O Palestrante
Na madrugada de sábado para domingo Amber vivenciava um pesadelo, se debatia na cama, aquilo tomava conta de seu corpo. No pesadelo a jovem se encontrava em um lugar alto, frio, ventava muito, com ela uma pessoa, não conseguia saber quem era, a tal pessoa falava suavemente, acariciava seus cabelos e lamentava, Amber se via deitada e olhando para uma grande lua azulada que brilhava no topo do céu por trás da cabeça daquele indivíduo, lentamente aquela pessoa foi deslizando algo gelado pelo corpo da jovem, ela sentia um certo desconforto, contudo não era uma sensação ruim, as palavras doces que escutava deixava aquela noite fria um pouco mais aconchegante, Amber se sentia entregue, relaxou enquanto era conduzida pela voz, porém ao abaixar os olhos por curiosidade, pôde presenciar a cena que deu forma ao seu pesadelo, todo o seu tórax e barriga abertos, seu coração pulsava na mão daquela pessoa, suas palavras já não a alcançavam mais, seu corpo foi esfriando, ela sentia a morte, mas não a morte como muitos descrevem, uma caveira, ou uma entidade sombria que causa pavor, não, Amber enxergou a morte como uma versão dela mesma, uma versão mais alegre, mais jovem, uma versão sem arrependimentos, aquela Amber trazia um abraço reconfortante que tirava toda dor e tristeza, o abraço da morte.
Amber desperta com um pulo, ofegante e tremula, nunca havia tido um pesadelo se quer parecido com aquele. Ficou deitada na cama na esperança de conseguir adormecer novamente.
Se aproximava das 15hrs do domingo, e Amber saia de casa para comprar algumas coisas no mercado, desde sexta-feira não teve contato com qualquer policial, nem mesmo avistou viaturas próximas ao seu apartamento, logo se pôs a pensar, afinal como ela poderia ver algo se esteve trancada no apartamento por um dia e meio, Manhattan não se resumia a janela de seu quarto. Ela desceu e foi caminhando pela rua, a cidade parecia vazia, talvez por ser domingo. Logo a jovem entra no mercado, pega seu carrinho e vai andando escolhendo os produtos, não pegou muita coisa, só o necessário para duas semanas. Se aproximando do caixa vê Henrique, ele logo a vê também e sai disparado na direção da jovem e a abraça com força, Amber fica um pouco surpresa com o abraço repentino, e logo quando ele se recompõe a jovem pede desculpas.
– Perdão Henrique, não apareci no local marcado e você deve ter ficado muito preocupado.
– Olha, estou realmente muito bravo com você, mas te ver bem me trouxe um grande alívio. Eu só queria saber o motivo de sua ausência!?
– Eu fui levada a interrogatório.
– Por quê?
– O detetive responsável pela investigação do caso Buddha Puzzle me intimou a prestar depoimento alegando meu envolvimento com o suicídio da Catherine.
– Sim, o bundão do Adam. Só que ainda não entendi!
– Eles receberam uma ligação anônima avisando sobre a possível morte de Catherine.
– E foi você Amber?
– .......
– No dia em que te encontrei você estava na cabine telefônica.
– Isso não significa muita coisa Henrique!
– Pelo visto você negou isso a polícia, mas me diga a verdade Amber!
– Sim, foi eu quem ligou para a delegacia aquela noite!!
– Como sabia que a Catherine iria se suicidar?
– Eu nunca soube que ela iria se suicidar, mas a enxerguei como uma possível vítima do serial killer!
– E como chegou a essa conclusão?
– Não sei! Uma intuição, uma aposta...
– Desculpe, mas só esses motivos não são o suficiente!
– Acredite se quiser, foi isso que aconteceu!
– Tudo bem então, se você diz! Mas nós precisamos arranjar uma maneira de nos comunicarmos, depois que você não apareceu na sexta-feira eu fiquei achando que estava morta.
– Sim, seria bom ter uma maneira de entrar em contato, já que não tenho telefone em minha casa.
– Falando em casa, por você estar comprando neste mercado significa que mora perto, correto?
– É, mais ou menos...
– Poderia me mostrar aonde mora e eu te visitaria, o que acha?
– Não sei Henrique, desculpe, mas não me sinto segura fazendo isso.
– Te entendo, faz sentido! E se eu te mostrasse aonde moro, é aqui perto, e sempre que você sumir e não conseguir entrar em contato é só passar lá!
– Também não sei se é uma boa ideia.
– Vamos, para de ser besta.
– Tudo bem, vamos terminar de comprar as coisas aqui e iremos na sua casa. Espero que sua mãe me deixe entrar!
– Deixa sim, só precisamos fazer isso antes das 17hrs, antes dos ataques dela. – Riu Henrique.
Naquele fim de tarde que parecia tudo calmo, na TV passava matérias sobre os incêndios criminosos, matérias sobre o seriel killer, uma espécie de série documentária tinha sido criada para contar os assassinatos e tentar explicar os métodos e pensamentos do assassino, os casos teriam se tornado uma grande atração e todos queriam ser informados do que se passava na mente do responsável, mesmo sendo pura especulação de psicólogos e psiquiatras renomados. O programa se chamava “Montado o Quebra-cabeça da Morte”, vinha sendo anunciado a alguns dias e teria sua estreia naquele domingo, 17:30, quase toda a américa do norte se sentaria no sofá para assistir, todos queriam saber o que possivelmente passava na cabeça do Buddha Puzzle.
15:50, Henrique abria a porta para Amber entrar em sua casa.
– Mãe, cheguei!!!
– Oi filho, comprou o que eu pedi? Ohh, quem é essa moça?
– Esta é a Amber.
– Prazer senhora.....? – Amber olha para Henrique querendo saber o sobrenome da mãe dele.
– Ahh, Walker, Jude Walker. – Responde Henrique.
– Senhora Walker, prazer em conhecê-la.
– O prazer é meu. E você Henrique, trouxe os palmitos em conserva? Quero fazer uns lanches para assistir ao programa do serial killer.
– Aqui mãe, eu os trouxe. E que horas vai passar isso na TV?
– 17:30.
– Okay. Eu e a Amber vamos subir no meu quarto, se precisar de algo é só chamar.
– Ela vai ficar para assistir o programa com a gente?
– Não sei senhora Walker, não quero incomodar. – Disse Amber.
– Deixe de bobagens, seria ótimo ter companhia, o Henrique vive fora e nunca me dá atenção, queria alguém para assistir comigo.
– Não seja dramática mãe.
– Talvez eu fique sim, senhora. – Disse Amber.
– Seria ótimo.
– Perfeito, agora nós vamos subindo mãe. E pode deixar suas compras na nossa geladeira Amber, pelo menos o que necessitar.
– Okay.
Amber guarda algumas de suas compras na geladeira e sobe para o quarto com Henrique. Era a primeira vez na casa e no quarto de um homem, olhava atentamente aos detalhes de tudo, se sentia em outro universo, por que se sentia tão empolgada com uma coisa tão simples? Sua situação atual não permitia romances, porém algo despertava em Amber, seu amor platônico por Dylan já nem se fazia presente, Henrique era aquele que estava passando pelos problemas com ela, apesar de não confiar totalmente nele a ponto de revelar tudo, ela se sentia acolhida pela forma bruta e protetora dele, provavelmente ele a enxergava como uma mulher, apesar de ser um dos alunos modelos da escola, o bonitão, bom nos estudos, com o estilo de Bad Boy.
– Enfim no meu quarto, pode se sentar na cama, fique à vontade.
–” Enfim”?? – Riu Amber.
– Ah foi mal, desculpe se a expressão soou errada. – Riu Henrique.
– Não, tudo bem, eu entendi. – Riu Amber.
– Pois bem Amber, me conte mais sobre o que aconteceu na delegacia! – Perguntou Henrique enquanto brincava com uma bola de beisebol.
– Como você sabe, eu não falei a verdade sobre a ligação. O detetive Adams tinha voltado de uma reunião em Nova Iorque, o FBI pode entrar no caso a qualquer momento. Também acabei contando sobre uma pessoa que eu vi pela janela me vigiando, estava de preto e com um capuz cobrindo o rosto.
– E.. Conseguiu ver quem era a pessoa de capuz?
– Não, assim que percebeu que eu o vi, a pessoa se virou e saiu andando, foi assustador.
– Que bom que contou à polícia.
– Sim, pois é...
– Seria bom ter o FBI, quem sabe eles conseguissem resolver.
– O diretor da faculdade estava na sala comigo.
– O diretor!?
– Sim, o assassino ligou para ele aquela tarde, e passou um enigma para ser resolvido.
– Enigma? Você conseguiu ouvir qual era o enigma?
– Não ouvi, eu li.
– E como era?
– Não me lembro com clareza, mas falava de conhecimento, alma, umas coisas deste tipo.
– Alguém conseguiu resolver o enigma?
– Não!
– Se você lembrasse o que estava escrito eu poderia ajudar, sou bom nessas coisas.
– Imagino que seja, você também é meio enigmático. – Riu Amber.
– Eu? Sério? Por que diz isso?
– Sei lá, só vim descobrir o seu sobrenome agora, e você tem esse jeito meio “garoto perdido”.
– O que supostamente isso deveria significar? – Os dois dão risada.
– Um homem, misterioso.
– Se for assim, eu ainda nem sei o seu sobrenome ainda.
– Ops, verdade!!
– Olha só como são as coisas né “garota perdida”. – Risos.
– Amber Mitchel. Este é meu nome completo.
– Prazer, senhorita Mitchel. – Pega a mão de Amber e dá um beijo.
– Parece que ainda existem cavalheiros neste século. –Risos.
– Sou um homem raro.
– Convencido! Aliás Henrique, do que você trabalha? Já que estamos nos conhecendo melhor agora...
– Numa pequena empresa de arquitetura, eles começaram a mais de um ano, antes disso eu nem trabalhava.
– Mais uma curiosidade!
– Pergunte.
– Quantos anos você tem?
– 19 anos.
– Não acredito, sério!!??
– Sério, por quê?
– Sou mais velha do que você, tenho 22. – Amber dá risada.
– E a idade importa tanto assim? – Pergunta Henrique enquanto se senta na cama e se aproxima de Amber olhando fixamente em seus olhos.
– Eu não diria que a idade importa, mas é curioso você ter começado a conver.... – A voz de Amber foi se transformando em um sussurro por causa da aproximação de Henrique.
– ............. – Henrique se aproxima cada vez mais até que beija Amber.
O produtor do programa “Montando o Quebra-cabeça da Morte” possuía uma fita VHS que tinha ido buscar nos correios um dia atrás, sábado. Os carteiros não saiam para fazer entregas aos finais de semana, o produtor foi solicitado por telefone, um dos atendentes do correio alegava ter um pacote em seu nome, o conteúdo era frágil e havia instruções de que o próprio destinatário viesse buscar. O produtor foi e pegou uma caixa enorme, porém muito leve, dentro estava a VHS, levou para casa e assistiu, o conteúdo era espantoso, ele não relatou a polícia pensando em acrescentar como conteúdo extra no programa, com certeza aquela emissora de TV atingiria os mais altos picos de audiência.
No quarto, Henrique se afasta de Amber depois de um longo beijo, o primeiro da jovem, naquele momento ela estava rendida pelo afeto de outro corpo, Amber só queria continuar, ir mais adiante naquilo, nem lembrava mais o que tinha ido fazer na casa do rapaz. Henrique a encarava com vergonha.
– Eu, eu, olha, não sei se devemos fazer isso, sua mãe pode aparecer a qualquer momento e nos ver.
– E que mal tem, minha mãe já me flagrou fazendo coisas muitos piores. – Riu Henrique.
– Eu não sei, acho errado...
– Você não gostou? Fiz algo de errado?
– Não é isso, foi bom, na verdade foi ótimo, mas não faz sentido a gente se encontrar no mercado e acabar na cama fazendo esse tipo de coisa!
– Foi só um beijo Amber, ninguém fez nada demais aqui!
Amber encara Henrique com desejo, o corpo da jovem ansiava por mais.
– Vamos descer e ajudar a sua mãe a fazer os lanches. – Amber se levanta da cama e vai em direção a porta.
– Amber!!
– ???
Henrique coloca Amber contra a porta e começa novamente a beijá-la, a jovem não resiste, ele a segura pela cintura e recua de volta para a cama, os dois se deitam, Amber começa a tirar a roupa dele e ele a dela, não dava mais para segurar, a jovem já nem pensava mais. Henrique se levanta e procura por um preservativo nas gavetas de seu guarda-roupas, acha um, não tinha mais volta e Amber sabia disso.
17:10, a mãe de Henrique começa a andar pela cozinha um pouco perturbada, já tinha tomado seu remédio alguns minutos antes.
No quarto, os dois deitados olhando para o teto, Amber não sabia o que dizer, acabará de realizar um ato que imaginava ser totalmente fora de cogitação para ela, levando em conta o seu passado. Henrique se levanta da cama e vai até a janela fumar um cigarro, ele mantinha uma pose de homem sério. Amber se levanta da cama enrolada nos lençóis e anda pelo quarto.
– Quadrinhos? – Pergunta Amber.
– Sim, eu sempre gostei bastante, na verdade meu sonho era ser um quadrinista, sempre desenhei bem, mas a realidade é dura, arquitetura vai me dar mais futuro.
– Legal, o seu pensamento é bem maduro para...
– ...Uma pessoa mais nova? – Risos.
– Não exatamente. – Risos.
– Você me parece saber muito bem o que quer da vida, eu tenho meus objetivos também, contudo não os vejo como algo que eu realmente queira seguir.
– E o que você quer da vida Amber?
– Talvez esse seja o maior problema, eu não sei, as coisas simplesmente acontecem e nós temos que nos ajustar, faço arquitetura porque também desenho bem e tenho bastante noção geométrica, só por isso, contudo a minha vida é trabalhar e sobreviver neste inferno.
– Bem poético! Já pensou em ser escritora? Poderia acabar se descobrindo.
– Não zombe de mim, falo sério!
– Eu também falo.
– Eu não sei o que quero ser, só sei o que preciso fazer.
– Então tá mulher independente, você quem manda! A propósito, já são mais de 17:00, não quero que fique e veja a minha mãe doida, não quero te expulsar nem nada, entretanto é melhor você ir.
– Eu sei, mas eu queria ficar só um pouquinho, ela me parece ser uma pessoa tão boa e gentil.
– Ela é, quando está plena de suas faculdades mentais.
– Só um pouquinho, só para ver o começo do programa. Já que agora estou envolvida diretamente ao caso.
– Está bem, vamos descer e esperar começar.
Os dois descem e encontram a mãe de Henrique sentada no sofá, muito calada, apenas assistindo TV, eles vão até a cozinha e pegam os lanches que ela havia preparado. Se sentam próximo a dela, e ela sorri, o programa está prestes a começar.
Na TV se iniciava o esperado programa, e a apresentadora começa saudando os telespectadores.
– Boa tarde a todos que nos assiste, meu nome é Lindsan Cooper e hoje vamos iniciar com este programa feito especialmente para tentar desvendar e analisar as ações do assassino, serial killer, maníaco, e qualquer outro adjetivo pejorativo que queiram dar a este monstro que vem aterrorizando os moradores da cidade de Manhattan. Gostaríamos de avisar que este programa não é recomendado para crianças, os assuntos aqui tratados hoje serão pesados e sensíveis. Faremos reencenações das cenas dos crimes que aconteceram para tentar examinar com mais detalhes todos os fatos, familiares das vítimas aceitaram participar para nos darem depoimentos. Também teremos a presença de renomados nomes da psicologia e da psiquiatria para explicar o modo de agir e de pensar do assassino, e por último, um pouco fora do planejado, iremos exibir um conteúdo exclusivo, fiquem até o final. O mergulho na mente deste criminoso começa agora. Monte conosco o quebra cabeça da morte.
Amber, Henrique e sua mãe passam os 90 minutos acompanhando o programa, a mãe dele já estava apresentando sinais de estresse e algumas vezes se levantou e se sentou sem razão, Amber ficou ao lado dela conversando, tentando distrai-la. O programa caminhava para o fim, o conteúdo exclusivo estava para ser revelado.
– Muitas coisas aconteceram nesses últimos tempos, tentamos passar tudo o mais detalhado possível neste programa. Porém ainda não acabou, nosso produtor chefe adicionou material extra, confesso que nem mesmo eu sei do que se trata, uma surpresa a todos nós, vamos assistir agora.
O vídeo começa. Sentado em uma cadeira amarrado, no centro de um quarto, chorando, uma luz focava em seu rosto, um rapaz de descendência asiática olhava para a câmera, por trás dele uma pessoa, não era possível identificar quem era. A pessoa que estava atrás dele toca em seu ombro, e o rapaz que chorava começa a falar.
– Boa noite, eu sou Natan Takashi, serei seu palestrante...
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