*Bônus*
Belo Horizonte
Dezembro, 2008
Na véspera do Natal de 2008, às oito e cinquenta da noite, Cristina está se preparando para dormir. A garotinha vestiu seu pijama de unicórnio e escovou os dentes com a ajuda de sua mãe. Rosana não precisou convencer a filha que já está na hora de ir para a cama. Tina teve um dia muito agitado, não foi difícil ficar cansada.
Durante a manhã, ela foi com o pai à Praça da Pampulha. Carlos incentivou a filha a abandonar as rodinhas da bicicleta. Cristina encorajada pelo pai, fez questão de tentar. Ela confiou que Carlos não a deixaria cair, ele estaria a todo instante por perto. Em um determinado momento, Carlos sentiu que a garotinha estava pronta para seguir sozinha, então, decidiu tirar as mãos da bicicleta. Ele deu um sorriso quando Cristina continuou pedalando pela praça sem perceber que ele já estava distante, ela não se deu conta que já era esperta e destemida o suficiente para não precisar das rodinhas. Enquanto a filha seguia seu caminho, ele continuava com o sorriso orgulhoso nos lábios, observando atentamente cada pedalada. O vento soprou no rosto dela, fazendo com que seus cabelos castanhos ficassem sob seus olhos, impedindo de enxergar à sua frente. Foi nesse momento, que ela tirou a mão do guidão para afastar o cabelo do rosto, o que ela não sabia, é que não poderia contar com o seu pai para parar a bicicleta. Então, por ter se distraído, acabou caindo na calçada. Essa experiência resultou em um joelho machucado e um corte na testa. Ela chorou baixinho quando reparou que alguns adolescentes estavam rindo da situação, apesar de não ter sido nada engraçado, foi frustrante e doloroso. As consequências dessa imprudência, foram curativos nos machucados e a repreensão de Rosana, justificada pela negligência do pai de sua filha. Cristina foi recompensada com um livro de contos, rapidamente deixou esse ocorrido para trás sem pensar duas vezes. Ora, é melhor ter um livro em mãos do que ficar se lamentando. E, além do mais, não se pode desistir do seu objetivo. Faz parte adquirir cicatrizes durante o processo. Cicatrizes são a marca que você batalhou para atingir as suas metas, ainda que a sua meta seja andar de bicicleta sem as benditas rodinhas.
Depois dessa aventura, ela foi para a casa da tia passar o tempo com a sua prima. Elas são melhores amigas desde bebês. Beatriz e Cristina passaram o tempo assistindo alguns filmes, cujo o tema de cada um era o Natal. Agora à noite, ela deitou-se na cama esperando o beijo de boa noite dos seus pais. O vento acompanhado com o frescor desta noite de verão, fez com que o tecido da cortina dançasse pelo quarto da garota. Rosana, temerosa como é, fechou a janela com receio que sua filha acordasse resfriada na manhã seguinte. Ela beijou a testa de Cristina e desejou uma boa noite. Carlos permaneceu no quarto para pedir perdão pelo acidente novamente.
— Tina, perdão. Prometo que não vai acontecer novamente, querida. — Cristina somou esse pedido de desculpas com os anteriores, resultando no décimo primeiro.
— Tudo bem, papai. O senhor pode contar uma história para mim?
— Claro. — ele pegou o livro que leu para a filha na noite passada — Tradição é tradição.
A garota deitou-se de lado para facilitarsua atenção na história. Esse é um dos momentos favoritos de sua rotina. Quando ela tinha oito anos de idade, declarou para o pai que jamais queria que ele parasse de narrar suas histórias. Tina sabe ler muito bem, mas nada se compara a ter a dádiva de ter esses momentos com o seu pai, ela se sente a garota com nove anos de idade mais sortuda do mundo.
— Era uma vez, há muito tempo, um rei e uma rainha jovens, poderosos e ricos; mas pouco felizes, porque não tinham concretizado o maior sonho deles: terem filhos... — Carlos lê o primeiro paragrafo do conto da Bela Adormecida.
Provavelmente é a décima vez que ele narra este conto para a filha. Sem contar todas as vezes que ocasionalmente ela mesma leu sozinha. Certamente, é um de seus favoritos. Em determinadas falas dos personagens, Carlos altera a voz, dando vida para eles. Sua filha acha graça das vozes que ele faz e gargalha de sua impressionante interpretação. Inegavelmente, se ele não seguisse a carreira de advogado, poderia muito bem se adequar ao teatro, caso não fosse tão sério e reservado. Supostamente, ele só demonstra seu lado mais extrovertido para as pessoas mais íntimas.
O conto chega ao fim e ele guarda o livro no mesmo lugar da qual foi tirado. Troca mais algumas palavras com a filha e põe o cobertor sob ela. Apaga a luz do abajur e despede dela com um beijo na testa, prometendo que amanhã de manhã vai ser a hora perfeita para abrir os presentes que ele e a sua esposa compraram. Cristina recebe três presentes, dois dos seus pais e um do Papai Noel. Tina está muito animada e ansiosa para ganhar a agenda que pediu para o Bom Velhinho. Os três trabalharam bastante para deixar a sala decorada para esse feriado tão célebre. Ao som de músicas natalinas, montaram a árvore, penduraram a guirlanda na porta do apartamento e, evidentemente, deixaram os presentes em baixo da árvore. Ele sai do quarto fechando a porta em seguida. Cristina fecha os olhos e coloca em prática o método de contar carneirinhos para ficar sonolenta depressa. Passaram-se vinte minutos e o sono não chegou para ela. Se estivesse em algum desenho animado, agora seria o momento exato para aparecer uma lâmpada acesa em cima de sua cabeça. Como não conseguiu dormir, optou a ir à sala para checar se o lanche que deixou para o Papai Noel ainda está lá. Levantou-se da cama sorrateiramente, calçou as pantufas e saiu do cômodo em passos leves e silenciosos para não causar nenhum tipo de barulho. Mas quando chegou à sala, ficou completamente surpresa pela cena que foi obrigada a presenciar. Seu pai, quem contara um conto há alguns minutos, estava comendo o lanche que foi destinado ao Papai Noel.
— Pai, por que o senhor está comendo o lanche que eu deixei para o Papai Noel? — Tina pergunta ainda atônita e furiosa pelo o ocorrido.
— Filhota, desculpe, eu não sabia. Ele ainda não chegou, podemos preparar outro. — Carlos pronuncia as palavras de forma suave e pesarosa para que Cristina não fique ofendida pela sua atitude impensada.
Tarde demais. A garotinha com seus nove anos inexperientes e ingênuos já está irritada e sem saber o porquê de tal comportamento. Ora essa! Como o pai não possui conhecimento que é tão comum algumas crianças deixarem um copo de leite e biscoitos para o Senhor Noel quanto as bochechas ficarem coradas em dias calorosos? Não é algo complexo e desconhecido para o resto da população mundial. E Tina pode provar com evidências concretas e aceitáveis que ela não é a única criança a ser tão cortês na véspera de Natal. Filmes podem confirmar tal ação.
— O que está acontecendo? E por que você não está na cama? — Rosana sai do quarto, preocupada com o que está sucedendo em sua sala.
— O papai comeu o lanche que eu deixei para o Papai Noel. — tristemente a garota responde cabisbaixa.
— O que você pensa que está fazendo, Carlos?
Sem se preocupar com a repreensão da esposa, calmamente ele utiliza a barra da camisa para limpar o farelo do biscoito dos lábios e, despretensiosamente, diz:
— Querida, eu já expliquei para ela que eu não sabia. Não vamos criar um tumulto, podemos preparar outro lanche.
Rosana olhou para a inquietação de sua filha e voltou a se concentrar em seu marido. Observou toda a sua calma e quietude diante da situação e despejou palavras impolidas para ele, talvez fora tomada pelo estresse que passou de manhã, quando sua filha frágil e desprotegida foi aparentemente lesionada ao cair da bicicleta.
— Você tem noção do que fez? Já não bastava deixar a nossa filha se machucar e agora quer estragar o que ela fez? Era para ela já estar dormindo para eu deixar o presente embaixo da árvore.
Por alguns segundos Rosana esqueceu-se da presença de sua filha na sala, pois não deveria de forma alguma proferir o seu plano de todos os Natais. Quando percebeu a frase que escapou de sua boca, olhou para Cristina, que está totalmente estupefata pela descoberta.
— Como assim, mamãe? Não é o Papai Noel quem traz o presente? — algumas lágrimas descem pelo rosto dela.
— Sente-se aqui, filha. — a mãe indicou um espaço no sofá. As duas sentaram-se e Carlos aproveitou o momento para sair de cena, já que as duas mulheres da casa estão dramaticamente irritadas com ele — O Papai Noel é uma figura que simboliza a bondade e a alegria que permeia o Natal. É para as pessoas praticarem solidariedade com as outras, consegue entender?
— Então, os pais compram os presentes e mentem para os filhos por quê?
Touché. Nota-se que a garotinha já faz bons questionamentos, apesar da pouca idade.
— Sinceramente, eu não sei dizer exatamente o porquê. É um hábito que existe há vários anos, é como se fosse uma tradição que as pessoas seguem. O que não é nada justo se for parar para pensar, o responsável da criança gasta dinheiro e um senhor que é lembrado uma vez por ano quem recebe todo o crédito e reconhecimento. — Rosana balança a cabeça de um lado para o outro, mostrando-se claramente não concordar com esse costume.
— Por que mentiu para mim, mamãe? — algumas lágrimas ainda descem pelo rosto da garotinha.
—Desculpa, não queria que você tivesse descoberto dessa maneira. É claro quemais cedo ou mais tarde você iria descobrir a verdade, mas isso não significaque eu te enganei propositalmente. Tudo bem?
— Entendi. Eu posso contar a verdade para as outras crianças?
— Nãããão! — sem hesitar Rosana responde — Você não pode fazer isso, não seria certo com as outras crianças. — explica de forma mais calma e sucinta.
— Por quê? Não é melhor que elas saibam a verdade? — ainda sem entender, Cristina resolve indagar.
— Elas só deverão saber a verdade quando chegar a hora certa. Se você fizer isso, pode ser que elas não sejam tão compreensivas quanto você. E você não quer arruinar a Magia do Natal para as outras crianças. Certo?
Com um sorriso contido, Tina pensa melhor e acaba concordando com a opinião de sua mãe.
— Certo.
Depois do que ocorreu essa noite, é provável que ela ainda escreva cartas antecipadamente ao Natal; mas desta vez, serão para dois destinatários, Papai e Mamãe Noel. Visto que agora ela sabe quem são os responsáveis pelos seus presentes natalinos.
♡
Oi, pessoal. Tudo bem com vocês?
Como prometi, aqui está o capítulo bônus. Se tudo ocorrer como planejei, os próximos capítulos vão sair a partir da terceira semana de Janeiro, estou ficando mais ocupada porque estou trabalhando em mais três projetos além desse livro — por enquanto eu ainda não posso contar nada, sorry; mas garanto que vocês vão gostar.
Além de contar como foi a descoberta da inexistência do Papai Noel, esse capítulo também mostra como antigamente a Tina era mais próxima do pai dela. Antes de escrever eu imaginei que ficaria melhor, eu ainda não estou satisfeita; mas infelizmente eu não consegui melhorar. De qualquer forma, espero que vocês gostem.
Feliz Natal e Feliz Ano Novo!
Beijinhos e até o próximo capítulo! 😙❤
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro