Capítulo 2
Depois de soltar um grito que assustaria até a alma mais sombria, pego minha toalha, que graças aos céus, sempre deixo dentro do cubículo comigo, me enrolo, calço meus chinelos e saio em disparada pelo corredor vazio do colégio.
Eu sei muito bem quem foram os idiotas que fizeram isso, mas eles não perdem por esperar. Eu vou matá-los!
Procuro pelas duas cabeça-ocas, sala por sala. A cada porta que abro e encontro o lugar vazio, minha raiva aumenta.
Praticamente grito os nomes dos dois enquanto corro pela escola apenas de toalha e chinelos. Seria uma cena cômica se não fosse trágica.
Depois de andar quase dez minutos a procura daqueles dois, dou meia volta e decido regressar até o vestiário. Como sei a combinação do armário de Amanda, vou pegar uma roupa dela emprestada. Não posso voltar para casa desse jeito!
Porém é como se o universo estivesse contra mim, porque bem na hora que me viro, colido com um dos idiotas que estava procurando.
─Você! –Aponto para o garoto que me escrutina completamente antes de dar uma risadinha cínica. ─Onde estão minhas roupas? É bom dizer de uma vez antes que eu arrebente essa sua cara! –Grito enquanto me aproximo. Alex não se move um centímetro sequer. Esse garoto não tem amor à vida, só pode.
─Não sei do que está falando. –Cruza os braços e se encosta em um dos armários azuis do enorme corredor.
─Ah, mas você sabe muito bem! Eu sei que foram vocês dois que roubaram minha roupa do vestiário! Não posso ir embora assim, porra! –Coloco meu dedo no seu peitoral musculoso e ele observa o ato com uma sobrancelha levantada e uma expressão de deboche.
─Eu não entro no vestiário feminino. É proibido.
─Mas a sua namorada entra né! Vocês vão me pagar, e com juros!
Alex apenas ri da minha situação. Babaca. Muito engraçado sumir com as coisas dos outros. Eu só não dou uma surra nesses dois, porque perderia minha bolsa, mas se eu fosse uma riquinha mimada igual eles, ah meus amigos, a família já poderia encomendar os caixões.
Ficamos alguns minutos nos encarando enquanto imagino "mil e uma maneiras de torturar Alex Estensoro e Melina Stevens", até que um pigarro soa detrás de mim. O sorriso na boca do idiota aumenta ainda mais, me arrancando um arrepio de medo. Me viro lentamente e dou de cara com a diretora. MERDA!
Seu rosto adquire uma expressão tão furiosa, que quase posso ver a fumaça saindo pelos seus poros velhos e enrugados.
Elizabeth Manson é uma mulher na casa dos seus cinquenta e tantos anos, com tantos doutorados que não cabem nos dedos para contar. Sua rigidez e eficiência são reconhecidas no país inteiro e ninguém, além de Alex e Melina é claro, tem coragem de desobedecer alguma de suas ordens.
─Posso saber o que está acontecendo aqui? –Pergunta olhando diretamente para mim. Eu sabia que ela não ia atribuir a culpa a Alex. Ele é seu pupilo, seu protegido, já que os pais dele fazem doações milionárias cada ano para o colégio.
─Diretora, eu estava tomando banho para ir embora, quando saí, minhas roupas não estavam onde deixei e... –Começo a explicar, mas sou interrompida.
─Acha mesmo que vou acreditar nisso senhorita Evans? –Seu cenho franzido evidencia o que ela acaba de dizer.
─Mas foi o que aconteceu, diretora! Eu não tenho roupas para vestir, minha bolsa com minhas coisas simplesmente sumiu do vestiário e eu vim procurar! –O desespero começa a tomar conta do meu ser. Se eu levar uma suspensão ou mesmo uma advertência sequer, meu histórico impecável será manchado e minhas chances de conseguir entrar em uma faculdade decente irão descer pelo ralo, assim como minhas lágrimas.
─Isso não explica o fato de que encontrei vocês dois sozinhos no corredor, muito próximos, diga-se de passagem. –Mas era só o que me faltava! Como ela pode sugerir que possa estar pegando o Alex? Eca!
─Eu... eu encontrei Alex e pedi que ele me ajudasse a procurar minhas coisas, não é mesmo Alex? –Lanço um olhar desesperado pedindo por favor que ele me ajude pelo menos uma vez na vida.
O garoto demora alguns segundos para responder e meu medo, e ódio, aumentam exponencialmente.
─Uhum. –Ele diz simplesmente e como era de se esperar, a senhora Manson acredita imediatamente no que disse.
─Bom, se é assim, vamos até os achados e perdidos, deve haver alguma coisa que lhe sirva. –Diz e começa a caminhar. O barulho dos seus saltos me irritando a cada passo.
Sigo a diretora para o meu próprio bem e surpreendentemente Alex caminha lentamente atrás de mim.
─Vocês me pagam. –Sussurro e ele solta uma risadinha rouca.
─Você é quem tem que me pagar, jogadora. Está me devendo uma, salvei a sua pele hoje. –Diz no pé do meu ouvido. Garoto cínico.
─Eu estou nessa situação por culpa de vocês! –Minha voz sai esganiçada, porém, graças aos céus, a diretora não escuta nada da nossa "conversa" particular. ─Pode dar um jeito de encontrar minha bolsa, Satã Jr, ou eu vou denunciá-los por roubo. –Ameaço, mas ao contrário da reação que eu esperava, de medo, ele ri mais uma vez.
─Quero ver você tentar. Não tem nenhuma prova.
Droga. O babaca tem razão. Eu sequer vi quem entrou no vestiário e levou minhas coisas, mas tenho certeza que foram esses dois.
Depois de atravessar a escola, me sentindo em um "walk of shame" estudantil, chegamos na sala da diretora. Ao lado está a sala da coordenação onde do lado de fora há uma enorme caixa com as coisas esquecidas pelos alunos apressados.
A diretora entra na sua sala e aponta a caixa, indicando em um sinal silencioso, o que tenho que fazer.
Me aproximo com cara de nojo, tentando achar algo que não tenha sido usado para vestir, algo minimamente decente, quando uma alça preta me chama a atenção.
Me debruço na caixa e cavo até ao fundo, só para achar minha bolsa, enterrada em meio a roupas sujas e velhas. Eu sabia!
─Bela visão. –O hálito quente de Alex ressopra no meu ouvido e demoro alguns segundos para entender do que diabos ele está falando.
─Sai daqui seu idiota! –Grito e ele se afasta gargalhando. Sinto meu rosto queimar de vergonha. Será que ele viu minha...
Melhor não pensar nisso. Pego minha bolsa e saio correndo o mais rápido dali para me vestir e sair desse colégio maldito.
Entro no banheiro feminino e visto minhas roupas na velocidade da luz. Pelo menos aquela vaca não tirou minhas coisas de dentro e as misturou com o resto da roupa nojenta.
Guardo minha toalha e saio de chinelos mesmo. Pego minha chave em um dos bolsos ocultos e vou até a entrada do colégio.
Me aproximo da minha moto e vejo Alex encostado nela. Hoje definitivamente não é meu dia.
─O que quer agora, assombração? –Digo enquanto dou um empurrão no seu corpo, o tirando de cima do meu bebê.
─Só queria me certificar de que não havia perdido nada... –Levanta sobrancelha.
─Arram, sei. –Sento no banco de couro e pedalo para dar a partida. ─Só pode estar me achando com cara de otária. –Resmungo e ele ri. O que deu nesse garoto hoje?
─Tem razão. –Se afasta, finalmente, da moto e olha diretamente nos meus olhos. ─Eu vim aqui só te lembrar que está me devendo um favor.
Essa é boa. Esse garoto não se enxerga mesmo. Deixo a moto em neutro e desço novamente, me aproximando até ficar quase cinco centímetros de distância do seu corpo.
─Escuta aqui, se acha que vou te devolver o "favor", –Faço um sinal de aspas na última palavra. ─está muito enganado. Vocês fizeram isso comigo e agradeça que não te dei uma surra, então espero que suma da minha frente e não volte mais.
O empurro para enfatizar minha ameaça, mas antes que eu possa recolher minha mão, Alex pega no meu pulso, me segurando com certa força.
─Você não manda aqui, jogadora. Pode ter certeza disso. Eu vou cobrar o meu favor, e quando chegar a hora, espero que seja inteligente o suficiente para retribuir.
─É melhor você esperar sentado sabe, porque em pé vai cansar. –Digo e retiro bruscamente meu braço do seu aperto.
Subo novamente na minha moto e saio derrapando do lugar.
Quem esse garoto pensa que é? Acha que vai me causar medo, me ameaçando desse jeito? Era só o que me faltava! Fui criada nas ruas, quase entrei para uma gangue, se Alex acha que há uma mínima possibilidade de me causar medo, está muito enganado.
Costuro pelas ruas da cidade, com a última cena se reproduzindo uma e outra vez na minha cabeça. O olhar de Alex era sombrio e se eu não fosse louca do jeito que sou, até sentiria medo, mas eu sou Marjorie Evans e o dia que um garoto me causar algum tipo de sentimento, pode ter certeza que será outro muito diferente.
Depois de quase dez minutos de trânsito e ainda com a cabeça a mil, finalmente estaciono na calçada da minha casa.
Moro praticamente do outro lado da cidade, em um dos subúrbios, conhecido como "The Village", porque dizem que a cidade começou daqui, como uma pequena vila, mas com o avanço e crescimento, as famílias mais ricas, moram no lado oposto em "Fresh Pines".
Desço da moto depois de girar a chave e entro na minha casa. Meu lar é pequeno, mas minha família é muito unida e o nosso amor é gigante. Meus pais fazem de tudo para que eu possa ser alguém na vida e eu retribuo esse sacrifício, sendo a melhor filha que posso. Nunca reprovei de ano e tampouco tirei notas baixas. Quando Rogers me encontrou a alguns anos atrás, eu estava no ensino fundamental, quase entrando para uma gangue por más influências, mas ele viu potencial em mim. Passou na frente de uma quadra velha e me viu jogando basquete com algumas garotas gângsters.
No outro dia ele estacionou na frente da minha casa e ofereceu a bolsa esportiva para meus pais, que aceitaram imediatamente. Esse simples ato, mudou completamente o curso da minha vida. Se não fosse por Rogers, talvez eu sequer estivesse viva hoje.
Dou um beijo no rosto da minha mãe e outro no do meu pai. Vou até o quarto de Emma, minha irmãzinha e a encontro brincando com algumas bonecas velhas que ganhamos de alguns amigos e uma caneca azul que ganhou do seu melhor amigo, Austin. Ela não à solta para nada, incluso para tomar banho leva a caneca junto. Se o objeto não está com ela, minha irmãzinha entra em desespero e grita até a encontrarmos.
Emma tem Asperger e é muito difícil compreendê-la e cuidá-la, mas nós somos os Evans, e não desistimos nunca. A amamos incondicionalmente e eu daria minha vida por ela, sem pestanejar.
Algumas crianças zombam dela por causa do seu jeito, mas eu faço questão de deixar claro que ela é tão especial como qualquer outra e merece respeito na mesma medida.
─Oi meu anjo, o que está fazendo? –Dou um beijo na sua bochecha e ela me abraça apertado. A única pessoa que tem contato físico com ela sou eu. Aparentemente sou a única em quem Emma confia o suficiente.
─Chá. –Diz simplesmente, mas eu entendo perfeitamente o que ela quer dizer. Está brincando de "a hora do chá" com suas amigas, Tiffany, Baby B e Magricela, suas três bonecas prediletas.
─Que bom! Eu vou descer para comer algo e depois venho te contar o que aconteceu hoje na escola, okay? –Dou outro beijo na sua cabeça e a deixo sozinha no quarto. Sempre conto algumas coisas do meu dia para ela, para que não tenha medo quando tiver que ir ao ensino médio. Ela frequenta outra escola, onde só tem até o fundamental. Está no sexto ano e é uma garotinha muito inteligente.
Vou até a cozinha, como o prato que mamãe deixou no forno para mim e volto até Emma. Conto algumas coisas triviais que aconteceram hoje e depois vou para o meu quarto descansar.
Fecho os olhos, pegando rapidamente no sono e a primeira imagem que vem na minha cabeça é: eu de toalha, demasiado perto de Alex Estensoro.
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