8. Touro
Eu entendia que a atitude de Lucas na tarde anterior havia sido apenas para que eu me entregasse a ele. Sabia de todas as suas armas, Carolina me contava tudo. E mesmo se não soubesse, me manteria firme na minha decisão. Sabia como era Lucas e não me entregaria a ele.
Fui pro colégio decidida a falar com Carol já que ela não havia respondido minha mensagem no dia anterior. Antes que eu pudesse chegar nela, a garota se aproximou às pressas.
- Você viu o que o Lucas tá espalhando pela escola toda? - Franzi o cenho, vendo Lola e Guilherme se aproximarem em seguida.
- Não. - Olhei para a garota, me virando para ela agora que havíamos parado a meio caminho da sala. - Você recebeu minha mensagem?
- Lucas tá falando que vocês transaram e que você era virgem. - Carol falou de uma vez. - E eu sei que é mentira, porque sei que você não é virgem.
- E ela não acreditaria, porque é sua amiga e sabe que você não faria isso com ela. Não é mesmo, Carol? - Gui completou, arregalando os olhos para a amiga.
- É, claro, tanto faz. - Abanou a mão para Guilherme. - E aí? O que você vai fazer?
Acariciei a ponte do meu nariz, de repente sentindo minha cabeça latejar.
- Vou conversar com ele entre as aulas. - Suspirei profundamente. - Me desculpe por tudo. - Abracei Carol, que retribuiu o abraço.
- Tudo bem. - Ela me afastou, sorrindo para mim.
Sabia que ela devia ter chorado a tarde toda no dia anterior e me doeu não estar lá com ela, por mais que eu soubesse que ela não iria me querer lá.
- Ele foi mesmo à sua casa? - Guilherme quis saber.
- Foi. - Voltei a caminhar, querendo chegar à sala antes que o sinal batesse. - Só pedi pra ele se afastar, porque nunca ficaríamos juntos. Ele tentou me beijar, mas eu o empurrei. - Falei rapidamente, tranquilizando Carolina que ouvia tudo com atenção.
- Tudo bem, amiga. - Ela sorriu mais uma vez para mim e tocando minha mão enquanto entrávamos na sala.
Não tive coragem de olhar na direção de Lucas e me limitei a sentar no meu próprio lugar. Mas não deixei de enviar uma mensagem para ele, que aparecia online naquele momento.
Eu: Me encontre na frente da sala assim que todos forem para o pátio. Quero falar com você.
Continuei sem olhar para ele até que o sinal do horário em que nos falaríamos soasse. Me limitei a fazer anotações e prestar o máximo de atenção nas aulas. Antes de meus amigos saírem, disse à eles que falaria com Lucas e, apesar deles insistirem por ficarem caso eu precisasse de ajuda, insisti que eles fossem para o pátio. Sabia que Carolina poderia surtar a mínima investida do garoto.
Depois de cinco minutos de agitação, eu estava completamente sozinha com Lucas. O garoto, que deveria estar ao lado da porta, entrou na sala assim que o último aluno saiu e fechou a porta atrás de si.
- Por favor. - Indiquei a carteira à minha frente, onde hoje estava sentado Guilherme e Lucas obedeceu ao meu pedido.
- Pensou melhor sobre nós? - Questionou, a perna se cruzando e formando o número quatro enquanto ele alcançava minha mão.
Me afastei prontamente, não queria ter problemas com sinais mal fornecidos durante mais um dia com Lucas.
- Por que você disse para a escola toda que tirou minha virgindade, Lucas? - Cruzei meus braços e o fitei, as sobrancelhas erguidas esperando uma resposta dele.
Lucas ficou vermelho, branco e então gaguejou. Não esperava que eu o confrontasse daquele modo e com certeza estava surpreso pela minha atitude.
- Eu sei que você não o fez e eu poderia chamar o garoto que o fez nesse segundo, mas eu vou poupá-lo do constrangimento. Não vou pedir para que você desminta, cada um sabe o que faz e eu sei que o Universo vai operar algum jeito de puni-lo um dia. E o mais importante: eu não poderia me importar menos. - Me levantei e esperei que ele me desse passagem, mas ele continuou parado, o olhar fixado em mim. Parecia... Admirado. - Dá licença, Lucas.
O garoto pareceu despertar de seu torpor e permitiu que eu passasse. Quando estava na porta, parei e me virei para ele, que tinha os olhos fixos no piso da sala de aula.
- Sugiro que você mude suas táticas. Dizer que ama a garota só para levá-la para cama já é uma tática velha e todas as garotas que caíram nela espalharam para as outras. - Seu olhar encontrou o meu, ele estava intrigado com todas as verdades que eu lhe dizia. Me senti tentada a continuar e foi o que eu fiz. - Não se engane, nenhuma garota cai no seu truque sem querer. Todas elas querem cair e a maioria delas nem gosta de você. Não como Carolina ama, mas você não merece o amor da minha melhor amiga e eu ainda acredito que ela vá encontrar alguém para quem ela poderá dar todo esse amor. Só espero que você não acabe sozinho, Lucas.
Dito isso, saí da sala e fechei a porta atrás de mim, caminhando para longe dali.
É claro que meu amigos vibraram com tudo o que eu havia dito. Nunca achei que conseguiria ter tanta calma para dizer tudo o que sentia sobre Lucas para ele. Achei que desabaria, que bateria nele, mas fiquei impressionada com o meu esporro calmo e maduro. Com certeza aquilo o faria refletir.
Não recebi mensagens dele e foi melhor assim. Logo depois do jantar, eu me sentei na sala com meus familiares e assisti a uma novela que passava, mas que nunca havia visto até aquela semana. Havia estado com eles durante toda a semana e todos estranharam, mas ninguém disse uma palavra sequer.
Pelo menos não até aquele momento.
- Tudo bem, Ju. O que está acontecendo? - Minha mãe, a mais corajosa dentre todos naquela casa foi quem se pronunciou para mim.
Se eles soubessem que eu não acumulava ódio ou raiva alguma, provavelmente teriam se referido à mim há um bom tempo.
Me virei para a minha mãe, estava sentada no chão com Davi e ela no sofá com meu pai, Tuti tomava conta do outro sofá. Um sorriso brincava em meus lábios, mas eu tinha a expressão confusa.
- Como assim, mãe?
A senhora Silva se ajeitou melhor para falar comigo e eu podia ver o olhar curioso dos homens daquela casa em cima de nós.
- Você está mais próxima da família, assiste novela conosco, até mesmo incentivou Tuti a fazer o mesmo. Além disso, não é mais grosseira como na semana passada estava e não é tão fria como sempre foi. - Minha mãe listou todas as minhas mudanças e eu sabia bem ao que ela se referia.
Não conseguindo terminar sua linha de raciocínio, eu a interrompi:
- Tudo bem. Mas não acredito que isso seja um problema, certo? - Ergui as sobrancelhas.
- Não! De maneira alguma!
- O que sua mãe e eu queremos saber, filha - Meu pai interviu, sabendo que minha mãe não teria coragem de perguntar o que queria. - É se você está usando algum tipo de entorpecente.
Ao final daquela frase eu passei a gargalhar e fui acompanhada por Davi, que sabia de toda a verdade e com certeza estava achando hilário meus pais pensaram aquilo sobre mim. Mas era totalmente compreensível.
- Mãe, pai - Peguei a mão de cada um deles antes de continuar. - Eu não estou usando nenhuma droga.
- Graças a Deus! - Meu pai ergueu as mãos para o ar, soltando da minha.
- Vou ligar para a sua avó, ela estava preocupada. - Minha mãe dizia, já digitando no celular para realizar a ligação.
Não contive uma gargalhada, não poderia acreditar que eles sequer cogitaram que eu estava usando drogas.
Observei minha mãe conversar com a minha avó no celular, entendendo apenas parte da conversa.
- É mãe, deve ser isso mesmo. - Os olhos semicerrados da dona Alessandra na minha direção me diziam que os questionamentos ainda não haviam acabado. Ela descolou os lábios do celular e fez mais uma pergunta: - Você está namorando, Julia Silva?
- Por Deus, mãe. Não, eu não estou namorando. - Continuei a rir. - E nem estou apaixonada. Eu não tenho nada, eu juro.
Minha mãe resmungou e voltou a falar com a minha avó.
Agradeci por deixar de ser o centro das atenções quando a trama da novela ficou boa demais para haver mais diálogo ali.
- Sua mãe vai nos deixar no shopping, Ju? - Carol quis saber, logo na saída do colégio.
- Vai sim. - Sorri. - Você vai, Gui?
- Acho que n...
- Vai sim, você precisa de uma roupa nova, meu amor. - Apertei sua bochecha e o vi revirar os olhos.
Nós havíamos combinado de ir ao shopping comprar roupas para o dia seguinte, já que era o aniversário de Carolina e nós queríamos ficar impecáveis.
Desde a minha conversa com Lucas, não havia mais recebido mensagens ou ouvido qualquer outro boato pelo colégio. Quase não recebia seus olhares ou de qualquer amigo ou romance seu. Carolina também dissera que ele não viera atrás dela, isso me deixava mais tranquila. O que eu temia é por seu aniversário, pois sabia que ela havia convidado ele.
Confiaria que ela havia percebido quem era o Lucas e tentaria seguir em frente.
O carro ficou apertado com a carona, mas não demorou para chegarmos até o shopping. Depois dali, voltaríamos de ônibus cada um para a sua casa. Ainda tínhamos nossas próprias malas para aprontar para o dia seguinte.
- Todas vão dormir lá em casa amanhã? - Guilherme quis saber e olhou para Davi, que também nos acompanhava.
- Acredito que sim. - Respondi, assentindo, vendo minhas amigas e meu irmão me acompanharem.
Minha mãe confiava em Guilherme e não se importava caso eu precisasse dormir na casa dele. Carolina e Lola apenas davam uma desculpa qualquer para seus pais. Já havia dito para elas que mentir não era o melhor caminho, mas elas conheciam os riscos e não seria eu a citar todos eles toda vez em que faziam isso.
Assim que terminamos de comer, fomos até uma loja de departamentos e escolhemos nossas roupas. Os garotos ficaram em um andar separado do nosso, já que as roupas masculinas ficavam separadas das femininas. Percebi que a minha opinião sobre as roupas que as garotas vestiam estava muito mais solidificada, crítica e não estava satisfeita até que elas não estivessem perfeitas. Demoramos o dobro tempo dos garotos, mas não deixei de opinar nas roupas deles também e os fiz trocar assim como havia pedido para as garotas.
Quando estávamos todos no metrô, Carol se virou, olhando para as tarefas que havia anotado no celular durante a semana, e disse:
- Tudo bem, amanhã quero todas na casa do Gui perto do meio dia para ajudar com a montagem da decoração e som. OK?
- Sim senhora. - Gui bateu continência.
- Você já mora lá, Guilherme. - Carolina revirou os olhos.
- Mas você sabe se dormirei lá hoje? - Meu amigo ergueu as sobrancelhas duas vezes.
- Você vai continuar fazendo segredinho para nós, não é mesmo? Tudo bem, Guilherme. Nessa festa eu descubro o que você está aprontando. - Minha amiga ergueu a mão espalmada na direção dele.
- Será?
- Por que tanto segredo? - Foi a minha vez de colocar a mão na cintura e o olhar inquisitivamente.
- Olha só se não é a minha estação! - Guilherme fugiu do assunto e foi até a porta. - Até amanhã, pessoal! - Acenou, correndo até as escadas rolantes.
- Por que ele desceu duas estações antes da dele? - Davi questionou, o cenho franzido.
Eu e Lola rimos, enquanto Carol balançava a cabeça em negação. Lola abraçou Davi e selou seus lábios, fazendo o meu irmão se esquecer sobre o que falava há um segundo atrás.
Nunca achei que ia querer aquele tipo de estabilidade, mas eu senti ciúmes bom - se é que aquilo existia - daquela cena pela primeira vez, desejei aquilo para mim também, aquela troca verdadeira de sentimentos.
Será que era loucura?
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