EPÍLOGO
T h o m á z
Eu não estava necessariamente com raiva. Estava mais para frustrado. Quando cheguei no galpão para trabalhar, fiz questão de cumprimentar todos os funcionários como sempre faço antes de ir direto para o escritório. De manhã, na verdade antes de acordar e encarar a normalidade, eu estava feliz de acordar nu ao lado de Giennah e mais ainda de poder receber um feliz aniversário. Mas meu humor afundou quando ela apenas me deu um beijo, disse bom dia e levantou da cama. Eu poderia ter apenas continuado dormindo se eu não fosse a porra de um carente querendo um feliz aniversário como eu tinha idealizado com a minha esposa na cama. Só que eu precisava segui-la como uma sombra, esperando que ela se lembrasse. Primeiro fomos no quarto da nossa filha, Katherine, como sempre fazíamos de manhã. Bastou ela abrir um sorrisinho feliz para eu esquecer até mesmo que dia era hoje. Ela era uma bebê linda e gorduchinha, e que puxou os meus olhos claros e cabelos loiros escuros, uma mistura minha e de Giennah. Mas seu nariz era arrebitado igual ao da mãe, e isso era realmente a coisa mais linda.
Giennah se inclinou no berço para pega-la, acomodando-a no colo. Ela provavelmente estava faminta, porque não demorou muito para ela perceber que estava pressionada no peito da mãe, levando as mãozinhas para cima.
- Acho que alguém está com fome. – Disse Giennah.
Olhei para ela nos braços da mãe, a fome estampada nos olhos, os pezinhos se agitando em felicidade.
Sorri para ela, acariciando seus cabelos finos e cheios. Ela era uma bebê de 9 meses e que sorria para tudo. Assim que me notou, olhou para mim e piscou, sorrindo novamente. Ela foi a coisa mais linda e preciosa que Giennah poderia ter me dado. Vendo seus olhinhos brilhando para mim, me fez ver um pouco da mãe dela, e como ela tinha um brilho único, que passava pra qualquer um apenas de olhar, assim como passou para mim. Elas eram toda a minha vida.
Depois desse momento pela manhã, ainda não tinha recebido nem um parabéns, o que me deixou um pouco desconfiado, mas também frustrado. Estávamos na Califórnia, um calor de agosto, então tirei a jaqueta quando cheguei no escritório. Estava vendo alguns orçamentos quando Caleb entrou na sala. Cumprimentei ele, mas apenas isso. Ele pegou o que precisava e saiu da sala, fechando a porta. Porra! Todos sabiam que hoje, 29 de agosto, era o meu aniversário. Mais tarde, quando passei no Lony's para comprar uma peça que eu precisava, encontrei com Hannah. Depois que Giennah e eu decidimos nos mudar para a Califórnia, além de sua transferência para o Tribunal daqui, discutimos sobre Hannah. Giennah sabia sobre a minha fase com ela, até porque nos viu juntos. Eu fiquei apreensivo em como elas iriam interagir, mas depois de um tempo, elas ficaram amigas, o que realmente me surpreendeu, mas me deixou de certa forma aliviado.
Hannah estava atrás do balcão, digitando algo no computador, quando eu entrei. Ela ergueu a cabeça para mim e sorriu.
- Hey, bom dia. Como está Kat? – Perguntou.
Sorri, lembrando da minha filha.
- Ótima! Ela está bem.
- Que bom. Espero que Giennah também.
- Sim, as duas.
Ela falou mais alguma coisa, mas eu foquei nas minhas próximas palavras. Mas antes que eu pudesse falar alguma coisa, Lony se aproximou de nós.
- Procurando alguma coisa, Thomáz?
- Na verdade, eu já sei exatamente o que eu quero, mas eu realmente não sei que dia é hoje. Vocês sabem?
Hannah franziu o cenho, e Lony pareceu pensar. Hannah pegou um calendário que estava em cima do balcão e olhou.
- 29 de agosto, por quê?
Olhei para os dois, me frustrando mais ainda com seus olhares calmos e normais. Puta que pariu, aqui também não.
- Isso, obrigado. Vou pegar o que eu preciso.
Depois disso, fui direto para o galpão e preferi trabalhar nas motos do que ficar trancado no escritório. Já eram 18h e eu já estava acabando com um motor, quando Caleb apareceu. Eu sabia que era ele, mas não olhei para cima.
- Stanfield, preciso que você veja um carro aqui. Eu não trabalho nessa parte, eu sei, antes que você diga alguma coisa, mas Jonas está te chamando.
Me desencostei da moto, limpando a mão no pano. Passei por ele sem dizer nada. Eu sabia que estava sendo um cretino, mas definitivamente não menos do que eles estavam sendo. Caleb trabalhava mais na limpeza dos carros e motos, e também era meu sócio. Ele saiu do bar em que trabalhava quando o chamei para trabalhar comigo, e ele não pensou duas vezes. Éramos parceiros aqui. Mas não hoje. Hoje eu realmente estava puto. Ajudei Jonas, mesmo desconfiando que ele não conseguisse fazer o que disse estar com dificuldade, já que ele era um dos melhores mecânicos da oficina.
Quando deu 19h, fui para casa, que não era muito longe dali. O galpão estava aberto, como sempre quando eu ia embora, deixando para Caleb fechar. Quando entrei em casa, fui recebido por Luck, que pulou em cima de mim, lambendo o meu rosto. Brinquei um pouco com ele, e quando larguei as chaves no balcão, reparei em uma revista de carros esportivos no balcão da cozinha. Estava aberta em uma página em que um Porsche Panamera aparecia. Franzi o cenho. Era um carro que eu queria muito, para falar a verdade. Eu poderia jurar que não tínhamos revistas de carros em casa, até porque todas estavam no meu escritório. Estranhei, mas não liguei. Subi as escadas e antes de ver Kat ou Giennah, fui tomar um banho. O dia tinha sido estressante o suficiente. Eu falaria com ela se ela lembrava que dia era hoje, e mostraria meu desapontamento, mas eu sabia que bastava Giennah sorrir ou franzir o rosto que eu a perdoaria, mesmo que tivesse me machucado. A simples expressão sincera, o seu sorriso e os olhos brilhantes na minha direção eram a cura do que tinha me ferido.
Já vestido, fui no quarto de Kat, mas encontrei o berço vazio e nem sinal dela. No nosso quarto ela não estaria com Giennah, já que eu tinha usado o banheiro de lá.
- Giennah? – Chamei.
Nada. Desci, mas a sala e o quintal estavam silenciosos. Ela sempre me avisava quando saía, ainda mais com Kat. Chamei novamente, mas nenhuma resposta. Com uma pontada de preocupação, peguei o celular, bem no momento em que o telefone tocou na minha mão, com o nome de Caleb na tela. Atendi, mas ele não deu tempo para eu falar.
- Thomáz, uma mulher chegou aqui com um carro, mas já estamos fechando. Ela disse que não sai daqui até resolvermos o problema no carro dela. Acho que como somos uma oficina famosa, até fora do estado, ela quer que nós consertemos o carro dela.
- E vocês não conseguem resolver isso? Preciso achar Giennah e Kat. Elas não estão em casa.
- Não, é sério, ela está ameaçando não sair daqui até falar com o dono.
Fechei os olhos.
- Porra, Caleb, você é meu sócio, eu preciso mesmo encontrar minha esposa e minha filha, resolve isso dessa vez, por favor. – Desliguei o celular, já calçando o tênis e ligando para Giennah.
Ela atendeu no segundo toque.
- Onde você está? – Perguntei.
- Eu precisei resolver uma coisa, mas estamos bem. Desculpa não te ligar, mas não se preocupe, já estamos chegando.
- Tudo bem. Você me assustou.
- Desculpe, baby, eu esqueci completamente.
Me despedi rapidamente. Pois é, parecia que ela não esqueceu apenas de me ligar.
Meu telefone tocou novamente, com o nome de Caleb na tela.
- Ela realmente não vai sair daqui até você aparecer.
Suspirei. Eu realmente estava tendo um dia de merda. Peguei as chaves e fui de moto até o galpão.
G i e n n a h
Tinha que dar certo. Eu passei a última semana inteira planejando uma festa surpresa para Thomáz, e foi difícil esconder isso dele. Ele não pareceu desconfiar, mas nessa manhã ele parecia realmente decepcionado. Eu não sabia o que eu faria caso ele mesmo me lembrasse que hoje era seu aniversário, porque eu teria que mentir mais ainda. Precisei de todas as minhas forças para não agarra-lo na cama e comemorar essa manhã, mas eu precisava seguir com o plano. Meus pais chegariam essa noite, junto com Matthew. Sim, Matthew. Ele traria a namorada, e viria como parte da família, como ele sempre fora.
Eu tinha combinado com Caleb e com os outros funcionários, para ninguém parabeniza-lo hoje. Pesou um pouco o meu coração, mas ele gostaria no final. Na verdade, eu tinha certeza que sim, conhecendo Thomáz. Assim que ele saísse do galpão, Caleb me ligaria e eu iria com a surpresa para lá. Já estava tudo acertado. Caleb tinha combinado com o namorado e eles estariam lá antes de Thomáz chegar, como se ele precisasse de reforços para conter uma mulher revoltada com problemas no carro.
E foi isso que aconteceu. Meus pais já estavam no telhado do balcão, que na verdade era uma área aberta, junto com os outros convidados. A mãe, o irmão e o padrasto de Thomáz também já tinham chegado, entre outros. Abby e Josh já estavam aqui. Eu não poderia ter ficado mais surpresa quando Thomáz e eu nos mudamos para cá e a nova casa de Abby e Josh era bem ao lado da nossa. Vizinhos. Essa palavra tinha agora um significado para mim. Antes, eu morava com Abby ao lado de Thomáz. Agora, tínhamos nossa casa, e ao lado, Abby e Josh. As coisas tinham mudado agora, e eu não poderia estar mais feliz.
Eu estava na esquina, pronta para receber o sinal de Caleb, dizendo que Thomáz tinha chegado. Era só esperar.
T h o m á z
Quando desliguei a moto em frente ao galpão, fiquei puto porque não tinha merda de carro nenhum, e a área aberta da entrada estava vazia, apenas com as luzes acesas. Caleb apareceu com o celular na mão. Ele estava calmo. A porra do cara estava calmo.
- Cadê o carro? Não me diga que ela foi embora.
Ele se aproximou e olhou para trás de mim.
- Na verdade, ela acabou de chagar. – Ele maneou com a cabeça para algo atrás de mim.
Quando eu me virei, vi apenas dois faróis direcionados nos meus olhos. Tapei o rosto com a mão, tentando enxergar. O carro vinha em alta velocidade, até entrar desacelerado no galpão. Nenhum carro e moto que estávamos trabalhando de manhã estava ali embaixo, sendo que tínhamos sempre essa área lotada de automóveis. Estava vazio. O carro parou bem no meio da área vazia, e então meus olhos caíram para o carro. Um Porsche Panamera. Rapidamente lembrei de ter visto aquela revista na bancada da cozinha aberta bem na imagem desse carro. De quem quer que seja, é um puto de um sortudo. Tentei parar de admirar o carro, para ver quem sairia, já que tinha insulfilme nas janelas.
A porta abriu, e apenas as pernas de uma mulher apareceram. Franzi o cenho. Eu reconheceria aquelas pernas a um quilômetro de distância. Giennah saiu do carro de forma elegante como ela sabia fazer quando queria, e tirou o cabelo dos olhos, olhando para mim. Perdi o fôlego. Ela ajeitou o vestido preto justo, e andou até mim em saltos altos até demais. Mas aquilo não era nada para ela. Ela caminhou sem tirar os olhos de mim, sem se desequilibrar.
Com um sorriso, ela disse:
- Feliz aniversário!
Olhei para ela, ainda um pouco chocado demais. Então ela não esqueceu. A minha ficha foi caindo aos poucos, enquanto eu olhava para ela. Reparando que eu estava sem fala, ela riu e passou os braços pelo meu pescoço, seu perfume inundando minhas narinas. Imediatamente a apertei contra mim.
- Não vai buscar o seu presente?
Eu estava mais relaxado do que o dia inteiro agora, então suspirei em deleite pela mulher na minha frente, e afundei o rosto no seu pescoço.
- Você sabe que acordar ao seu lado todos os dias já é o meu maior presente.
Ela riu. Beijei seu pescoço e olhei para ela. Notei que seu cheiro tinha impregnado em mim, e eu amava quando isso acontecia.
- Mas deu tanto trabalho organizar tudo. Você pode fingir que prefere o carro do que a mim, agora.
Eu ainda estava vidrado nela, quando Giennah se afastou para eu olhar para o carro. Eu não fazia ideia de como ela conseguiu esse carro, mas realmente, ele era o meu sonho de consumo desde sempre.
- Tem algo especial te esperando no banco de trás. – Disse ela, quando eu me aproximei do carro, notando cada detalhe.
Fui até a porta. Quando abri, sorri em surpresa. Kat virou o rostinho na minha direção assim que fiz barulho, e quando me reconheceu, sorriu e soltou um gritinho, levantando os bracinhos. Ri para ela, que estava sentada em uma cadeirinha com segurança. Giennah tinha pensado em tudo. Tirei ela do carro e a segurei no colo. Ela estava com um laço vermelho na cabeça.
- Embrulhei ela com um laço vermelho como um presente. – Giennah disse.
Eu gargalhei, jogando a cabeça para trás. Kat não sabia do motivo, mas riu junto.
- Realmente, um pequeno presente que vale mais do que esse carro. – Falei, dando um beijo no topo de sua cabeça com cabelos cheios.
Me aproximei de Giennah e dei um beijo nos seus lábios vermelhos, sussurrando:
- Obrigado. Ainda não caiu a ficha que você me deu um carro como esse, mas depois eu penso sobre isso.
Ela ergueu as sobrancelhas.
- Não precisa pensar demais, eu quis comprar o carro, e nós podemos. E o mais importante, você merece. Pela pessoa, pelo marido e pelo pai que você é, você merece isso, Thomáz.
Eu sorri, balançando a cabeça e a beijando mais uma vez. Demorei mais um pouco no beijo, e só parei quando Kat bateu com a mão entre os nossos rostos, como se quisesse que seus pais parassem de se beijar e dessem um pouco de atenção para ela. Sorrimos para ela, e demos um beijo nas suas bochechas, tendo a mesma ideia. Ela riu.
- A surpresa ainda não acabou.
Olhei ao redor e Caleb tinha sumido. Giennah me levou até a escada que levava até o telhado. Subimos, e assim que cheguei no último degrau, fui recebido por um grito de feliz aniversário. Reconheci meus amigos, o pessoal da oficina, Lony e Hannah, e fiquei surpreso quando vi minha mãe com meu irmão junto com o meu padrasto. Apertei um pouco Kat no meu colo, enquanto ela estava ocupada puxando o meu cabelo. Ver a minha mãe aqui com o meu irmão me lembrou o meu pai. Fazia tanto tempo que eu não comemorava um aniversário com o meu pai, que em todo aniversário eu ainda sentia um vazio. A sua presença faz falta, mesmo que eu ainda não o tenha perdoado. Eu ainda sentia essa nuvem do passado em mim, mas era difícil me desfazer dela. Agora eu era pai, e eu sabia que não gostaria que essa nuvem pairasse em cima da minha filha. Nunca. Me aproximei deles, e Kat soltou meu cabelo, encarando as pessoas que pararam na sua frente. Olhei para ela, com os enormes olhos verdes claros olhando tudo, como se só tivesse notado agora as luzes penduradas no ar e as pessoas a sua volta. Minha mãe brincou com ela e me abraçou forte. Eu sabia o que ela queria passar com esse abraço. Ela pensava o mesmo sobre o meu pai nos meus aniversários e do meu irmão. Sorri para ela e deixei Kat em seus braços, dando um beijo na sua cabeça pequena antes de cumprimentar as outras pessoas, depois de abraçar forte o meu irmão.
...
Já era madrugada, e estávamos cansados da festa que durou mais do que esperávamos. Eu nunca tinha rido tanto com os meus amigos, e Giennah sempre estava presente nas rodas, rindo junto. Eu me pegava admirando o seu rosto bonito com um sorriso estampado e que não saía. Eventualmente eu a puxava para dançar comigo, e ela nunca recusava. Ela estava feliz. E se ela estava feliz, eu também estava.
Katherine não estava conseguindo dormir como sua mãe, que já estava dormindo na cama, cansada. Eu me levantei para acalma-la, mas ela ainda resmungava. Eu a ninei por um tempo, mas nada resolvia. Sem pensar muito, desci direto para a cozinha com ela nos meus braços. Luck estava atrás de nós. Fui direto para a geladeira e peguei a bandeja com um pedaço do bolo que tinha sobrado. Kat ainda resmungava, provavelmente querendo Giennah, mas ela estava cansada demais, e eu teria que me virar. Eu não me importava nem um pouco em acalma-la, mas nós compartilhávamos da mesma necessidade de Giennah. E eu sabia que era difícil ficar longe por muito tempo. Coloquei ela sentada na bancada da cozinha, e segurei suas costas. Com um garfo, peguei um pedaço do bolo e comi. No mesmo momento eu pensei no porquê eu estava fazendo aquilo. Eu costumava comer tortas e doces escondido da minha mãe junto com o meu pai nas madrugadas. Isso sempre me fazia dormir melhor à noite. Peguei um pedaço pequeno de bolo e dei para Kat. Ela estranhou, mas aceitou. Ela parou de chorar para comer, e quando terminou, olhou para mim com os olhos enormes. Sorri. Peguei mais um pouco e dei para ela, que aceitou de imediato.
- Não conta pra sua mãe se não ela vai me matar. Ela só não faria o mesmo com você porque é fofa demais. Te invejo por isso. – Sussurrei para ela, que sorriu pela primeira vez depois de chorar.
Éramos cúmplices como eu e meu pai fomos quando eu era criança. Comi mais um pedaço do bolo, me debruçando com o cotovelo na bancada. Meu pai fazia o mesmo. Kat já estava lambendo a mão com o bolo. Naquele momento, eu senti algo se aliviar em mim. Senti pela primeira vez aquela nuvem escura do passado se dissipando quando sussurrei, observando a minha filha:
- Eu te perdoo, pai. Eu te perdoo.
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