oieeee
fui liberado, vou dar a volta por aí pra te pegar
×───||───×
Ainda era cedo, bem longe da hora que costumavam jantar, mas já estavam de frente à casa de Jimin. E diferentemente das outras vezes, não teve beijinhos no canto da boca porque não houve despedida. Jeongguk saiu do carro com as pernas estranhamente bambas. Pisar na calçada e logo subir as escadas que o levavam em direção à porta de entrada era como andar no asfalto em dia de protesto, incomum.
Jimin abriu a porta, logo retiraram os sapatos e, assim que depositou a guitarra na poltrona, anunciou sem checar se Jeongguk estava preparado para isso.
— Chegamos!
Alguns arfares foram escutados ao longe, junto de gritinhos animados. E sem demora, a porta da cozinha foi aberta e uma alfa de 1,93m de altura surgiu na sala, com seu cabelo castanho claro dourado caindo em ondas sobre os ombros e um vestido florido que chegava somente aos joelhos.
— Jeongguk! — Yeri disse, abraçando-o com muito carinho e deixando um pouco do seu cheiro de acácia no hanbok dele. — Que bom que veio.
— Eu que agradeço pelo convite, sra Park. — Curvou-se em agradecimento depois de ser solto.
— Olha só como ele é bonitinho, amor. — Apontou para Yuna, que observava a cena com um sorriso no rosto.
Yuna também quis dar um abraço em Jeongguk e, assim, sumiu nos braços do alfa, pois ela tinha quase a mesma altura de Jimin, se não mais baixa. Seu cabelo era curto, não passava das orelhas, e quando ela sorria, os olhos sumiam, as pálpebras ficavam apertadinhas como as de Jimin. Jeongguk logo soube a quem ele puxou. Diferente de Yeri, que tinha a mandíbula bem marcada e os olhos angulados.
— Vamos lá pra cozinha, ainda estamos terminando o jantar — Yuna chamou, largando Jeongguk e andando na frente.
— Relaxa, ainda é cedo — Jimin comentou, assistindo a todos os abraços com um sorriso enorme no rosto, achando fofo a forma como o alfa era todo educadinho.
E mais uma vez, Jimin colocou Jeongguk dentro de uma rotina íntima sem que ele se sentisse um intruso. Começaram a conversar sobre o que o alfa gostava de comer enquanto Yeri terminava de cozinhar tudo e Yuna recheava um bolo. Jimin se ocupou com o suco e toda vez que Jeongguk perguntava se podia ajudar em alguma coisa, todos respondiam que já estavam quase terminando.
A casa de Jimin parecia ter saído do resultado da pesquisa cottagecore no pinterest, com as prateleiras de pratos e outros utensílios feitos de madeira clara e Yeri e Yuna sendo as protagonistas daquele filme, os vestidos floridos dançavam junto aos seus movimentos. O plot twist era Jimin, vestido de preto dos pés à cabeça, mesmo que o seu visual punk, com todos aqueles piercings no rosto, caísse por terra enquanto ele estava concentrado demais cortando um limão siciliano em rodelas, as bochechas proeminentes pesavam e o biquinho nos lábios aparecia.
Yeri já tivera muitos estilos, conheceu Yuna quando era hippie e usava faixas no cabelo. De lá para cá muita coisa mudou, não só em suas roupas, mas também na forma como encarava a vida. Praticava reiki veementemente, dava palestras e cursos e a casa era repleta de cristais. Até aprender que os cristais podiam atrair muita coisa boa para quem comprava, mas só desgraças para quem os extraía, como trabalho escravo, desmatamento e degradação ambiental. Nunca mais comprou nenhum.
E o reiki foi deixando de ser praticado aos poucos, a cada novo cio de Jimin, quando as suas mãos não conseguiam curar nada. Não deixou de acreditar, mas foi desanimando, perdendo as esperanças de que aquilo pudesse ser útil para a pessoa mais importante da sua vida: o seu filho.
E entre todas as outras metamorfoses que viveu, havia um serzinho tão constante morando dentro da sua casa e Yeri só podia admirar tudo o que Jimin queria ser e era. Toda a sua constância fez com que ele se tornasse um ótimo guitarrista, aprimorando o talento com estudos. Enquanto ela, sabia de muitas coisas, aprendia até se tornar ótima e, então, trocava o foco.
Jimin nunca foi próximo do que elas imaginaram de um filho quando acariciavam a barriga de Yuna em noite de lua cheia. No entanto, nunca sentiram as suas expectativas frustradas, pois tudo o que o pequeno ômega mostrava para elas era visto com surpresa e felicidade ao estarem conhecendo o menino que nasceu do amor das duas, mas não as pertencia.
E era isso que Jeongguk admirava, sentado ao balcão com o rosto apoiado entre as mãos. Ainda não sabia sobre o que Yeri passara até chegar ali, muito menos Yuna, mas era perceptível o contraste entre os três e, assim, Jeongguk sabia que todas as partes de Jimin eram aceitas, que todas os seus sonhos foram incentivados e que ele nunca duvidou que era capaz. Inconscientemente, um aperto pairava em seu peito e ele se perguntou o que teria se tornado se os seus pais tivessem sido metade do que as mães de Jimin foram para ele.
A cozinha inteira cheirava a carne grelhada e bolo de baunilha, a mistura fez o estômago de Jeongguk roncar e a boca salivar. Yeri, de ouvido mais apurado, o olhou surpresa e pediu por calma, sorrindo.
— É que o cheiro tá muito bom — Jeongguk choramingou, um pouco sem graça, e Jimin roubou um pedaço de carne da grelha, aproximando-se o suficiente para ficar entre as suas pernas e colocá-la em sua boca, como se aquela não fosse a primeira vez de Jeongguk naquela casa.
Quando finalmente sentaram-se para comer, a conversa fiada ainda não havia cessado e Jeongguk se viu gargalhando durante a refeição, escutando as histórias de quando Jimin era criança e confundia laranjas com bolas que ele podia pegar para brincar.
— Ainda hoje eu preciso pensar antes para não chamar uma laranja de bolinha — Jimin confessou, gesticulando com os chopsticks entre os dedos. — Mas poxa, elas são esferas perfeitas!
O ômega agradeceu mentalmente às mães por não tocarem no assunto imprinting com Jeongguk ali. Já ouvira o suficiente de como aquilo era extraordinário, tanto que o motivo de ter um bolo tão grande sobre a mesa era para celebrar o grande acontecimento, mesmo que contidamente. A família Park gostava de fazer bolo para tudo.
E o clima seguiu assim, com Jeongguk falando pouco e ouvindo mais, até que a sobremesa fosse servida e ele suspirasse com a explosão de sabores do bolo em sua boca.
— Nossa, eu nunca comi um bolo tão bom assim — Jeongguk dizia, satisfeito em saber que tinha um inteiro sobre a mesa, perguntando-se se seria estranho pedir para levar um pedaço para casa. — A Mary faz uns bons, mas nenhum como esse.
— Quem é Mary? — Jimin perguntou.
— A governanta lá de casa — respondeu, muito mais preocupado em comer do que se atentar aos olhares que a sua fala causou. Ninguém naquela mesa conhecia alguém que tivesse empregada, a não ser que considerassem a época que Yuna vivia com os pais.
— Vou separar um pedaço para você levar para ela. — Yuna sorriu, levantando-se para pegar uma vasilha de plástico e sendo bem generosa ao preenchê-la com o bolo.
E um silêncio estranho se apossou da mesa. Tudo o que se escutava era Yuna cortando o bolo, os rangidos dos eletrodomésticos e Jeongguk raspando o prato. Jimin olhou para Yeri e ela parecia estar procurando as palavras certas para começar, mesmo que o filho acenasse que não com a cabeça, quase que desesperadamente.
— E, Jeongguk... — Yeri começou, um pouco receosa, ignorando Jimin. O alfa levantou a cabeça e a olhou com aqueles olhos brilhantes de quem parecia estar vivendo a primeira vida. — Você se importa de nos mostrar a cicatriz?
— Ai, não acredito nisso — Jimin reclamou e recebeu um olhar de Jeongguk de cenho franzido. O ômega deixou os ombros caírem e completou. — Ué, eu contei, elas sabem tudo sobre a minha vida.
— Se você não quiser, não tem problema — Yeri se intrometeu. — É só que ficamos curiosas para saber como é uma marca de imprinting.
— Se Jimin se sentir confortável com isso, por mim tudo bem.
— É só não tocar no assunto "teoria do que aconteceu na vida passada". — Jimin olhava fixamente para o bolo que comia lentamente. A língua de Jeongguk coçava para dizer que nem todo imprinting deixava marcas, que tudo depende do que aconteceu para que ele se desencadeasse, mas com o pedido de Jimin, só foi capaz de se levantar e retirar a parte de cima do hanbok.
Tentou mostrar a cicatriz puxando a gola da camiseta para baixo, mas não deu certo. Puxou ela para cima, mas ficou desconfortável com o tecido enrolado em suas axilas e nem mostrava a marca completamente. Quando deu por si, estava sem camisa no meio da sala de jantar de Jimin com as mães dele de olhos vidrados na cicatriz esbranquiçada em seu peito bronzeado.
— Eu vou pegar uma lupa — disse Yeri, correndo em direção a gaveta da cristaleira e saindo da frente da visão de Jimin, que ficou vermelho quando viu o alfa e todos os músculos definidos do peitoral e abdômen.
A tensão de conversarem sobre a cicatriz foi dissipada graças ao conjunto de músculos do alfa, Jimin nem ouvia o que as mães falavam. Colocou a colher cheia de recheio dentro da boca e nem percebeu que a retirava lentamente, como se estivesse degustando outra coisa.
Quando Yeri e Yuna terminaram a inspeção no que elas acreditavam ser uma cicatriz de flecha, Jimin ainda tinha metade do bolo para comer. Estava um pouco desnorteado ao ver que tudo voltou ao normal e Jeongguk vestia a camiseta.
— E-é... a-assunto encerrado? — perguntou, enfiando todo o resto do bolo na boca e usando a limonada para engolir mais rápido, a acidez lavando o seu paladar.
— Não, mas vamos comentar sem a sua presença — Yuna disse, soltando uma risadinha maléfica de brincadeira e pegando os pratos para levá-los para a cozinha.
— Querem ajuda? — Jeongguk ofereceu, colocando o hanbok de volta.
— Não precisa, querido. — Yeri pegava o restante dos pratos e olhou desconfiada para Jimin, que ainda estava sentado sem se mover. — Acho que Jimin tem algumas coisas pra te explicar, né filho? Aproveita que ele já tá aqui e vão lá pra cima.
— Ah é! — Ele pareceu acordar, boiando ainda mais em pensamentos sórdidos depois da mãe mandá-lo para o seu quarto com o alfa. — Vamos lá.
Subiu as escadas na frente e agradeceu mentalmente ao Jimin do passado por ter arrumado o quarto. Acendeu as lâmpadas e Jeongguk assobiou quando entrou, pois a decoração era tudo o que imaginou e mais um pouco.
A janela principal dava para os fundos do quintal, iluminado por pequenas luzes, facilmente confundíveis com bundinhas de vagalumes. O quarto estava debaixo de um sótão e, por isso, a janela se estendia do rodapé até o teto, com uma viga enorme ao lado repleta de pôsteres de bandas que ele não conhecia. Estantes de livros pintadas de preto se encaixavam perfeitamente nas paredes, abrindo uma exceção somente para a escrivaninha, que era apenas uma madeira extensa pregada na parede.
O quarto era inteiramente branco, mas pouco se via da tinta devido aos pôsteres. A cabeceira da cama ficava encostada em uma parede inclinada do sótão, quadros de cortiça com polaroids e lâmpadas de natal decoravam a parede da direita.
— Então... — Jimin começou, de braços cruzados e passos incertos no piso de madeira. — Esse é o seu pequeno lar pelos próximos cinco dias.
— Eu gostei. — Sorriu sincero, não só pela decoração que era agradável, mas também pelo cheiro mais intenso de ameixas negras que tornava tudo irresistível. — O que você precisa me explicar? — perguntou, depois de perceber que um silêncio desconfortável daria as caras por ali.
— Ah é, ok, vamos lá. — E andou em direção à cama para começar. — Então, essa é a cama... Óbvio. — Sorriu nervoso, apontando para ela. — Amanhã eu vou colocar um forro impermeabilizante debaixo dos lençóis, mas não se preocupa que ele não faz barulho de plástico nem nada, eu só estou avisando pra você saber o que é quando for trocar os lençóis. Uma pilha deles estará aqui, nessa cadeira. — E bateu no estofado do móvel que Taehyung normalmente se sentava para tomar café da manhã enquanto Jimin tentava sair da cama. — Enfim, é importante trocá-los porque ninguém gosta de ficar deitado em uma poça de... — Remexeu os lábios antes de dizer. — Mancha.
— Entendi, trocar os lençóis.
— Sobre a comida. As minhas mães deixam uma cesta cheia de mantimentos na porta. Você pega, coloca aqui dentro e assim que não tiver comida suficiente para nós dois, é só colocar a caixa vazia na porta e pegar a cheia. Deu pra entender?
— Deu sim. — Assentiu, achando graça do nervosismo de Jimin. — Alimentar e hidratar o bruxinho, entendi.
— Tá. — Parou no lugar para tentar lembrar qual seria o próximo passo, como se tivesse ensaiado tudo o que deveria explicar. E ensaiou mesmo. — Vem aqui. — E começou a andar de repente em direção à porta que havia dentro do quarto. — Esse aqui é o banheiro. — Fez a parada dramática ao dizer algo óbvio. — Se os meus calores apresentarem pausas, me dê, pelo menos, um banho por dia, por favor? — pediu, dentro do box, sentindo-se terrivelmente indefeso, mas de um jeito sensual, com Jeongguk apoiando os antebraços na parte de cima da estrutura metálica.
— Pode deixar comigo. Dar banho no bruxinho — repetia as instruções para gravar melhor, mas Jimin sorria todo bobo ao ser chamado de bruxinho. — Mas e esse monte de sabonete aí? Qual eu uso em você? — Apontou com o queixo para a prateleira de granito pregada na parede de azulejo português.
— Eu vou colocar etiquetas depois indicando qual é qual, mas a ordem é a seguinte: shampoo, condicionador e sabonete. — Apontou para cada uma das rodelas que, realmente, se pareciam com sabonetes. — A minha mãe faz pra vender, é muito bom porque não afeta as nossas fragrâncias como os industriais fazem, enfim... Próximo passo.
— Qual é? — Jeongguk perguntou, depois de voltarem para o quarto e Jimin parecer meio sem jeito de falar.
— Essa talvez seja uma das instruções mais importantes, mas a mais chata de falar assim... sóbrio — respondeu, e Jeongguk franziu o cenho, tentando imaginar o que seria. — Se você se sentir muito cansado, achando que não dá mais conta, existe esse gaveta aqui. — Jimin apontou para a mesa de cabeceira. — A qual eu não vou abrir agora porque seria muito constrangedor, mas tem vibradores e outras coisas aqui.
— Hm — Jeongguk murmurou, em pânico, sem saber o que dizer porque não sabia como usar aquelas coisas e, bem, será que o seu lobo, que viveu há centenas de anos, saberia lidar com aquele artefato tecnológico?
— É isso — Jimin concluiu, entrelaçando os dedos em cima do peito, como se fosse um jornalista encerrando o jornal. — Quer testar o colchão? Vê se você gosta. — Apontou para a cama. — Se você não gostar, sinto muito, não vai dar tempo de trocar.
Jeongguk se deitou, rindo, colocando um braço atrás da cabeça e com a mão livre, bateu no colchão para que Jimin se deitasse ao seu lado. O ômega seguiu o comando, deitando de frente para ele, apoiando-se nos cotovelos.
— Entendeu todas as instruções?
— Uhum... — E acariciou o nariz de Jimin, colocando-o entre os seus dedos e, céus, como amava quando ele sorria daquele jeito para si. — Eu vou cuidar bem de você, bruxinho. Não se preocupa.
— Eu sei que vai, é só que... — Jimin respirou fundo, tanto pelo receio de admitir, quanto pelas carícias que recebia em sua pele nua da cintura. — Eu tenho medo, não de você, mas do que pode acontecer. Sei lá, é uma experiência nova e eu não consigo prever nada, vou estar andando no completo escuro.
— Eu consigo prever várias coisas — disse, em um tom mais baixo, as mãos quentes mais pesadas na pele de Jimin, subindo por debaixo do cropped.
— O quê? — perguntou, mal conseguindo respirar, sentindo o hálito de morangos e creme inglês do alfa. Seus olhos teimavam em olhar para a boca dele, mas a mente esforçava-se para fixar nos olhos, o que também não melhorava nenhum pouco a situação.
— Prevejo eu e você juntinhos nessa cama. — Aproximou-se para beijar o canto da boca de Jimin que, sinceramente, não sabia como tivera forças para não virar o rosto e beijá-lo languidamente. Talvez fosse a falta de experiência que o travasse, algo sussurrando em seus ouvidos que ele nem sabia por onde começar e achava melhor nem tentar. — Você vai receber muito carinho e eu prometo que vou tentar fazer de um jeito bem gostoso — disse, com os lábios colados na bochecha de Jimin, que mantinha os olhos fechados enquanto ouvia, tentando controlar o que começava a melar entre as pernas. — Vou fazer do seu cio uma experiência boa, confia em mim.
— Eu confio — sussurrou, jogando pela boca todo o ar dos seus pulmões e abriu os olhos, acordando de um sonho e vislumbrando outro bem na sua frente. Era incrível como Jeongguk fazia as suas pernas bambearem com um punhado de palavras e beijinhos em partes aleatórias do seu rosto. Não havia como dar errado, não quando ele se afastava para não acabar beijando-o, pois tinha medo do que poderia acontecer entre os dois em cima de uma cama em um quarto fechado. Jeongguk parecia ter o mesmo medo. — E sabe o que eu andei pensando?
— O quê? — suspirou, fechando os olhos de tão confortável que o colchão era e de como os lençóis eram cheirosos. Estava entorpecido pelas ameixas negras.
— Me perguntei se você já pensou sobre parar de tomar os supressores, já que eu tô aqui, disposto a cuidar de você também. — Jeongguk arregalou os olhos com a fala de Jimin e todo o resto que ele dizia parecia um zunido em seus ouvidos. — Fiz algumas pesquisas e vi que tomá-los por muito tempo pode trazer complicações ao seu corp-
— Jimin — interrompeu-o. — Eu preciso te dizer uma coisa.
— O quê?
— Promete que não vai ficar chateado?
— O que é?! — Jimin disse mais alto, o coração batendo na boca. Jeongguk nem havia falado, mas ele já sentia o balde de água fria jogado na sua cara. Nem tudo pode ser perfeito, não é?, pensou.
— Lembra de ontem, quando você me achou dormindo no meio do campus e eu só disse que não dormi direito durante a noite? — Jeongguk começou e Jimin assentiu. — Então, eu não dormi porque tomei os supressores e o meu lobo quis expulsá-los do meu corpo, passei mal a noite toda e, enfim, o resto você já sabe. A questão é que eu não tomo os supressores desde o dia que te conheci porque o meu lobo te reconheceu e ele acha que não tem mais motivo para ser controlado.
— Poxa, gatinho. Você podia ter me falado — respondeu, compreensivo, acariciando o cabelo dele e pensando no que Namjoon havia falado: no fim das contas, quem não dormiu foi o lobo de Jeongguk.
— Eu sei, mas fiquei com medo de te assustar. — Ronronou com o carinho, aconchegando-se no peito de Jimin e logo as suas pernas se enroscaram. O cheiro de melão do cabelo de Jeongguk sobressaltou-se e, logo, Jimin mergulhou o nariz nos fios castanhos.
— Bom, eu tô assustado agora. Isso quer dizer que você pode ter um cio a qualquer momento?
— Segundo o google, não. — Riu, nervoso e voltou a olhar para Jimin. — Vi que esse que eu tomava é acumulativo no organismo e que deve ser tomado mediante acompanhamento médico, que vai regular as pausas e as doses. No caso, eu não fiz nada disso e tomei durante quatro anos ininterruptos.
— Desde os 18? — Jimin fez uma conta mental e perguntou-se quantos cios Jeongguk tivera antes de começar a tomar os supressores, porque aquilo parecia uma medida desesperada.
— Sim, porque eu comecei tendo um cio por mês, era um inferno. Não conseguia viver. E eu não fiz acompanhamento médico porque os meus pais cagaram pra mim e eu não sabia o que fazer, ninguém sabia e, agora, eis me aqui, sem saber o que fazer de novo.
— Calma, gatinho — Jimin pediu, com aquele tom de quem diz que não precisa realmente se preocupar. — Pelo o que você disse, vamos conseguir sobreviver a essa semana, então, quando o meu cio passar, a gente vê um médico pra você, fechado?
— Fechado. — Jeongguk fez um muxoxo e resmungou qualquer coisa antes de abraçar Jimin bem forte, com mais um daqueles ataques de afeto. — E desculpa esconder isso, bruxinho.
— Falando assim, até parece que se passaram meses. — Jimin riu, apertando o corpo grande em seus braços. — Jeongguk, isso aconteceu ontem, relaxa.
— Você também tem a sensação de que a gente, realmente, se conhece de outras vidas? — Viraram-se para olhar o teto, pensativos, mas Jeongguk aproveitava para gravar cada cantinho daquele quarto. — Parece que eu te conheço há anos, mas hoje só faz três dias.
— Sim — Jimin afirmou. — Hoje ainda é quarta-feira e parece que eu posso conversar com você sobre qualquer coisa.
— Bem, e você pode. — Deu de ombros, rindo das coisas que falavam. — É até estranho olhar pra esse quadro cheio de polaroids e não me ver nele — disse, referindo-se ao quadro de cortiça ao lado da cama, com fotos das mães nas mais diversas situações e caretas feitas ao lado de Taehyung. Até Jin aparecia por ali, sentado com um violão na mão. Todos, menos Namjoon, de quem Jimin não conseguia se aproximar, quem dirá manter a foto de um alfa que nem gostava do cheiro em seu quarto. — É estranho perceber que tínhamos uma vida antes de nos conhecermos e isso não fazer o menor sentido, porque, pra mim, agora que já te conheço, parece que você sempre esteve lá.
— É verdade. — Jimin se sentou, olhando para o quadro e sentindo que algo ali faltava. Um rosto, um sorriso e um par de óculos que pertenciam a Jeongguk. — Mas, pelo menos uma parte disso a gente pode resolver agora. — E se levantou para pegar a instax guardada dentro do guarda-roupa.
Jeongguk seguiu o que ele foi fazer e logo se sentou na cama. Jimin fez o mesmo, mas entre as pernas do alfa. E, as mãos quentes, mais uma vez, abraçaram-lhe a cintura nua e Jimin sentiu a respiração de Jeongguk ricochetear contra a sua nuca. Engoliu em seco e ergueu a câmera, preparando o seu melhor sorriso e acreditando que Jeongguk fazia o mesmo atrás de si.
O flash o deixou cegos por alguns segundos e a foto impressa começava a sair da câmera. O coração de Jimin batia forte ao permanecerem na mesma posição, com Jeongguk acariciando a sua barriga com as pontas dos dedos e queixo apoiado em seu ombro, esperando que a foto se revelasse e soubessem como se saíram. Só esperava que os ouvidos de Jeongguk não fossem tão apurados, porque era ridículo se sentir daquele jeito com uma mão grande e quente pesada em seu abdômen. Ou talvez, não fosse tão ridículo assim.
— Ah, fofinhos — Jeongguk comentou, quando era possível começar a ver alguma coisa. — Mas eu também quero uma — choramingou, beijando a nuca de Jimin, todo pidão. — Pode tirar outra?
— Claro. — E como poderia negar alguma coisa para ele pedindo desse jeito?
Mas Jimin estava na ponta do colchão e o tecido da calça escorregava. Jeongguk chegou mais para trás e o puxou pela cintura, chocando os corpos e escorregando as mãos para as coxas de Jimin, que voltou a sentir algo querer escorrer entre as pernas. Inconscientemente, a sua bunda se empinou e Jeongguk o puxou para ainda mais perto, fazendo o ômega gemer sem querer e os beijos na nuca se tornarem mais intensos ao ponto de sentir a língua do alfa em sua pele.
— Ok, eu acho que isso vai dar muito errado. — E em um pulo, Jimin não estava mais no colo de Jeongguk, que erguia o quadril para arrumar a calça que subiu.
— Não vai dar errado, o problema é que eu acho que a gente vai... — Arregalou os olhos, gesticulando qualquer coisa, sem saber o que dizer sem ser explícito demais. E podiam chegar aos finalmente se quisessem, eram adultos e, mais do que isso, almas gêmeas, toda aquela tensão era natural. Mas Jimin queria ir aos poucos e as suas mães estavam no andar debaixo, provavelmente esperando para se despedir de Jeongguk. Não era o momento certo, um beijo e eles não iam conseguir parar. — Acho que esse é o momento perfeito pra eu ir embora, né?
— Você sempre sabe quando é a sua deixa, né? Já é a segunda vez só hoje. — Jimin pegou em sua mão e saíram do quarto abraçados, Jeongguk passou o braço sobre os seus ombros e desciam as escadas lentamente.
Não precisaram procurar por Yeri e Yuna, que sentaram-se na sala para tomar um chá, ofereceram-no a Jeongguk, mas ele recusou. E com mais abraços e uma sacola de pano com vasilhas cheias de bolo, o alfa saiu pela porta acompanhado de Jimin, com os pés calçados com o seu chinelo de ficar dentro de casa.
Jeongguk desceu o primeiro degrau e abriu os braços para o ômega, que hesitou por um momento antes de receber uma pseudobronca.
— Ah, mas você vai me dar um abraço, sim. Esqueceu que eu tenho que te encher de beijo antes de ir?
E lá se foram os beijinhos no canto da boca, nas bochechas, nariz e testa, mas quando o ritual terminou, os dois não conseguiram se afastar. Os narizes se acariciavam e os corpos não podiam encontrar maior proximidade, as respirações eram sincronizadas e bastou sentir o hálito doce de Jimin depois de um suspiro longo para Jeongguk encostar os lábios aos dele e passar a ponta da língua pelo labret.
Os vãos dos dedos de Jimin se encheram com os fios do cabelo de Jeongguk e uma mão serpenteado a linha da sua coluna foi o suficiente para que os seus lábios se entreabrissem e o alfa, timidamente, tentasse colocar a língua dentro da sua boca. E então, o beijo aconteceu, o ritmo dos movimentos surgia aos poucos, o encaixe mais perto a cada nova tentativa e quando aconteceu, quando finalmente sentiram que estava certo, Jeongguk se afastou para retirar os óculos e enfiá-lo dentro do bolso.
E beijaram-se novamente, calma e intensamente. Suas línguas dançavam no ritmo que Jimin descreveria como algum solo de Santana, e se Jeongguk já o abraçava de repente e deixava beijos por toda a sua face, perguntava-se o que seria de si depois daquilo. As mãos dele serpenteavam o seu abdômen e a ponta dos dedos puxavam levemente o cós da calça para baixo, deixando explícito o seu desejo de senti-lo mais.
E sorrisos surgiram entre o beijo antes da boca de Jimin ser abandonada e o pescoço tomado. A língua de Jeongguk, finalmente, sentiu o gosto do cheiro de Jimin ao ser pressionada contra a glândula de cheiro e as mãos do alfa voltaram para a cintura, não se aguentando somente ali. As palmas se encheram nas curvas e preencheram-se com a bunda dele, apertando a carne em uma mistura de força e carinho que deixaram as suas pernas trêmulas.
Sem forças para recusar qualquer toque, desmanchou-se nos braços de Jeongguk ao sentir os dedos dele onde começava a se formar uma mancha, pressionando-os contra a costura da calça, fazendo Jimin puxar mais forte o seu cabelo para não gemer alto em frente de casa.
Sob os dedos, Jeongguk sentia a entrada de Jimin pulsar, cada vez mais úmida. Pressionava a língua em movimentos circulares e chupava a pele da glândula de cheiro, sua ereção era empurrada contra a dele e sussurrar contra o seu ouvido era inevitável.
— Eu devia ter tentado te beijar no seu quarto. — Jimin sorriu safado com a fala de Jeongguk, tendo a certeza de que, pelo menos, aquela previsão estava certa. — Eu ía te foder tão gost-
— Cala a boca — Jimin pediu, rindo de nervoso com as bochechas pegando fogo. Jeongguk deu um tapinha em sua bunda, afastando-se um pouco para olhá-lo nos olhos. — Será que o nosso primeiro beijo não poderia ser mais romântico?
— Mas bruxinho, aqui é tesão acumulado de centenas de anos, você precisa entender — brincou, agarrando-o e enchendo o pescoço dele de beijinhos.
— Pela Grande Lua Cheia, mas você só piora a situação — disse Jimin, dentro daquele aperto gostoso que ele não queria soltar.
— Tá bom, parei. Desculpa aí, família Park. — E se afastou com um sorriso gigante no rosto, enfim recompondo-se. Jimin arrumou o seu cabelo, penteando-o com os dedos e sem que percebessem, os selinhos carinhosos transformaram-se em línguas enrolando-se uma na outra e suspiros pesados ricocheteando contras a bocas. — Ai, tchau. Se eu não for de uma vez, eu nunca vou.
E assim, Jeongguk, relutante, começou a descer a escada, colocando os óculos e lembrando que levava uma sacola de pano em mãos.
— Tchau, gatinho. Até amanhã. — E Jimin sentou-se no primeiro degrau da escada, assistindo Jeongguk ir. Ficou ali mesmo depois do carro dele desaparecer de frente da sua casa. Não sabia qual era a intensidade do cheiro da sua mancha e nem se as mães ainda estavam na sala, queria evitar constrangimentos.
Quando finalmente subiu para o seu quarto, achou a polaroid na cama e sorriu apaixonado olhando para ela. E antes de pregá-la no quadro de cortiça, escreveu com a sua letra mais bonita:
12 de junho de 2017
Nosso primeiro beijo
Pois o beijo podia ter escapado do que se passava nos filmes de romance clichê, mas as memórias que guardaria dele eram mais piegas do que um livro inteiro de poesia. E até não parecia, mas Jimin amava poesia.
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