Capítulo 3
Pov Ana
Depois de dois longos meses Sophia acordou. Foram meses muito complicados, eu basicamente não saia do hospital, mesmo que nas primeiras semanas eu não pudesse estar junto da minha irmã, eu não conseguia sair dali. Até porque eu não tinha para onde ir, nem tinha mais ninguém na minha vida. Éramos só nós duas agora.
A "ViúvaCinza", depois de me vir dizer todas aquelas barbaridades, nunca mais se dignou em nos vir ver ao hospital. Não que eu fizesse questão, nunca gostei dela. E hoje, sei que a minha intuição estava certa. Aquela mulher não era uma boa pessoa. E a filha, não ficava atrás. Ouvir tudo o que ela me disse foi difícil, eu estava sozinha. Completamente sozinha, com uma menina de 13 anos a meu cargo, que tinha ficado literalmente dependente de mim.
"Faz três dias que estou neste quarto, e finalmente hoje vou ter alta. Não vejo a hora de me autorizarem a ir ver a Sofi, mesmo que apenas por uma janela. Preciso de ter a certeza que ela ainda está aqui comigo. Preciso de lhe dizer que ela não me pode deixar, que tem que lutar por mim, por nós.
- Bom Dia.- olho para a porta e nem acredito no que estou a ver...- Soube que vais ter alta...
- Sim. Quando é que é o enterro do meu pai?
- Já foi.- ela diz, e eu simplesmente fico a olhar para ela.- Não fizemos nem velório, foi tudo muito rápido. E sem muita gente, não havia necessidade.
- Como assim sem velório? Eu não me despedi? E os amigos do meu pai? Por que é que não esperaram que eu saísse? Era meu pai, eu tinha o direito de ter estado lá...
- Despedir de quê? Querida, aquilo era só um corpo. E desde quando o teu pai tinha amigos? Ele tinha colegas de trabalho...
- Não. Isso é mentira, ele tinha amigos sim.
- Seja. E em relação a essa coisa de teres direito. Quem é que o fez ir de fim de semana? Tu. Então a culpa foi toda tua, tu e essa tua inveja.
- A Senhora não tem o direito de me falar isso. Ele era meu pai, eu perdi-o e a Sofi...eu nem sei...
- Aquela coisa, ela não vai resistir durante muito tempo. Vais ficar sozinha e sem nada.
- Eu tenho a casa, aquela casa é minha e da Sophia. O meu pai disse-me que ela seria nossa...
- Isso mudou, tudo o que era do teu pai é meu agora. Tu Anastácia Steele estás sem onde cair morta.
- NÃO. aquela casa é nossa: minha e da Sofi. O meu pai não ia dar a casa que comprou com a minha mãe. Não ia...- Neste momento entra a Tia Flora, que vem logo abraçar-me...- Diz-me que é mentira, por favor.
- Desculpe minha menina, eu não pude fazer nada. Eu fiz umas malas com roupas suas e da Sofi, as suas coisas da escola e a mochila da nossa pequena.
- NÃO. Não é verdade, "Tia" diz me que não é verdade...por favor...
Flora, que estava connosco desde que Sophia nasceu, foi aos poucos entrando na nossa família. Ela era a mãe que Sofi nunca teve, e a que eu sentia falta. Era a nossa Tia Flo.
- Bem já fiz o que tinha que fazer. Até nunca mais Anastácia, e nem te atrevas a fazer alguma coisa para me tirar o que é meu.
- Isto não pode estar a acontecer. Não pode, eu estou a sonhar, num pesadelo, isto não é real.
- Calma minha menina. Na rua vocês não ficam, eu levei o que consegui para minha casa. Agora vamos vestir-nos, vamos ver a nossa pequena e depois descansar numa cama que não esta de hospital.
- Eu quero ir ao cemitério...eu quero despedir-me dele.
- Tudo bem. Vamos.
Naquela manhã depois de ver a minha irmã, fomos ao cemitério. Nem se deram ao trabalho para colocarem o meu pai no meu local onde estava a minha mãe. Chorei, chorei tudo o que ainda não tinha chorado até àquele dia. E pedi, pedi ao meu pai para não levar Sofi. Eu precisava dela, precisava de algo que me mantivesse viva."
Depois disto, a minha vida resumiu-se a ficar perto da minha irmã. Com a ajuda da Tia Flora e de alguns amigos da faculdade consegui acabar o curso. O dia da minha formatura, que deveria ser um dia feliz tornou-se um dia triste. Todos os meus colegas tinham as suas famílias ali, a festejar o seu sucesso, e eu? Eu estava sozinha. Sem os meus pais, sem a minha irmã. Nem a Tia Flora pôde estar. A "ViúvaCinza" decidiu que iria festejar a formatura de Leila em grande estilo então sobrou para a minha "Tia".
Eu estava sozinha, naquele campus enorme. Olhava para todos, felizes, a abraçar os pais, irmãos, tios, avós. Não era para ter sido assim, não era suposto ser assim. Eu queria os meus pais ali comigo, a abraçar-me, a dizer-me que se orgulhavam de mim. Queria a minha irmã que provavelmente estaria emburrada por tudo aquilo ser uma chatice. Eu queria a minha família ali, mas tudo o que tinha era um vazio.
Eu não aguentava mais olhar para tudo aquilo, decidi nem ir ao almoço de confraternização. Fui até ao meu cacifo, peguei nas minhas coisas e caminhei até ao meu carro. Uma nova lágrima me escorre dos olhos, lembro-me bem do dia em que recebi o carro do meu pai. Ele teimou que eu não podia estar dependente de horários de transportes, que o carro me daria mais liberdade de poder ir até estudar com colegas, e ele ficaria mais descansado por saber que eu não viria para casa sozinha às tantas horas da noite.
- Ana!!!- Viviane, a minha melhor amiga desde sempre vinha a correr até mim.- Ei! Onde vais? Ainda temos o almoço.
- Eu não vou.- Viviane olha para mim...- Eu não consigo Vi, doi muito. Ele devia estar aqui...e...
- Eu percebo, e sei que onde quer que o Tio Ray esteja ele está muito orgulhoso de ti. Mas por favor, este era o nosso sonho: formar-nos, festejar juntas e...
- Juntas com as nossas famílias Vi. Eu já não tenho ninguém...eu vou para o hospital, quero ir ver a Sofi.
- Ana, se precisares de alguma coisa...qualquer coisa, sabes que podes sempre contar comigo e como os meus pais, certo?
- Sim. Eu sei, mas neste momento a única coisa que preciso é que a Sophia acorde. eu não a posso perder, não posso.
Limpei as lágrimas, entrei no carro e dirigi para o hospital. Mesmo ficando ali no meio de um silêncio, apenas interrompido pelo barulho do batimento cardíaco de Sophia, era o único lugar onde me sentia bem. Mesmo que irritante, o som do coração da minha irmã a bater dava-me esperança que ela ainda iria voltar para mim.
Quando chego ao hospital, estaciono o carro, e pego no diploma. Mesmo que ela não possa ver, quero mostrar-lhe que consegui. Apesar de todos as nossas perdas, nós vamos conseguir sair de tudo isto mais forte. Caminho para o quarto de Sofi, começo a ver um grande movimento no corredor, mas nem estranho muito, aqui nos cuidados intermédios, há sempre esta correria. Porém, quando me aproximo do quarto da minha irmã, percebo que a correria estava a dirigir-se para lá. E começo eu também a correr.
Tento entrar, mas uma das enfermeiras impede-me. Eu choro, grito, até que as forças nas pernas simplesmente desaparecem e apenas me deixo cair no chão. Eu não a posso perder, não posso. Ela é tudo o que me resta, tudo o que ainda me mantem viva.
- Ana.- olho para trás e vejo a "Tia" Flora...- Calma minha menina, ela está bem. Ela está bem...
- Mas...eu...eu vi...- não consigo falar, não consigo nem entender o porquê dela estar com um sorriso na cara.
- A nossa Sophia está bem. Ela acordou...
- Ela acordou...sério...mas então por que é que este movimento todo? Eu não estou a perceber nada.
- Vamos entrar, o médico está lá dentro...- assinto com a cabeça, mas sem perceber o que estava a acontecer.
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